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Instrumento legal de aplicação de precedentes judiciais na

3.2 Aplicação dos Precedentes pela Administração Pública – fase

3.2.4 Premissas de aplicação de precedentes pela administração

3.2.4.2 Instrumento legal de aplicação de precedentes judiciais na

A segunda premissa, que trata do instrumento legal que autoriza a aplicação de precedentes pela administração pública, é, talvez, uma das mais problemáticas para assentar essa possiblidade.

Com efeito, o ponto central da referida premissa é que o atuar da administração pública somente pode ser oriundo do Poder Legislativo, em cumprimento, mais uma vez, ao princípio da legalidade, princípio da democracia, da separação dos poderes e da indisponibilidade do interesse público. Ricardo Vieira de Carvalho Fernandes (2010, p. 157- 158) auxilia nos seus fundamentos:

O princípio da legalidade registra, por sua vez, que a vontade do Estado é expressa por meio da lei. A lei pode, sim, dispor de bens e interesses públicos, vez que é instrumento da vontade popular. Com isso, unindo ambos os princípios chega-se à conclusão de que se admite exceção à indisponibilidade de bens e interesses públicos, desde que expressa em lei.

A grande questão a ser dirimida na premissa em foco é a natureza da lei ora denominada de autorizativa de aplicação de precedentes na administração pública.

Faz-se necessário que seja uma norma constitucional, daí exsurgindo a imposição dessa autorização se dar por emenda constitucional? Ou, de modo mais simplificado, pode uma lei dotar os servidores públicos de competência para aplicação de precedentes judiciais em detrimento de outra lei? E, qual espécie de lei, ordinária, complementar ou delegada? Ainda, de forma mais singela, poderia um simples decreto, portaria ou instrução normativa administrativos impingir competência ao administrador para encampar no seu mister precedentes judiciais, afastando uma lei que disciplina sua atividade?

Inicialmente, deve ser afastada, de pronto, a possiblidade de adoção de precedentes por meio de atos decorrentes diretamente do próprio poder executivo, principalmente por ofensa ao princípio da legalidade e da separação dos poderes; haveria, aqui, afastamento da lei por ato administrativo, além da não participação do legislador, é dizer, participação popular, no estabelecimento de parâmetros de atuação do administrador, não sendo demais destacar que o Brasil é uma república, não uma monarquia.

A segunda possibilidade de norma possível seria uma lei, ordinária ou complementar.

Dentro dessa possibilidade a lei, dita autorizativa, não poderia ter uma forma de aprovação mais facilitada que a lei objeto do precedente. Por isso que deveria ser uma lei complementar; tendo quórum e disciplina mais qualificados para aprovação, evitar-se-ia a contradição de se autorizar por lei ordinária a administração pública de adotar medidas nos moldes de precedentes que são de competência de disciplinamento por lei complementar, como em matéria tributária159, desde de que não exigida, é claro, lei específica, conforme se exige, por exemplo, para a concessão de parcelamento do crédito tributário, nos termos do art. 155-A do Código Tributário Nacional160, a concessão de

159 O art. 146 da Constituição Federal, por exemplo, é assim redigido: “Art. 146. Cabe à lei complementar: I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar; III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: I - será opcional para o contribuinte; II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes.”

160 “O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica. § 1º Salvo disposição de lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas. § 2º Aplicam-se, subsidiariamente, ao parcelamento as disposições desta Lei, relativas à moratória. § 3º Lei específica disporá sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação judicial. § 4º A inexistência da lei específica a que se refere o § 3º deste artigo importa na aplicação das leis gerais de parcelamento do ente da Federação ao devedor em recuperação

subsídio, isenção, anistia ou remissão de tributos, de acordo com o art. 150, § 6º, da Constituição Federal161, como também para a fixação e alteração da remuneração de servidores públicos, conforme art. 37, X, da Constituição Federal162.

É dizer, evita-se que norma, que tem como pressuposto do processo legislativo a sua aprovação por maioria simples, possibilite o afastamento de outra que tem a maioria absoluta como exigência do processo legislativo para aprovação.

Conjecturou-se, também, dessa lei autorizativa de aplicação de precedentes vinculantes pela administração pública ser lei delegada, disposta como instrumento do processo legislativo no art. 59, IV, da Constituição Federal.

A lei delegada, entretanto, não se mostraria adequada aos propósitos que se visa dar à autorização legal de aplicação de precedentes judiciais pela administração pública. Isso porque a lei delegada é utilizada para casos específicos, singularidades determinadas e especiais e, a lei autorizativa que se reputa melhor, deve ser abstrata, mas com parâmetros objetivos, para abarcar, possibilitar e autorizar de antemão toda a complexidade existente nas controvérsias a serem dirimidas e assentadas pelos precedentes vinculantes.

Não pode ser objeto de lei delegada, por imperativo do art. 68, § 1º, da Constituição Federal, certas matérias, como as reservadas à lei complementar, que retiram ou restringem o dinamismo e a concretização do entendimento jurídico almejado pela dita lei autorizativa.

Pressupõe a lei delegada regulamentação de matérias pelo Poder Executivo, entretanto, no caso dos precedentes vinculantes, esta regulamentação, ou melhor, o disciplinamento da forma de

judicial, não podendo, neste caso, ser o prazo de parcelamento inferior ao concedido pela lei federal específica”.

161 “Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g”.

162 “a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;”

entendimento e aplicação da norma jurídica já é existente no domínio da jurisdição, sendo apenas transportado para a administração pública.

Por fim, uma vantagem que se poderia extrair da lei delegada é a contida no art. 49, V, da Constituição Federal, que dispõe competir exclusivamente ao Congresso Nacional “sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”. Esse poder de sustar pode também ser exercido pelo Legislativo se o Poder Executivo, na aplicação de precedentes vinculantes pela lei autorizativa, que não a delegada, se afastar do que aquele poder entende que deva ser o direito aplicável, bastando para tanto que edite lei que discipline a matéria versada no precedente vinculante nos termos por ele – o Poder Legislativo – almejado. A rigor, o procedimento acaba sendo o mesmo, daí por que a vantagem então descrita em relação à lei delegada também se estende, como não poderia ser diferente diante da soberania do Poder Legislativo, à lei autorizativa.

Diante, portanto, dessas características da lei delegada é que se a descartou como “ponte de transição” entre os sistemas judicial e administrativo.

À lei complementar, entretanto, também poderia se conjecturar que não poderia regulamentar a adoção de precedentes pela administração pública porque se trata de delimitação de competência de um poder estatal, matéria afeta apenas à Constituição Federal. Já que o disciplinamento da estrutura do Estado e de seus poderes/funções tem natureza de direito constitucional, a afetação de atos normativos de um poder/função para o outro deveria realizar-se por norma constitucional. A regulamentação de súmula vinculante no Brasil apenas corroboraria essa assertiva.

Por conseguinte, restaria unicamente a possiblidade de aplicação de precedentes judiciais pela administração pública por meio de emenda constitucional. Essa seria uma regulamentação que estancaria qualquer restrição, seja de legalidade, de separação de poderes ou de democracia.

Não obstante, parece mesmo poder, por lei complementar, autorizar-se a administração pública a aplicar precedentes judiciais.

Isso porque a Constituição Federal já autoriza, quando diz expressamente sobre o princípio da legalidade, que referida legalidade, dentro da esfera competencional de cada ente federativo, deve ser exercida em conjunto com os demais princípios constitucionais expressos e implícitos, objetivando a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, de redução das desigualdades sociais e regionais e de promoção do bem de todos. Essa construção perpassa por uma integridade do entendimento do Direito no território brasileiro.

Assim, havendo a legalidade, no caso lei complementar, não se estaria ofendendo a Constituição Federal porque é dela mesma que se extrai a competência e legitimação para que lei possa possibilitar a adoção dos precedentes judiciais pela administração pública.

Aqui se vê presente a teoria do ordenamento jurídico de Norberto Bobbio (2007), de onde se retira que é o ordenamento jurídico que regula a própria produção de normas. Existindo imposição de legalidade para a atividade administrativa, tendo lei complementar disposta sobre essa atividade, ao autorizar a aplicação do direito em consonância com precedente vinculante163, mostra-se evidente o respeito àquela legalidade constitucional, pressuposta da encampação de precedentes pela administração pública, desde que exercida, adverte-se, dentro do campo de competência normativa elencada na Constituição Federal.

Ora, se um ordenamento jurídico é um conjunto de normas, existem normas inferiores que derivam das superiores, com o que possui o ordenamento uma estrutura hierárquica. Nesse sentido, Bobbio (2007, p. 199) adota, como por ele mesmo afirmado, a teoria da construção gradual do ordenamento jurídico de Hans Kelsen164.

Nessa direção, a atividade administrativa somente pode se extrair da lei, que, por sua vez, se extrai do princípio constitucional da legalidade; assim, a lei autorizativa retira sua validade da norma superior constitucional que impõe a legalidade à administração. Por aludido enfoque que não se admite que se retire validade do atuar administrativo com fundamento direto na jurisdição, a não ser nos casos

163 Na perspectiva da teoria de Bobbio (2007, p. 186), a lei autorizativa seria classificada como norma de estrutura ou de competência, que são “aquelas normas que não prescrevem a conduta que se deve ter ou não mas prescrevem as condições e os procedimentos por meio dos quais são emanadas normas de conduta válidas”.

164 Colhe-se de Kelsen (2009, p. 247): “A ordem jurídica não é um sistema de normas jurídicas ordenadas no mesmo plano, situadas umas ao lado das outra, mas é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da conexão de dependência que resulta do fato de a validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, se apoiar sobre essa outra norma, cuja produção, por sua vez, é determinada por outra; e assim por diante, até abicar finalmente na norma fundamental – pressuposta. A norma fundamental – hipotética, nestes termos – é, portanto, o fundamento de validade último que constitui a unidade desta interconexão criadora”.

expressamente ressalvados pela norma de validade superior. Tal é o caso da inadmissão do efeito vinculante à administração da decisão em arguição de preceito fundamental.

Poder-se-ia, nesta análise, objetar que, tendo o Código de Processo Civil de 2015 regulamentado os precedentes vinculantes, então também estaria respeitado o princípio da legalidade e daí decorreria a aplicação direta dos precedentes do art. 927 na atividade administrativa.

Todavia, ao menos duas restrições mostram-se presentes nessa objeção.

A primeira é relativa a que os precedentes vinculantes estatuídos no Código de Processo Civil de 2015 são direcionados apenas para a jurisdição. A redação do caput do art. 927 não deixa dúvidas ao endereçar a observância dos precedentes “aos juízes e tribunais”.

A segunda restrição é concernente às competências constitucionais legislativas elencadas nos artigos 22, 24, 25, 29 e 30, da Constituição Federal, entrelaçadas com o princípio federativo.

Deveras, se o texto constitucional delimita, dentro de um federalismo indissolúvel, quais as matérias cada ente federativo deve legislar, é adequado concluir que as condutas estatais estão diretamente relacionadas ao que cada competência legislativa dispõe. Não se retira texto constitucional que as condutas dos entes públicos podem ser afetadas diretamente pela jurisdição ou pela lei de processo; as exceções estão expressamente contidas na Constituição (súmulas vinculantes e decisões em ação direta de inconstitucionalidade e declaratória de constitucionalidade) e, por isso, classificam-se esses precedentes como diretamente vinculantes.

O que retrata aqueles dispositivos constitucionais de competências legislativas é que as matérias neles disciplinadas decorrem de lei. Assim o é, por exemplo, a competência privativa da União para legislar sobre direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho (CF, art. 22, I), como para os Estados legislarem concorrentemente com a União sobre direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico (CF, art. 24, I), além de se organizarem e se regerem pelas Constituições e leis que adotarem (CF, art. 25), e os Municípios legislarem sobre assuntos de interesse local (CF, art. 30, I) e regerem-se por suas leis orgânicas (CF, art. 29).

A competência privativa da União de legislar sobre processo não tem o condão de afastar ou usurpar toda essa expressa regulamentação de competências legislativas decorrentes da Constituição Federal. Nem tampouco se visualiza, dentro do próprio

texto constitucional, a construção de norma constitucional que dote de competência a lei de processo para dispor sobre matérias de competências de cada unidade federativa da República brasileira.

As competências dos tribunais superiores, portanto, em que pese dizerem respeito à interpretação a ser dada ao direito no território brasileiro, afetam-se à jurisdição e, quanto à administração, aplicam-se diretamente por imposição constitucional ou, indiretamente, se assim lei complementar dispuser.

A lei complementar autorizativa serviria ainda como um consenso entre os sistemas legislativo, administrativo e judiciário, principalmente pela exegese que hoje é clara no sentido de que a administração pública deve se abrir à interpretação judicial cristalizada em precedentes.

Conforme Tércio Sampaio Ferraz Júnior (1994a, p. 182-185), apesar de a validade da norma ser relacional (“relação de imunização”), ou seja, extraída de um contexto de normas denominado ordenamento, essa relação não é formal ou estática, como defende Kelsen, mas sim pragmática, no sentido de que envolve “os usuários, suas possíveis reações e contra-reações”. Afinal, “se a possibilidade do diálogo é eliminada pela desconfirmação do ouvinte como partícipe ativo da comunicação, o discurso normativo se torna irracional e, em consequência, ilegítimo” (FERRAZ JÚNIOR, 1978, p. 181).

A lei autorizativa refletiria, além de um instrumento para o diálogo do discurso normativo, uma consensualidade contemporaneamente existente no âmbito administrativo. Loubet (2009, p. 86-87) ressalta que

os instrumentos que caracterizam a Administração Consensual estão revestidos de validade jurídica, eis que não agridem a Carta Fundamental, sobretudo ao se levar em conta que as inspirações que coordenam esse movimento são legítimas, ao conjugá-las com o espírito do Texto Constitucional. É que o direito não é um apanhado de prescrições escritas, entabuladas em um Código. Muito mais do que isso, o direito é experiência viva, dinâmica, sensível, que visa, ainda que idealmente, a estar ajustado à realidade que busca disciplinar. Assim, não pode ser considerada apenas a letra da lei para solucionarem-se questões concretas e intrincadas, até porque, das diversas formas de interpretação, a gramatical é a que menos proporciona elementos

ao operador do direito, havendo mesmo aqueles que não a qualificam como um método, mas um pressuposto interpretativo”.

Apesar de se entender possível e muitas vezes necessária a aplicação de precedentes judiciais pela administração pública, notadamente para sedimentar também em âmbito administrativo a interpretação jurídica dada pelos tribunais e a integridade do sistema jurídico nacional, pacificando relações administrativas variadas, evitando desgastes desnecessários de tempo, dinheiro e angústias sociais, o aspecto formal165 ora em foco, da exigência de uma lei autorizativa, de uma ponte de transição entre a administração e a jurisdição, dentro do disciplinamento e regime jurídico-político- constitucional brasileiro, se mostra obrigatório.

3.2.4.3Natureza do precedente

A terceira premissa refere-se à natureza do precedente, devendo ser encampados apenas os precedentes vinculantes assim considerados os contidos no art. 927 do Código de Processo Civil de 2015, quais sejam, as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade, os enunciados de súmula vinculante, os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos, os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior

165 A propósito dos limites de conteúdo e de forma que o poder superior pode impor ao inferior, Norberto Bobbio (2007, p. 204) é oportuno: “Por isso fala-se de limites materiais e de limites formais. O primeiro tipo de limites refere-se ao conteúdo da norma que o poder inferior é autorizado a emanar; o segundo tipo refere-se à forma, ou seja, o modo ou o processo com que a norma do poder inferior deve ser emanada. Se nos colocarmos do ponto de vista do poder inferior, observaremos que este recebe um poder que é limitado ou em relação

àquilo que pode comandar ou proibir, ou em relação a como pode comandar ou

proibir. Os dois limites podem ser imposto contemporaneamente; mas em alguns casos um pode existir sem o outro. A compreensão desses limites é importante, pois eles circunscrevem o âmbito em que a norma inferior é legitimamente emanada: uma norma inferior que exceda os limites materiais, ou seja, que regule uma matéria diferente das que que lhe forem atribuídas, ou regule de maneira diferente da que lhe foi prescrita, ou exceda os limites formais, ou seja, não siga o processo estabelecido, é passível de ser declarada ilegítima e de ser expulsa do sistema”.

Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Apenas esses precedentes, sem inclusão de ratio decidendi de julgamentos outros, porquanto, foram os que o poder competente – o legislativo -, dentro de sua competência constitucional elegeu e disciplinou para a jurisdição. Como decorrência dessa legalidade, não se adere à aplicação de todo e qualquer precedente que não os formalizados pela lei como vinculantes. A tradição do civil law, e não da common law, ressoa ainda no ordenamento jurídico brasileiro, ao menos para administração pública em que a fonte primária ainda permanece sendo a lei ou o que ela própria delimitar.

Questão pertinente, nesse particular, é que a ratio decidendi ou os fundamentos determinantes muitas vezes não se mostram de fácil identificação no julgamento pelas Cortes Superiores, mormente a constitucional, em virtude do procedimento do próprio julgamento colegiado em que cada um dos Ministros apresenta seus votos com argumentos variados, e a conclusão não reflete um conjunto de fundamentos consensuais, mas sim decorre da contagem de votos para chegar-se ao resultado, da maioria que acompanhou o relator ou o voto divergente vencedor166, o que impõe um maior cuidado na aplicação de precedentes.

166 Marcelo Neves (2014, p. 199) melhor sintetiza: “Não se sedimenta uma jurisprudência que construa precedentes orientadores de futuros julgamentos. Relacionado a esse problema, ocorre, não raramente, uma deficiente clareza no verdadeiro fundamento da decisão. É verdade que essa questão relaciona-se com a própria organização institucional do procedimento de tomada de decisão no STF. Cada Ministro apresenta votos (geralmente longuíssimos) em separado,