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CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA

2.3 IMPORTÂNCIA DA INTERDISCIPLINARIDADE

Os avanços científicos e tecnológicos alcançados pelo homem na atualidade indicam possibilidades de um futuro cujas estruturas pedagógicas tradicionais não conseguem mais acompanhar. O conhecimento não se move de forma linear, mas num movimento circular e de auto-organização. (TEIXEIRA, 2007)

Essa realidade complexa aponta para a urgência da produção de um conhecimento não-fragmentado, de um conhecimento que leve em consideração os princípios de continuidade e descontinuidade, da unidade e da multiplicidade, de um todo que é muito maior do que a simples soma de suas partes.

Santomé (1998) afirma que a globalização provocou mudanças que afetaram o setor industrial e empresarial, especialmente a partir da década de 80. Essas mudanças refletiram no mercado de trabalho, que passou a exigir pessoas que tivessem competência para desempenhar bem várias funções, o que exigiu uma capacitação mais global, menos fragmentada.

Para Goldman (1979, citado por THIESEN, 2008), um olhar interdisciplinar sobre a realidade permite um melhor entendimento da relação entre este todo e as partes que o constituem. O autor afirma que, apenas por meio do pensar dialético, edificado na historicidade, pode-se realizar a integração entre as ciências. Destaca- se aqui a importância do materialismo histórico-dialético que, ao colocar a

historicidade e os princípios do movimento dialético da realidade como fundamento para as ciências, deu grande contribuição para a superação do problema da fragmentação do conhecimento.

Além das importantes contribuições advindas das formulações filosóficas do materialismo histórico-dialético, também as teorias críticas trouxeram contribuições para esse novo enfoque epistemológico por meio de proposições pedagógicas.

O trabalho interdisciplinar em educação é defendido por muitos estudiosos que alegam ser este crucial nas ciências sociais. Para Frigotto (1995), o alcance de uma maior objetividade (sempre relativa, porque histórica) somente se atinge pelo intercâmbio crítico intersubjetivo dos sujeitos que investigam uma determinada problemática.

O autor defende que o modo de pensar fragmentário e linear, produz conhecimentos que, transformados em ação, trazem inúmeros problemas para a humanidade. Para ele isso só pode ser resolvido mediante práxis revolucionária, o que constitui um processo histórico de superação. Práxis é aqui entendida como reflexão teórico-crítica e ação prática na produção de alternativas ao modo alienante e excludente de produção da vida humano-social (p. 41).

Segundo Lück (1994), a cooperação entre as várias disciplinas provocará intercâmbios reais e, consequentemente, enriquecimentos mútuos, pois quanto mais trocas se estabelecem, mais complexos se tornam os sujeitos, que desenvolverão maior capacidade de agir sobre o real. Destaca-se aqui a importância do exercício do diálogo, da abertura para novas posturas, para novos indicadores e possibilidades de trabalho. O exercício dialético é, segundo a autora, fundamental para ensejar novas proposições de sínteses que provocarão o surgimento de tantas outras sínteses, numa constante dialética.

Alem de ser vista como uma necessidade, a interdisciplinaridade é apontada também como meio para superar desafios, sendo o principal deles, segundo Fazenda (2006) “vencer as amarras pessoais”, as próprias resistências, num processo de convencimento e de superação que exige uma adesão irrestrita ao processo de desvelamento da prática.

Para Etges (1995), a interdisciplinaridade, se desenvolvida sistematicamente, pode elevar a capacidade de cooperação, uma vez que ela não só aprecia a tolerância frente às outras teorias, como também incita a criação de novas teorias. O autor afirma que a conseqüência mais radical da interdisciplinaridade aponta para

uma rearticulação total da universidade atual, por meio da formação de redes que devem ser organizadas de modo a primar pela liberdade.

A interdisciplinaridade proposta, segundo o autor, se funda num trabalho científico sendo, em primeiro lugar, “uma ação de transposição do saber posta na exterioridade para as estruturas internas do indivíduo, constituindo o conhecimento.” (p.73)

Apontada como necessária para mediar a comunicação entre os cientistas e entre eles e o mundo do senso comum, a interdisciplinaridade permite extrapolar a linguagem específica de cada área, criando-se assim uma linguagem comum entre as diferentes disciplinas ou especialidades. Por isso, se constitui num elemento mediador de comunicação.

O Por meio da territorialização do conhecimento, segundo Macedo (2003), diferentes especialistas exercem seu poder num ritual que envolve, além do domínio do conhecimento, uma linguagem que diferencia os especialistas dos não-

especialistas. “Esta linguagem se torna cada vez mais específica, de modo a

continuar atuando como instrumento de diferenciação.” (p. 47)

O trabalho interdisciplinar constitui possibilidade de promover a superação da fragmentação das experiências escolares entre si, como também da dissociação destas experiências com a realidade social. É uma prática que emerge da compreensão de que o processo ensino-aprendizagem não se restringe ao fazer pedagógico, mas se configura num problema também epistemológico.

Tanto a Psicologia quanto a Psicopedagogia fundamentam a proposição de um currículo que seja interdisciplinar, baseadas em estudos realizados que comprovam que a aprendizagem se dá pela capacidade de estabelecer relações entre conceitos espontâneos e científicos. Essa teoria exige um repensar do currículo escolar, que deve se basear na ideia de rede de relações, eliminando-se os redutos disciplinares. (NOGUEIRA, 1994) Para o autor, as ciências devem pensar num ser humano global, abordando um mesmo tema sob vários enfoques, sempre respondendo às necessidades da relação teoria e prática, educação e sociedade.

Tomando como exemplo, tanto os parâmetros quanto as diretrizes curriculares oficiais, seja da educação básica seja da educação superior, verifica-se que a interdisciplinaridade é apontada como "eixo articulador" imprescindível.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (1997) é reforçada a importância instrumental de cada área do conhecimento, porém, a

integração entre estas e os Temas Transversais é ressaltada ao longo de todos os volumes do documento. Propõe-se a elaboração de eixos organizadores que possibilitem um tratamento interdisciplinar e cíclico aos conteúdos. É possível encontrar referência à importância da interdisciplinaridade como forma de enriquecimento do trabalho pedagógico, de integração entre os conteúdos, de flexibilização no tratamento destes conteúdos, de ampliação de conceitos e do entendimento da realidade e, principalmente, como forma de superação de um ensino fragmentado do mundo.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (2002) trazem a interdisciplinaridade como eixo integrador, indicando que esta deve nascer da necessidade sentida pela própria escola, pelos seus professores e alunos. A proposta contida no documento reforça a necessidade de se estabelecer ligações de complementaridade, de convergência, interconexões e passagens entre os conhecimentos, considerando que esta integração pode criar as condições necessárias para uma aprendizagem mais motivadora, significativa e, portanto, vinculada ao real.

A Resolução do Conselho Nacional de Educação, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de Pedagogia no ano de 2006, além de explicitar a importância da interdisciplinaridade em alguns artigos, reforça-a ao estabelecer núcleos de estudos (núcleo de estudos básicos; núcleo de

aprofundamento e diversificação de estudos e núcleo de estudos integradores) que

devem se articular ao longo de toda a formação, a partir da integração entre os diferentes componentes curriculares.

Consta em seu artigo 3º que o estudante de Pedagogia trabalhará com um

repertório de informações e habilidades de conhecimentos teóricos e práticos plurais, cuja consolidação será proporcionada no exercício da profissão, fundamentando-se em princípios de interdisciplinaridade, contextualização, democratização, pertinência e relevância social, ética e sensibilidade afetiva e estética.

O enfoque interdisciplinar aparece também no artigo 5º da mencionada Resolução, inciso VI, quando anuncia que o egresso do curso de Pedagogia deverá

estar apto a ensinar Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano.

A abrangência da formação do profissional pedagogo, com a extinção das habilitações e com a integração dos enfoques relacionados às práticas educativas escolares e não-escolares, à gestão educacional, à educação de jovens e adultos, dentre outros, traz uma contribuição importante por propiciar o rompimento com as visões fragmentadas das habilitações e com a dicotomização das funções do pedagogo.

As Diretrizes anunciam a exigência de uma sólida formação teórica, fundamentada nas contribuições das diferentes ciências e saberes que atravessam o campo da pedagogia. Essa formação exige, por sua vez, um novo olhar e uma nova organização do currículo do curso, para além das concepções restritas a um elenco de disciplinas fechadas em suas áreas de conhecimento.

Vale ressaltar que, apesar de fazerem, recorrentemente, referência à interdisciplinaridade, nenhum destes documentos apresenta uma base conceitual ou de caráter didático a respeito do tema.

Com base em Moraes (2008), podemos afirmar que as discussões sobre interdisciplinaridade estão fortemente presentes nas atuais tendências teóricas que tratam dos processos de construção do conhecimento. A autora, ao discutir o paradigma educacional emergente, destaca a presença desse enfoque no construtivismo piagetiano, na pedagogia libertadora de Freire, na teoria das inteligências múltiplas de Gardner, na abordagem histórico-cultural de Vygotsky, na teoria da complexidade de Morin, nas formulações de Capra, Papert, Prigogine, Bohm, Boaventura Sousa Santos e vários outros.

2.4 - INTERDISCIPLINARIDADE NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: BREVE HISTÓRICO

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