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2. CAPÍTULO 2 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.3 O ENSAIO BIDIRECIONAL

2.3.5 Interrupção Prematura do Ensaio

Uma das principais limitações do ensaio bidirecional é a dificuldade, ou mesmo impossibilidade, de levar o ensaio até as rupturas de ambos os trechos da estaca, o superior e o inferior, porque, para isso, elas teriam de ocorrer simultaneamente. Entretanto, muitas vezes a prova de carga convencional também não é levada até a ruptura. Dependendo de qual trecho da estaca romper durante o ensaio bidirecional, obtêm-se, diretamente, o atrito lateral último, ou a resistência de ponta última.

Para cada pressão aplicada pela expancell, os trechos

I

(fuste) e

II

(ponta fictícia) da estaca reagem um contra o outro, mantendo o equilíbrio das forças pelo princípio de ação-reação. Quando ocorre a ruptura geotécnica de algum dos dois trechos, os respectivos deflectômetros "disparam" (SILVA, 1983), ou seja, o trecho rompido apresenta aumento do deslocamento brusco e ininterrupto. O manômetro mantém-se constante e não é mais possível aplicar incrementos, uma vez que a carga não se sustenta devido à falta de reação do elemento rompido. Este comportamento caracteriza o final do carregamento do ensaio.

Considera-se que a interrupção prematura do ensaio bidirecional é mais problemática quando o deslocamento registrado do trecho que não rompeu é mínimo, da ordem de décimo de milímetro a milímetro, e a curva carga-recalque resulta aproximadamente linear (comportamento linear-elástico), indicando que a resistência geotécnica praticamente não foi mobilizada. Com base em Décourt (2016), a mobilização plena do atrito lateral durante a prova de carga, para carga aplicada no topo, ocorre para um deslocamento no topo da ordem de grandeza do encurtamento elástico da estaca mais alguns poucos milímetros, sendo esta última parcela referente ao quake do fuste. No caso do ensaio bidirecional, como a carga aplicada tem sentido oposto e é de baixo para cima, entende-se que a plena mobilização do atrito lateral se daria para deslocamento no topo referente apenas ao quake do fuste. Para a total mobilização da resistência de ponta, o autor sugere o deslocamento de 10% do diâmetro, que corresponde à ruptura convencional.

Deve-se buscar instalar a expancell na posição ideal de equilíbrio para as cargas a serem aplicadas no ensaio, “de modo a romper sucessivamente a base o fuste do elemento testado” (SILVA, 1983).

Para a definição da posição da expancell em estacas escavadas, deve-se buscar o esgotamento total do atrito lateral do trecho acima (trecho

I

), pois a NBR 6122 (ABNT, 2010) limita a carga de ponta: "no máximo 20 % da carga admissível pode ser suportada pela ponta da estaca". Entretanto, no ensaio bidirecional, como a carga é aplicada em profundidade, é inevitável que a ponta seja solicitada com cargas acima deste valor, antes da mobilização do trecho

I

.

Silva (1983) e Osterberg (1998) comentam que o esgotamento da resistência de ponta em estacas escavadas é devido muitas vezes à presença de material amolgado sob a ponta, em função do processo executivo. Observa-se que esta anomalia muitas vezes não seria detectada por provas de carga convencionais, sendo uma vantagem do ensaio bidirecional, como foi mencionado acima. Para mitigação deste problema, deve ser feita a adequada limpeza de ponta, conforme preconizado na NBR 6122 (ABNT, 2010).

A interrupção prematura do ensaio também pode ocorrer devido a problemas de concretagem da estaca, devido às dificuldades apontadas no Item 2.3.2 – "Metodologia Executiva", deixando vazios no entorno da expancell, que levarão a grandes deslocamentos sob pequenas cargas. Uma alternativa para tentar mitigar este problema seria a concretagem prévia sob o prato inferior da expancell, em formato cônico, conforme indicado na Figura 2.20.

Durante um ensaio bidirecional, para a carga de um mesmo estágio, podem ser observados deslocamentos muito maiores em um trecho, em relação ao outro. Mesmo que a carga máxima prevista para o ensaio seja atingida, esse comportamento pode dificultar a obtenção da curva carga-recalque equivalente para o topo da estaca, porque será necessário extrapolar a curva referente ao trecho menos mobilizado. Uma alternativa a esta dificuldade é dada pela norma americana D8169/ D8169M (ASTM, 2018), sugerindo que se especifique uma carga máxima de ensaio (correspondente a, aproximadamente, o dobro da carga a ser aplicada na expancell), maior que a carga máxima equivalente desejada.

A execução do ensaio bidirecional com uso de expancells em dois níveis diferentes pode contornar este problema (OSTERBERG, 1998); entretanto, há elevado custo associado.

Caso os cuidados apontados acima não tenham sido tomados, ocorrendo a interrupção prematura do ensaio, face ao esgotamento quer do atrito lateral, quer da

resistência de ponta, deve ser feita, sempre que possível, a extrapolação da curva carga-recalque do trecho não rompido. Sugere-se que a curva seja limitada por valores obtidos através de métodos semiempíricos adequados ao tipo de estaca e local, como os de Aoki e Velloso (1975) e Décourt e Quaresma (1978). Entretanto, quando os deslocamentos forem mínimos, por exemplo, menores que 1 mm, mantendo-se no trecho elástico e não indicando o comportamento da curva carga- recalque, não se recomenda a extrapolação dos valores.

Para a extrapolação dos dados, Fellenius (2014a) apresenta o uso da Ration Function e de funções hiperbólicas. Através dos estudos de casos desenvolvidos durante a pesquisa realizada, sugere-se a extrapolação através do modelo hiperbólico (Eq. 54a ou 54b) ou de Cambefort (1964), neste caso eventualmente para a ponta de estacas escavadas (Eq. 55).

No caso de modelos hiperbólicos, a carga de ruptura do trecho não rompido durante o ensaio pode ser obtida utilizando-se o Método de Chin (1970, 1971), desde que limitada por valores obtidos através de métodos semiempíricos, conforme citado anteriormente.

A D8169/ D8169M (ASTM, 2018) preconiza que a curva equivalente deve ser limitada pelo menor valor medido de deslocamento, para o trecho superior ou inferior à expancell. Entretanto, como será explicado no Item 2.3.7 – "Métodos de Interpretação – Curva Equivalente", para a obtenção da curva equivalente, os deslocamentos medidos devem ser corrigidos em função da compressibilidade da estaca, resultando em valores maiores. Assim, a restrição da norma americana só é cabível quando se adota a hipótese de estaca infinitamente rígida, como no "método tradicional".

Para a hipótese de estaca compressível, recomenda-se indicar, na curva equivalente estimada para carregamento no topo, os marcos de extrapolação das cargas e deslocamentos lidos no ensaio bidirecional, corrigidos para aplicação de carga no topo, conforme segue:

 Indicar a carga máxima atingida no ensaio, que corresponde, aproximadamente, a

2P

cell, onde

P

cell é a carga axial aplicada pela

expancell;

 Se a curva do fuste foi extrapolada, indicar o ponto (

y

o;

P

o) de início da

da Eq. 70 de Massad (2015), adotando-se

y'

p igual ao máximo

deslocamento lido no topo da estaca durante o ensaio;

 Analogamente, se a curva da ponta foi extrapolada, indicar o ponto (

y

o;

P

o) de início da extrapolação. O deslocamento

y

o pode ser obtido a partir

de

y'

p, através da Eq. 70 de Massad (2015), adotando-se

y'

p igual ao

máximo deslocamento lido no trecho da ponta durante o ensaio.

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