• Nenhum resultado encontrado

Instrumentos de pesquisa e caracterização dos sujeitos

3.1.1 Questionário do Saber

Os questionários aplicados em sala de aula foram inspirados nos “inventários do saber” ou “balanços do saber”17 utilizados nas pesquisas de Charlot18 e de outros autores com

estudantes franceses sobre o tema da relação com o saber. Esse instrumento originalmente consiste na produção de um texto na qual o aluno avalia os processos e os produtos de sua

17 Instrumento desenvolvido por Bernard Charlot e utilizado inicialmente nas pesquisas que coordenou na

Universidade de Paris VIII, junto à equipe ESCOL (CHARLOT, 1996) e depois em outras pesquisas, sobre a relação com o saber.

18 ESCOL – Educação, Socialização e Coletividades Locais (Departamento das Ciências da Educação,

aprendizagem. Seu enunciado diz: “Desde que nasci, aprendi muitas coisas; em casa, no bairro, na escola, em muitos lugares. O que me ficou de mais importante? E agora, o que eu espero?” (Charlot, Butier e Rochex, 1992, p. 36). Porém, na construção do “Questionário do Saber”, como o denominamos, foi feita uma adaptação da metodologia utilizada nestes estudos, para sua adequação a faixa etária dos alunos aqui pesquisados – de forma a facilitar a escrita de suas respostas – e para melhor corresponder aos objetivos desta pesquisa. Assim, os “Questionários do Saber” foram estruturados de maneira diferente dos “balanços do saber”: têm nove perguntas que abrangem tanto questões sobre as relações com os saberes quanto questões mais específicas sobre o sentidos da escola (ver APÊNDICE E).

O intuito da aplicação dos questionários era obter um panorama geral das percepções e concepções sobre a escola dos alunos que convivem na mesma classe daqueles que seriam entrevistados. Com isso, visamos vislumbrar o “campo de sentidos” que envolve cotidianamente os alunos entrevistados e, inversamente, observar o quanto das vozes desses alunos é representativa de sua classe.

Os questionários foram realizados em sala de aula, durante o horário escolar, ocupando um período de tempo correspondente a uma aula (50 minutos), tempo esse cedido pelo professor responsável e estipulado anteriormente junto ao coordenador da escola. Foram aplicados sem aviso prévio aos alunos, propositalmente, mas também não havia a obrigatoriedade de sua participação – apesar disso, todos os alunos presentes quiseram participar, em ambas as escolas. Na escola pública 27 alunos participaram da pesquisa (não perfazendo a totalidade da classe, já que alguns alunos haviam faltado às aulas naquele dia) e na escola pública foram 20 alunos (número correspondente à turma completa). Assim, os questionários foram aplicados a um total de 47 sujeitos.

3.1.2 Ficha de dados dos alunos

A Ficha de Dados do Aluno (APÊNDICE C), que constava na abertura dos questionários e das entrevistas, teve por objetivo fazer um levantamento dos dados pessoais e escolares dos sujeitos pesquisados; dos dados pessoais, profissionais e escolares de seus pais ou responsáveis e de seus irmãos; e também compreender a constituição familiar em termos de número de irmãos, situação conjugal do casal parental e situação de moradia da família. O intuito desse instrumento foi obter, de forma aproximada, um perfil escolar, familiar e sócio- econômico do aluno entrevistado.

3.1.3 Roteiro para entrevista individual

O roteiro para a entrevista (APÊNDICE D) serviu como referência para alcançar, em todas as entrevistas, os dados necessários ao entendimento das questões centrais desta pesquisa. Quando foi percebido que o teor do discurso dos sujeitos entrevistados favorecia outras indagações, essas foram incluídas livremente durante a entrevista. Esse roteiro abordava praticamente as mesmas questões contidas nos “Questionários do Saber”, de forma a facilitar a comparação entre os depoimentos dos alunos entrevistados e as respostas dos seus colegas de classe quanto aos temas privilegiados nesta investigação.

Ainda em relação a esse roteiro, percebemos que certas questões poderiam ter sido eliminadas e outras incluídas, de forma a conduzir a um melhor entendimento do que se buscava com esta investigação. Por vezes, também, a pesquisadora seguiu fielmente o roteiro, tornando as entrevistas um tanto cansativas ou não permitindo uma maior amplitude, flexibilidade ou liberdade das respostas dos alunos entrevistados – problema identificado pós as transcrições, assim como o das perguntas desnecessárias ou daquelas que poderiam ser importantes, mas que não foram incluídas anteriormente. Porém, para as análises foram consideradas apenas as passagens dos relatos dos alunos que se mostraram mais genuínas e relevantes para o entendimento das concepções dos sujeitos entrevistados sobre a escola e o saber.

3.1.4 Entrevistas

As entrevistas permitiram um maior detalhamento e aprofundamento das questões propostas nos “Questionários do Saber”, além de uma melhor observação, através dos depoimentos dos sujeitos, das suas percepções pessoais a respeito do tema investigado. Assim, como dito anteriormente, através das entrevistas procuramos encontrar indícios nos relatos dos alunos que pudessem esclarecer os sentidos mais pregnantes da escola para eles.

As entrevistas aconteceram na própria escola em que os alunos estudavam, em horário marcado individualmente com eles e em local reservado especificamente para tal, de forma a evitar interrupções ou interferências de outra natureza que não aquelas inerentes à relação entrevistador-entrevistado. Além disso, procurou-se marcá-las em horários que não coincidissem com o das suas aulas. Isso aconteceu conforme o previsto com os quatro alunos entrevistados da escola privada (as entrevistas foram realizadas no período vespertino, sendo

que suas aulas acontecem pela manhã). Dos cinco alunos da escola pública, três foram entrevistados no contra-turno de seu horário regular de aulas (que é vespertino), porém, dois deles, por sucessivos não comparecimentos, acabaram sendo entrevistados pela tarde mesmo, durante o horário de aulas, com o aval do coordenador da escola e dos professores responsáveis – que os liberaram das aulas enquanto estivessem em entrevista, o que pode ocorrer sem grandes prejuízos ao aluno por ser aquela uma semana comemorativa em sua escola.

O tempo de duração das entrevistas variou entre 55 min. e 1h e 53min. Elas foram gravadas em arquivos de áudio e transcritas integralmente (APÊNDICE F)19 para sua posterior análise.

3.1.5 Sujeitos da pesquisa

Como explicitado anteriormente, da coleta de dados através dos “Questionários do Saber”, participaram 47 sujeitos, sendo 20 da escola particular e 27 da pública.20 As

entrevistas foram realizadas com 9 alunos, sendo cinco da escola pública (três meninos e duas meninas) e 4 da escola privada (dois meninos e duas meninas)21 – os alunos entrevistados fazem parte também do conjunto de sujeitos que responderam aos questionários em classe.

Portanto, a amostragem total desta pesquisa está representada por 47 alunos do 7º ano (antes 6ª série) do Ensino Fundamental, provindos de duas turmas, cada turma de um estabelecimento de ensino da cidade de São Paulo (um público e outro particular), tendo idade entre 11 e 14 anos, sendo nove deles (5 meninos e 4 meninas) entrevistados individualmente pela pesquisadora.

Os sujeitos entrevistados foram: Ricardo, Fábio, Viviane, João e Daniela (da escola pública) e Gabriel, Marcos, Luana e Elisa (da escola privada)22. Entre os alunos da escola pública, Daniela contava com 11 anos, Viviane acabara de completar 14 e os três meninos

19

O APÊNDICE F consta do CD Room que acompanha a dissertação escrita. Optamos por esta forma de apresentação das transcrições porque estas perfizeram um grande número de páginas, o que demandaria a utilização desaconselhada de excessiva quantidade de papel para sua impressão. Além disto, optamos por fazer transcrições literais dos depoimentos e não recorrer a correções de nenhuma natureza, mantendo-se a forma coloquial da expressão oral da língua portuguesa, tal como proferida pelos alunos e pela pesquisadora durante as entrevistas.Para facilitar o entendimento do diálogo, foram utilizadas a letra “P” para indicar as falas da entrevistadora (pesquisadora) e a primeira letra do nome dos alunos para indicar as suas falas.

20 Detalhes da composição desta amostra nos itens 4.1 e 4.2 do capítulo “Questionários do Saber”. 21 Detalhes desta amostra no item 5.1 do capítulo “A voz dos alunos”.

22 Estes são nomes fictícios. Os nomes dos alunos foram alterados para resguardar o sigilo quanto a sua

estavam com 12 anos. Os alunos da escola privada tinham todos 12 anos, à exceção de Gabriel que, assim como Daniela, iria completá-los até o final daquele ano.

Elegemos a escuta de estudantes com idade entre 11 e 14 anos e estando no 7º ano da escola porque:

estão no início do segundo ciclo do Ensino Fundamental, nível de ensino que em todas as regiões do Brasil, segundo dados do INEP (BRASIL, 2006), há um maior abandono da escola – comparado às primeira séries do Ensino Fundamental –, há uma grande elevação das taxas de distorção série-idade e no qual a evasão se torna mais acentuada (culminando no Ensino Médio);

estão entrando numa fase diferente da vida, na qual já não são considerados nem se consideram “tão pequenos” ou “tão infantis”, e na qual, pressupõe-se, iniciam-se questionamentos, que ficarão mais fortes no final do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, relativos a importância dos estudos, ao seu futuro, ao seu devir como adulto – portanto, já podem refletir melhor sobre questões que se queria investigar;

estão mais ou menos no “meio” da escolarização fundamental, nem no início (fase de maior adaptação ao funcionamento geral da escola, a suas regras, normas, práticas, rituais), nem estão no final da escolarização formal (quando surgem outras preocupações);

e também estão passando por algumas novas mudanças na escola (fragmentação do currículo em diversas disciplinas, diferentes professores, etc.), que geram reorganizações (temporais, espaciais e de ritmos) e engendram relações diferenciadas com professores, colegas, regras e saberes.

3.1.6 Caracterização das escolas

A escolha de uma escola pública e outra particular para a realização desta pesquisa foi feita com o intuito de observar as possíveis semelhanças e diferenças entre os relatos dos alunos sobre a escola e o saber. Optamos por não citar o nome das escolas para evitar a sua exposição desnecessária e de seus alunos.

A escola pública que se dispôs a participar desse estudo faz parte da Rede Pública de Ensino do Estado de São Paulo, pertence à Diretoria de Ensino – Centro (COGSP23), localiza-

se, portanto, no centro da cidade de São Paulo e funciona há 32 anos. Oferece Ensino

Fundamental – Ciclo II (6º ao 9º ano), Ensino Médio e Educação para Jovens e Adultos. Funciona nos três períodos: o EF II é oferecido no matutino e vespertino; o EM no matutino e noturno; e EJA somente no noturno. Possui 30 salas de aula e cada turma tem em média 35 alunos, totalizando cerca de 3000 alunos matriculados por ano. Existe um coordenador e 120 professores entre titulares de cargo efetivo e os admitidos em caráter temporário. O prédio onde funciona a escola é uma construção antiga de três andares onde estão distribuídas as salas de aula, uma biblioteca (com livros, enciclopédias, revistas e jornais), uma sala de informática para uso dos alunos, uma cozinha e uma copa onde é servida a merenda escolar, além dos banheiros para uso dos alunos (um feminino e um masculino por andar). Há ainda um laboratório de ciências desativado. A sala dos professores, a secretaria e a diretoria se encontram no andar térreo. Na área externa existe um pátio coberto, duas quadras poliesportivas (sendo uma coberta), uma sala temática construída especialmente para as aulas de educação artística (“sala ambiente”) e uma cantina. Alguns desses equipamentos não se encontram em boas condições para atendimento dos alunos ou para o desenvolvimento adequado das atividades a que se destinam. É o caso de diversas salas de aula, quadras e alguns banheiros.

Assim, essa escola tem um espaço físico não muito amplo em vista de sua numerosa clientela. Para atender a enorme demanda de alunos, principalmente no período da tarde, tem inclusive que adaptar alguns ambientes (salas em más condições de uso) para o funcionamento das aulas.

A escola privada que participou desta pesquisa faz parte de uma rede que possui três unidades na Grande São Paulo. A unidade onde foi realizada a coleta de dados está sob a jurisdição da Diretoria de Ensino – Sul (COGSP), localiza-se no bairro do Morumbi, zona sul da cidade de São Paulo, e funciona há 35 anos. Oferece educação básica: Educação Infantil (manhã e tarde), Ensino Fundamental – Ciclo I (manhã e tarde), Ensino Fundamental – Ciclo II (manhã) e Ensino Médio (manhã). A EI e o EF-I são também oferecidos em período integral (das 8:00 às 17:30). Tem 33 salas, com no máximo 20 alunos por classe, e um total aproximado de 800 alunos matriculados a cada ano. Não se obteve o número exato de professores.

Nos dois prédios principais que compõem essa unidade estão as 33 salas de aula, uma biblioteca e os cinco laboratórios (de física, de química, de biologia, de ciências e de informática). A biblioteca tem um acervo de livros, enciclopédias, revista jornais, CDs, DVDs e vídeos e conta ainda com computadores com acesso a Internet e espaços para contação de história e trabalhos em grupo. Além disso, a escola tem um auditório multimídia com 150

lugares no qual existe uma lousa eletrônica que fica disponível para o uso de todas as disciplinas. A secretaria e a diretoria ficam em espaço exclusivo e há também um espaço diferenciado para a EI com atelier de arte, brinquedoteca e parque.

Para a prática de esportes há quatro quadras poliesportivas, sendo uma coberta, um campo de futebol gramado, uma piscina, uma sala de ginástica olímpica, uma de dança, uma de judô e outra de ginástica. Há ainda um mini-campo de futebol, uma área com animais domésticos, um playground, um circuito lúdico ao ar livre e uma ampla área verde – todos bem conservados.

A escola mantém parceria com um curso de línguas e uma livraria muito conhecidos na cidade. Oferece ainda “plantão de dúvidas” no contra-turno das aulas. E conta também com uma cantina e um refeitório.

Como se pode perceber essa escola tem espaço físico amplo, bons equipamentos e recursos tecnológicos para um número reduzido de alunos – o que sugere um melhor atendimento da clientela, pelo menos nesse aspecto.