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1 DA REGIÃO ÀS REGIÕES METROPOLITANAS

1.2 Interesses regionais, locais e regiões metropolitanas

1.2.1 Interesse local e regional

A relevância da caracterização de interesses comuns e interesses locais é destacada por Alves (2001, p. 74) quando assevera ―ab initio que os interesses comuns não são o mero somatório dos interesses municipais adjacentes‖. Assim, os interesses locais ou peculiares, conforme assevera Ferraz (1976, p. 21), ―não são aqueles de interesse exclusivo de um município. Equivalem a interesse predominantemente municipal‖. Atualmente, quando se faz menção ao intenso processo de globalização dos interesses, observa-se que amplia o entendimento de que toda e qualquer atividade realizada em qualquer que seja o país no mundo pode ter menor ou maior consequência em outros locais. Portanto, entende-se que determinados serviços ou funções devem ser executados em conjunto/parcerias com os demais municípios, pois, se deixados à mercê de cada município, notadamente não terão tratamento global satisfatório que atenda ao conjunto de municípios que compõem aquela unidade regional urbana.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 25, § 3º, admite a criação de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões com o intuito de integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum – FPIC. Nesse sentido, identificada uma função ou serviço que deixa de ser predominantemente local, (é o caso da educação, particularmente a educação profissional), pode o Estado instituir uma região metropolitana ou se valer das que já existem para, nos termos do dispositivo constitucional acima, integrar aquelas atividades.

A partir do exposto, algumas questões devem ser levantadas e discutidas para análise e melhor compreensão dos elementos presentes na Constituição Brasileira de 1988, bem como da participação efetiva das políticas de educação profissional na promoção do processo de desenvolvimento das Regiões Integradas de Desenvolvimento. O que significa integrar e qual o limite entre interesses comuns e interesses essencialmente locais que constituem o núcleo da questão?

Entende-se, inicialmente que não é a lei que instituiu a região metropolitana que vai determinar o que são interesses comuns. Acredita-se que é a realidade concreta, esta, sim, que vai apontar quais funções serão apropriadas a serem desempenhadas por outro ente ou órgão que não seja exclusivamente o município. Segundo (ALVES, 2001, p. 77), ―a configuração de competências tem aspectos formais e materiais, e estes últimos, como conteúdos empíricos,

dependem da realidade constatada e não apenas da expressão literal de seus respectivos conceitos‖. Corroborando com essa perspectiva, Vasco (2007) afirma que:

A análise e a identificação dos serviços deve ser procedida por meio do exame de cada caso concreto, conforme as suas peculiaridades urbanas e inter-relacionamentos governamentais, porquanto cada região metropolitana possui um caráter que lhe é peculiar. Nesse entendimento, apenas um estudo técnico poderia apontar, em cada lugar e com precisão, os objetos do interesse da ação metropolitana, sob pena de se criar zonas cinzentas, pois há diferenças capazes de identificar e isolar uma determinada função, conforme suas características particulares, classificando-a na órbita intermunicipal ou local. (VASCO, 2007, p. 340-341)

Nesta perspectiva, os interesses comuns podem ser definidos a partir de uma análise dos conflitos e divergências concretas, presentes nas regiões a partir de suas demandas. Destaca-se o dinamismo desta mesma realidade e a necessidade permanente de avaliação do que sejam as demandas comuns dessas unidades regionais urbanas. Silva (1970) já manifestou essa preocupação ao afirmar que:

Sucede que a dinâmica social e as mutações econômicas modificam constantemente a dimensão dos interesses. Aquilo que em determinado momento histórico é de interesse tipicamente local, amanhã pode transcender às raias municipais, para abranger um círculo mais amplo, como é o fenômeno urbano de nossos dias, que dada a função das cidades, ou de cada cidade em particular, vincula várias cidades, influindo mutuamente, umas em outras, com repercussões naturais na vida das várias comunidades envolvidas no processo. (SILVA, 1970, p. 37)

Neste contexto, os critérios para a identificação e evidência jurídica destes interesses comuns podem ser definidos a priori, com feito nos dispositivos da Lei Complementar nº 14/73, ou ser definidos ad hoc, ―conforme o exame das características intrínsecas e contextuais pelas quais determinada função pública passa a ser de interesse comum‖ (ALVES, 2001, p. 80). Prontamente identificados os interesses comuns, a questão passa pela execução dessas atividades; como e por quem serão executados as funções e os serviços que podem atender ao conjunto destes interesses nas unidades regionais urbanas. Numa análise bem elementar, dir-se-ia que o responsável seria o órgão executivo da região metropolitana, como é o caso da COMEC na Região Metropolitana de Curitiba, e da COMEL na Região Metropolitana de Londrina, ambas no Paraná, que, por sua vez, se encontram em estágios de evolução distintos.

Estas questões merecem maior atenção quando nos reportamos às atribuições de competências determinadas pela Constituição de 1988. Entende-se que o federalismo de integração (ALVES, 2001) admite a ampliação de delegação de atribuições, considerando que haja entendimentos entre as partes envolvidas. No entanto, o Estado não pode atribuir-se determinadas funções que são de competência dos municípios, assim como os municípios não poderão deixar de cumprir com suas atribuições constitucionais.

Alves (2001) nos chama a atenção para o fato de que a região metropolitana tem carácter essencialmente administrativo e não política e, portanto, essas normas de caráter administrativo não poderão impor-se aos entes políticos, como os municípios. Conforme diz esse autor ―as normas jurídicas que podem ser impositivas aos Municípios, em relação às funções públicas de interesse comum, serão aquelas oriundas da Assembleia Legislativa do Estado, no exercício de suas competências comum e concorrente‖ (ALVES, 2001, p.29). Neste sentido, o Estado não poderá proteger interesses estaduais, pois ―o que define o interesse metropolitano que especializa os serviços comuns aos Municípios da Região, é interesse regional, porém um interesse regional qualificado, cuja titularidade não é do Estado somente, mas do Estado e dos Municípios‖ (MEIRELLES, 1995, p. 146).

Nesse contexto, entende-se integrar como uma pauta de conduta do Estado, produto de um planejamento regional, que leve em consideração as obrigações de cada ente federativo e em que cada um assuma suas atribuições. Dessa maneira, a atuação de cada município deve estar em consonância com o planejamento mencionado e, conforme Ferraz (1976, p. 21), identificado o que sejam os serviços de interesse comum, ―não é defensável admitir que sua realização conjunta constituiria simples opção discricionária, dos Municípios da região‖. Assim sendo, integrar não é, portanto, executar diretamente nem se substituir à organização ou ao planejamento de tais funções públicas relacionadas aos interesses comuns. Faz-se necessária a prerrogativa da manutenção do equilíbrio entre a necessidade lógica da integração das funções e o imperativo constitucional da preservação da autonomia dos entes federados.

Neste sentido, a estrutura constitucional assevera que será objeto da competência legislativa e executiva estadual a integração destas funções comuns, ou seja, não procede que se fale em substituição ou integração das funções de interesse exclusivamente local. De acordo com essa perspectiva, o exercício dessas funções públicas de interesse comum ―é peculiar, visto que os Municípios não poderão exercê-las de modo isolado, senão conjuntamente, numa espécie de cogestão entre eles e o Estado que tem a responsabilidade de organizá-las originalmente, mediante lei complementar‖ (FERRAZ, 1976, p. 23-24).

O conjunto de elementos jurídicos viáveis para se executar os objetivos, para os quais foram criadas as regiões metropolitanas, ou seja, integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum-FPIC, tendo em vista que as competências e autonomias dos Estados e municípios devem ser preservadas, serão discutidos e analisados a seguir. Esta questão aponta para outro aspecto constitucional que é a inexistência de um quarto nível de poder no contexto do sistema federativo brasileiro. Ainda que nível tivesse sido estabelecido pelo constituinte originário, possivelmente alguns problemas poderiam aflorar, conforme identificados em estudos de Ferraz (1976), quando aponta que, com o surgimento de regiões metropolitanas a partir da Lei Complementar nº 14/73 e 20/74, estas concentram cerca de 90% da população e da renda do país, o que, segundo esse autor, pode fragilizar a própria Federação, pois enfraqueceria os Estados e os demais municípios no que diz respeito às questões orçamentárias.

Vale ressaltar o que escreveu Abrucio (2000) em relação ao pensamento do economista Fernando Rezende acerca das questões orçamentárias:

As desigualdades [na distribuição dos recursos tributários] são particularmente severas nas áreas metropolitanas, onde a maneira como a atividade econômica e a população se distribuem no espaço determina o resultado. Na Região metropolitana do Rio de Janeiro, por exemplo, os Municípios dormitórios – aqueles que concentram a população que trabalha no núcleo central – chegam a apresentar um muitas vezes menor do que a média regional, embora enfrentem fortes pressões para melhorar o atendimento das necessidades de seus residentes. (ABRUCIO, 2000, p. 76)

A partir das reflexões pontuadas acima, compreende-se que não se trata de um quartus

genus na estrutura federativa brasileira. É importante atentar-se para a análise em relação ao

planejamento urbano regional e à execução de certas atividades e se estas são obrigatórias ou facultativas aos municípios, mas que permitam processos de coordenação federativa na perspectiva do que preconiza o Art. 8, incisos IV e V do Projeto de Lei do Estatuto das Metrópoles.

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