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2. ESTUDOS DA TRADUÇÃO

2.4 Interpretação de Língua de Sinais: Efeitos de Direcionalidade

São consideradas unimodais aquelas traduções/interpretações que envolvam línguas de uma mesma modalidade. Podemos tomar como exemplo de interpretação unimodal, a interpretação que envolva pares linguísticos de uma mesma modalidade, como no caso do Português e Inglês (unimodal por se tratar de línguas de modalidade exclusivamente oral- auditivas), ou ainda, a Libras e a ASL8 (unimodal por se tratar de duas línguas de sinais, ou

seja, exclusivamente da modalidade gesto-visual).

É interessante notar que no caso de intérpretes unimodais, é comum que uma das línguas de seu par linguístico de trabalho, seja a sua L1. Tomemos por exemplo intérpretes do par linguístico unimodal Inglês/Português: no Brasil, é comum que intérpretes deste par linguístico sejam brasileiros (que possuam o Português como primeira língua – L1, e o Inglês como segunda língua – L2), ou estrangeiros (que possuam o Inglês como L1, e o Português como L2).

Neste exemplo, o fato das duas línguas compartilharem a mesma modalidade, ou seja, de serem de natureza oral-auditiva, possibilita que intérpretes unimodais possam ser nativos de

qualquer uma das línguas que compõe este par linguístico (tanto o Português, quanto o Inglês),

apesar de que, tradicionalmente, entre intérpretes unimodais de línguas orais, a direcionalidade da interpretação deve ser produzida partindo da L2 para a L1, sob a alegação que somente nesta direção, o intérprete produziria mensagens linguisticamente e culturalmente apropriadas. Portanto, a partir desta premissa, um intérprete brasileiro do par linguístico Inglês/Português deveria atuar, prioritariamente, em situações cuja direcionalidade da interpretação se dá da língua inglesa para a portuguesa, por exemplo.

O fato de esperar que intérpretes dominem vários idiomas e trabalhem unidirecionalmente num par linguístico é outro fator que diferencia serviços de interpretação de alto prestígio de outros menos desejáveis. Intérpretes contratados em organizações internacionais, como a União Europeia e a Organização dos Estados Americanos devem demonstrar proficiência em interpretação de duas ou mais línguas, mas geralmente interpretam em apenas um idioma, a sua "língua materna" (JONES, 1998, tradução nossa). 9

8 American Sign Language ou Língua Americana de Sinais, utilizada nos Estados Unidos e no Canadá.

9Whether interpreters are expected to know multiple languages and work unidirectionally within a language pair is another factor that differentiates high-prestige interpreting assignments from less desirable ones. Staff interpreters at international organisations such as the European Union and the Organisation of American States must demonstrate proficiency in interpreting from two or more languages, but they generally interpret into just one language, their "mother tongue." (Jones, 1998).

Porém, este paradigma não é comum entre os intérpretes de um par linguístico bimodal, isto é, um par linguístico constituído de duas línguas de modalidades diferentes: sendo uma língua oral, de modalidade oral-auditiva, e outra sinalizada, de modalidade gesto-visual.

Este é o caso dos TILS: profissionais bilíngues, biculturais e bimodais, já que sendo profissionais que intermediam situações comunicativas entre surdos e ouvintes, estes profissionais precisam necessariamente ser ouvintes para que possam ter acesso a ambas modalidades, visto que a audição é imprescindível ao exercício deste tipo de interpretação.10

No caso de intérpretes bimodais, como os TILS, a LS é frequentemente adquirida com L2.11 Em contextos inclusivos (como em palestras, cursos, salas de aula do ensino fundamental,

contextos midiáticos etc.), o intérprete de LS frequentemente trabalha em uma direcionalidade inversa a dos intérpretes de línguas orais. Deste modo, o TILS deve produzir, em LS (sua L2), uma mensagem que seja apropriada ao contexto-alvo, ou seja, a um indivíduo ou comunidade Surda que se presta do seu serviço de interpretação, ou participa desta interação comunicativa. Entretanto, no cenário atual, a comunidade Surda tem se empoderado progressivamente e a LS ocupa cada vez mais espaço de destaque na sociedade – principalmente no meio acadêmico, onde o sujeito Surdo deixa de ser apenar o receptor dos conhecimentos provenientes de mestres e doutores ouvintes, e passa a ter lugar de expressão próprio, oportunizando a produção de um conhecimento, não somente traduzido, mas nativo da língua de sinais. Assim, neste estudo, optamos pela direcionalidade da Libras para o Português brasileiro na tarefa de interpretação simultânea realizada pelos participantes desta pesquisa.

Neste capítulo discorremos sobre os Estudos da Tradução, sua origem como disciplina, seu campo epistemológico, os diversos tipos de mapeamentos de área e nos posicionamos em relação a algumas premissas teóricas, principalmente no que tangencia a interpretação em LS e seus efeitos de modalidade e direcionalidade.

No próximo capítulo, discorreremos sobre conceitos importantes que servirão como pontos de partida para realização desta pesquisa, tais como a Memória de Trabalho e a Semelhança Interpretativa.

10Isso se dá especialmente em contextos de interpretação bimodal, onde a mensagem é proferida numa língua oral e precisa ser captada via audição, para que possa ser interpretada e transmitida de maneira visual. Existem surdos capazes de traduzir entre línguas orais (na modalidade escrita) e línguas de sinais, já que ambas são

visualmente perceptíveis. Há também a possibilidade de intérpretes Surdos unimodais, isto é, intérpretes que

trabalham com duas LS, como a Libras e a ASL, ou ainda, os Sinais Internacionais – este tipo de serviço é comumente encontrado em eventos internacionais, onde há a presença de público surdo provenientes de vários países de LS distintas.

11Em exceção à esta generalização, temos exemplos de alguns CODAs (Children Of Deaf Parents, em Português:

Filhos de pais Surdos) que desde a nascença se encontram em um ambiente sinalizante, nestes casos, pode-se ter adquirido uma língua de sinais concomitantemente com a língua oral fala no país.

3. MEMÓRIA DE TRABALHO E SEMELHANÇA INTERPRETATIVA