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Formas amastigotas de Leishmania sp. foram observadas no miocárdio de 66,7% (20/30) dos cães em pelo menos uma das áreas estudadas (Figura 12). Os parasitas foram observados no citoplasma de macrófagos e, com raras exceções, no meio extracelular. Verificou-se uma correlação entre o número de células parasitadas e a intensidade do infiltrado inflamatório, tanto no AD (p=0,039) como no VD (p=0,018). Os valores mínimo, máximo e mediana do número de células parasitadas encontram-se listados na Tabela 3.

Os resultados individuais do número de macrófagos parasitados, obtidos pela avaliação imuno-histoquímica para detecção de Leishmania sp. nas quatro áreas do miocárdio, encontram-se apresentados no Apêndice F.

Tabela 3 – Valores mínimo, máximo e mediana do número de células parasitadas por Leishmania sp. na parede livre de átrio direito (AD), parede livre de ventrículo direito (VD), septo interventricular (SIV) e parede livre de ventrículo esquerdo (VE) do miocárdio de 30 cães naturalmente acometidos por leishmaniose visceral. (Araçatuba-SP, 2012)

Estatística AD VD SIV VE

Mediana 5,5 3,5 1 1,5

FIGURA 12 - Fotomicrografias de coração de cães naturalmente acometidos por LV. (a) Em átrio direito observam-se formas amastigotas do parasita (setas), associadas a foco de infiltrado de células inflamatórias. Obj. 40x. (b) Em ventrículo direito observa-se a presença do parasita (seta) no interior de macrófagos (detalhe). Obj. 100x (em imersão). Complexo Estreptavidina Biotina Peroxidase. (Araçatuba-SP, 2012).

a

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5 DISCUSSÃO

Por meio de uma abordagem observacional transversal (HULLEY et al, 2008), o presente estudo avaliou a ocorrência de alterações histopatológicas e a presença de Leishmania sp. no miocárdio de cães acometidos por LV. Os resultados obtidos indicam que em cães naturalmente acometidos pela enfermidade pode ocorrer lesão de cardiomiócitos. Nas literaturas médica e veterinária, além de serem raros os estudos que avaliaram o coração de pacientes com LV, a grande maioria consiste no relato de casos individuais (FERRARI et al., 2006; FONT et al., 1993; LÓPEZ-PEÑA et al., 2009; MOFREDJ et al., 2002; PUERTO-ALONSO et al., 2006; TORRENT et al., 2005; ZABALA et al., 2005), sendo poucos os ensaios realizados em um número maior de indivíduos (ALVES et al., 2010; MORAIS et al., 1988).

Embora a literatura descreva o acometimento cardíaco como um evento raro em cães e seres humanos com LV (ALVES et al., 2010; FERRARI et al., 2006; LÓPEZ-PEÑA et al., 2009; PUERTO-ALONSO et al., 2006), foi possível verificar uma alta prevalência desse tipo de manifestação na população avaliada. É provável que tal discrepância se deva ao fato de muitos pacientes com LV se apresentarem assintomáticos quanto ao comprometimento do sistema cardiovascular, o que faz com que tais alterações sejam subestimadas.

A especificidade diagnóstica da avaliação histopatológica do miocárdio é muito limitada, uma vez que as células musculares cardíacas respondem à agressão com um espectro limitado de reações (VLEET; FERRANS, 2009). Quando se estudam alterações presentes no miocárdio, é imprescindível que tal informação seja cuidadosamente considerada, uma vez que alguns tipos de lesões podem estar associadas à presença de enfermidades concomitantes, e não são causadas diretamente pela presença de um único agente etiológico. Por esse motivo, e levando-se em consideração o fato de que a área onde foi realizado o presente estudo é endêmica para erliquiose canina, todos os animais que apresentaram títulos de anticorpos para E. canis foram excluídos

do experimento. Assim como o Trypanosoma cruzi, a E. canis apresenta potencial de produzir miocardite em cães (DINIZ et al., 2008).

Os 30 cães avaliados no presente estudo apresentaram média de idade de três anos, caracterizando uma população predominantemente jovem. Em sua maioria, os relatos que descreveram o acometimento cardíaco de cães com LV o fizeram em cães adultos a idosos (FERRARI et al., 2006; FONT et al., 1993; LÓPEZ-PEÑA et al., 2009; SILVA et al., 2009), sendo raros os casos descritos em cães mais jovens (TORRENT et al., 2005; ZABALA et al., 2005). Em um desses relatos, foi demonstrada a ocorrência de vasculite generalizada e miocardite severa em uma cadela da raça Bulldog, com apenas três anos de idade, que não apresentava sinais clínicos sugestivos de comprometimento cardiovascular (TORRENT et al., 2005).

A ocorrência de miocardite severa associada à presença de inúmeras formas amastigotas de Leishmania sp. no miocárdio também foi descrita em um cão da raça Boxer com apenas quatro meses de idade, que apresentava dispnéia aguda e sinais de insuficiência cardíaca direita e esquerda, com edema pulmonar e efusões pleural e peritoneal (ZABALA et al., 2005). Ao avaliar uma população predominantemente jovem, o presente estudo demonstrou a ocorrência de um grande espectro de alterações histopatológicas no miocárdio, além de identificar a presença de formas amastigotas de

Leishmania sp. Sendo assim, não é possível estabelecer se a intensidade da

lesão cardíaca observada teria sido mais severa caso fosse avaliada uma população com idade mais avançada, assim como permanece incerto se o desenvolvimento de sinais clínicos relacionados à disfunção cardíaca pode sofrer alguma influência da idade do animal ou do tempo decorrido da infecção.

As alterações macroscópicas mais comumente observadas no miocárdio dos cães com LV foram dilatação ventricular direita e hipertrofia ventricular esquerda, discordando dos relatos de Alves et al. (2010), que não relataram a ocorrência de alterações macroscópicas importantes ao avaliarem corações de 22 cães com LV. Por outro lado, Zabala et al. (2005), ao avaliarem um cão com leishmaniose visceral, também observaram dilatação de VD e hipertrofia de VE.

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Nas literaturas médica e veterinária estão descritos casos de envolvimento pericárdico (FONT, et al., 1993; MOFREDJ et al., 2002) e de alterações macroscópicas compatíveis com infarto do miocárdio (FERRARI et al., 2006), apesar de tais alterações não terem sido observadas no presente estudo.

Não foi possível determinar a causa da dilatação ventricular direita, observada em 53,3% dos cães avaliados. Uma possível explicação seria o envolvimento pulmonar concomitante, frequentemente presente em cães com LV (ALVES et al., 2010; DUARTE et al, 1986; GONÇALVES et al., 2003; MARSHALL et al., 2000), levando a um quadro de cor pulmonale. Entretanto, dos 16 cães em que se observou dilatação de VD, apenas cinco apresentavam sinais clínicos sugestivos de broncopneumopatias, tais como a presença de estertores pulmonares e secreção nasal mucopurulenta.

A hipertrofia concêntrica do ventrículo esquerdo foi previamente relatada em cães naturalmente acometidos por LV (CORTADELLAS et al., 2006; ZABALA et al., 2005). Em estudo realizado por Cortadellas et al. (2006), esse tipo de hipertrofia constituiu a manifestação mais comum da hipertensão arterial sistêmica em cães com doença glomerular devido à leishmaniose visceral. Na presença de hipertensão arterial sistêmica a hipertrofia concêntrica do VE representa uma resposta adaptativa à sobrecarga de pressão (aumento da pós-carga), podendo levar à disfunção miocárdica, dilatação cardíaca, insuficiência cardíaca congestiva e morte (SCHOEN; MITCHELL, 2010). Outra causa potencial de hipertrofia ventricular esquerda e insuficiência cardíaca congestiva é a anemia crônica (IBERNON et al., 2011; NAITO et al., 2009), manifestação comumente observada em cães e seres humanos com LV.

A presença de áreas pálidas no miocárdio não esteve associada a nenhuma alteração histopatológica extensa, como a presença de intensidade acentuada de infiltrado inflamatório, fibrose ou necrose de cardiomiócitos. A presença de áreas pálidas no coração tem sido observada em cães normais sem que haja uma correlação com qualquer alteração histopatológica detectável e, dessa forma, não apresentam significado clínico (OCARINO et al., 2011; VLEET; FERRANS, 2009).

Apesar da elevada prevalência de infiltrado inflamatório, necrose de cardiomiócitos, proliferação de tecido conjuntivo e presença de formas amastigotas de Leishmania sp. no miocárdio, tais alterações foram discretas e insuficientes para produzir manifestações clínicas de comprometimento cardíaco nos cães com LV, corroborando estudos que avaliaram um maior número de cães (ALVES et al., 2010) e seres humanos (MORAIS et al., 1988) acometidos pela enfermidade. No entanto, esses achados diferem do envolvimento cardíaco severo que foi previamente relatado por outros autores (FONT et al., 1993; LÓPEZ-PEÑA et al., 2009; ZABALA et al., 2005).

A ocorrência de infiltrado inflamatório do tipo linfoplasmocitário no miocárdio de cães naturalmente acometidos por LV também foi descrita em estudos prévios (ALVES et al., 2010; FERRARI et al., 2006; FONT et al., 1993; LÓPEZ-PEÑA et al., 2009; TORRENT et al., 2005; ZABALA et al., 2005). No entanto, a intensidade da inflamação não havia sido associada com a presença do parasita, fato que foi observado no presente estudo.

A área em que se observou a presença de infiltrado linfoplasmocitário em maior intensidade foi o átrio direito, concordando com o relato de Torrent et al. (2005), que observaram a presença de miocardite e vasculite em um cão com LV. Outros autores que estudaram o coração de cães com LV não descreveram a avaliação de espécimes obtidos a partir de diferentes regiões do coração (ALVES et al., 2010; FERRARI et al., 2006; FONT et al., 1993; LÓPEZ-PEÑA et al., 2009; ZABALA et al., 200;). Esse tipo de infiltrado inflamatório também é observado no miocárdio de cães e seres humanos com cardiomiopatia chagásica crônica (PAVARINI et al., 2009; ROSSI, 1998).

A presença de reação inflamatória granulomatosa tem sido descrita em diferentes órgãos de cães com LV como linfonodos (MOREIRA et al., 2010), baço (SANTANA et al., 2008), fígado (MCFARLANE, et al., 2011), pele (SOUZA-LEMOS, et al., 2008) e miocárdio (AJELLO; CATARSINI, 1976; TORRENT et al., 2005). No presente estudo essa alteração foi identificada em 23,3% dos cães. Embora a presença do parasita não tenha sido observada com muita frequência no interior dos macrófagos dos granulomas, houve

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correlação entre a severidade da reação granulomatosa e o número de células parasitadas no AD (p=0,046) e SIV (p=0,022), confirmando estudos anteriores que também verificaram essa correlação ao avaliarem órgãos linfóides (MOREIRA et al, 2010; SANTANA et al.; 2008). De acordo com Santana et al. (2008), a presença de granulomas no baço de cães com LV parece refletir a ocorrência de inflamação crônica em resposta à infecção não controlada, em vez de indicar proteção contra a enfermidade. Essa teoria pode ser apoiada pela atividade antimicrobicida exercida por algumas citocinas (CORRÊA et al., 2007) e pela resposta predominantemente Th2 verificada nos granulomas do tipo lepromatoso (ACKERMANN, 2009), resultando na inibição da capacidade de destruição do parasita pelos macrófagos, em virtude do mecanismo imunológico ativado.

A ocorrência de necrose de cardiomiócitos foi previamente descrita em casos isolados de cães com LV (FERRARI et al., 2006; ZABALA et al., 2005). Em um estudo que avaliou a ocorrência de alterações cardíacas em 22 cães com LV, relatou-se a presença de necrose em intensidade leve, porém sem especificar a prevalência da lesão na população avaliada. No presente estudo, embora a alteração tenha se mostrado frequente (80% dos cães), o achado não difere dos resultados dos estudos previamente citados, uma vez que a mesma manifestou-se principalmente em intensidades discreta ou moderada, não tendo sido observadas áreas extensas de necrose. Uma possível justificativa para a elevada prevalência de necrose de cardiomiócitos observada no presente estudo consiste no fato de terem sido avaliados fragmentos de quatro diferentes áreas do coração, aumentando o tamanho da amostra de tecido cardíaco.

O tipo de necrose de cardiomiócitos observado no presente estudo foi a necrose coagulativa, a exemplo de estudos anteriores realizados no miocárdio de cães com LV (ALVES et al., 2010; FERRARI et al., 2006; ZABALA et al., 2005). Quando presente, esse tipo de necrose foi observado principalmente na forma de necrose hialina, caracterizada por edema celular, perda das estriações transversais e hipercromasia nuclear (ROBINSON; MAXIE, 1993).

Porém, um segundo padrão de necrose de cardiomiócitos, a necrose em bandas de contração, que não havia sido descrita anteriormente em cães com LV, foi observada em 29,1% das áreas que apresentaram necrose. Apesar de pouco descrito na espécie canina, esse padrão de necrose pode estar associado à hipóxia do miocárdio, conforme observado em cinco cães que foram submetidos à parada cardíaca anóxica por pinçamento transversal da aorta ascendente (DIAS et al., 2002).

A necrose fibrinóide de artérias do miocárdio, verificada em 10% dos cães, é um tipo especial de necrose que está associada à lesão endotelial e pode ocorrer nas paredes de pequenas artérias e arteríolas musculares. A lesão caracteriza-se pela entrada e acúmulo de proteínas séricas, seguidas pela polimerização da fibrina na parede vascular, formando um colar intensamente eosinofílico que encobre a estrutura celular subjacente (KUMAR et al., 2010; VLEET; FERRANS, 2009). Essa lesão é decorrente de danos nas camadas íntima e média, como ocorre nas vasculites imunomediadas (MYERS; MCGAVIN, 2009), mas também é frequentemente observada em cães com síndrome urêmico e naqueles com hipertensão arterial sistêmica (VLEET; FERRANS, 2009).

O presente estudo foi o primeiro a relatar a ocorrência desse tipo de necrose na parede de vasos sanguíneos do miocárdio de cães com LV. É provável que tenha ocorrido em consequência do dano vascular associado à deposição de imunocomplexos circulantes, os quais causam danos em vários órgãos (BARBIÉRI, 2006; CIARAMELLA; CORONA, 2003; KONTOS; KOUTINAS, 1993). Além disso, os três cães apresentavam glomerulonefrite e síndrome urêmico, e um deles possuía hipertensão arterial sistêmica, o que

poderia justificar a ocorrência de necrose fibrinóide.

A ocorrência de infiltração gordurosa, caracterizada pela presença significativa de adipócitos infiltrados entre as fibras miocárdicas (VLEET; FERRANS, 2009), foi observada em 16,7% dos cães, e apresentou-se mais frequente no AD e VD. Alves et al. (2010), ao avaliarem o coração de 22 cães com LV, também identificaram a presença de infiltração gordurosa, embora em

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apenas um animal. O significado clínico dessa alteração ainda é bastante controverso e tem sido motivo de erros de diagnóstico em seres humanos (BASSO; THIENE, 2005; IOZZO, 2011). Estudos de necropsia indicaram que a infiltração gordurosa pode ser ocasionalmente observada em corações de seres humanos normais, principalmente quando associada ao envelhecimento, caquexia ou obesidade (BASSO; THIENE, 2005).

A ocorrência de infiltração gordurosa também tem sido descrita em cães com cardiomiopatia chagásica crônica (ANDRADE et al., 1997; CALIARI et al., 2002). Sua participação no processo infamatório decorrente dessa enfermidade, e possivelmente também da LV, é digna de novos estudos, uma vez que os adipócitos são capazes de produzir TNF, MIF e TGF, que são mediadores envolvidos em fenômenos como a migração leucocitária e a fibrogênese (FRÜHBECK et al., 2001).

Em apenas um animal verificou-se vasculite no AD, associada a uma área focalmente extensa de deposição de colágeno. A ocorrência de vasculite necrotizante sistêmica foi previamente relatada em cães com LV (PUMAROLA et al., 1991; TORRENT et al., 2005). Embora a vasculite possa estar relacionada à ação direta do parasita (CABALLERO-GRANADO et al., 1998), acredita-se que o dano vascular em cães com LV seja consequente a uma lesão imunomediada (PUMAROLA et al., 1991; TORRENT et al., 2005).

Embora evidenciado em 73,3% dos cães ou 41,7% dos fragmentos estudados, o aumento do conteúdo de tecido conjuntivo entre as fibras musculares ocorreu principalmente em intensidade discreta. Na maioria das vezes em que esteve presente esse aumento foi observado em áreas onde havia a presença concomitante de infiltrado de células inflamatórias e, de forma menos frequente, esteve associada à presença de necrose de cardiomiócitos. De maneira semelhante, Rossi (1998) demonstrou que a presença de áreas de fibrose observadas no miocárdio de oito pacientes humanos com cardiomiopatia chagásica crônica esteve associada com a presença de acentuado infiltrado linfoplasmocitário e à ocorrência de alterações degenerativas de cardiomiócitos. A associação entre a ocorrência de fibrose e

a presença de células inflamatórias pode ser justificada pelo papel que essas células exercem na fibrogênese, por meio da liberação de citocinas e fatores de crescimento, durante a fase de reparo por cicatrização do tecido cardíaco (ROSSI, 1998).

Apesar de bastante comuns, as alterações histopatológicas como presença de infiltrado inflamatório, necrose de cardiomiócitos e aumento do colágeno intersticial apresentaram-se predominantemente em intensidade discreta a moderada, e foram insuficientes para produzir sinais clínicos decorrentes de comprometimento da função cardíaca. No entanto, a importância de exames complementares tais como eletrocardiografia computadorizada de repouso ou ambulatorial (sistema Holter) e a avaliação de biomarcadores cardíacos em cães naturalmente acometidos por LV não foi avaliada, e permanece incerto se o dano cardíaco observado pelo estudo histopatológico poderia ter sido identificado por tais exames subsidiários.

Embora a carga parasitária de Leishmania sp. no tecido cardíaco tenha sido baixa, exceto em um animal em que foram observadas inúmeras formas amastigotas do parasitas no átrio direito, 66,7% dos cães apresentavam o parasita em pelo menos uma das áreas avaliadas. Esses resultados diferem dos achados de Alves et al. (2010), que observaram a ocorrência do parasita no miocárdio em apenas um entre 12 cães com LV, e também do estudo realizado por Morais et al. (1988), que avaliaram o miocárdio de 16 seres humanos com LV e não identificaram a presença do parasita, ambos pela técnica de imuno-histoquímica. No presente estudo, a existência de correlação entre o número de células parasitadas e a intensidade do infiltrado inflamatório, tanto no AD (p=0,039) como no VD (p=0,018), sugere a participação direta do parasita na patogenia da inflamação cardíaca

Lesões semelhantes são observadas na cardiomiopatia chagásica (PAVARINI et al., 2009; ROSSI, 1998), embora existam ainda discordâncias quanto a sua patogênese, isto é, se a presença do Trypanosoma cruzi em sítios específicos do miocárdio estimula o desenvolvimento e manutenção de reação inflamatória crônica (TARLETON, 2001; ZHANG; TARLETON, 1999),

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ou se o parasita induz a uma reação imunomediada (CUNHA-NETO et al., 1996; ENGMAN; LEON, 2002; LEON et al., 2001; PONTES-DE-CARVALHO et al., 2001).

Os resultados do presente estudo confirmam o desenvolvimento de alterações histopatológicas e a presença do parasita no miocárdio de cães naturalmente acometidos por LV. Entretanto, novos estudos são necessários para melhor elucidar a patogenia das alterações histopatológicas observadas, bem como sua evolução diante do curso natural da enfermidade ou de seu tratamento.

6 CONCLUSÃO

Fundamentando-se nos resultados obtidos nas condições do presente estudo, pôde-se concluir que:

 Alterações histopatológicas como presença de infiltrado inflamatório do tipo linfoplasmocitário, necrose de cardiomiócitos e aumento do colágeno intersticial apresentam elevada prevalência em cães com leishmaniose visceral.

 Apesar de comuns, as alterações histopatológicas observadas apresentaram-se predominantemente em intensidade discreta a moderada, e foram insuficientes para produzir sinais clínicos decorrentes de comprometimento da função cardíaca.

 A imunodetecção de Leishmania sp. no miocárdio de 66,7% dos cães avaliados, associada à correlação observada entre o número de células parasitadas e a intensidade de células inflamatórias, sugere uma ação direta do parasita na resposta inflamatória presente nesse órgão.

 A existência de correlação entre o número de células parasitadas por

Leishmania sp. e o número de granulomas observados no miocárdio de

cães com leishmaniose visceral sugere que esse tipo de resposta inflamatória não confere proteção contra o parasita.

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