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CURVA ROC

6.1. Incidência de Pré-eclâmpsia

Inicialmente, algumas palavras sobre os critérios utilizados não só para o diagnóstico, mas também para a seleção das pacientes.

Quisemos estudar somente pacientes sem patologias, porque nosso desejo era entender as reais causas da pré-eclâmpsia pura neste grupo etário específico.Ao englobar pacientes com nefropatia, colagenose ou hipertensão prévia, poderíamos até ter uma incidência maior de pré-eclâmpsia, mas ela iria se sobrepor a um quadro materno pré-estabelecido, com difícil separação entre as duas situações nosológicas.

Quanto à malformação fetal, ela também aumenta o risco para pré-eclâmpsia, como o estudo populacional de Conde-Agudelo; Belizán (2000) tão bem expôs. Entretanto, no dia-a-dia do atendimento ambulatorial, por diversas vezes nos defrontamos com a difícil tarefa da comunicação deste tipo de diagnóstico fetal e notamos como a pressão arterial materna freqüentemente se eleva, frente à angústia emocional vivida pela paciente, sendo na maioria das vezes alteração efêmera e sem maiores conseqüências. No entanto, ao entendermos ser parte da fisiopatologia da DHEG o stress psicossocial, hipótese esta bem plausível por todas as questões levantadas na literatura, ter dentro do estudo uma paciente já estressada por motivos bem específicos como a preocupação com a malformação de sua criança, faz perder importância outros aspectos também estressantes da vida do adolescente.

Entendemos assim ter sido de bom alvitre a exclusão deste tipo de paciente. O modelo que temos em mãos com esta amostra homogênea de adolescentes sem patologias e bem acompanhadas é limpo, claro e muito útil para o raciocínio que teremos de iniciar agora.

Os 6,14% de incidência que logramos alcançar no presente estudo é matéria para muitas considerações. É incidência baixa em termos nacionais e até mesmo em comparação com antigos dados levantados no próprio serviço. Será nossa população diferente daquela estudada em outros levantamentos?

Em que pesem as considerações de Ribeiro et al (2000), reconhecendo mudanças significativas na população obstétrica de adolescentes nos últimos 15 anos, seja no aspecto de escolaridade, estado civil ou no uso do sistema de saúde, parece- nos que a questão fundamental não é tanto o tipo de paciente estudado, mas sim o tipo de assistência, a forma do estudo e os critérios estabelecidos para o diagnóstico da doença.

Ao nos determos na cifra consignada para todas as formas de hipertensão reconhecidas na gravidez destas jovens, as quais juntas formariam o grupo da DHEGLOBAL, podemos ter alguma luz para analisarmos melhor esta questão. Os 19,74% verificados junto a este grupo relembra muitas outras incidências principalmente nacionais, por volta dos 20%. A maioria desses trabalhos, com altas cifras da doença, não esclarecem adequadamente os critérios utilizados e provavelmente devem ter diagnosticado DHEG em quem apenas teve um episódio de hipertensão transitória e que nunca viria a ter proteinúria nem outras repercussões mais sérias da doença que ora estudamos.

Esta questão metodológica é essencial, para progredirmos no estudo da pré- eclâmpsia. Sem uma boa definição da doença, torna-se impossível comparar os diversos resultados presentes na literatura e tirar conclusões desta análise.

Em relação às cifras de nosso serviço, podemos afirmar que as incidências anteriormente relatadas (Bittar et al, 1991; Galletta et al, 1995; Galletta et al, 2000) e que apresentam nítido declínio com o tempo (15, 12 e 9%, respectivamente) estão em parte relacionadas com questões metodológicas, porque os critérios diagnósticos destes trabalhos não tinham sido tão rígidos como no presente estudo, mas certamente estão associadas com uma maturidade cada vez maior da equipe

multiprofissional, que trabalha com a mesma filosofia de atendimento há cerca de 15 anos, abordando a adolescente de forma compreensiva e global.

Não temos dúvida alguma, baseados até na análise da literatura, que a assistência multiprofissional diminui a incidência e as complicações da pré- eclâmpsia entre as adolescentes, como o trabalho de meta-análise de Scholl et al (1994) tão bem demonstrou. É o que temos percebido também em nossa prática, onde a assistência conjunta a vários aspectos relevantes na vida destas jovens, sejam psico-emocionais, familiares, escolares, nutricionais ou de higiene, certamente interferiu no resultado obstétrico. A elaboração do presente estudo vem adicionar mais informação a esta questão, colaborando no sentido de não só esclarecer sobre a real incidência da doença, mas também na investigação adicional sobre quais seriam os fatores mais importantes na gênese do distúrbio hipertensivo, com vistas a uma abordagem diferenciada do problema no atendimento que se fornecerá doravante, por esta mesma equipe multiprofissional.

Chama a atenção, na análise da literatura nacional pertinente, que os menores índices de pré-eclâmpsia sejam justamente em serviços com assistência multiprofissional (Monteiro et al, 1995; Galletta et al, 2000) ou naqueles particulares (Aleixo, 1991; Vitiello, 1988), onde as pacientes têm acesso a um pré-natal diferenciado. Certamente, a cobertura e o tipo de assistência pré-natal seriam fatores decisivos no risco para pré-eclâmpsia.Este fato é muito importante para a nossa realidade brasileira, para que se estimule o surgimento de mais e mais grupos multidisciplinares de atendimento pré-natal.

Estamos falando de um grupo de gestantes sem apoio familiar ou social, iniciando o pré-natal tardiamente, com grande inadequações alimentares, de baixo nível sócio-econômico, baixa escolaridade e solteiras em sua grande maioria. Apesar deste perfil plenamente desfavorável, obtivemos apenas 6,14% de pré-eclâmpsia. Isto é muito pouco, considerando as características das pacientes do grupo. Possivelmente, se este mesmo grupo fosse atendido há dez anos atrás, a cifra seria de 15% (Bittar et al, 1991); se fosse há quinze anos, seria de 20 a 30% (Mathias et al,

1985b). O protocolo de assistência médica continua o mesmo, os médicos também têm as mesmas condutas, as pacientes possuem praticamente o mesmo perfil. O que mudou foi o contato cada vez maior e mais maduro entre os profissionais. Este é o caminho para uma melhor assistência pré-natal e para melhores condições de saúde no Brasil.