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3. Leituras libertadoras e experiências produtivas de mediação de leitura literária

3.1 Políticas governamentais para a leitura no Brasil

3.1.2 Importância e contribuições do Plano Nacional do Livro e da Leitura

A principal política governamental voltada para a leitura no Brasil, atualmente, é o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) que, como um projeto guarda-chuva, fomenta e desenvolve diversas ações em todo o país com a finalidade de promover a leitura. De acordo com a obra PNLL: textos e história, organizada por José Castilho Marques Neto (2010), o Plano em questão é uma iniciativa bastante promissora do governo federal, resultante de diversos diagnósticos sobre o baixo índice de leitura pela população brasileira e que se tornou uma “referência para muitos dos planos de leitura que também se desenvolvem nos países irmãos do continente americano e no mundo ibérico” (MARQUES NETO, 2010, p. 14). Certamente, isso decorre da integração de diversos setores interessados no desenvolvimento da leitura no Brasil, a exemplo das universidades, as organizações não governamentais voltadas para formação do leitor e os representantes do mercado editorial. Conforme esclarece o projeto do PNLL:

Os entrelaçamentos conceituais e práticos da ação do Estado com a sociedade e a indissociabilidade entre a cultura e a educação na formação de leitores são pontos referenciais que o PNLL do Brasil possui e foram intensamente debatidos e assimilados como necessidade da política pública de leitura em inúmeros foros internacionais. Nesses 4 anos o plano brasileiro de leitura foi intensamente debatido e assimilado em dezenas de convenções, seminários, congressos e reuniões de especialistas de inúmeros

países, particularmente aqueles organizados pelo Cerlalc/UNESCO (Red de Dirigentes de Planes de Lectura) e pela OEI (Comite de expertos en lectura y bibliotecas) (MARQUES NETO, 2010, p. 14). Dos debates promovidos entre os setores interessados, nasceu um conjunto de “diretrizes para uma política pública voltada à leitura e ao livro no Brasil, cuja motivação principal era “a necessidade de formar uma sociedade leitora como condição essencial e decisiva para promover a inclusão social de milhões de brasileiros no que diz respeito a bens, serviços e cultura, garantindo-lhes uma vida digna e a estruturação de um país economicamente viável” (MARQUES NETO, 2010, p. 31). Note-se, nesse discurso, a relevância que se dá ao papel da leitura para a integração e o desenvolvimento dos sujeitos na sociedade contemporânea.

A abrangência do PNLL é bastante extensiva, afinal, o Plano se propõe a nortear, de forma orgânica, políticas, programas, projetos e ações continuadas desenvolvidos no âmbito de ministérios [...], governos estaduais e municipais, empresas públicas e privadas, organizações da sociedade e de voluntários em geral, procurando evitar o caráter por demais assistemático, fragmentário e pulverizado com que se têm implementado essas iniciativas em nosso país, desde, pelo menos, o início do século XIX (MARQUES NETO, 2010, p. 31). O objetivo dos idealizadores do Plano é que essas propostas se realizem por meio de “amplos programas do governo, com coordenações interministeriais devidamente articuladas com estados, municípios, empresas e instituições do terceiro setor”, com a finalidade de democratizar o acesso, fomentar a leitura e a formação de mediadores, valorizar a leitura e o seu valor simbólico e desenvolver a economia no setor do livro. De acordo com Marques Neto (2010), a elaboração do documento final do PNLL resultou de um debate com “toda a cadeia produtiva do livro – editores, livreiros, distribuidores, gráficas, fabricantes de papel, escritores, administradores, gestores públicos e outros profissionais do livro” (p.31), juntamente com os profissionais que se dedicam à formação do leitor, os “educadores, bibliotecários, universidades, especialistas em livro e leitura” [e demais] “organizações da sociedade, empresas públicas e privadas, governos estaduais, prefeituras e interessados em geral” (p. 32). Como detalha Marques Neto:

Entre as diversas iniciativas que contribuíram diretamente para a elaboração deste Plano, podem ser lembradas: o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), o Programa Nacional da Biblioteca Escolar (PNBE), o fórum da Câmara Setorial do Livro, Leitura e Literatura (instituída por decreto presidencial em 2005 e da qual decorreu o atual Colegiado Setorial de Livro, Leitura e Literatura), o Projeto

Fome de Livro (iniciativa do MEC/Biblioteca Nacional), o Programa Nacional do Livro no Ensino Médio (PNLEM), o Programa de Formação do Aluno e do Professor Leitor e o Viva leitura – Ano Ibero-americano da Leitura (2005), imenso programa desenvolvido pelo MinC, MEC, organismos internacionais e entidades da sociedade. Merece especial ênfase a contribuição oferecida pelo Programa Nacional de Incentivo à Leitura (PROLER), que, com a experiência acumulada ao longo de mais de quase duas décadas na realização de projetos de fomento à leitura por todo o país, com a promoção de oficinas, cursos, palestras e eventos artístico-culturais das mais diferentes naturezas, pôde fortalecer subsídios para o debate em questão (MARQUES NETO, 2010, p. 32).

A avaliação dos resultados dos três primeiros anos do PNLL se deu em assembleias estaduais do livro e da leitura, entre 2009 e 2010, e culminou nas discussões e encaminhamentos realizados durante a Pré-Conferência Nacional do Livro e da Leitura, ocorrida em março de 2010, em Brasília. De acordo com Neto (2010, p. 33), as propostas encaminhadas pelas assembleias estaduais não indicavam “mudanças nos conceitos, princípios e diretrizes do Plano, mas contribuições que, em sua essência, apontam para um desejo daqueles que trabalham nos estados e municípios em trazer para uma dimensão local as bases em que está consolidada a política nacional”. A necessidade de implementar, dinamizar e manter as bibliotecas públicas destacou-se como uma das preocupações centrais dos integrantes das assembleias, o que reforça os princípios do PNLL, “como o da compreensão da biblioteca como um equipamento cultural que reúna elementos de acessibilidade do espaço físico” [além da] “ampliação e a qualificação do acervo” [e da] “contratação de mediadores de leitura capacitados; a incorporação à biblioteca de diferentes suportes de texto e novas tecnologias” (MARQUES NETO, 2010, p.33).

A necessidade de abarcar a diversidade de situações culturais e sociais no acesso ao livro, explicitamente na forma de atividades que garantam o acesso da população comumente marginalizada da relação com a leitura e o livro, é evidente nas discussões e reflexões promovidas pelas assembleias do PNLL. Garantir ações que, por um lado, alimentem a “cadeia criativa do livro” e, por outro, integrem a população brasileira – tradicionalmente excluída dos processos de letramento literário – à mesma cadeia. Isso reafirma a importância de se integrar setores da sociedade que estão associados às discussões sobre a leitura, pois olhares de diferentes ângulos permitem o planejamento e a execução de ações que, conforme nos esclarece o documento do PNLL, garantam “a otimização de recursos e

esforços que venham conferir maior eficácia às políticas públicas” (MARQUES NETO, 2010, p. 34).

Um consenso saiu das discussões realizadas em torno do PNLL, entre 2009 e 2010: para transformar o tema da leitura e do livro em Política de Estado, é preciso avançar e priorizar alguns pontos: transformar o Plano Nacional do Livro e Leitura em lei, “dando-lhe uma situação institucional estável”, fortalecer o fórum de discussão sobre leitura, na forma do Colegiado Setorial do Livro, Leitura e Literatura do MinC, fixar “marcos legais, com base na Constituição, que tornem viáveis as políticas, os programas, os projetos e as ações continuadas preconizados pelo Plano” e institucionalizar “uma nova estrutura de governo, que deve ser consolidada e/ou instituída no âmbito da administração pública federal para a área da leitura e do livro (e, por conseguinte, da biblioteca e da formação de mediadores)” (MARQUES NETO, 2010, p. 34-35).

Os eixos de trabalhos e projetos incentivados pelo PNLL abarcam questões como a democratização do acesso ao livro, implantações e fortalecimento de bibliotecas em todo o país, o fomento à leitura e à formação de mediadores, bem como o fomento às pesquisas sobre o livro e a leitura. São ações que, somadas às iniciativas de valorização do valor simbólico da leitura e de fomento à produção, distribuição e circulação de bens de leitura, integram diversos interesses que podem culminar em uma verdadeira política governamental, em todas as suas instâncias.

As transformações fomentadas pelo PNLL já são visíveis em muitos estados e municípios do país. São projetos de leitura que, implementados e em funcionamento, colocam em prática as ações propostas pelo Plano, construindo pontes entre os diversos espaços sociais, englobando tanto o contexto escolar quanto o extraescolar. Contudo, ainda há uma grande diferença no volume de projetos por regiões no país, bem como na comparação entre capitais, cidades de grande porte e pequenas cidades, e mais ainda entre zona urbana e zona rural. O que se pode afirmar, dessa comparação, é que as discussões e os encaminhamentos do PNLL beneficiam muito mais regiões mais desenvolvidas e urbanizadas do que outras com menor índice de desenvolvimento. Ainda que se tenha avançado significativamente nas discussões sobre a leitura, a sociedade brasileira ainda se distancia bastante do ideal de uma sociedade leitora, a exemplo dos resultados da pesquisa Retratos da leitura no Brasil (2012).

3.2 Projetos e iniciativas não governamentais: experiências de transformação