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A influência das usinas hidrelétricas na expansão do território das cidades estudadas

LISTA DE ABREVIATURAS

2. OBJETIVOS – Luz elétrica, precisa-se!

9.2. A cidade progressista e a eletricidade – de 1890 a

9.2.1. A influência das usinas hidrelétricas na expansão do território das cidades estudadas

A existência de uma usina hidrelétrica exercia papel de destaque na ordenação de qualquer município, quer como expressão de modernidade e poderio, quer como fator relevante na criação de novas indústrias.

A implantação das hidrelétricas deveria obedecer a outras condicionantes que não só os caminhos (estradas ou ferrovias), mas também a proximidade da fonte geradora de energia, já que as perdas eram grandes e o custo da rede era muito alto no início do processo.

Flávio Saes faz uma importante contribuição ao estudo do papel que as companhias concessionárias tiveram no estado de São Paulo. Seu recorte no tempo e espaço veio reforçar o período de escolhido para este estudo, apoiando a opção feita e reforçando a importância do período para o panorama do estado de São Paulo. Apesar da ênfase de Saes ser a ferrovia, há analogia com o setor elétrico e a energização do estado e é utilizado como base no estudo sobre os avanços da eletrificação pelo interior do estado. Devido ao problema de perda na transmissão, as usinas eram implantadas próximas à cachoeira mais próxima do núcleo urbano, ou quando particulares, a indústria era

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instalada ao seu lado. Isto fez com que surgissem várias pequenas usinas nas cidades e bairros industriais ao longo das linhas de transmissão. Logo após, com a implementação dos transformadores de tensão e finda a polêmica da transmissão em corrente alternada, as usinas começam a ter mais geradores por unidade. É a época em que cada usina ganhou um novo grupo gerador e a capacidade aumentou, gerando excedente até para a implantação da rede de transportes públicos (os bondes) no começo do século XX. O abastecimento passa a não mais depender mais da proximidade com a usina.

“O avanço da urbanização, com o conseqüente aumento da demanda por serviços públicos, e o incremento das atividades industriais, observadas no sudeste do país, abriram boas perspectivas para investimento no incipiente campo da energia elétrica” (CENTRO DA MEMÓRIA DA ELETRICIDADE NO BRASIL, 1988. p.28).

A geração de energia elétrica no Brasil vai desenhando novas fronteiras entre o rural e o urbano, o campo e a indústria.

Figura 24. Indicação dos eixos de industrialização no interior paulista. Fonte: MARANHÃO, 2002. p. 68.

Tendo em vista a ordenação do território de uma cidade do interior paulista, a condição ideal para a implantação de uma nova indústria era estabelecida pelo seu posicionamento no quadrante delimitado pela ferrovia (de acordo com o sítio da estação

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ferroviária) e da rede elétrica (de acordo com o sítio da usina). Assim, a indústria conseguiria mais facilmente receber matéria-prima e escoar sua produção, abastecida pela energia hidrelétrica – uma fonte constante (mas não muito confiável), independente de horários e operários que garantissem o abastecimento.

Isso gerou novas formas de gerencia da produção e até novos horários do trem, uma vez que a produção se implementou e o horário de trabalho foi expandido.

Não foi possível investigar todas as cidades que receberam uma usina hidrelétrica na época do estudo devido a quantidade. Escolheu-se então fazer amostragem.

Como as cidades do interior paulista se desenvolveram de forma muitíssimo semelhante em vários aspectos - o que pode ser facilmente verificado através da revisão bibliográfica aqui proposta e da vasta literatura e estudos sobre o interior paulista e a economia cafeeira, decidiu-se citar alguns fatos e acontecimentos relacionados com a chegada da eletricidade de algumas cidades do período conforme iam surgindo na pesquisa bibliográfica. Não há muita ordem nesses relatos que foram encontrados em revistas, jornais, anuários de época, artigos e até mesmo em relatos pessoais; são mais uma amostragem de como a eletricidade impactou a sociedade paulista da época e as alterações que provocaram no cotidiano do interior paulista. As alterações listadas são os famosos “melhoramentos urbanos” e novos prédios e equipamentos, mas que tem um rebatimento direto na transformação da paisagem dessas cidades.

Uma conseqüência direta sobre o desenvolvimento e a ordenação do território das cidades paulistas que implantaram usinas hidrelétricas entre 1890 e 1930, é o surgimento de bairros no quadrante da estação com a usina, conforme os mapas das Figuras 28 a 35, para as cidades de São Carlos, Rio Claro, Piracicaba, Campinas e São José do Rio Pardo.

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As figuras foram elaboradas usando-se a base do Google Mapas (https://maps.google.com.br/maps). No cruzamento dos eixos está o centro da cidade ou onde a cidade surgiu; normalmente uma igreja e a praça central. Em preto, foi realçado traçado da ferrovia e um pin marca a localização da estação ferroviária. Outro

pin demarca a posição da usina hidrelétrica histórica. Desta forma, delimitou-se o

quadrante da estação ferroviária/central hidrelétrica.

Figura 25. Setor da cidade de São Carlos após energia elétrica. Figura elaborada a partir da base do Google Mapas (https://maps.google.com.br/maps).

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Figura 26. Fig. 26A. Av. São Carlos em 1888/89. Fig. 26B. Av. São Carlos em 1910. Fonte: Arquivo Municipal/Fund. Pró-Memória de São Carlos

Figura 27. Setor da cidade de Rio Claro após energia elétrica. Figura elaborada a partir da base do Google Mapas (https://maps.google.com.br/maps).

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Figura 28. Peça publicitária da Central Elétrica Rio Claro, início do século XX. (Acervo: Fundação Patrimônio Histórico da Energia de São Paulo)

Figura 29. Setor da cidade de Piracicaba após energia elétrica. Figura elaborada a partir da base do Google Mapas (https://maps.google.com.br/maps).

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Figura 30. Setor da cidade de São José do Rio Pardo após energia elétrica. Figura elaborada a partir da base do Google Mapas (https://maps.google.com.br/maps).

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Figura 32. Setor da cidade de Campinas após energia elétrica. Figura elaborada a partir da base do Google Mapas (https://maps.google.com.br/maps).

O que se notou foi que, nestas cinco cidades, surgiram neste quadrante os primeiros bairros operários e as primeiras fábricas, numa expansão da cidade justificada pela disponibilidade de energia para as indústrias e escoamento da produção. Este setor foi hachurado em amarelo. Não é exatamente a posição da casa de força das usinas o que mais interessa, mas o percurso da linha de transmissão até a cidade.

Ao longo das linhas de transmissão surgiram fábricas e bairros.

O desenvolvimento da cidade no quadrante energia/ferrovia não é uma regra nem unanimidade no interior paulista, mas é preponderante. Quase todas as cidades paulistas por onde passa a ferrovia, tem uma central hidrelétrica e cria um novo vetor de crescimento, segregado do centro tradicional, onde vão se localizar as indústrias e os imigrantes.

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Foram estudadas, por esse viés, somente cinco cidades, mas são exemplares na medida em que são as primeiras a receber energia hidrelétrica e tornam-se posteriormente pólos industriais no estado, com exceção de São José do Rio Pardo que tem sua economia alicerçada no rural e na geração de energia.

É fato notório que a posição da estação ferroviária, como terminal de embarque é o fator prioritário da implantação das fábricas; a segunda condicionante é a disponibilidade de energia, o que acontecia nas proximidades da linha de transmissão.

Figura 33. Estação da Estrada de ferro de Campinas em 1878. Notar os postes da cidade já eletrificada e os bondes puxados por cavalos. Fonte: Getulio Grigoletto, 2009

Dessa forma, é de esperar que os bairros operários ou mesmo o setor de serviços fossem se posicionando nas imediações das indústrias, onde havia também disponibilidade de terra barata, uma vez que ainda não fazia parte da cidade. Muitas vezes eram as próprias indústrias que criavam os bairros para seus operários. Surgem os “subúrbios” ou os “bairros”.

A denominação bairro já exprime que é algo diferente da cidade; remete a um novo logradouro que necessariamente não é como a cidade, tem uma paisagem diferente. No começo do século XX o “bairro” era o local distante do centro, sem muitas das “melhorias” e identificado com indústria e imigração.

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Nas cinco cidades nota-se o nascimento de bairros operários ou de classe média no setor hachurado. Outra característica desses novos bairros era muitas vezes serem planejados. Nota-se sempre o traçado retilíneo, as ruas mais largas, quadras retangulares, tudo como mandava os manuais higienistas. Estão longe de serem agrupamentos espontâneos; são a expressão da vontade do loteador e do poder público.

Apesar da eletrificação ter priorizado os centros das cidades, quase nunca aparecendo nos bairros, em conseqüência do custo, há um reflexo indireto no surgimento de novos bairros, quase sempre operários e que, via de regra, não dispunham de luz elétrica. A linha de transmissão quase sempre passava sobre suas cabeças, sem poderem desfrutar das comodidades da energia elétrica.

Claramente é um indicador que a energia elétrica além de cara, não era amplamente disponível. O antigo e o moderno ainda conviveriam por longos anos nas cidades e ser operário (uma condição moderna) não implicava em ter um cotidiano equivalente. Vivia- se a contradição de ter uma função moderna e urbana, morando e agindo na condição do modo de vida rural, enquanto a elite rural vivia do mundo rural, mas morava na cidade moderna e usufruía dos novos confortos urbanos.

Surgiram os códigos sanitários e de obras para regulamentar o uso e ocupação da cidade progressista. Tentou-se impor recuos às vilas operárias construídas fora do perímetro urbano. As praças foram remodeladas e embelezadas em quase todas as cidades, inclusive na capital São Paulo.

As companhias de eletricidade eram também, em sua maioria, proprietárias das companhias de bondes, que transportavam os trabalhadores. Mas como coloca Bodanis (2008):

“Companhias de bondes, que haviam instalados grandes usinas geradoras para acionar seus carros, descobriram que depois das sete horas da noite, quando os operários estavam em casa, não havia aplicação de seu produto. O que se poderia

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fazer com a capacidade ociosa? Uma solução foi inventar o parque de diversões moderno. Montanhas-russas operadas eletricamente e arcadas brilhantemente iluminadas surgiam nos limites das cidades por todo o país e em partes da Europa Ocidental. Por volta de 1901, a maioria das grandes cidades americanas já

contava com esses parques de diversão [grifo nosso, o que quer dizer que elas

já estavam eletrificadas], propriedade das companhias de bonde, que também lhes

forneciam a energia.” (BODANIS, 2008. p. 55)

Os usos da energia para diversão passam a ser largamente usados e se popularizaram, quer seja nas diversões como os carrosséis que surgiam em todas as cidades “importantes” do mundo no começo do século XX, quer seja nos footings das praças iluminadas, ou nas pistas de patinação, bailes e agremiações; tudo patrocinado pelas companhias de energia.

Outra utilização do patrimônio das companhias de energia foi o de loteamento das terras valorizadas pelo lazer nas margens dos rios, como fez a Light. “Já na primeira década do século, a Cia Light conseguiu autorização para construir uma represa no rio Guarapiranga, um dos afluentes do Pinheiros” (CORREA e ALVIM, 1999) de modo a garantir a regularidade da vazão. Em 1913 o local se valoriza com uma rede de bondes. A represa criou novas áreas de lazer da elite, como os clubes que surgiram para a prática de esportes.

9.3. Cidades acesas - Impactos da energia elétrica sobre o