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CAPÍTULO 1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.2 CONFIGURAÇÕES ESPACIAIS URBANAS E SEUS ASPECTOS (IMPACTOS) AMBIENTAIS,

1.2.5 Influências do cinturão e infraestrutura verdes nos microclimas urbanos

As áreas verdes urbanas, segundo Gunawardena, Wells e Kershaw (2017), podem ser consideradas como maciços vegetados, à exemplo de parques, arborização e orla urbanos, jardins, corredores de mobilidade, fachadas e telhados vegetados, com provisão de benefícios ecossistêmicos no ambiente urbano. Dentre os benefícios, incluem-se: redução na transformação de águas pluviais em escoamento superficial, mitigação de enchentes, espaços para drenagem urbana mais sustentável, melhoria de aspectos estéticos de paisagem, do bem- estar e modificação dos microclimas locais (Ibidem).

Dentre as influências diretas destes espaços, destaca-se a incidência nos microclimas por meio da redução das temperaturas da superfície e do ar (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW,

27 Conceito apresentado em “The Death and Life of Great American Cities”, de Jane Jacobs (1961), em que a

autora afirma que as calçadas devem ser dotadas de pedestres continuamente, pois seus “[...] olhos pertencem àqueles que podemos denominar proprietários naturais da rua” (JACOBS, 1961, p.35, tradução). Assim, na visão de Jacobs, uma rua deserta está apta a ser insegura, pois são seus constantes transeuntes, assim como suas fachadas visualmente permeáveis, que provêm a vigilância e a segurança nos espaços públicos.

2017). Indiretamente, há também a modificação do microclima por meio da redução da transferência de calor para áreas urbanizadas, reduzindo, desse modo, as cargas de refrigeração mecânica ou outros tipos de emissão de calor de origem antropogênica devolvidos ao clima urbano (Ibidem).

Por conseguinte, as áreas verdes são um tipo de “capital natural” que pode ser utilizado para mitigação de efeitos adversos das ICUs, eventos extremos de calor e mudanças climáticas (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017). Aliás, um estudo recente de Emmanuel e Loconsole (2015) indicou que, para a região de Glasgow Clyde Valley no Reino Unido, um incremento de aproximadamente 20% na cobertura vegetal urbana pode eliminar entre 33% e 50% dos efeitos de ICUs, esperados até 2050.

Masiero e Souza (2013) explicitam que o ambiente urbano, via de regra, apresenta temperaturas e umidade mais críticas do que o meio rural. Isso se deve às variações de energia decorrentes das emissões de calor antropogênicas, da estruturação da malha urbana, das propriedades de absortância das superfícies construídas, e da baixa presença de superfícies de evaporação em comparação às áreas rurais (Ibidem). Logo, os microclimas urbanos são afetados pela presença de espaços verdes e pela manutenção de condições que favoreçam a evapotranspiração (MASIERO e SOUZA, 2013).

Por meio de sua sombra, a vegetação urbana mantém o ar mais frio por intermédio da interceptação e absorção28 da radiação solar, limitando a irradiação do calor e a absorção desta

radiação por parte das superfícies urbanas (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017). Estima-se que a percentagem de refletância da radiação, que retorna para a atmosfera, seja de apenas 15% para as árvores e entre 20–25% para as gramíneas (Ibidem).

Gunawardena, Wells e Kershaw (2017) explicitam, também, que a vegetação beneficia indiretamente a amenização do clima e melhoria do bem-estar por meio da filtragem da poluição, em que partículas sólidas incidem e aderem nas superfícies da vegetação, e os poluentes gasosos são diretamente absorvidos pelas folhas. A redução de tais poluentes minimiza a absorção e dispersão atmosférica da radiação infravermelha de ondas curtas e longas, que influencia o equilíbrio e as taxas de aquecimento ou resfriamento atmosférico (Ibidem).

28 Parte da energia absorvida é utilizada por compostos químicos fitoativos na vegetação para o processo biológico

Ademais, as copas da vegetação modificam o fluxo dos ventos e a rugosidade da superfície, alterando a “transferência de calor convectiva29”. De tal modo que os processos de transferência

de calor combinados com a transpiração da vegetação – evapotranspiração –, são influenciados pela umidade e fluxo dos ventos (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017).

A manutenção de cinturões verdes pode oferecer benefícios tanto na eficiência energética nos edifícios dos núcleos urbanos como na melhoria da qualidade do ar (MASIERO e SOUZA, 2013; GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017). No contexto ambiental urbano, a transferência de calor convectiva representa um fluxo de baixa pressão induzido, em decorrência de um diferencial no gradiente térmico entre o cinturão verde e o núcleo urbano (OKE, 1989).

Assim, a denominada “brisa do parque” está representada pela subsidência de uma massa de ar (fluxo descendente) sobre a área verde, em que os maciços vegetados absorvem energia (calor) para seus processos naturais de fotossíntese e evapotranspiração (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017). Subsequentemente à esta subsidência sobre as áreas verdes, ocorre a divergência desta brisa do parque para o núcleo urbano (por sua vez mais quente) e, a partir disso, a circulação dessa massa de ar aquecida ascende no núcleo urbano e converge sobre o cinturão verde e realimenta uma difusão externa da massa de ar frio (Ibidem).

Esta dissipação de energia, por meio de um fluxo contínuo de ar urbano aquecido que realimenta uma corrente de baixa pressão que passa pelo cinturão verde, na visão de Oke (1989), Gunawardena, Wells e Kershaw (2017), explica este diferencial térmico aparente na relação áreas verdes-espaços urbanos. Na Figura 1 estão ilustrados os fluxos de transferência de calor convectiva.

Figura 1 – Transferência de calor convectiva no contexto ambiental urbano (OKE, 1989; GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017)

Fonte: Elaboração do autor

As características de densidade das copas que formam o dossel florestal são similarmente relevantes, de modo que as gramíneas oferecem uma barreira de ar estagnado junto ao solo, e as florestas densas impedem o fluxo dos ventos, retendo o ar mais quente embaixo das copas (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017).

Além disso, as copas da vegetação interceptam parte das águas pluviais, e suas raízes se espalham e formam barreiras e depressões na superfície que também retêm estas águas (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017). Isso favorece a redução do escoamento superficial e permite a intensificação da infiltração, elevando a umidade do solo e auxiliando nos processos de evapotranspiração (Ibidem).

Algo importante pois à medida em que a evapotranspiração é reduzida, ocorre uma alteração no equilíbrio da distribuição da energia urbana. Assim, uma determinada fração da energia (calor), que seria convertida pela evapotranspiração, passa a contribuir com a formação de ICU (GUNAWARDENA, WELLS e KERSHAW, 2017).

Adicionalmente, a impermeabilização sistemática do solo e a redução das áreas verdes, que restringem a infiltração, interferem tanto nos processos de arrefecimento evaporativo (quando os corpos d’água liberam gotículas em função da incidência de correntes de vento), quanto através da transferência de calor convectiva – em que a energia (calor) fornecida pelo ar é absorvida para a realização dos processos naturais de evaporação e evapotranspiração (MASIERO e SOUZA, 2013).

Em contrapartida, a combinação do potencial eólico e da umidade (fornecida pela vegetação ou pelos corpos d’água), pode contribuir para melhoria das condições climáticas de uma cidade, favorecendo o bem-estar e a qualidade de vida dos cidadãos – visto que o aumento das taxas de umidade e a incidência de correntes de maior pressão proporcionam uma maior renovação do ar urbano, e uma redução nas amplitudes térmicas urbanas (MASIERO e SOUZA, 2013).