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2. REVISÃO DE LITERATURA

2.4 IMPORTÂNCIA DAS AVES NA TRANSMISSÃO DE PROTOZOÁRIOS

2.4.1 Toxoplasma gondii

Diversas espécies de aves domésticas e silvestres têm sido identificadas como hospedeiros intermediários naturais de T. gondii, a exemplo de anseriformes (patos), accipitriformes (gaviões, abutres, urubus, falcão), galiformes (perdizes, faisões e perus), gruiformes (carquejas), charadriiformes (gaivotas, andorinhas), columbiformes (pombos, rolas), strigiformes (corujas) e passeriformes (pardais, escrevedeira-amarela) (Dubey et al., 2001). A infecção de aves com T. gondii tem sido observada desde 1911, quando o parasito foi observado pela primeira vez em aves, por Cariri (Dubey, 2009).

Estudos sorológicos em aves e isolamento de T. gondii a partir de tecidos de aves por bioensaio em camundongos e gatos, têm sido relatados em diversos países. Essas aves são oriundas de zoológicos (Literák et al., 1992; Zhang et al., 2000; Dubey et al., 2001), criatórios particulares (Leite et al., 2007) e aves de vida livre (Dubey et al., 1992; Quist et al., 1995; Work et al., 2000; Dubey et al., 2003b). Algumas espécies de aves são

resistentes à infecção por T. gondii, porém outras podem desenvolver sintomatologia da doença e ir a óbito. Em 2002, dois gansos foram a óbito por toxoplasmose disseminada, apresentando cistos do parasito em fígado, baço e ureter, além de lesões significativas em outros órgãos (Dubey et al., 2001).

Estudos sobre parasitos Toxoplasmatíneos em galinhas têm recebido grande atenção em diversas regiões do mundo, incluindo o Brasil (Dubey, 2009), que conta com mais de 109.127.169 cabeças de galinhas poedeiras, onde o nordeste do país representa cerca de 14% desse efetivo comercial; porém, essa quantidade de aves no país é subestimada, pois é comum a criação de galinhas caipiras junto com outras espécies animais, o que não é contabilizado (IBGE, 2009). Estima-se que no ano de 2009 o consumo de carne dessa espécie foi de 7,6 milhões de toneladas (http://www.mfrural.com.br/ acesso 02/03/2010).

Frangos de criações comerciais estão menos expostos a T. gondii quando comparados com galinhas caipiras. Na Bahia, 3% de 200 galinhas poedeiras foram soropositivas para T. gondii, número este significativamente inferior ao de galinhas caipiras soropositivas para o parasito (25%) (Costa et al., 2008). No Rio Grande do Sul foi encontrada uma soroprevalência de 2,8% em aves comerciais abatidas em um frigorífico (Meireles et al., 2003).

Devido à mudança de hábitos alimentares, a criação de galinhas caipiras vem aumentando, pois os consumidores têm procurado galinhas orgânicas para o consumo, resgatando então o sistema de criação extensivo. Em 1995, foi demonstrado que pessoas que mantinham criações de galinhas caipiras apresentaram maiores freqüências de anticorpos contra T. gondii do que pessoas que não mantinham contato com aves (Camargo et al., 1995).

Um aspecto importante das aves na transmissão de T. gondii para os carnívoros, é que cães e gatos semi-domiciliados ou de vida livre, tem o hábito de caça, sendo que comumente suas presas são pequenos roedores e aves (Frenkel et al., 1987; Ferroglio et al., 2007). As aves representam 24% dos animais silvestres rotineiramente caçados por

felinos, contudo, as pertencentes à ordem Passeriforme são mais observadas na preferência de caça pelo animal, pois são aves pequenas e encontradas nas cidades (Woods et al., 2003).

Pombos e pardais são as aves silvestres mais comumente encontradas no meio urbano, portanto, são transmissores potenciais de T. gondii e N. caninum para cães e gatos, os quais podem eliminar oocistos no ambiente, facilitando a transmissão desses parasitos para humanos (Literák et al., 1992; Tsai et al., 2006; Alves et al., 2009; Gondim et al., 2010).

O solo contaminado com oocistos de T. gondii pode ser fonte de infecção para animais e humanos, sendo que as galinhas são boas indicadoras de contaminação ambiental, pois se alimentam diretamente do solo (Ruiz & Frenkel, 1980). Em um estudo no Rio de Janeiro, em uma área endêmica para toxoplasmose humana, as galinhas serviram como bons indicadores de contaminação ambiental; obteve-se isolamento de T. gondii em aves que residiam na região estudada (da Silva et al., 2003).

Galinhas alimentadas com oocistos de T. gondii podem albergar cepas virulentas do parasito em diferentes tecidos sem apresentar sinais clínicos de toxoplasmose (Dubey et al., 2002b). Aves infectadas podem servir de fonte de infecção para gatos, que podem ser alimentados com seus tecidos e eliminar oocistos no ambiente (Ruiz & Frenkel, 1980). Em um estudo para avaliar a presença de T. gondii em galinhas e as diversidades genéticas entre as cepas isoladas, foram observadas cepas com variados graus de virulência e uma frequência de animais soropositivos entre 2 a 100% (Dubey, 2009).

Toxoplasma gondii está presente em galinhas em diferentes continentes, sendo que diversos trabalhos têm relatado a soroprevalência para o parasito nessas aves (Dubey et al., 2003a; Dubey et al., 2003b; Dubey et al., 2003c; Dubey et al., 2003d; Sreekumar et al., 2003a; Dubey et al., 2004a; Dubey et al., 2008). No Brasil, galinhas soropositivas para T. gondii têm sido observadas em diferentes regiões do país, conforme dados sumarizados na Tabela 1.

Tabela 1 – Frequências de anticorpos anti-Toxoplasma gondii em galinhas criadas em diferentes Estados do Brasil

Estado Sistema de manejo Método diagnóstico n. Ponto de corte Frequência Referência AM VL VL MAT HAI 50 17 1:5 1:16 66% 41,2% (Dubey et al., 2006b) (Ferraroni and Marzochi, 1980)

RS VL MAT 50 1:10 38% (Dubey et al.,

2007)

PA VL MAT 34 1:10 58,8% (Dubey et al.,

2007)

PR VL MAT 40 1:5 40% (Dubey et al.,

2003d)

RJ VL MAT 198 1:10 65,1% (da Silva et al., 2003) SP MAT 82 1:10 40,2% (Dubey et al., 2002b) PE, RN, MA, BA, CE, SE e AL

VL MAT 152 1:5 53,3% (de Oliveira et al., 2009) BA VL e C IFI 200 200 1:16 25% 3% (Costa et al., 2008)

MAT = aglutinação modificada; IFI = imunofluorescência indireta; HAI = teste de hamaglutinação; VL = vida livre, C = criação comercial

O isolamento de T. gondii por bioensaio em camundongos e gatos a partir de tecidos de galinhas naturalmente infectadas, tem sido descrito em vários países, sendo portanto evidente a importância da galinhas na transmissão do parasito (Dubey, 2009). No Brasil o parasito tem sido isolado em diversas regiões, incluindo Amazônia (Dubey et al., 2006b), Rio de Janeiro (Dubey et al., 2003a), Paraná (Dubey et al., 2003d), São Paulo (Dubey et al., 2002b), Pará, Rio Grande do Sul (Dubey et al., 2007), Minas Gerais (Brandao et al., 2006), Pernambuco, Rio Grande do Norte, Maranhão, Bahia, Ceará, Sergipe e Alagoas (de Oliveira et al., 2009).

2.4.2 Neospora caninum

Em um estudo epidemiológico realizado na Holanda, a presença de galinhas, gansos e patos foi associada estatisticamente com uma maior ocorrência de abortos bovinos por N. caninum (Bartels et al., 1999). Em outro estudo epidemiológico, a presença de galinhas foi considerada um fator de risco na transmissão do protozoário para a espécie bovina (Otranto et al., 2003).

A confirmação das aves como hospedeiros intermediários naturais de N. caninum só foi relatada recentemente, quando DNA do parasito foi detectado em tecidos de galinhas e de pardais (Costa et al., 2008; Gondim et al., 2010).

Sabe-se que galinhas caipiras (criadas em contato com o solo) estão mais expostas a N. caninum do que galinhas de criações comerciais; no Estado da Bahia, 23,5% de 200 galinhas caipiras foram soropositivas para o parasito, ao passo que somente 1,5% de 200 galinhas poedeiras de criatórios comerciais foram soropositivas para N. caninum (Costa et al., 2008).

A identificação de pardais como hospedeiros intermediários naturais de N. caninum, além de galinhas, amplia o leque de hospedeiros naturais do parasito; essas aves provavelmente se infectam a partir da ingestão de oocistos presentes no solo. A identificação de N. caninum em tecidos de aves naturalmente infectadas pode ter uma grande importância epidemiológica, uma vez que tecidos de aves são consumidos por canídeos e outros possíveis hospedeiros definitivos, o que pode ter um grande impacto na disseminação de N. caninum (Gondim et al., 2010).

Infecções experimentais com N. caninum têm sido realizadas em diferentes espécies de aves. Pombos (Columbia lívia) e Poephila guttata foram inoculados com N. caninum com o intuito de investigar se essas aves poderiam servir como hospedeiros intermediários do parasito. Pombos foram susceptíveis à infecção, pois apresentaram sorologia, PCR e cultura celular positivas para o parasito, além de lesões características

em exame histopatológico; Poephila guttata foram resistentes a infecção (McGuire et al., 1999).

Frangos, galinhas poedeiras e ovos embrionados foram inoculados com taquizoítos de N. caninum por via intraperitoneal e cavidade alantoideana. As galinhas demonstraram resistência ao parasito, pois não apresentaram sinais clínicos da doença, porém soroconverteram após 15 dias de inoculação e os títulos de anticorpos não foram dose-dependentes. Contudo, os ovos embrionados infectados induziram a excreção de oocistos em cães, o que coloca a possibilidade do papel das aves na transmissão do parasito para outras espécies animais (Furuta et al., 2007).

Em outro estudo, pombos foram inoculados com taquizoítos de N. caninum, sendo que um pombo foi a óbito após 25 dias de inoculação; no exame imuno-histoquímico, parasitos foram encontrados em pulmões, coração, sistema nervoso central, fígado, baço e rins (Mineo et al., 2009).

Apesar da confirmação de infecção natural de N. caninum em galinhas e pardais (Gondim et al., 2010; Costa et al., 2008) e da demonstração da susceptibilidade de certas espécies de aves em infecções experimentais com o parasito (McGuire et al., 1999; Mineo et al., 2009), ainda não foi confirmado o papel das aves na transmissão do parasito para outras espécies animais.

2.4.3 Hammondia sp.

Até o momento da elaboração deste trabalho, não foram identificados quaisquer relatos de infecção natural por H. heydorni ou H. hammondi em qualquer espécie de ave doméstica ou silvestre.

2.5 DIAGNÓSTICO DE INFECÇÃO POR PARASITOS

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