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Interesses ou direitos coletivos stricto sensu

Em sentido amplo, a expressão interesses coletivos refere-se a interesses transindividuais, de grupos, classes ou categorias de pessoas. Nesse sentido é que a Constituição de 1988 fez referência a direitos coletivos, em seu Título II, e a interesses coletivos, no art. 129, III. Também nessa acepção é que o CDC, em seu art. 81, parágrafo único e art. 87, disciplina a ação coletiva (MAZZILLI, 2002, p. 47).

Contudo, ao mesmo tempo em que utilizado esse conceito amplo, o Código de Defesa do Consumidor veio a introduzir um conceito mais restrito de interesses coletivos, daí a definição doutrinária de direitos coletivos stricto sensu à previsão do inciso II, do parágrafo único do art. 81 do CDC.

Nesse sentido, segundo a definição do mencionado dispositivo legal, são interesses ou direitos coletivos, ³RV WUDQVLQGLYLGXDLV GH QDWXUH]D LQGLYLVtYHO GH TXH VHMD WLWXODU JUXSR categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação MXUtGLFDEDVH´

Do mesmo modo que os direitos difusos, os direitos coletivos também são transindividuais e indivisíveis. Contudo, distinguem-se em relação àqueles no diz respeito à sua origem, uma vez que os primeiros sempre supõem titulares indetermináveis, ligados por circunstâncias de fato, ao passo que os segundos dizem respeito a grupo categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, ligadas pela mesma relação jurídica de base (MAZZILLI, 2002, p. 48).

A despeito dos direitos coletivos serem indivisíveis assim como os difusos, parte da doutrina vai além, fazendo distinção quanto à possibilidade dessa indivisibilidade ser absoluta

ou relativa. Antonio Gidi, valendo-se das lições de Rodolfo Camargo Mancuso, que é quem propõe tal divisão, explica, em suas palavras, que

A indivisibilidade referente ao direito difuso é absoluta em função da própria indeterminação das pessoas que compõem a comunidade titular do direito. Já a indivisibilidade do direito coletivo é meramente relativa, pois os membros da coletividade titular do direito são perfeitamente identificáveis e individualmente beneficiados (1995, p. 28).

Não obstante essa diferenciação, normalmente tem se falado que ambas as categorias classificam-se como direitos transindividuais, vez que indivisíveis em essência, diferenciando-se no que diz respeito, aí sim, à relativa ou absoluta possibilidade de se determinar seus titulares. Vale dizer, nos difusos há indeterminação absoluta/total dos titulares, ao passo que nos coletivos há indeterminação relativa dos titulares. Nessa linha, é o ensimanento de Zavascki (2009, p. 36), para quem os direitos coletivos são direitos ³WUDQVLQGLYLGXDLVFRPGHWHUPLQDomRUHODWLYDGRVWLWXODUHV´

Além disso, dispõe o art. 81, parágrafo único, II do CDC que a coletividade titular de um direito coletivo é composta de pessoas ³OLJDGDVHQWUHVLRXFRPDSDUWe contrária por uma relação jurídica-EDVH´GLIHUHQWHPHQWHGRVGLIXVRVQRVTXDLVDFRPXQLGDGHWLWXODUGRGLUHLWRp FRPSRVWDVGHSHVVRDV³OLJDGDVSRUFLUFXQVWkQFLDVGHIDWR´FRQIRUPHPHQFLRQDRLQFiso I do indigitado artigo da lei.

Essa relação jurídica de base, caracterizadora dos direitos coletivos, pode ocorrer de duas formas: entre os membros de um grupo ou pela ligação com a parte contrária. Na primeira hipótese, tem-se um elemento subjetivo (affectio societatis) que une os membros do grupo entre si em busca de objetivos comuns, como no exemplo dos associados de determinada associação, dos acionistas de uma sociedade ou ainda dos advogados enquanto membros de uma classe. No segundo caso, o que existe é um vínculo jurídico que liga determinado grupo de pessoas à parte contrária, como no exemplo dos contribuintes de um mesmo tributo, dos estudantes de uma mesma escola ou dos contratantes de um determinado tipo de seguro (DIDIER e ZANETI, 2009, p. 75).

Conforme ensinam Didier e Zaneti (2009, p ³FDEH ressalvar que a relação base necessita ser anterior à lesão (caráter da anterioridade)´1HVVHVHQWLGRH[HPSOLILFDPID]HQGR D FRPSDUDomR GH TXH ³QR FDVR GD SXEOLFLGDGH HQJDQRVD D OLJDomR FRP D SDUWH FRQWUiULD

também ocorre, só que em razão da lesão e não de vínculo precedente, o que a configura como direito difuso e não coletivo stricto sensu´

Nessa linha também assevera Hugo Nigro Mazzili

Embora o CDC se refira a ser uma relação jurídica o elo comum entre os lesados que comungam o mesmo interesse coletivo (tomado em seu sentido estrito), ainda aqui é preciso admitir que essa relação jurídica disciplinará inevitavelmente uma hipótese fática concreta; entretanto, no caso de interesses coletivos, a lesão ao grupo não decorrerá propriamente da relação fática subjacente, e sim, da própria relação jurídica viciada que une todo o grupo. Assim, por exemplo, tomemos um contrato de adesão, com uma cláusula ilegal. A ação civil pública que vise à anulação dessa cláusula envolverá uma pretensão à tutela de interesse coletivo em sentido estrito, pois o grupo atingido está ligado por uma relação jurídica básica comum, que, nesse tipo de ação, deverá necessariamente ser resolvida de maneira uniforme para todo o grupo lesado (2002, p. 47-48).

Assim, conforme concluem Didier e Zaneti

O elemento diferenciador entre o direito difuso e o direito coletivo é, portanto, a determinabilidade e a decorrente coesão como grupo, categoria ou classe anterior à lesão, fenômeno que se verifica nos direitos coletivos stricto sensu mas não ocorre nos direitos difusos (2009, p. 75).

A despeito dessa diferenciação, os direitos coletivos também apresentam algumas das características mencionadas no item anterior quando se tratou dos difusos, quais sejam: insusceptibilidade de apropriação individual, de transmissão, seja por ato inter vivos ou causa mortis, de renúncia ou transação, e defesa em juízo em forma de substituição processual. Entretanto, a mutação dos titulares ativos coletivos da relação jurídica de direito material ocorre com relativa informalidade jurídica, bastando a adesão ou exclusão do sujeito à relação-base (ZAVASCKI, 2009, p. 36-37).

Por fim, nos termos do art. 103, II do CDC, no caso dos direitos coletivos a coisa MXOJDGD TXH DGYLHU GD VHQWHQoD SRVVXLUi HILFiFLD ³ultra partes´ RX VHMD SDUD ³DOpP GDV SDUWHV´PDVOLPLWDGDDRJUXSRFDWHJRULDRXFOasse (DIDIER e ZANETI, 2009, p. 75).