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Interpretação de texto: impossibilidade de traduzir o que lê, ou de escrever com as próprias palavras

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DAS COMPETÊNCIAS E HABILIDADES EM LEITURA À FORMAÇÃO DO PENSAMENTO TEÓRICO-CIENTÍFICO

1. Categoria: competências e habilidades em leitura e escrita

1.4. Interpretação de texto: impossibilidade de traduzir o que lê, ou de escrever com as próprias palavras

Muito freqüentemente, encontram-se estudantes universitários com dificuldades de compreensão da leitura que realizam. Essas dificuldades resultam de fatores conjugados. Para Souza (2005, p. 1), “Isso ocorre porque a maior parte do tempo destinado às aulas de língua portuguesa é consumido com atividades que envolvem a gramática e, assim, o aluno vai ficando longe do processo de leitura e elaboração de textos”.

Pode-se confirmar a assertiva de Souza (2005) com o seguinte depoimento de uma aluna:

- Agora, em Português eu sempre tive uma dificuldade muito grande, principalmente gramática (Narrativa - Aluna 3 - Arqueologia).

E a mesma aluna acrescenta, em relação à disciplina Língua Portuguesa, na universidade:

- E eu to gostando muito do Português de agora [...] me deu abertura para a consciência crítica [...] tem que ser despertada nossa consciência crítica [...] só a gramática não vai resolver nada (Narrativa - Aluna 3 - Arqueologia).

Carvalho e Silva assim argumentam sobre a complexidade do ato de ler: “Ler para aprender [...] é tarefa complexa. Envolve várias operações cognitivas: buscar informações, colher dados, distinguir o que é concreto, argumento, pressupostos, fato, opinião, juízo de valor” (1996, p. 68).

Há, ainda hoje, a crença de que a aprendizagem da leitura esgota-se na alfabetização, em uma negação do caráter processual da aprendizagem, ou responsabilizam o ensino fundamental e médio pela não continuidade do desenvolvimento, nos alunos, das competências e habilidades em leitura e escrita.

Contudo, se alguns argumentos contêm uma parcela de verdade, nem todos podem ser acatados por levarem à acomodação e ao imobilismo. Tomar ciência de que o aprofundamento e aprimoramento da leitura não se esgota e, por isso, continua no ensino superior levará a uma postura pedagógico-didática comprometida com a busca de solução para esse aflitivo problema que frustra quem tem a responsabilidade de ensinar e quem se encontra no papel de aprender. De certa forma, a narrativa a seguir ajusta-se à reflexão que se faz:

- Já aqui no primeiro período o professor [...] pegava muito no meu pé, porque se preocupava muito com a aprendizagem da gente, contribuiu muito (Narrativa - Aluna 1 - Pedagogia). E, ao prosseguir sua exposição, essa aluna ainda constata que:

- [...] eu ainda não dei conta de colocar o texto numa lógica certa [...] agora, aqui [na universidade], é que eu estou aprendendo a, devagar, fazer uma leitura correta do texto e compreender, até então, eu lia por ler e não compreendia. Acho que a verdadeira alfabetização tá sendo aqui (Narrativa - Aluna 1 - Pedagogia).

Na entrevista, a mesma aluna, ao comentar sobre suas dificuldades relativas à leitura, à redação de textos e ao entendimento das aulas, deixa um relato contundente em relação à escolaridade por ela vivenciada antes da universidade. Embora o relato da aluna seja longo, optou-se por registrá-lo na integra, pois sintetiza depoimentos de outros tantos alunos de escola pública, em particular do curso noturno.

- Sim, tenho [dificuldade] porque os textos da faculdade são bem mais difíceis, principalmente os textos que a gente vê lá fora. O 2º grau lá fora é muito vago e uns textinhos muito vagos e umas perguntinhas. Aqui não, já é uma exploração maior. Eles querem lá fora é fingimento mesmo, e isso a gente tem que superar isso, porque pegar um diploma para mim tem que ser com qualidade. E, isso aí, eu pretendo

melhorar muito, porque dificuldade eu tenho (Entrevista - Aluna 1 - Pedagogia).

O quadro, quando se trata desses alunos, apresenta-se desalentador, o que fica claro na análise da professora de Didática Fundamental, do curso de Pedagogia. Consultada sobre as dificuldades dos alunos, no início da vida acadêmica, responde:

- [...] não somente ao iniciarem a vida acadêmica universitária, mas durante todo o percurso, é o extremo estranhamento frente aos conceitos científicos (Professora 2 - Didática Fundamental - Pedagogia).

Indagada sobre o que a universidade e o Departamento poderiam fazer por esses alunos, essa professora comenta sobre a existência de programas, no curso de Pedagogia, com esse objetivo, porém acrescenta que as barreiras ao êxito dessa tarefa também existem: alunos trabalhadores, que evadem sem que tenham atingido melhorias satisfatórias no processo de sua aprendizagem; acúmulo de trabalho dos docentes, o que leva esse tipo de atividade a ficar muito restrita às iniciativas e esforços individuais de professores, junto a alunos também isolados de um contexto maior. A professora ainda expressa que:

- O Departamento pode contribuir com a problemática da dificuldade de aprendizagem evidenciada pela maioria dos alunos, mas tem de haver um envolvimento mais sistemático e incisivo do conjunto de professores (Professora 2 - Didática Fundamental - Pedagogia).

À mesma indagação, a professora de Língua Portuguesa em Psicologia e Arqueologia propõe que a universidade, em todas as disciplinas, deveria dar atenção à linguagem, pois que todos os alunos precisam desenvolver competências e habilidades em leitura e escrita.

- Então, eu acho que a Língua Portuguesa estaria presente realmente em todas as disciplinas, se essa questão do texto fosse trabalhada em todas as disciplinas. (Professora 1 - Língua Portuguesa - Psicologia/Arqueologia)

É fato que as dificuldades dos alunos, quanto à leitura e escrita, preocupam muitos educadores. São objeto de estudo e pesquisa; professores que se ocupam com o problema sugerem metodologias para a sua superação, o que é bem-vindo e necessário. Entretanto, acredita-se que a questão exige muito mais e passa pela luta política de valorização da educação e do reconhecimento de que todos têm o direito à educação e ao conhecimento de sua língua na modalidade padrão. E isso precisa ocorrer independentemente da origem sociocultural do aluno, pois é o domínio da língua, nessa

modalidade, que lhe abre, as possibilidades de pensar, de aprender a aprender, de desenvolver os processos cognitivos, que lhe permitirão o acesso à interlocução necessária e importante para o desenvolvimento humano, que passa pela capacidade de pensar cientificamente, o que só será possível mediante a linguagem científica. É sobre esse assunto que, em seguida, se dispõe a estudar.

2. Categoria: formação de conceitos - processo de desenvolvimento

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