ECONOMIA DA INOVAÇÃO E ECONOMIA TERRITORIAL DA INOVAÇÃO
CAPÍTULO 1 – A ABORDAGEM DA ECONOMIA DA INOVAÇÃO
4. Inovação: a perspectiva empresarial e os critérios de sucesso
Braun (1986: 50-58) elaborou uma análise dos factores subjacentes ao sucesso da dinâmica empresarial de inovação, dividindo-os em quatro grandes grupos:
a) o chamado factor humano, que sugere que as dinâmicas inovadoras de êxito se fundam na qualidade dos recursos humanos que a empresa possui;
b) a existência de fluxos oleados de comunicações com os clientes e o meio envolvente, nomeadamente consultores externos;
d) a introdução no mercado de produtos inovadores mas suficientemente desenvolvidos, de modo a evitar desilusões e queixas nos mercados potenciais pelo possível surgimento de defeitos.
Para Pavitt et alli (1989: 21-24), ainda nessa linha de análise, a implementação bem sucedida de uma inovação depende de três factores:
a) do estabelecimento de efectivos vínculos horizontais, quer intra-empresariais entre as actividades de I&D, a produção e o marketing, quer inter-empresariais, nomeadamente com clientes e com centros de racionalidade e competência técnica e científica;
b) do perfil pessoal e profissional do promotor da inovação na empresa e do seu grau de relacionamento com as diversas funções desenvolvidas interna e externamente (técnica, produção, marketing);
c) da estrutura organizacional e decisional da empresa, nomeadamente da existência dos mecanismos de agilização na tomada de decisões.
Freeman, Sharp e Walker (1991: 35-36), por seu turno, detendo-se sobre a mesma problemática, elencaram dez características de empresas que obtiveram sucesso no campo da inovação, sem que todavia essas mesmas empresas, a título individual, as consigam reunir todas simultaneamente. Essas características são as seguintes:
a) grande intensidade das actividades de I&D internas às empresas;
b) realização de investigação fundamental ou articulação com organismos que desenvolvem essa modalidade de investigação;
c) recurso à utilização de patentes como forma de garantir protecção e capacidade negocial nos mercados;
d) dimensão suficientemente grande para possibilitar arcaboiço financeiro e logístico na realização de actividades de I&D durante períodos mais dilatados;
e) mecanismos decisionais mais flexíveis que permitam obter respostas mais rápidas do que os competidores;
f) forte presença de espírito de risco;
g) organização orientada para a detecção de mercados potenciais;
h) forte investimento na gestão de mercados potenciais e desenvolvimento de esforços para captar, educar e ajudar os clientes;
i) definição de estratégia empresarial para coordenar as diferentes actividades empresariais, como a I&D, a produção, o marketing e a comercialização;
j) boas comunicações com o exterior e com os clientes.
Assim, nesta matéria, parece recorrente a ênfase em factores como a comunicação interna e externa, a flexibilidade e o apoio à figura do dinamizador tecnológico por parte da direcção das empresas. Cumpridos estes requisitos, a promoção da inovação encontra-se facilitada pela assunção de uma estratégia descentralizada na tomada de decisões e pela existência de canais formais e informais de fluxos de informação relevantes.
Souder (1989), citado por Roca (1994: 53), analisou quinze casos de inovações radicais, do tipo technology-push, com o objectivo de identificar os mecanismos que originam o êxito de determinada inovação. Atentando em casos como o laser, o nylon, os diamantes sintéticos ou os díodos de germânio, Souder (op. cit.) enumera os seguintes factores de sucesso comuns a todos as inovações analisadas:
a) numa fase inicial, todas as inovações penetraram mercados relativamente reduzidos e selectivos, exercendo aí mais facilmente efeitos demonstrativos que as caucionaram e tornaram mais visíveis e atractivas para mercados mais alargados; b) os projectos de desenvolvimento da inovação assentaram em redes de cooperação
envolvendo o inventor e a empresa comercial responsável pelo lançamento do novo produto no mercado;
c) a larga maioria das empresas baseou a sua abordagem ao processo de inovação na fertilização entre mecanismos de technology-push e market-pull, nomeadamente através do recurso à opinião dos clientes durante a fase de desenvolvimento;
d) houve sempre o cuidado de adequar o produto final à cultura de utilização dos clientes finais, moldando diferentemente o produto em função da especificidade dos hábitos e costumes dos utilizadores;
e) cuidou-se sempre de incorporar o novo produto com outros relacionados já existentes no mercado, tendo em vista o ganho final por parte do utilizador, procurando maximizar a função de utilidade social.
É ainda Roca (1994: 53) que, de modo brilhante, equaciona a problemática inerente aos produtos desenvolvidos segundo o critério do empurrão científico: se fizeres um estudo
de mercado já chegas tarde; com efeito, para grande parte dos novos produtos, de carácter radical, existe, quase por definição, um desconhecimento do seu mercado potencial, no sentido em que para esse novo produto a procura está apenas latente e tem dificuldade em objectivar-se. Daí que seja absolutamente fundamental (op. cit.) a estreita conexão com as necessidades reais dos utilizadores potenciais, de modo a detectar problemas e ser capaz de os solucionar com o novo produto, sem modificar substancialmente os costumes dos clientes.
Rothwell (1992: 332), analisando aquilo que designa por 5ª Geração do Modelo de Inovação, refere, por sua vez, que a implementação bem sucedida da inovação depende dos seguintes factores de êxito representados no quadro 1.4:
Quadro 1.4 - Factores de sucesso dos projectos inovadores
1. Factores relacionados com a execução do projecto de inovação - existência de bons canais internos e externos de comunicação;
- tratamento da inovação como uma tarefa que implica o conjunto da empresa; - aplicação de procedimentos de planificação e controlo do projecto;
- eficiência no trabalho de desenvolvimento e no nível de qualidade da produção; - orientação para o mercado e ênfase na satisfação das necessidades do utilizador; - disponibilização de serviço técnico de apoio aos clientes;
- definição de uma política activa de recursos humanos; - gestão de alto nível open-minded.
2. Factores intrínsecos à gestão empresarial
- implicação da direcção e apoio explícito à inovação;
- definição de uma estratégia empresarial de longo prazo que incorpore a estratégia de inovação prosseguida;
- envolvimento em grandes projectos a longo prazo; - aceitação do risco por parte da direcção;
- adopção de uma cultura de inovação e de agilização empresarial.
Fonte: Rothwell (1992: 332)
Resumindo, das diferentes abordagens apresentadas sobre a análise dos factores de sucesso na promoção de uma inovação e da sua aceitação pelo mercado, podemos, sinteticamente, reter as seguintes conclusões gerais:
- destacar, desde logo, a importância que é atribuída ao papel desempenhado pelo utilizador final da inovação, gerando uma cultura de permanente aferição da resposta do mercado e, assim, combatendo o perigo proveniente da mera assunção de uma lógica interna subordinada aos ditames do technology-push; ou seja, em termos operacionais, envolver ab initio o departamento de marketing da empresa na definição das linhas estratégicas de desenvolvimento do projecto de inovação, assegurando, assim, a sua ligação aos gostos e necessidades do mercado;
- a existência de recursos humanos qualificados é, também, fundamental, o que levanta
a questão da adequação dos seus níveis educativos e formativos, bem como as políticas salariais perfilhadas nas empresas que pretendem desenvolver projectos de cariz inovador; com efeito, é essencial a existência de capital humano devidamente qualificado e motivado para empreender um projecto a um tempo aleatório e complexo.
Interessa verificar que boa parte do sucesso das iniciativas visando a criação de inovações, quaisquer que elas sejam, radica menos na existência ou não de departamentos de I&D integrados na empresa do que no comportamento e na organização dos seus recursos humanos, da sua capacidade de promover canais hierárquicos facilitadores da tomada de decisão, do fomento de canais internos e externos de comunicação valorizando os circuitos formais mas também os informais. A institucionalização de departamentos empresariais de I&D que não constituam verdadeiro suporte de articulação e irrigação das restantes áreas operacionais da empresas (a engenharia do produto, o design, a produção, o marketing, etc.) não garante uma mais-valia empresarial. Há, aqui, que romper, definitivamente, com a visão ultrapassada inerente ao modelo linear de inovação : a inovação não é a resultante da actividade do departamento de I&D, mas é, antes e cada vez mais, uma função distribuída em que participam activamente todas as unidades orgânicas da empresa e, fora da mesma, fornecedores e clientes.
Muitos autores (por exemplo, Clark e Guy, 1998: 372) têm vindo a notar que, tipicamente, a empresa que segue uma estratégia de sucesso no campo da inovação e, assim, renova de forma sistemática os seus factores de vantagem competitiva,
afirmando-se não raramente como líder na respectiva área territorial e sectorial, é aquela que demonstra maior orientação externa para os mercados, maior ênfase na formação dos seus recursos humanos, laços de cooperação mais aprofundados com as empresas e instituições que prestam serviços avançados no domínio científico- tecnológico e que possuem melhores competências aos níveis da gestão técnica, organizacional e do marketing.