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Figura 12 - Logos de algumas das maiores

Por outro lado, os avanços tecnológicos do final do século XX como a internet, a computação ubíqua, a mobilidade e as redes sociais vêm transformando o modo como vivemos, nos relacionamos e produzimos. De uma sociedade consumidora de produtos massificados nos transformamos em uma sociedade produtora e retransmissora de conteúdos em massa (MANOVICH, 2009). Neste cenário, onde os meios principais de produção das indústrias criativas, computadores e programas de computação gráfica, são acessíveis, os produtores independentes de conteúdo começaram a ganhar espaço. Essa transformação atingiu toda a indústria criativa, inclusive a de games.

Diversos softwares que facilitam a produção dos games, conhecidos como engines1, e que antes eram proprietários dos grandes estúdios

passaram a ser disponibilizados comercialmente ao lado de outras ferramentas de computação gráfica. Designers, artistas e programadores independentes podiam criar jogos com visuais inovadores, mecânicas inusitadas e temáticas polêmicas, muitas vezes desafiando o senso comum e ainda assim encontrar seu público.

Os indie games, como são conhecidos os jogos eletrônicos produzidos com um caráter mais criativo e original, se tornaram uma realidade no mercado. A possibilidade não só de criar como também de distribuir os conteúdos independentes, representa uma mudança significativa nas relações da indústria.

Para Anthropy (2012):

Além da Internet, a popularização dos dispositivos móveis, também abriu uma nova frente para o mercado de jogos ao converter usuários de

smartphones e tablets em jogadores casuais. Esse tipo de jogador não busca jogos que exijam envolvimentos longos com regras complexas, mas, sim, um passatempo para os momentos diários de espera entre atividades. Jogos com regras mais simples e de curta duração encontraram o cenário ideal

1 Uma engine é uma plataforma de programação e edição de jogos que engloba uma série de funcionalidades já preparadas para aplicação, como um sistema de render em tempo real, cálculos

The Internet in particular has made self-publishing and distributing games both possibly and easy. Authors are able not only to put their works online, but to find audiences for them. Publishers want to be gatekeepers to the creation of videogames, but the Internet has opened those gates. (ANTHROPY, 2012, p.9) It has never been easier to develop a game, thanks to the wide range of development SDKs such as Unity 3D, Game Maker and Unreal that are now available. The opportunities to self-publish your own games are many and varied - you can create the game you want to create and know that you can get it to market on a large array of different devices, including PCs, consoles and mobiles. (HILL-WHITTALL, 2015, p.14)

nas plataformas móveis, sempre disponíveis e amplamente disseminadas. Enquanto as publishers de games para consoles exigiam o cumprimento de uma série de requisitos para autorizar a produção de um estúdio, as lojas de aplicativos para mobile faziam poucas exigências, interessadas em oferecer uma variedade maior de conteúdo. Com barreiras de entrada mais baixas, inúmeros estúdios passaram a produzir para essas plataformas. O grande sucesso de jogos casuais como “Angry Birds” (ROVIO, 2009), que transformou um pequeno estúdio em uma grande empresa de licenciamento, motiva e estimula os novos ingressantes. Outro fator que contribuiu para o sucesso dos jogos casuais foi a sua combinação com mecânicas de compartilhamento em redes sociais. Buscando recompensas e reconhecimentos públicos, os usuários desses games publicam suas conquistas e convidam seus contatos para ingressarem na disputa. Jogos como “Farmville” (ZYNGA, 2009) e “Candy Crush” (KING, 2012) são bons exemplos de como a influência social pode operar no sucesso de jogos simples.

Essa abertura no mercado dos jogos propiciada por mudanças tecnológicas na produção, distribuição e no modo de consumo, propiciou o ingresso de novos atuantes. Entretanto, como discutido anteriormente neste trabalho, a independência nos games é compreendida como a

priorização da criatividade em detrimento das condicionantes comerciais

em um projeto. Como definido pelo IndieCade (2015), essa priorização não significa a exclusão ou o desinteresse pelo lado econômico, apenas o interesse em inovar e ainda assim alcançar o sucesso.

Em qualquer indústria, a inovação é a exceção e não a regra. As supostas reproduções de jogos previamente existentes não podem ser creditadas exclusivamente à influência das grandes publishers, temerosas por seus investimentos . Diversos estúdios, mesmo sem as pressões dos financiamentos externos, também abdicam de inovar e criam seus produtos baseados nas histórias de sucesso da indústria (ANTHROPY, 2012, p.5). Uma grande quantidade de jogos feitos para as plataformas móveis seguem essa estratégia, mudando apenas superficialmente um game de sucesso e se transformando em caça-níqueis para as empresas produtoras. Outra prática comum, como na indústria do Cinema, é a criação de “franquias” quando um game inicial vira uma série de outros jogos se beneficiando das campanhas de marketing já realizadas para divulgação de marcas e eventuais personagens.

Figura 13 - Imagem do game “Angry Birds” (ROVIO, 2009)

Fonte: http://mcdn2.angrybirdsnest.com/ wp-content/uploads/2011/04/Angry-Birds-Se- asons-Easter-Sneak-Peak-4.jpg

Figura 14 - Imagem do game “Farmville” (ZYNGA, 2009)

Fonte: http://images.wwgdb.com/games/3994/ gallery/8968.jpg

Figura 15 - Imagem do game “Candy Crush” (King, 2012)

Fonte: http://cdn2.knowyourmobile.com/sites/ knowyourmobilecom/files/Array/candy-crush- saga-screenshot-01.jpg

Dentro do universo dos jogos, existem diversos gêneros e subgêneros, classificados em relação ao gameplay (ADAMS, 2010, p.390), ou ao modo como se joga e às experiências do jogador ao interagir com o jogo. Um game pode se enquadrar em um gênero e ainda assim acrescentar algum grau de inovação e criatividade que o qualifiquem como indie. O caso de “Braid” (BLOW, 2008) ilustra essa relação. O jogo do gênero ação2, subgênero plataforma3 , inovou ao incluir uma mecânica de rewind, análoga à função de voltar dos controles de tocadores de video, que permitia aos jogadores realizarem novamente uma ação em caso de fracasso, em vez de puní-los com a perda imediata do jogo.

E se os indies são reconhecidos pela inovação isso não significa que os grandes estúdios também não se arrisquem. “Child of Light” (UBISOFT, 2014) é um jogo do gênero RPG4 ricamente ilustrado, com uma protagonista feminina sem nenhum apelo sexual, com diálogos e narrações totalmente escritos em rimas, produzido pela gigante Ubisoft, publisher e criadora de grandes sucessos comerciais como a franquia “Assassin’s Creed” (UBISOFT, 2007), um game de ação furtiva.

O pesquisador alemão Andreas Jahn-Sudmann (2009) rejeita a originalidade e o teor contestador de muitos jogos pretensamente indies:

Para Jahn-Sudmann (2009), em vez de serem realmente inovadores, muitos jogos indies apenas diferem das grandes produções apenas na sensação visual. Por falta de meios, essas produções utilizariam uma estética que remeteria às primeiras gerações de jogos, se referindo ao estilo Pixel Art, freqüentemente utilizado por desenvolvedores independentes. De fato, sem recursos abundantes, os produtores indies precisam adaptar os métodos organizados e dispendiosos das grandes produções comerciais, à sua realidade mais modesta.

2 An action game is one in which the majority of challenges presented are tests of the player’s physical skills and coordination. Puzzle-solving, tactical confl ict, and exploration challenges are often present as well. (ADAMS, 2010, p. 392)

3 Platform games, or platformers, are cartoonish games in which an avatar moves through a vertically exaggerated environment, jumping on and off platforms at different heights, while avoiding obstacles and battling enemies. (ADAMS, 2010, p. 396)

4 RPG é um gênero em que os jogadores experimentam uma série de aventuras em um mundo imaginário, através de um avatar ou um pequeno grupo de personagens cujas habilidades e poderes

Countless independent (casual) games only differ from the mainstream due to their not being able to economically- technically compete with the visual sensations of the “big games” and thus are, on the representational level, forced to limit themselves to a minimum aesthetics somewhere between comic and retro style that tends to suggest that the prime aim was to keep alive the charms of the home computer or PC era.

(JAHN-SUDMANN, 2009, p.7)

Figura 16 - Imagem do game “Braid” (BLOW, 2008). Fonte: http://www.nerdspot.com.br/

wp-content/uploads/2013/03/braid-level.jpg

Figura 17 - Imagem promocional do game “Child of Light” (UBISOFT, 2014). Fonte:

http://putzfilmes.com/wp-content/uplo- ads/2015/02/child-of-light-listing-thumb- 02-ps3-us-11sep14.png

Figura 18 - Imagem do game “Assassin’s Creed III” (UBISOFT, 2014). Fonte: http://

www.bellabyte.com.br/wp-content/uplo- ads/2013/08/assassins-creed-3-gameplay.jpeg

Essa percepção sobre os indie games pode ser explicada por outro aspecto do acesso aos meios de produção: eles estão disponíveis para qualquer um interessado em criar. Não só designers, artistas ou programadores profissionais se apropriam do meio, mas também estudantes e amadores. A cultura do DIY5 está cada vez mais disseminada na sociedade (JWT, 2009). Neste contexto, produtos bem projetados se misturam a experimentos de todo o tipo que, pelo volume maior, podem acabar causando essa impressão.

Qualquer projeto tem limitações, no caso dos indie games a restrição mais freqüente é orçamentária. Em uma grande produção comercial, diversos profissionais altamente especializados atuam em um sistema de divisão de tarefas bastante claro. Em uma produção independente, uma equipe reduzida, ou mesmo um indivíduo, precisa de todos os elementos que compõem um jogo. Roteiro, mecânicas, direção de arte, animações, interface, efeitos sonoros, programação e testes continuam sendo necessários, independentemente do tamanho da produção. Freqüentemente a solução encontrada pelos indies é acumular funções, utilizar ferramentas acessíveis e recorrer à criatividade. Como afirma Kremers:

Essa força criativa, mesmo com menos recursos, pode se diferenciar através de ideias originais e impulsionar a indústria dos games. Embora os novos meios democratizem a produção através das ferramentas digitais de produção, distribuição e financiamento, algumas iniciativas recentes podem ser compreendidas como manobras do capital visando cooptar o movimento independente:

5 DIY (Do It Yourself): uma tendência nas formas atuais de produção e consumo, estimulada pela Internet e sentimentos anti-globalização e anti-consumo (JWT, 2009). A origem do termo é mais remota, porém no movimento Punk dos anos 70 adquiriu características semelhantes às atuais, com o controle dos meios de produção para a criação de uma cultura alternativa (SALEN & ZIM- MERMAN, 2003).

In a move similar to film studios and the music industry, digital games publishers are increasingly outsourcing the production (of parts of games) to so-called second and third party studios - that more often than not are the very “indies” operating outside the corporate system. (DEUZE, 2007 apud MARTIN; DEUZE, 2009,

p. 277)

“Independent game creators are starting to make games based on their own personal desires and goals, and although these games are not made by teams of 100 developers with multi million dollar budgets, they have something to offer that the big boys often can’t touch: freedom from focus groups, financial dogma, shareholders, and so on. They can, and often do, differentiate themselves from mainstream games with ideas and concepts that are genuinely original and progressive to the art of making games.” (KREMERS, 2009, p.371)

Monopólios de lojas virtuais como a App Store (APPLE,) que intermedia a venda de aplicativos e cobra 30% sobre a transação, o surgimento da categoria “indie” dentro de lojas online como mais uma prateleira a ser explorada e consumida, grandes grupos de mídia interessados em parcerias com pequenos desenvolvedores oferecendo sua estrutura de divulgação em troca de 50% de participação nos lucros gerados a partir do conteúdo criado de forma independente. Esses exemplos mostram como algo autêntico pode se tornar mais uma engrenagem do sistema.

Outra visão menos entusiasmada é apresentada por Lev Manovich, segundo a qual deve-se evitar a armadilha de pensar as novas mídias “em função de estratégias estéticas e tropos ideológicos historicamente recorrentes” (MANOVICH, 2005, p.40). Segundo o autor, toda mídia, quando surge, passa pelo deslumbramento de ser um instrumento de democratização e de permitir uma melhor representação da realidade.

Essa percepção idealizada pode estar novamente nublando uma avaliação mais realista dos fenômenos. As formas de produção dos games podem estar se transformando apenas para manter os interesses dos grandes grupos que dominam a indústria. Como afirma David Harvey (2012, p.307) sobre a lógica transformativa e especulativa do capital, cuja “trajetória de desenvolvimento não é previsível em nenhum sentido comum exatamente porque sempre se baseou na especulação - em novos produtos, novas tecnologias, novos espaços e localizações, novos processos de trabalho”, mas sempre em busca do lucro.

[...] em vez de tentar identificar o que há de “singular” no fato de computadores digitais funcionarem como dispositivos de criação, distribuição e telecomunicação de mídias, podemos procurar por certas técnicas estéticas e tropos ideológicos que acompanham toda nova tecnologia das mídias modernas e da telecomunicação em uma etapa inicial de sua introdução e disseminação. Eis alguns exemplos de tais tropos ideológicos: a nova tecnologia permitirá “melhor democracia”, ela nos dará melhor acesso ao “real” (oferecendo “mais imediaticidade” e/ou a possibilidade de “representar o que antes não podia ser representado”), ela contribuirá para “a erosão dos valores morais”, ela destruirá a “relação natural entre os humanos e o mundo”, “eliminando a distância” entre observador e observado. (MANOVICH, p.37 In:

LEÃO, 2005)

Figura 19 - Foto de evento da Sony mostra a relação da indústria com os indies (Playstation

loves indies). Fonte: http://www.meups4.com.

br/wp-content/uploads/2015/02/Jogos-Indie. jpg

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