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6. METODOLOGIA

6.4 Interpretação e Narrativa

Essa técnica Narrativa recebe o nome segundo a palavra latina que a designa, narrare, ou seja, contar histórias. O ato de contar, de relatar, parece seguir normativas universais que indicam o processo de produção de uma história. Portanto, a narrativa está estruturada na base de informações que sustentam o fluxo narrativo e estão alicerçadas em regras subjacentes. Contar histórias diz de um processo esquemático autogerador, tendo três principais características:

- Textura detalhada: compreende a necessidade de oferecer informações detalhadas com o objetivo de dar conta, elementarmente, do laço que liga um acontecimento a outro. O narrador engaja-se em fornecer detalhes, os mais precisos possíveis, para a compreensão dos acontecimentos assim relatados. Faz-se necessário dar conta do tempo, lugar, motivos, planos e habilidades.

- Fixação da relevância: o narrador transmite aspectos dos acontecimentos relevantes, de acordo com sua perspectiva e seu olhar sobre o mundo, tornando-se assim um olhar particular e, necessariamente, seletivo.

- Fechamento da Gestalt: o acontecimento central do processo narrativo deve ser contado em sua totalidade, preservando a regra fundamental da narrativa, ou seja, começo, meio e fim. Baseado nesta estrutura tríplice de uma conclusão há uma promoção da fluidez da história, tornando-a mais acessível ao receptor (JOVCHELOVITCH e BAUER, 2002).

As entrevistas narrativas são classificadas como um método de pesquisa qualitativa. São consideradas formas de entrevistas não estruturadas, contendo

interesse na profundidade e estabelecendo características específicas. Uma narrativa está formalmente estruturada, pois ela transita no cotidiano, considerando que os contadores de histórias possuem internalizadas as regras fundamentais de uma narração, pois uma narrativa segue um esquema gerador próprio (JOVCHELOVITCH e BAUER, 2002).

Fases principais da entrevista narrativa:

Iniciação: criam-se os procedimentos e as regras preliminares para o ato narrativo, permissão para se gravar a entrevista. Deve-se ter clareza dos tópicos que orientam o interesse do entrevistador. É necessário o esclarecimento sobre os objetivos de tal ato narrativo, portanto os tópicos devem ser suficientemente amplos a ponto de permitir ao entrevistado desenvolver uma história, percorrendo acontecimentos passados e direcionando-se à situação atual.

Narração central: durante a narrativa, é importante que o entrevistador se abstenha de qualquer comentário, procurando estabelecer uma escuta atenta que possa encorajar a continuidade da narrativa.

Fase de questionamento: após a escuta atenta, chega-se ao momento de costurar os fragmentos narrativos pronunciados pelo entrevistado; busca-se bordear lacunas promovidas pela história. As perguntas podem ser orientadas tanto nos acontecimentos mencionados na história, quanto pelo tópico do projeto de pesquisa. Fala conclusiva: no final da entrevista é importante ter em mãos um diário para sintetizar os comentários informais e as impressões visuais que serão de grande importância para a construção dessa cena de pesquisa.

A interpretação: a interpretação da entrevista narrativa considera as circunstâncias possíveis e inevitáveis na própria situação da entrevista, portanto, busca encontrar um nível autêntico da narrativa, compreendendo que, ao nos lançarmos ao episódio narrativo, somos convocados, irrefutavelmente, à arena interpretativa. A entrevista narrativa se constrói como um aparato técnico gerador de histórias, tornando-se, assim, forma aberta quanto aos procedimentos analíticos que seguem a coleta dos dados. O primeiro momento interpretativo se dá no ato da transcrição, buscando a maior fidedignidade possível, o que deve acarretar no retrato mais legítimo do episódio narrativo (JOVCHELOVITCH e BAUER, 2002).

Muitos pesquisadores das ciências humanas sustentam que o cerne da pesquisa científica está calcado fortemente na ficção, e muitos intitulam seus escritos como ficcionais assumindo, assim, sua subjetividade na ordem da escrita.

Tão logo um pesquisador se interroga sobre a escritura de sua pesquisa, ele gira em torno de elementos que voltam quase que invariavelmente sob a pena da caneta: estatuto da linguagem, construção de um saber que cede lugar a outro, relação com seu saber com a realidade presumida como última a conhecer. As palavras alteridades, de si e do outro, ética e poética, estética e ficção são as balizas que cada um retoma a sua maneira... Não se trata de maneira nenhuma de um capricho estético de pesquisadores desejosos de serem reconhecidos como autores, mas de umas das conseqüências de certas posições epistemológicas. O trabalho sobre a página em branco, sobre o estilo, faz parte da construção do objeto. A estética da forma não se dissocia de seu conteúdo (CIFALI e LOPES, 2005, p. 64).

Segundo Jovchelovitch e Bauer (2002), uma análise estrutural visa os elementos formais da narrativa. Na análise narrativa, estão implicados sempre os aspectos cronológicos e não cronológicos da história, portanto, a narrativa é uma sucessão de eventos ou episódios que remetem a atores, ações, contexto e espaços temporais.

A narração de eventos e episódios apresentam uma ordem cronológica e permite uma interpretação de como o tempo é usado pelos contadores de história. Os aspectos não cronológicos de uma narrativa correspondem a explicações e razões encontradas por detrás dos acontecimentos, aos critérios implícitos nas seleções feitas durante a narrativa, aos valores e juízos ligados à narração e a todas as operações do enredo. Compreender uma história é captar não apenas como o desenrolar dos acontecimentos é descrito, mas também a rede de relações e sentidos que dá à narrativa sua estrutura como um todo. É função do enredo organizar os episódios em uma história coerente e significativa. É vital, por isso, identificar o enredo na análise de narrativas (JOVCHELOVITCH e BAUER, 2002, p. 108).

Segundo Connelly e Clandinin (1995), a investigação narrativa tece seus olhares sobre a experiência educativa. Uma das razões de sua utilização na educação é a assertiva de que os seres humanos são elementarmente organismos contadores de histórias. Relatamos histórias de modo individual e social. Portanto, o estudo das narrativas é o estudo das formas como o homem experiencia o mundo. Tanto os professores como os alunos são contadores e também personagens de tais histórias.

Nesse sentido, as narrativas de participante e investigador convertem-se, obedecendo aos laços da investigação num eterno construir e reconstruir de narrativas compartilhadas. O trabalho de investigação das narrativas em ciências

sociais desemboca, inevitavelmente, em interpretações que se produzem intrinsecamente ao processo narrativo, inserindo-nos no ato ficcional (CONNELLY e CLANDININ, 1995).