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1.3 INTERNACIONALIZAÇÃO SETORIAL 1 Sistema-mundo capitalista

1.3.2 Integração de um setor ao sistema-mundo capitalista

Para Christian Palloix (1975) a internacionalização do capital sempre afeta um setor específico do sistema produtivo, de modo que este se integra ao plano global da divisão internacional do trabalho ou, para usar a categoria braudeliana, ao sistema-mundo capitalista. Esta integração se dá, paradoxalmente, através da adesão à concorrência interimperialista — ou, como afirmam Cristaldo e Pereira (2008), em termos de uma disputa entre arranjos distintos entre o Estado e o Capital através da unidade produtiva capitalista, a Empresa. Portanto, a internacionalização não ocorre necessariamente a partir de uma empresa em particular, mas muito mais normalmente a partir de todo um setor produtivo, o qual depende de uma conformação particular que inclui o Estado e o sistema financeiro como suportes para sua inserção competitiva no sistema-mundo. Assim Paloix afirma,

[...] la construction sectorielle articule nationalement les branches industrielles et

financières engagées dans le cours de l’internationalisation (double tendance à l’égalisation des conditions de production et d’échange, et à leur différenciation), mais la spécificité de cette sectorialisation [...] s’inscrit dans le procès

d’internationalisation du capital, l’état de la concurrence interimpérialiste [...].

(PALLOIX, 1975, p.148).

Mas este autor não chega à especificidade das diferentes indústrias. Quando fala de internacionalização setorial, está considerando o plano mais geral do capitalismo e suas divisões entre os setores de bens de produção, capital e consumo durável e não-durável. Palloix (1972) defende que existiram três tipos, ou etapas históricas, do processo de internacionalização do capital: até o século XIX teria predominado a internacionalização a partir da expansão do capital-mercadoria [M’], ou como Braudel (1996) definiria, do capital mercantil. A partir dos estertores do século XIX, teria ganhado corpo uma expansão internacional a partir do capital financeiro [D], sobretudo graças à atuação da City londrina, a qual financiou empreendimentos diversos em países subdesenvolvidos, com foco em infraestrutura e produção de matérias-primas. Depois da II Guerra Mundial e com o fim do via imperialista de desenvolvimento, a internacionalização do capital produtivo [M] com foco na produção de mercadorias torna-se o foco principal, através dos instrumentos de Investimentos Externos Diretos.26

Parece-nos, no entanto, que o devir histórico nos últimos 30 anos se impõe à análise histórica palloixiana, pois ressurge a internacionalização do capital financeiro, corroborando a tese cíclica de Braudel (1996) sem, no entanto, invalidar a estrutura básica da proposta de Palloix. Porém, uma classificação tão abrangente do processo faz perder de vista as nuances e particularidades setoriais no que diz respeito às distintas indústrias. É possível dizer, diante da evidência levantada por Chesnais (1996), Arrighi (1996) e Cristaldo e Pereira (2008) que, apesar da tônica da internacionalização do capital no último quartel do século XX ter sido dada pelo capital financeiro, distintas indústrias se internacionalizaram a partir de diferentes maneiras, o que justifica um trabalho como o qual aqui se constrói. Ao observar a internacionalização de uma indústria como a da Construção Civil a qual emerge de um país cuja integração no plano do capitalismo global ainda era [e é] subordinada, afloram suas complexidades pautadas nas articulações intersetoriais e interindustriais.

26 A análise de Rosa Luxemburgo a qual classificamos dentro da teoria imperialista se torna particularmente

datada. Isto, pois discorre sobre um processo de internacionalização que quase exclusivamente busca novos mercados para realização da produção, e, portanto, sugere-se apenas à margem da estrutura orgânica do capital, como afirma Christian Palloix (1974). Esta autora teria perdido a dinâmica histórica do processo ao generalizar e considerar definitiva a forma dominante de seu tempo. O ponto de inflexão do século XX, destacado por Palloix, está no fato que, dado os países desenvolvidos optarem por sistemas econômicos de crescimento pautado no consumo interno, o processo de internacionalização do capital ganha um contorno essencialmente produtivo – produz-se mais barato fora com fins voltados para o consumo interno. Logo, assegura que a internacionalização é um dos elementos constituintes da noção de Capital, ainda que esta tenha passado por fases históricas distintas.

A internacionalização a partir de um país periférico encerra muitas características de um processo complementar e acessório do amplo processo de internacionalização produtiva do capital mundial. De maneira prática, parece-nos que a indústria de construção civil brasileira se internacionalizou com características mistas de capital-produtivo e capital-mercadoria, isto também por conta dos atributos únicos de seu serviço. Desta maneira, perfazendo o primeiro caso apontado. Mas, só pode fazê-lo graças ao fato de que o processo de internacionalização do capital a partir dos países centrais. Este por sua vez pautado na exteriorização do processo de transformação — do tipo “capital produtivo” (PALLOIX, 1975, p.146) o qual evoluiu para uma internacionalização financeira (CHESNAIS, 1996) —, demandou serviços de infraestrutura nos países-alvo, abrindo oportunidades para esta indústria em específico.

Isto explicaria, por exemplo, porque apenas esta indústria brasileira se internacionalizou de maneira pujante e dinâmica. Pois, no plano global de expansão do capital, teria exercido um importante papel complementar, não concorrendo com firmas oriundas dos países centrais, ao contrário dos aparentemente dinâmicos setores de duráveis e bens de capital brasileiros na década de 70, os quais foram dizimados nas décadas seguintes (BRESSER-PEREIRA, 1996. GREMAUD et al, 1997). E também por conta disto, faz-se necessária uma análise do contexto interno do qual afloram as bases da internacionalização da indústria brasileira de construção civil, para então um aprofundamento em sua especificidade.