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O Ministério Público enquanto fiscal da lei

3.3 Atuação no processo civil

3.3.2 O Ministério Público enquanto fiscal da lei

No Código de Processo Civil, a atuação do órgão ministerial como interveniente está expressamente prevista no art. 8277.

Trata-se do exercício, pelo Ministério Público, da função de fiscal da lei, também denominada de custos legis. Nesses casos, a intervenção do parquet, nos dizeres de Cássio Scarpinella Bueno (2010, p   RFRUUH GH ³IRUPD LPSDUFLDO´ RX VHMD ³SDUD H[HUFHU XPD atuação processual que transcende o interesse subjetivado, próprio, de cada uma das partes que estão na relação processual perante o Estado-MXL]´

Conforme aduz Elpídio Donizetti (2008, p QHVVHVFDVRV³RSULPHLURDVSHFWRDVHU tutelado é a ordem jurídica, até porque, preservada esta, na demanda, preservado estará o UHJLPHGHPRFUiWLFRRVLQWHUHVVHVVRFLDLVHLQGLYLGXDLVLQGLVSRQtYHLV´

Discorrendo sobre o mencionado dispositivo legal contido no CPC, Mazzilli ensina que os casos que ensejam a atuação interventiva podem ocorrer em duas hipóteses

A primeira, nos processos em que, diante da qualidade de uma parte, deva zelar pela indisponibilidade de seus interesses ou suprir alguma forma de inferioridade (p.ex., intervém pela qualidade da parte quando se verifica no processo a presença de incapaz, índio, fundação, massa falida, acidentado do trabalho). A segunda hipótese ocorre, enfim, como órgão interveniente, quando, pela natureza da lide possa existir um interesse público a zelar (p. ex., em mandado de segurança, ações que envolvam questões de família, de disposições de última vontade, de estado etc.). (1998, p. 15).

Ocorrendo a intervenção ministerial pela natureza da lide, o parquet atua de duas formas: (a) zelando por um interesse indisponível ligado à própria relação jurídica, a exemplo das hipóteses previstas no inciso II do art.82; ou (b) cuidando de interesse que, mesmo sem ser indisponível, alcance um grupo considerável de pessoas, como no caso dos interesses

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Art. 82 - Compete ao Ministério Público intervir: I - nas causas em que há interesses de incapazes;

II - nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade;

III - nas ações que envolvam litígios coletivos pela posse da terra rural e nas demais causas em que há interesse público evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte

transindividuais78 e também nos litígios coletivos pela posse da terra rural (MAZZILI, 2002, p. 77).

Quanto à intervenção decorrente da qualidade da parte, adverte Elpídio Donizetti (2008, p   TXH ³QmR p D VLPSOHV SUHVHQoD GH HQWLGDGH GH GLUHLWR S~EOLFR TXH MXVWLILFD D intervenção, cabendo ao juiz, em cada caso, examinar a existência de interesse, levando-se em conta, além da qualidade da parte, a reSHUFXVVmRGDGHPDQGD´

Nesse sentido, não cabe ao parquet velar pelos interesses das pessoas jurídicas de direito público, suprindo eventuais omissões dos procuradores de tais entidades, seja pela proibição contida no art. 129, IX, in fine79 da CF, seja pelo fato de que o interesse público não deve ser necessariamente entendido como o interesse da Fazenda Pública80 (DONIZETTI, 2008, p. 99).

Caso o membro do parquet entenda, mesmo que determinado pelo juiz a emitir parecer intervindo no feito, que não se está diante de caso a justificar sua intervenção, caberá manifestar sua recusa quanto a esta. Isso porque é indispensável que a atuação do agente ministerial seja sempre pautada tendo em conta o perfil constitucional da instituição, sob pena de se distorcer as funções e finalidades atribuídas ao órgão ministerial pela Constituição.

Nas hipóteses de intervenção em decorrência da qualidade da parte, assume o Ministério Público uma posição protetiva, cuidando para que o direito daquela não seja lesado (MAZZILI, 2002, p. 79).

Nesse aspecto, verifica-se, conforme salienta Mazzilli, uma notável diferença da atuação ministerial conforme a hipótese ensejadora de sua intervenção

Intervindo em razão da natureza da lide, o Ministério Público defende interesse impessoal da coletividade; intervindo em razão da qualidade da parte, tem atuação projetiva à parte. Se o interesse que traz o Ministério Público a um processo se prender a uma pessoa (incapaz, p. ex.), a finalidade da intervenção será o zelo desse interesse; se o interesse se prender a uma relação jurídica abstrata (questão ambiental, p. ex.), a finalidade da intervenção será zelar para que esse interesse na seja objeto de disposição indevida, pouco importando agora quem seja o titular da relação jurídica material (2002, p. 79).

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No caso da ação civil pública (defesa de direitos transindividuais)GL]R†žGRDUWžGD/HLQTXH³R0LQLVWpULR 3~EOLFRVHQmRLQWHUYLHUQRSURFHVVRFRPRSDUWHDWXDUiREULJDWRULDPHQWHFRPRILVFDOGDOHL´

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Art. 129, IX da Constituição Federal - Exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades públicas.

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&RQIRUPHOHPEUD+XJR1LJUR0D]]LOOL S ³HPFDVRGHHYHQWXDOFRQIOLWRHQWUHRLQWHUHVVHS~Elico primário e o secundário, será pelo primeiro deles que deverá zelar o Ministério Público, só defendendo este último quando efetivamente FRLQFLGDFRPRSULPHLUR´

Na mesma linha é o ensinamento de Cassio Scarpinella Bueno que, referindo-se às hipóteses previstas no artigo 82 do CPC, dispõe

Há diversas formas de classificar aqueles três incisos. A que mais se mostra útil é a que distingue a atuação do Ministério Público para a tutela de um interesse público objetivamente indisponível, evidenciado pela natureza da lide, e aqueles casos em que sua atuação justifica-se pela qualidade das partes. Somente no primeiro caso é que a atuação do Ministério Público deve ser imparcial. Naquelas situações de atuação do Ministério Público fundamentada na indisponibilidade subjetiva, não, nestes casos, o Ministério Público deve atuar para proteger o interesse ou direito que justifica a sua intervenção (2002, p. 79).

Atuando na condição de custos legis, dispõe o art. 8381 do CPC que o parquet terá vista dos autos após as partes, devendo ser intimado de todos os atos do processo, podendo também juntar documentos e certidões, postular a admissão de prova e requerer toda e qualquer diligência a fim de que se possa, tanto quanto possível, aproximar-se da verdade no processo. Detém, ainda, legitimidade para recorrer82.

O art. 8483 da lei processual prevê que, sendo o caso de intervenção obrigatória do Ministério Público no processo, deve a parte promover sua intimação, sob pena de decretação da invalidade/nulidade do processo.

Cabe ressaltar que, a despeito da redação do indigitado artigo, a doutrina e jurisprudência firmaram entendimento no sentido de que basta a intimação do parquet para a regularidade do feito, não sendo necessário que o Ministério Público realmente participe do processo. Da mesma forma, mesmo que não intimado, se a decisão do processo for favorável ao interesse ensejador da sua intervenção, não há que se falar em nulidade (DONIZETTI, 2008, p. 100).

São alguns dos exemplos da intervenção obrigatória do MP como custos legis: o processo de mandado de segurança84, o processo de desapropriação de imóvel rural para fins

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Art. 83 - Intervindo como fiscal da lei, o Ministério Público:

I - terá vista dos autos depois das partes, sendo intimado de todos os atos do processo;

II - poderá juntar documentos e certidões, produzir prova em audiência e requerer medidas ou diligências necessárias ao descobrimento da verdade.

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Art. 499, § 2º do CPC - O Ministério Público tem legitimidade para recorrer assim no processo em que é parte, como naqueles em que oficiou como fiscal da lei.

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Art. 84 - Quando a lei considerar obrigatória a intervenção do Ministério Público, a parte promover-lhe-á a intimação sob pena de nulidade do processo.

de reforma agrária85, o processo de alimentos86, a ação popular87, na habilitação para o casamento88, nos procedimentos especiais de jurisdição voluntária89, entre outros diversos casos.