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4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

4.3 PRODUÇÃO DO CUIDADO NO ESTÁGIO CURRICULAR

4.3.2 Produção do Cuidado e sua Mediação com a Prática Social

4.3.2.1 Integralidade

Dentro da concepção ampla, e conceitual de integralidade, destacam-se: ações de educação em saúde, como estratégia articulada entre a concepção da realidade do contexto de saúde, e a busca de possibilidades de atitudes geradoras de mudanças a partir de cada profissional de saúde, do trabalho em equipe e dos diversos serviços que buscam uma transformação no quadro da saúde da população (MACHADO, M.F.A.S., et al., (2007).

Assim, passo à discussão das entrevistas das (os) discentes que tratam dos aspectos referentes à integralidade no processo de construção e reconstrução das práticas em enfermagem na perspectiva da produção do cuidado mediatizado pelos momentos de encontros vividos pelos atores sociais no decorrer do ECS:

Você reflete um pouco também sobre essas coisas. [...]. Aqui não, você tá no estágio, você vê. Eu acho que devia começar bem antes, porque você ia ter mais tempo ‘pra’ lidar com essas coisas enquanto pessoa. A postura de enfermeiro. Você ser estimulado, vamos dizer assim, você refletir sobre sua prática (Ent. 4, Grupo II).

[...]. É essencial, esse processo de cuidar, esse processo de trabalho. Poder ver, planejar e praticar a ação. E você estando presente como aqui é possível, a gente vê as mudanças nesse processo de cuidar de trabalho (Ent. 5, Grupo II).

Esse momento de encontro das (os) discentes com o ambiente de trabalho propicia (re)pensar o cuidado enquanto ato, refletido sobre o fazer sistematizado e social, não institucionalizado. Nesse sentido, Pires, M.R.G.M. (2005, p. 1031), sustenta que:

Cuidar é mais que um ato mecanizado, rotinizado e alienado de sentido, faz parte da realidade criativa dos seres, compondo-lhe a estrutura de ser e vir

a ser-no-mundo, sendo atitude humana inscrita na esfera vital, subjetiva e cultural das relações sociais.

Para a autora o “aprisionamento do ato de cuidar em normas, rotinas e técnicas desvirtuam o cuidado de sua existência criadora e reveladora” (Pires, M.RG.M., 2005, p.1031). Produz-se assim a institucionalização do cuidado. Esse cuidado institucionalizado tende a priorizar a proteção do usuário em detrimento de sua autonomia.

Nessa perspectiva, a busca da integralidade, pelos atores sociais, é apontada por Machado, M.F.A.S. et al., (2007, p. 336):

A integralidade é um conceito que permite uma identificação dos sujeitos como totalidades, ainda que não sejam alcançáveis em sua plenitude, considerando todas as dimensões possíveis que se pode intervir, pelo acesso permitido por eles próprios.

Nessa mesma linha de análise, resgato os relatos das (os) enfermeiras (os) preceptoras (es):

Olhe o processo de cuidar do enfermeiro, além dele estar passando todas as informações pertinentes, que o paciente deve receber, deve ter, para ter consciência do seu tratamento, e evitar complicações por conta disso, ele (enfermeiro) precisa também ouvir (Ent. 22, Grupo III).

[...]. A gente deve ver também de forma holística. Por exemplo: você ‘tá’ tratando essa doença, e daí, já investigar se tem alguma outra que pode ‘tá ‘atrapalhando, que venha a desenvolver. ‘Tá’ justificando sempre que você for dar uma orientação, ‘pra’ que ele venha a entender, pelo menos nessa realidade é o que eu tento fazer aqui na instituição (Ent. 23, Grupo III)

[...], todas as estudantes tinham um relacionamento interpessoal com a equipe, elas olhavam o indivíduo enquanto sujeito que é dono de uma vida, que tem diversos fatores que influenciam nesse processo dele. Elas eram muito boas no sentido de uma visão holística. [...] (Ent. 25, Grupo III).

Sob essa ótica, se identifica uma mudança da prática, ainda que não instituída, formalizada, mas que aponta para a construção de uma práxis social na formação, e que irá gerar novos movimentos entre os profissionais e usuários das unidades de saúde, onde ocorrem as práticas do ECS:

[...] de movimentos que o aluno ‘tava’ fazendo, de inovações, de organização de serviços, de trabalhar com a comunidade, de movimentos, desde fazer feiras de saúde até organizar a implantação de uma ação no âmbito do interior da unidade, capacitação da equipe, assumir junto com a gestão, a condução do processo do cuidado da Atenção Básica. [...] (Ent. 1, Grupo I).

[...]. O objetivo é contribuir para o aprofundamento na formação do enfermeiro generalista, mas contribuir com o disparar de movimentos de transformação no fazer/cuidar do o enfermeiro e no do professor. [...]. Então, assim, nos estágios têm sido feito, feiras de saúde, não ‘ta posto’ no estágio. O aluno enxerga como necessidade de potencializar resposta prá comunidade. E aí sai a feira. Treinamento das equipes, dos adolescentes do bairro, primeiros socorros, o estágio movimenta, articula com a escola. É o grupo da igreja, o ACS que é mais articulado com outros segmentos, que também provoca isso no aluno (Ent. 2, Grupo I).

É importante a construção de uma concepção crítica da educação que pretenda ser uma educação para a conscientização, para a mudança, para a libertação, e com isso construir uma relação de proximidade entre os profissionais e a população. Nessa relação educativa, a produção do conhecimento passa a ser coletiva, gerando uma modificação mútua, porque ambos são portadores de conhecimentos distintos, e favorece a construção/consolidação de movimentos em busca da integralidade da formação.

Nesse sentido, Machado, M.F.A.S. et al., (2007, p. 339), refere que:

Vale dizer que quanto mais conscientizados nos tornamos, mais capacitados estamos para ser anunciadores e denunciadores, frente ao compromisso que assumimos, permitindo desvelar a realidade, procurando desmascarar sua mitificação e alcançar a plena realização do trabalho humano com ações de transformação da realidade para a libertação das pessoas.

Esses achados permitem também refletir criticamente acerca da importância dos processos educativos na perspectiva de que as reformas curriculares baseadas nas DCN/ENF e nos serviços de saúde, busquem construir a consciência crítica para que a (o) enfermeira (o) se perceba educadora (or) nas diversas áreas de atuação profissional, pois conforme estudo realizado por Budó e Saupe, (2004) e referido por Machado, M.F.A.S. et al., ( 2007, p. 340):

É incontestável o papel do enfermeiro como educador em saúde, seja na sua versão individual ou coletiva. Entretanto, estudo sobre as práticas de educação em saúde no PSF realizadas por esse profissional em Fortaleza, CE identificou um despreparo técnico para exercer esta prática de modo articulado aos princípios do SUS, como também a dominância das ações clínicas, individuais e burocráticas exigidas dentro das Unidades Básicas de Saúde da Família.

Nessa perspectiva deve se considerar a necessidade da adoção da educação permanente, como um dos eixos na promoção de movimentos inovadores na gestão

democrática do SUS e na formatação de práticas de saúde que aproximem o cuidado integral e de qualidade aos usuários do SUS, e ter como foco de que o trabalho em saúde em ato é um processo que envolve usuários, trabalhadores e gestores (BRASIL, 2003; FRANCO, ANDRADE; FERREIRA. 2009).

Essa nova forma de atuar dos profissionais de saúde, especificamente enfermeiras (os) desencadeia outra aquisição de competências na formação desse profissional que é a condição da escuta sensível, através do acolhimento como forma de desconstruir as práticas fragmentadas, assistenciais, com filas intermináveis que contribuem para o atendimento (des)humanizado que gera desgaste aos profissionais e usuários do sistema de saúde.