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Básicos viii) Factores básicos intra-

2.5. Prevenção do tabagismo

Após ter sido descrito, na secção 2.1., a evolução do comportamento tabágico, enfatizando a importância da iniciação na instalação da dependência e o facto de a iniciação e a dependência ocorrerem precocemente na adolescência, depois de ter sido apresentado na secção 2.2. os factores que a investigação tem relacionado com o comportamento tabágico e, nas secções 2.3. e 2.4., os modelos que são utilizados para explicar este comportamento, e tendo sido identificadas algumas lacunas entre a influência social e o comportamento e entre a intenção e o comportamento nas secções 2.4. e 2.5., esta secção incide sobre a prevenção do comportamento tabágico. Quando a OMS classifica o tabagismo como a principal causa evitável de doença e morte prematura nos países desenvolvidos (WHO, 2008, 1999, 2003) sugere que o comportamento tabágico pode e deve ser prevenido. Como já foi referido antes (secção 1.3.), a prevenção do tabagismo (ou o controlo do tabagismo) inclui várias medidas a implementar nos níveis individual, micro e macro (WHO, 2008; World Bank, 1999). Nas medidas individuais cabem os programas de prevenção dirigidos aos adolescentes com a finalidade de evitar ou atrasar o inicio do consumo de tabaco, o comportamento regular e a dependência.

É comum organizar os programas de prevenção do tabagismo para adolescentes em três categorias: i) programas informativos ou racionais, ii) programas educativos ou afectivos e iii) programas baseados na influência social. Os primeiros são considerados inefectivos, os segundos pouco ou nada efectivos e os terceiros pouco efectivos (Becoña, 2002; Lantz et al., 2000).

Os programas de prevenção baseados na influência social conjugam a evolução dos modelos aplicados aos comportamentos relevantes para a saúde com a história da investigação do comportamento tabágico. Integram contributos das teorias sócio-cognitivas e da influência social (Ajzen & Fishbein 1980; Botvin, 1980; Evans, 1976; Bandura, 1986). Dirigem-se preferencialmente a adolescentes não fumadores, promovendo a consciência sobre os processos sociais que influenciam a iniciação tabágica e, ao mesmo tempo, a vontade e a capacidade para lidar com esses processos. São aplicados com base na escola e combinam estratégias educativas interactivas e estratégias dirigidas ao contexto micro social dos adolescentes. Vários estudos indicam que estes programas, quando promovidos de modo

integrado no contexto da escola e da comunidade, incluindo também a família, têm resultados positivos e duradouros (Biglan, Ary, Smolkowski, Duncan, & Black 2000; Pentz et al., 1989; Skara & Sussman, 2003; Tobler, Roona, Ochshorn, Marshall, Streke, & Stackpole, 2000; Vartiainen, Paavola, McAlister, & Puska, 1998).

No entanto, duas revisões de literatura recentemente publicadas sobre a avaliação destes programas coincidem nas suas conclusões e declaram estes programas como não sendo efectivos (Thomas & Perera, 2006; Wiehe, Garrison, Christakis, Ebel, & Rivara, 2005).

Thomas e Perera (2006) concluem que é limitada a evidência da efectividade de programas de prevenção do tabagismo para jovens com base na promoção de competências sociais, mesmo quando é utilizada uma abordagem multi-dimensional que integra a comunidade. Wiehe e colegas (2005) incluíram na sua revisão artigos publicados sobre a avaliação de programas de prevenção baseados na escola que acompanharam os participantes, pelo menos, até aos 18 anos ou até ao 12º ano de escolaridade. Concluíram que o seu impacto a longo prazo é reduzido ou nulo. Este artigo motivou uma polémica. Os argumentos em defesa dos programas apontaram limitações ao modo como a revisão foi efectuada, nomeadamente, na selecção dos artigos revistos, alguns dos quais sobre programas que não cumpriam os critérios mínimos necessários para alcançar resultados (Flay, 2005). Os argumentos contra os programas assentaram na ideia que existe evidência suficiente para desistir da sua utilização e contrapuseram outras estratégias mais eficazes onde será preferível investir os recursos públicos destinados a combater o tabagismo (Glantz & Mandel, 2005).

O designado Hutchinson Smoking Prevention Project é o exemplo internacional mais

conhecido e discutido de um programa de prevenção com base na escola, que reuniu as melhores condições de implementação, mas que não conseguiu resultados a longo prazo (Peterson et al., 2000). Este resultado foi alvo de um comentário de De Vries (2007) sugerindo, por um lado, que as expectativas sobre os resultados deste tipo de programas são excessivas e, por outro lado, que não se investe o necessário no desenvolvimento dos programas e nas condições para uma implementação satisfatória. Este autor reconhece que as intervenções com base na escola podem não ser suficientes para obter resultados e sublinha que estes programas devem conjugar intervenções na escola, com intervenções na comunidade e na família.

A recomendação de integrar as intervenções em vários contextos surge também na parte final do artigo sobre a avaliação do Hutchinson Smoking Prevention Project, mas estes autores vão mais longe, propondo que, antes de rever as estratégias e as medidas utilizadas

nos programas de prevenção, é necessário voltar às origens e questionar as teorias que têm sido aplicadas ao estudo da iniciação e do comportamento tabágico nos adolescentes (Peterson et al., 2000). Estes autores apontam as principais tarefas a realizar: i) identificar os preditores do comportamento tabágico nos jovens, ii) identificar, entre os preditores, aqueles que são modificáveis e podem ser alvo de programas preventivos, iii) avaliar até que ponto mudar estes factores de risco conduzirá a mudanças no comportamento tabágico dos jovens, e

iv) desenvolver e testar estratégias e medidas para mudar os preditores e o comportamento.

Neste contexto, a nível da Europa, um programa de referência é o ESFA – European

Smoking prevention Framework Approach, um projecto de investigação-acção, com um

design quasi-experimental, incluindo uma condição experimental e uma condição de controlo, que acompanhou durante três anos adolescentes de seis países, incluindo Portugal (De Vries et al., 2003c). As conclusões da avaliação deste projecto quanto à efectividade da intervenção não foram claras, sendo os resultados significativos em alguns países (foi o caso de Portugal) e não significativos noutros (De Vries et al., 2006b). Mas os resultados deste projecto sugerem também que existem diferenças entre países (sociais e culturais) nos factores associados ao comportamento que devem ser consideradas no desenvolvimento das estratégias e dos programas de prevenção, o que acentua a necessidade de mais investigação sobre os processos de iniciação e de aquisição do comportamento tabágico, a realizar com adolescentes de diferentes nacionalidades.

Os resultados fracos dos programas de prevenção baseados na perspectiva da influência social acabam por colocar em causa este conceito e justificam a necessidade de continuar a investigar o comportamento tabágico também a partir deste plano mais prático cuja finalidade será melhorar a efectividade destes programas.

2.7. Síntese e conclusões

A investigação sobre o comportamento tabágico pode ser dividida em quatro níveis principais:

i) descrever o comportamento e o processo da sua aquisição, ii) identificar os determinantes do comportamento,

iii) desenvolver modelos teóricos para explicar o comportamento, e iv) desenvolver e aplicar programas preventivos.

A primeira parte deste capítulo descreve o desenvolvimento do comportamento tabágico e pode resumir-se em quatro ideias:

i) a aquisição e o desenvolvimento do comportamento tabágico e da dependência tem

várias fases;

ii) a iniciação ocorre nos primeiros anos da adolescência (ou mesmo antes);

iii) os sinais de dependência surgem após alguns cigarros (e antes do comportamento

regular); e

iv) quanto mais precoce for a iniciação mais graves serão as consequências de fumar.

Estes conhecimentos provocaram numa mudança no foco da investigação, antes colocado sobre a instalação da dependência e agora colocado sobre o momento da iniciação e sobre a fase que antecede a iniciação. Espera-se que esta investigação contribua para melhorar a efectividade dos programas de prevenção dirigidos aos adolescentes que nunca fumaram.

Os determinantes do comportamento tabágico podem ser factores de risco e factores protectores e podem variar em função da fase no desenvolvimento do comportamento tabágico (susceptibilidade, iniciação e progressão para o comportamento regular), da fase do desenvolvimento psicossocial dos adolescentes e de outras características como o sexo e o nível sócio-económico. Dois factores que têm merecido destaque no estudo do comportamento tabágico são a influência social e a intenção.

Vários modelos têm sido utilizados para explicar o comportamento tabágico e para orientar o desenvolvimento de programas de prevenção para jovens que não fumam implementados com base na escola. Os programas desenvolvidos a partir da perspectiva da influência social são considerados os mais evoluídos. No entanto, a polémica sobre estes

programas tem aumentado nos últimos anos porque não tem sido possível demonstrar a sua efectividade.

A contestação dos programas de prevenção inspirados na perspectiva da influência social acaba por atingir as teorias que estão na sua origem. A aplicação do conceito e das teorias da influência social à explicação do comportamento tabágico e à sua prevenção tem sido debatida nos planos teórico e metodológico. Este contexto e estas dificuldades sugerem a necessidade de continuar a investigar o comportamento tabágico, as teorias utilizadas para o explicar e as estratégias utilizadas na sua prevenção.

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APÍTULO

3.