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CAPÍTULO I CAMINHOS METODOLÓGICOS E TEÓRICOS DA PESQUISA

1.4. Instrumentos da pesquisa, coletas de dados e aportes teóricos

Nesse tópico, abordar-se-á os instrumentos da pesquisa, como foi realizada a coleta de dados e pensado os aportes teóricos deste trabalho. Para isso, retratará sobre as fontes documentais, as entrevistas e as observações in loco.

De acordo com Laville e Dionne (1999), as fontes documentais promovem a informação direta. Os documentos possuem uma fonte rica e permanente de dados (GODOY, 1995) e “a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou problema” (LUDKE; ANDRÉ, 1986, p. 38).

Godoy (1995) considera que a análise documental deve incluir três elementos: a escolha, o acesso e a análise dos documentos. Em relação à escolha e ao acesso, foram utilizados os documentos oficiais que envolviam a alfabetização de fácil acesso à

pesquisadora pelas plataformas online do MEC e da SME/SP para compreender as concepções de alfabetização e letramento aderidas por eles e as perspectivas aventadas. Os cadernos escolares, como fontes primárias, foram selecionados por demonstrarem parte significativa das práticas escolares. A permissão do seu uso ocorreu mediante a autorização dos responsáveis pelos estudantes.

Para a análise dos documentos oficiais, recorreu-se aos estudos de Ball (1994) como recurso para investigar a política como texto e como discurso; para a análise dos cadernos escolares, pautou-se nos estudos de Gvirtz e Larrondo (2008) que consideram esse material como dispositivo escolar, uma fonte histórica, um produto de verdade de uma concepção, no caso, de alfabetização e letramento.

A política como texto é resultado das influências e abrange as lutas, os compromissos, as interpretações e as reinterpretações de autoridade pública e dos protagonistas que obtêm os significados da política baseando-se nas experiências e contextos e na sua história (BALL, 1994). A política fornece determinadas leituras e a análise dela nos documentos não é algo simples, "mas demanda pesquisadores capazes de identificar ideologias, interesses, conceitos empregados, embates envolvidos no processo, e as vozes presentes e ausentes" (MAINARDES, FERREIRA, TELLO, 2011, p. 157).

De acordo com Ball (1994), a política como discurso apoia-se nos estudos de Foucault. Os discursos são representados por meio de palavras e de proposições dotadas de significados, algumas delas podem ser excluídas, mas não é somente isso, considera-se uma construção e uma permissão de vozes, de conhecimentos e de subjetividades. Na verdade, cada qual é o que diz, o que faz a inferência de entender que os discursos apresentam tomadas de posições, conjunto de valores e ética no campo das políticas. Deste modo, algumas vozes são ouvidas, legitimadas com autoridade. Portanto, há a necessidade do reconhecimento e da análise de discursos que designam regimes de verdade, por exemplo, o neoliberalismo. Ou seja, "na prática, os atores estão imersos numa variedade de discursos, mas alguns discursos serão mais dominantes que outros" (MAINARDES, FERREIRA, TELLO, 2011, p. 157).

Nesse sentido, a abordagem do contexto de influência serviu como base para analisar o contexto de produção. A política como texto para verificação dos conceitos em relação à alfabetização e letramento e como discurso na investigação das vozes que aparecem como autoridade nos currículos e se transformam em pilares das políticas educacionais, ou seja, determinados discursos de alfabetização e letramento se destacaram em detrimento a outros possíveis.

Já na análise dos cadernos escolares, levantaram-se as atividades propostas em relação à leitura e escrita, solicitando às professoras das turmas que indicassem o caderno do aluno mais assíduo, o que supostamente possibilitaria a coleta de uma maior quantidade de atividades. Assim, nas aulas em que os estudantes estavam com professores da área de conhecimento da Linguagem (Arte ou Educação Física) ou de Enriquecimento curricular (Laboratório de Informática Educativa e Sala de Leitura), os cadernos escolares foram fotografados.

Para Gvirtz (1999, p. 12), o caderno escolar tem a “capacidad de conservar lo registrado, caráter que lo distingue de otros espacios de escrituración”, possibilita a interação entre professor e aluno por meio da tarefa escolar, sendo o reflexo das atividades produzidas na escola. Também, não pode ser utilizado como elemento neutro e representa:

[...] práticas discursivas escolares (que) se distingue de outro tipo de práticas discursivas, que são as pedagógicas quando se considera que são produção da escola, as pedagógicas seriam produções sobre a escola, ou seja, conformariam metadiscursividades, já que seriam práticas discursivas que se refere a outras práticas discursivas. O estudo dos cadernos de classe se refere, sem dúvida, a práticas discursivas escolares (GVIRTZ, LARRONDO, 2008, p. 38).

A utilização dos cadernos escolares para este estudo se voltou para as práticas discursivas escolares para verificar se as atividades se relacionaram com a perspectiva do alfabetizar letrando no componente de Língua Portuguesa cotejada pelo documento que define os Direitos de Aprendizagem e pelo PNAIC. Portanto, as atividades foram categorizadas mediante a identificação das regularidades, descontinuidades entre os diferentes enunciados que esse dispositivo escolar apresenta (GVIRTZ, 1999; GVIRTZ; LARRONDO, 2008).

As categorias foram distribuídas em Parlendas/músicas, alfabeto/ordem alfabética, nomes próprios, vogais, tirinhas, ditado recortado, sílabas, nomes de figuras-escrita, nomes de figuras-leitura, nomes de figuras-leitura (sílabas), acróstico, ordenar nomes, cruzadinha, listas e caça-palavras do modo pelo qual apareciam nos cadernos. Depois foram inseridas aos eixos Leitura, Produção de Texto, Análise Linguística (Apropriação do SEA e discursividade, textualidade e normatividade) e aos Direitos de Aprendizagem dos Elementos Conceituais e

Metodológicos para a Definição dos Direitos de Aprendizagem e Desenvolvimento do Ciclo de Alfabetização (1º, 2º e 3º Anos) do Ensino Fundamental e do PNAIC, apontando as

atividades regulares e as menos pontuais.

Quanto às entrevistas, optou-se pelas semiestruturadas (APÊNDICE I) que possibilitaram a aquisição de dados comparáveis entre os sujeitos (BOGDAN; BIKLEN,

1994), no caso, entre as professoras da Escola A e B. Considera-se que “a entrevista semiestruturada porque esta, ao mesmo tempo que valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação” (TRIVIÑOS, 1987, p. 146) e ainda permite a elaboração de questões básicas a partir de hipóteses, bem como durante a entrevista o levantamento de novas hipóteses, conforme respostas dos entrevistados. Esta flexibilidade oportunizou uma melhor abordagem em relação às informações coletadas (LUDKE; ANDRÉ, 1986) nas entrevistas com as professoras da Escola A e B.

Para a análise das entrevistas semiestruturadas utilizou-se a análise de conteúdo compreendida, de acordo com Bardin (1977, p. 42)

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens.

A análise de conteúdo tem a função de destituir a estrutura e elementos do conteúdo a ser investigado buscando a sua significação (LAVILLE; DIONNE, 1999). Por isso, é organizada por meio de três polos cronológicos: 1) pré-análise; 2) exploração do material; 3) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação (BARDIN, 1977). Deste modo, na pré-análise, referente à organização do material, a partir da produção das entrevistas semiestruturadas gravadas em áudio, realizou-se a transcrição e a leitura flutuante relacionando aos materiais bibliográficos e aos documentos oficiais. Ainda nesta etapa, encontrou-se a codificação em que os dados foram agregados a unidades de base e a categorização que consiste na classificação de elementos a fim de um estudo mais aprofundado (BARDIN, 1977). Dentre estas categorias, o conteúdo das entrevistas foi categorizado concordando com o propósito da pesquisa e, assim, criou-se um recorte de conteúdos mediante temáticas (ser professor, experiência profissional em turmas de alfabetização, participação em formações, currículo, visão sobre as reformas educacionais, concepções de alfabetização e letramento, utilização de materiais didáticos e pedagógicos).

Na fase de exploração de materiais, após uma análise mais aprofundada das entrevistas semiestruturadas, definiram-se as chaves de análise distribuídas em: perfis das professoras; formação das professoras; práticas pedagógicas e materiais didáticos e pedagógicos. Já no tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação foram relacionadas ao contexto de influência e de produção (BALL, 1994), representados neste

trabalho pelos momentos da histórica da alfabetização (MORTATTI, 2000, 2006) e pela análise dos documentos oficiais. Para a análise da primeira chave, referente aos perfis das professoras, pautou-se nos estudos de Nóvoa (1995, 2009) em relação à vinculação entre a pessoalidade e a profissionalidade, destacando que “cada um tem o seu modo próprio de organizar as aulas, de movimentar na sala, de se dirigir aos alunos, de utilizar os meios pedagógicos, um modo que constitui uma espécie de segunda pele profissional” (p. 16). As outras três chaves de análise (formação das professoras, práticas pedagógicas e materiais didáticos e pedagógicos) foram associadas aos princípios do documento que define os Direitos de Aprendizagem e ao PNAIC, na perspectiva do alfabetizar letrando.

Segundo Bogdan e Biklen (1994), as entrevistas podem ser utilizadas em conjunto com outros dados da pesquisa. Portanto, nesta pesquisa, as chaves de análises das entrevistas semiestruturadas foram relacionadas aos cadernos escolares e às observações in loco que, para Ludke e André (1986), devem ser sistemáticas e organizadas por meio de um planejamento, e ainda possibilitam a coleta de dados em situações em que não é possível de outra forma. Em tal caso, para a complementação dos dados levantados pelas entrevistas e pelos cadernos escolares, utilizaram-se as observações de forma não participante, haja vista que os cadernos escolares têm uma limitação, conforme explica Viñao Frago (2008, p. 25):

Nem tudo está nos cadernos. Eles silenciam, não dizem nada sobre as intervenções orais ou gestuais do professor e dos alunos, sobre seu peso e o modo como ocorrem e se manifestam, sobre o ambiente ou clima da sala de aula, sobre as atividades que não deixam pistas escritas ou de outro tipo, como os exercícios de leitura (a leitura em voz alta, por exemplo) e todo o mundo oral.

A organização para a observação in loco de uma semana seguiu um roteiro que abrangia a caracterização do ambiente, a organização da rotina diária e a identificação, tipo e descrição das atividades. Para o registro dos acontecimentos nas escolas-campo, utilizaram-se as notas de campo por meio do registro em folhas avulsas que, posteriormente, foram organizadas em um Diário de Campo. Bogdan e Biklen (1994) apontam que os registros de campo possuem a parte descritiva e a parte reflexiva. A parte descritiva foi formada pelos registros relacionados aos detalhes do campo vinculados à caracterização da escola e às salas de aula e os que envolveram a descrição das atividades de leitura e escrita propostas em sala de aula. Para isso, os registros foram numerados de 1 a 15, da seguinte forma: RC nº 1 – 16/05/2016 em que RC corresponde a Registro de Campo. Os registros de 1 a 5 condizentes à Escola A, turma A, de 6 a 10 referentes à Escola B, turma A e de 11 a 15 representando a Escola B, turma B. Já a parte reflexiva está relacionada a “frases e parágrafos que refletem um

relato mais pessoal [...] ênfase na especulação, sentimentos, problemas, ideias, palpites, impressões” (BOGDAN; BIKLEN, p. 165). Anotações reflexivas foram realizadas nos registros de campo em relação às professoras, aos alunos e ao ambiente.

Ressalta-se que as observações in loco foram também baseadas no documento que define os Direitos de Aprendizagem e no PNAIC em relação aos eixos, objetivos e Direitos de Aprendizagem para o 1º ano ali postulados e, principalmente, na concepção do alfabetizar letrando. As observações in loco, bem como os cadernos escolares foram articulados com as chaves de análises das entrevistas, ou seja, em cada categoria apareceram entrevistas e/ou cadernos e/ou Registro de Campo.

CAPÍTULO II – APRENDER A LER E A ESCREVER NO BRASIL: DAS