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Básicos viii) Factores básicos intra-

2.5. Influência social, intenção de fumar e comportamento tabágico

Apesar da relevância da influência social na explicação do comportamento tabágico e no desenvolvimento de programas de prevenção do tabagismo, uma revisão da literatura publicada nesta área revela que o papel desta variável na determinação do comportamento tabágico não tem tido uma elaboração teórica consistente e não tem conseguido apoio claro por parte dos estudos empíricos publicados (e.g., Armitage & Conner, 2001; Rivis & Sheeran, 2003; Rivis, Sheeran, & Armitage, 2006; Webb & Sheeran, 2006).

A relação entre a influência social e o comportamento tabágico remonta aos estudos pioneiros sobre a iniciação do tabagismo cujas conclusões sugeriam que os adolescentes começam a fumar por influência da pressão directa exercida por pessoas relevantes do seu meio social, com destaque para o grupo de pares (e.g., Evans, 1976; Evans, Rozelle, Mittelmark, Hansen, Bane, & Havis, 1978; USDHHS, 1994). Esta linha de investigação teve grande importância no desenvolvimento dos programas de prevenção para os adolescentes, caracterizados por incluírem uma componente destinada a treinar a sua capacidade para lidar melhor com a pressão directa para fumar dos pares (Botvin, Eng, & Williams, 1980; De Vries et al., 1995).

Os trabalhos de Bandura (1986, 1977) sobre os processos de influência a partir da observação do comportamento dos outros e das suas consequências (aprendizagem vicariante) acabaram por reforçar esta perspectiva e por alargar o conceito de influência social para lá da pressão directa para fumar exercida pelos pares. A influência social passou a abranger, além da pressão directa no contexto da interacção social, também processos indirectos de cunho mais individual e cognitivo. Entretanto, surgiu o Modelo da Acção Reflectida, que integra no seu núcleo principal de variáveis a intenção, a atitude e as normas sociais (normas subjectivas). Estas foram definidas como a percepção da pessoa sobre o que outros importantes pensam relativamente ao modo como se deve comportar (Fishbein & Ajzen, 1975). As normas subjectivas são mais um conceito do âmbito da influência social a juntar à pressão directa e à observação do comportamento dos outros (modelagem ou normas descritivas).

A preponderância atribuída por Evans aos pares como principais referentes de influência foi também sendo contestada pelos trabalhos posteriores. Em muitos estudos publicados, o impacto da influência dos pares era considerado o melhor preditor do comportamento tabágico dos adolescentes (e.g., Kobus, 2003), mas foram surgindo outros estudos indicando que a família, principalmente os pais, também podem influenciar o comportamento dos jovens (e.g., Bricker, Peterson, Andersen, Rajan, Leroux, & Sarason, 2006b, Bricker, Peterson, Leroux, Andersen, Rajan, & Sarason, 2006c; De Vries et al., 2003a; McMillan et al., 2005; Rajan et al., 2003).

Além destas incongruências sobre os processos de influência e sobre os referentes relevantes para a iniciação e o comportamento tabágico, a literatura aponta ainda outro problema: vários estudos empíricos não confirmaram o peso que a influência social adquiriu nos modelos teóricos e na história da prevenção do tabagismo (e.g., Armitage & Conner, 2001).

Estes resultados inconsistentes sobre o impacto da influência social no comportamento tabágico dos jovens podem ser causados por deficiências teóricas nas perspectivas da influência social, por insuficiências na operacionalização e medição desta variável, por inadequação dos métodos estatísticos utilizados, ou por diferenças nas amostras em termos de idade e de especificidade cultural (e.g., Avenevoli & Merikangas, 2003; De Vries et al., 2006b, 2003b; Hagger & Chatzisarantis, 2005, 2006; Kobus, 2003; McMillan et al., 2005). Por exemplo, alguns estudos concluíram que a influência dos pais no comportamento dos jovens tem sido subestimado e a influência dos pares tem sido sobrestimado, devido à utilização de amostras transversais cujos resultados favorecem a influência dos pares relativamente à dos pais (e.g., Bricker, Peterson, Sarason, Andersen, & Rajan, 2007; De Vries et al., 2003a; De Vries, Candel, Engels, & Mercken, 2006a).

Quanto à intenção de fumar, a situação desta variável é, em muitos aspectos, análoga à da influência social. Na matriz utilizada para apresentar os factores que se associam ao comportamento tabágico (secção 2.2), a intenção surge na categoria dos factores imediatos, ou seja, na categoria dos factores que estão mais próximos do comportamento e mais fortemente relacionados com este (Flay et al., 1999; Petraitis et al., 1995). A intenção é também a variável chave nos Modelo da Acção Reflectida e do Comportamento Planeado, assim como em vários modelos inspirados nestes, como o ASE e o I-Change. Segundo estes modelos, a intenção, além de ser o preditor mais imediato e mais importante do comportamento, é ainda

mediador da influência entre as variáveis situadas nas linhas anteriores dos modelos e o comportamento (Ajzen, 1988, 1991; Ajzen & Madden, 1986; Fishbein & Ajzen, 1975).

A verificar-se esta posição e este papel da intenção, esta variável poderá ajudar a resolver um problema de grande relevância no controlo do tabagismo, contribuindo para uma boa operacionalização da susceptibilidade para fumar e melhorando assim os resultados das medidas para prevenir a iniciação do tabagismo na primeira fase da adolescência.

No entanto, a controvérsia sobre a relação entre a intenção e o comportamento está instalada. São vários os estudos publicados que apoiam a tese que a intenção é o principal preditor do comportamento (e.g., Andrews et al., 2003; Choi et al., 2001; Wakefield et al., 2004) mas, ao mesmo tempo, os resultados da investigação nesta área revelam uma lacuna na relação entre estas duas variáveis e sugerem que o impacto da intenção no comportamento é inferior ao esperado (e.g., Armitage & Conner, 2001; Sheeran, 2002; Webb & Sheeran, 2006).

A influência social e a intenção parecem assim unidas por esta contradição entre, por um lado, uma elevada importância teórica, que se traduz numa grande relevância prática no plano do desenvolvimento de programas de prevenção para os adolescentes e, por outro lado, os resultados da investigação realizada para explicar e prevenir o comportamento tabágico nos jovens situam-se abaixo das expectativas.