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Início da produção de cerâmica de alta temperatura por imi grantes japoneses no Brasil

do tradicional ao sustentável

2.1. Início da produção de cerâmica de alta temperatura por imi grantes japoneses no Brasil

Uma das técnicas tradicionais introduzidas no Brasil junto com a cerâmica de alta temperatura foi a esmaltação a partir das cinzas de vegetais, utilizadas atualmente por vários ceramistas no Brasil que adaptaram a técnica aos materiais abundantes da região. As razões atribuídas ao uso estão relacionadas ao aspecto cultural – tra- dição familiar, descendência, a inluência sobre os não descendentes – e pelo as- pecto sustentável – que atribui à cerâmica características próprias de determinado local, reaproveitando um material que seria descartado.

Uma das características da cerâmica japonesa é a queima de alta temperatura, realizada em forno a lenha, de onde surgiram os vidrados de cinzas vegetais. Ambos foram introduzidos por imigrantes japoneses no Brasil.

Uma das principais técnicas que distingue a cerâmica japonesa é a queima a alta temperatura (acima de 1200 graus). Esta só é possível através da utilização de fornos com uma estrutura e arquitetura particulares, denomi- nados de anagama e noborigama, introduzidos no Japão no século III e no século XVII respectivamente. Já no Brasil não existe tradição de cerâmica de alta temperatura. Antes da Segunda Grande Guerra as cerâmicas quei- madas a alta temperatura eram maioritariamente de importação europeia. (MORAIS, 2010, p. 34–35.)

Conforme airma Morais (2010) no Brasil não existe tradição de cerâmica de alta temperatura. Foram os imigrantes japoneses, cinquenta anos após o início da imi- gração (que data de 1908), que inluenciaram a produção continuada dessa cerâmi- ca. A produção da cerâmica japonesa no Brasil começa com o término da Segunda Guerra Mundial, quando a imigração é vista como forma de desenvolvimento do país em termos econômicos e industriais. Com o crescimento da industrialização, o Brasil precisava de mão de obra especializada, e para os japoneses a vinda era vantajosa, pois o Japão enfrentava uma crise demográica. Nesse período, no Brasil, ocorrem relevantes transformações socioeconômicas no estado de São Paulo, surgindo os primeiros indicadores de produção de cerâmica japonesa.

É dentro deste contexto que assistimos à transferência para o Estado de São Paulo, de dois grupos emigratórios que permitiriam a realização dos objetivos de crescimento econômico e expansão industrial dos dois países. São eles empresas japonesas e imigrantes especializados como trabalha- dores qualiicados, técnicos industriais e artesãos preparados para abrir suas próprias oicinas (SAKURAI, 2008, p. 195).31 E é então sob esta conjun-

tura que surgem os primeiros indicadores de produção de cerâmica japo- nesa no país. (MORAIS, 2010, p. 39).

A pesquisadora relata ainda que em 1953 chegam ao Brasil, no primeiro navio de imigrantes do pós-guerra, o especialista em porcelana Mizuno Yozo e o técnico em porcelana Kojima Shigueo, natural da província de Gifu (região conhecida pela tra- dição em cerâmicas denominadas Mino), responsáveis pelas primeiras fábricas de porcelana no Brasil.

A família Mizuno chega ao Porto de Santos em 1953 e instala-se em São Caetano do Sul. Em 1956, mudam-se para Mauá–SP, onde se deu o início da produção de por- celanas com técnicas trazidas do Japão.

31 SAKURAI, C. A imigração dos japoneses para o Brasil no pós-guerra (19501980). In:

HASHIMOTO, F.; TANNO, J. L.; OKAMOTO, M. S. Cem anos da imigração japonesa. São Paulo, Editora Unesp, 2008, p. 190239.

Figura 128. Familia Mizuno, 1960.

A fábrica foi montada em um galpão, cuja base era feita com madeira de eucalipto e paredes de barro. Com peças de ferro-velho construíram os tornos; o forno, com tijolo de olaria.

Figura 129. Fábrica de porcelanas Mizuno, 1970.

A argila era extraída no terreno da fábrica, e dela começaram a produzir objetos utilitários em um forno a lenha que alcançava até 1200°C, com queimas que duravam cerca de 48 horas.

Figura 131. Forno de alta temperatura, 1960.

Figura 132.Produção de porcelana, 1960.

A indústria cresce na década de 70 e continua em atuação nos dias atuais, produ- zindo porcelanas no estilo oriental. Os produtos são comercializados em todo Brasil.

Shigueo Kojima, cujo nome artístico é Juho, trouxe consigo a forte inluência da cerâmica de Tajimi, cidade da província japonesa de Gifu, sua terra natal. Em Tajimi é tradicional a produção de cerâmicas Mino. Depois de três anos da chegada ao Bra- sil, em 1956 adquire um terreno em Mauá e a partir de 1959, instala sua fábrica de porcelana japonesa no Brasil.

É então a partir de 1959 que a família Kojima acelera a instalação da fábri- ca, utilizando materiais obtidos na região: tijolos refratários quebrados do pátio de uma indústria local, tijolos comuns das olarias vizinhas e argila das sobras de uma fábrica de bonecas. A primeira fornada acontece entre 7 e 9 de Abril de 1960, constituída na sua totalidade por peças fabricadas com a ajuda de um torno manual trazido por Kojima Juho do Japão. Só mais tarde a família passa a usar um torno elétrico, gerando um aumento signiicati- vo na produção. A Fábrica de Porcelanas Kojima foi a primeira fábrica de porcelana japonesa do Brasil, existindo até hoje em Mauá, onde se localiza também, desde 1937, a fábrica das famosas porcelanas Schmidt. (MORAIS, 2010, p. 41)

Figura 134. Primeira peça produzida no Brasil pela Famíla Kojima, em forno a lenha, 1960.

Além de chegada de empresas e de mão de obra qualiicada, o pós-guerra tam- bém foi marcado pela chegada de artistas japoneses no estado de São Paulo.

Essa imigração de artistas japoneses para o Brasil, nomeadamente para o Estado de São Paulo, pode ser dividida em dois momentos principais: o pri- meiro, da segunda metade dos anos 50 até à primeira metade dos anos 60; e o segundo durante a primeira metade da década de 70. [...] é a partir dos anos 30 que se começa a assistir à formação de uma comunidade artística nikkei, constituída majoritariamente por pintores, mas cuja efervescência é interrompida pelo eclodir da Segunda Guerra. Já na década de 50, o meio artístico paulistano entra em plena erupção, instituindo-se várias mostras

importantes, entre as quais a Bienal de São Paulo, da qual participaram treze artistas da comunidade japonesa. (MORAIS, 2010, p. 42)

Mas é no inal da década de 60 que a cerâmica começa a ganhar campo no cenário artístico, e ceramistas japoneses passam a se destacar em São Paulo.

Entre as tendências que imprimiram suas marcas na cerâmica contempo- rânea, temos a arte que fazem hoje no Brasil ceramistas ligados aos con- ceitos orientais, a contemplação. Os artistas japoneses radicados em São Paulo, desde o inicio do século, trouxeram consigo uma tradição cerâmica ligada ao objeto utilitário. Contudo, no período pós-guerra outros artistas aqui chegaram e, entre eles, alguns com posturas mais conservadoras, com conceitos de arte dentro da ilosoia oriental, sendo a cultura japonesa eminentemente estética. (FRANÇOIS, 2006, p. 64)

Junto à tradição do fazer cerâmico japonês, os vidrados de cinzas são incorporados a partir dos primeiros ceramistas imigrantes que chegaram ao Brasil, sendo assim adaptados para os materiais abundantes dessa região, conforme veremos a seguir.

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