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CAPÍTULO 3 – MARCO LEGAL E INSTITUCIONAL E AS CONTRIBUIÇÕES

3.2 Intenções no Marco Legal da Economia Solidária

Não obstante as legislações existentes na Economia Solidária ser um tema discutido a partir das décadas de 80 e 90, alguns acontecimentos favoreceram a sua evolução que será refletida a partir de então, um deles é o Fórum Social Mundial descrito no capítulo 2, criando Fórum Brasileiro de Economia Solidária – FBES, considerado atualmente como um espaço de articulação da sociedade sobre o tema.

Rosangela Nair Barbosa afirma que o FBES é “produto de atuação sociopolítica de proposição de mudanças na cena de natureza bem contemporânea, tanto nacional como internacional”, justificado por algumas razões, como: apoia-se basicamente em ONGs, reafirma a características de ação em rede e fóruns e apresenta capacidade mobilizatória internacional e articula-se com três segmentos do movimento de Economia Solidária: empreendimentos Solidários, entidades de assessoria e fomento e gestores públicos, (BARBOSA, 2007, p. 177)

Isto tem provocado dois dilemas observados durante a pesquisa da autora acima referida: o primeiro, a capacidade de manter a independência e a autonomia em relação ao que muitas organizações requerem na possibilidade de fiscalizar e controlar a atuação do Estado, e o outro, a relação conflituosa das ONGs como representantes políticas dos trabalhadores da economia solidária, a ponto dos membros da FBES questionarem a

diminuição dos debates internos do fórum ou de membros da Rede Brasileira da Socioeconomia Solidária – RBSES, em comunicação na rede eletrônica, observarem o abandono da agenda própria definida no encontro nacional. Além disso, o FBES depende efetivamente das verbas públicas e de sua parceria direta na normatização das ações da Senaes. (BARBOSA, 2007, p. 180).

A criação da Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES, subordinada à estrutura do Ministério do Trabalho, criada no governo Lula em 2003, representa um marco, pela primeira vez o governo assume uma outra via para o trabalho que não seja o emprego assalariado, até então a estratégia pública formal para desocupação envolvia a promoção do emprego, a qualificação profissional e o seguro-desemprego.

Rosangela Nair Barbosa reflete sobre a reelaboração cultural no que diz respeito às necessidades produtivas neste novo contexto:

O trabalho protegido perde sentido e a sociabilidade laborativa não mais se baseia no assalariamento, necessariamente. O Estado perde a função de responsável social pela promoção do emprego e deixa ao mercado parte considerável da regulação do trabalho, ficando a sociedade civil como salvaguarda e executora das ações pragmática de políticas públicas. (BARBOSA, 2007, p. 105)

Apesar das inúmeras atribuições da SENAES22 através do Decreto 5.063, de 08 de maio de 2004, percebe-se durante a entrevista com o coordenador da ITCP/FAFIRE e Conselheiro Suplente Estadual que não há muito avanços: “ainda não temos estes conselhos em todos os municípios, apesar de 2005 para cá o estado de Pernambuco ter avançado bastante, agora em 2009 agente conseguiu aprovar um Conselho Estadual de Economia Solidária do qual a incubadora faz parte, porém no município (Recife) ainda não tem” (sic)

Considerando que a ITCP/FAFIRE, em nível federal, é representada por ele23 neste conselho, as oportunidades de participação em eventos se dão através de cursos, oficinas, palestras sobre economia solidária. Como as reuniões do Conselho Estadual não tem uma periodicidade e local definido, a faculdade sedia alguns destes encontros.

As articulações com outros grupos de economia solidária são evidentes, fazendo-nos perceber durante as observações nesta pesquisa que o coordenador da incubadora possui inúmeras atividades pertinentes a esta função fora da extensão da Fafire, levando-nos a refletir sobre os aspectos positivos ao divulgar, colaborar e contribuir para o crescimento da economia solidária e a Incubação FAFIRE, pela sua excelente articulação

22 http://www.mte.gov.br/ecosolidaria/secretaria_nacional_atribuicoes.asp

externa, mas, em contrapartida, na maioria das vezes as reuniões mensais e deliberações do grupo Semeando Futuro são realizadas pela assistente social sem a sua presença.

Deve-se chamar a atenção para a importância observada por Barbosa que a SENAES dá aos estudos e pesquisa, sendo inclusive o cerne deste estudo, demonstrando, possivelmente, a forte presença universitária no meio em que emergiu a economia solidária, com opção socioeconomica para a vida brasileira, como se pode depreender da atuação das ITCPs e da Unitrabalho nesse processo:

O objetivo de fomentar estudos na área é tão central na estratégia da secretaria, que de seus dois departamentos, um é o “Departamento de Estudos e Divulgação”, responsável por uma das principais iniciativas da secretaria, que é o conhecimento das unidades de produção no território nacional e as entidades de assessoria, criando o Sistema de Informações em Economia Solidária – Sies. (BARBOSA, 2007, p. 232)

Com as informações adquiridas pelo mapeamento, a secretaria poderá dar maior consistência programática à política para o setor, à sua regulação social e mesmo a busca de adesão sociopolítica dentro e fora do governo.

Os dados do último censo da Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES também no site do Ministério do Trabalho e Emprego, o Atlas da Economia Solidária mostra que, em 2007, o estado de Pernambuco possui 1.52624 Empreendimentos de Economia Solidária, posicionando-se no 4º lugar em nível nacional, perdendo apenas para os estados do Rio Grande do Sul, Ceará e Bahia, respectivamente.

O Grupo de Estudos do Macroambiente Empresarial de Pernambuco – GEMEPE/FAFIRE, coordenado pelo curso de administração, está fazendo o mapeamento dos empreendimentos solidários do estado com previsão de término para o mês de outubro.

Durante sua pesquisa de doutoramento, Barbosa relata um dado interessante que a SENAES não concebe a política pública na área como limitada a uma instância administrativa do governo federal, ao contrário, transita na transversalidade pelas diversas pastas temáticas, fortalecendo as variadas ações públicas. (BARBOSA, 2007, p. 238)

Para ilustrar o que foi dito acima esta mesma autora cita o Ministério da Educação objetivando irradiar a economia solidária no processo educativo em todos os níveis, particularmente na esfera da educação de jovens e adultos, assim como a atuação das universidades no campo da extensão e particularmente das incubadoras de cooperativas populares. (BARBOSA, 2007, p. 276)

A Diretora Adjunta de Extensão Comunitária da FAFIRE tem como projeto colocar a disciplina de Economia Solidária no curso de administração: parece um contrasenso porque o curso de administração para ter sucesso tem que ser capitalista, qualidade... os efeitos contrários a economia solidária ... mas eu achava que iria ter muito mais choque e eu sempre quando tenho oportunidade sempre digo, já falei muitas vezes: a extensão não vai brigar, apesar de serem duas orientações diferentes agente não vai brigar, tem que ser compatível, agora se agente puder humanizar e tornar o curso de administração mais solidário vai ser muito melhor, para a própria instituição... (sic).

O Documento Base Nacional Sistematizado, com o tema “o direito às formas de organização econômica baseadas no trabalho associado, na propriedade coletiva, na cooperação e na autogestão, reafirmando a economia solidária como estratégia e política de desenvolvimento”, elaborado de janeiro a março e publicado em maio de 2010, para a II CONAES, após inúmeras contribuições das 27 conferências estaduais sistematizadas que serviram de debates e deliberações nesta conferência no período de 16 a 18 de junho, em Brasília, dividido em eixos temáticos.

No Eixo I são abordados os avanços da economia solidária, apesar de haver a necessidade de um maior fortalecimento organizativo, enquanto movimento através de fóruns e redes, através do crescimento de empreendimentos econômicos solidários, o consumo ético, consciente e responsável causados na produção de bens e serviços sobre a natureza, sobre trabalhadores (as) e sobre as comunidades. Em relação as políticas públicas, o documento Base relata que este assunto ainda não é prioridade para os governos estaduais e municipais, pois é vista como uma política assistencialista e/ou emergencial, além da diversidade de compreensões deste fenômeno implicando no discernimento entre política partidária e política pública.

No Eixo II são sugeridas as mudanças da aprovação do Projeto de Lei das cooperativas de trabalho com as finalidades de: conceituar e definir, no aspecto jurídico, o que é uma legítima cooperativa de trabalho; regulamentar seu funcionamento, fortalecendo seus espaços de decisão democrática; desburocratizar e facilitar a formalização, reduzindo o número mínimo de 20 para 7 sócios cooperados na criação de novas cooperativas; e estabelecer um mínimo de direitos constitucionais que esses tipos de cooperativas devem garantir aos seus associados, como também assegurar a implantação do Programa Nacional de Apoio às Cooperativas de Trabalho (PRONACOOP), previsto no Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional, facilitando o crédito, à qualificação social e profissional, assessoramento técnico e organizativo. (Doc. Base, 2001, p. 20)

E, o Eixo III, os avanços que se propõe para a organização do Sistema Nacional de Economia Solidária – SINAES.

Durante entrevista com conselheiro estadual que representa a Incubação FAFIRE25 e faz equipe da DAEAC, esta transversalidade é muito clara, porém com algumas ressalvas: a SENAES funciona bem, transversal, mas qual é o avanço nas políticas públicas? Por que não um ministério de Economia Solidária? Estas foram as nossas demandas da II Conferência Nacional de Economia Solidária – II CONAES. Será que estamos amadurecidos como movimento, como política? O ministério é uma proposta que se ventila para o futuro, tem uma relatora dessa lei escrevendo este projeto, tem assinatura correndo pelo Brasil todo. Por outro lado existem muitos entraves, muitas dificuldades, muitos desafios, o marco legal ainda é um deles (sic)

Diante destes fatos e discursos referentes à evolução histórica das legislações concernentes à extensão universitária e a economia solidária não podemos concluir este capítulo sem nos referir a accountability a partir do momento que ela trata da prestação de contas por parte dos entes públicos das suas ações na garantia de uma maior transparência e exposição das políticas públicas, tão bem refletida por Pereira:

Quanto maior a possibilidade de os cidadãos poderem discernir se os governantes estão agindo em função do interesse da coletividade e sancioná- lo apropriadamente, mais “accountable” é o governo. (PEREIRA, 2008, P. 36)

Ainda sobre este assunto, O‟Donnell refere-se a accountability vertical como “ações realizadas, individualmente ou por algum tipo de ação organizada e/ou coletiva, com referencia àqueles que ocupam posições em instituições do Estado, eleitos ou não”, (O‟DONNELL, 2008, p. 28) reafirmando, desta forma, o quanto tem sido efetiva a participação do FOREXT e da CONAES nas contribuições do marco legal da extensão universitária e economia solidária, respectivamente.

Desta maneira, a possibilidade da continuidade destas ações referentes ao marcos legais da extensão e da economia solidária traz alguns questionamentos na conclusão deste capítulo tais como: é fato a relevância ao ForExt para o real entendimento do papel da extensão universitária da instituições confessionais comunitárias, mas de que forma estas contribuições são realmente percebidas nesta trajetória do conhecimento apreendido no ambiente acadêmico interno que é levado para o externo e retorna outra vez para a instituição com outros questionamentos e desafios? E em relação à economia solidária reforçamos a demanda do II CONAES quanto ao seu marco legal, em relação ao seu amadurecimento enquanto política pública.

Como a pergunta de pesquisa deste trabalho questiona em que medida o Semeando Futuro, como um dos projetos de extensão e ação comunitária da FAFIRE com o foco em economia solidária é uma prestação de serviço público, faremos no capítulo seguinte uma análise detalhada das suas ações tendo como eixo norteador o que foi contemplado nos referenciais teóricos destes três capítulos.

CAPÍTULO 4 – PROJETO SEMEANDO FUTURO: ATENDENDO AOS SEUS