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Introdução ao Mercado de Concorrência Perfeita

Enquadramento Teórico

Façamos um ponto da situação da matéria desenvolvida até agora, de modo a enquadrar os capítulos que se seguem nesta primeira parte: nos capítulos 2, 3, 4 e 5 estudámos os conceitos fundamentais da teoria económica (bens, serviços, preços, moeda) e os mecanismos básicos a eles associados (produção, consumo e troca); no capítulo anterior precisámos o conceito de mercado, introduzido aquando do estudo

da troca, e estudámos as hipóteses gerais a ele associadas.

Neste capítulo daremos início ao estudo de um tipo de estrutura de mercado muito especial que dá

pelo nome de concorrência perfeita. Este estudo será feito no contexto de uma especialização total dos

agentes económicos envolvidos (vendedores e compradores)93 e será complementado nos capítulos 8 com

a fundamentação teórica do comportamento dos vendedores neste tipo de mercados e 9 com o estudo dos mercados de factores, também em concorrência perfeita. Por oposição, estudaremos no capítulo 10, e para fechar esta primeira parte, uma das inúmeras estruturas de mercado que existem para além da

concorrência perfeita: o monopólio.

1. Conceitos introdutórios

Antes de mais, convém recordar ao leitor que o estudo dos mercados de concorrência perfeita não se deve ao realismo da aplicação das suas hipóteses aos mercados reais, mas a duas razões fundamentais:

1. facilidade de análise que possibilita a introdução de instrumentos de análise que servirão para

outros tipos de mercado mais complexos;

2. utilização como ponto de referência94, ou de partida, para o estudo desses outros tipos de

mercado.

Hipóteses básicas do mercado de concorrência perfeita:

1. Informação perfeita: existe um mercado de fluxos onde a informação é perfeita, ou seja,

qualquer agente conhece as transacções efectivas e potenciais nesse mercado, bem como o facto de que qualquer outro agente presente no mercado dispor exactamente da mesma informação e obtida sem custos;

2. Separabilidade: existem dois tipos de agentes independentes, os vendedores e os compradores,

ou seja, todos os agentes tomaram uma opção de especialização que não lhes permite vir a ter o outro papel;

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3. Homogeneidade: o bem95 X, transaccionado neste mercado, é homogéneo, ou seja, os agentes

no mercado não reconhecem diferenças físicas nas diversas unidades transaccionadas no mercado e, para um comprador (vendedor) é irrelevante comprar (vender) a um determinado vendedor (comprador) ou a qualquer outro;

4. Racionalidade: o comprador quer comprar o mais barato e o vendedor quer vender o mais caro possível;

5. Análise em equilíbrio parcial: tudo o que se passa fora do mercado do bem X é considerado constante, hipótese também conhecida como ceteris paribus;

6. Atomicidade: existem muitos e pequenos compradores e vendedores, ou dito de outra forma,

cada agente, actuando individualmente, tem um peso tão insignificante no mercado que as suas decisões de compra, venda, entrada ou saída do mercado não afectam de forma visível os preços e quantidades trocadas.

Consequências das hipóteses:

Hipóteses necessárias Conclusões

1, 2 e 3 Existe um mercado de um único bem, o bem X.

1, 2, 3, 4 e 5 O preço observado é único.

• Comportamento de Price Taker: situação em que um agente, dada a estrutura de mercado vigente,

actua tomando o preço observado no mercado como um dado.

Neste modelo de mercado que aqui apresentamos, e devido às hipótese (de 1 a 6) que atrás apresentámos, todos os agentes actuam como price takers, isto é, consideram o preço de mercado como

um dado para o seu comportamento individual96.

2. O comportamento do consumidor individual

Antes de iniciarmos o estudo deste tipo de comportamento, introduzamos alguns conceitos a ele associados. Para este efeito, admitamos que existem m compradores (efectivos e potenciais) do bem X no mercado. Utilizaremos o índice inferior i para identificar destes agentes.

Função de Utilidade (do comprador i): expressão matemática que nos dá o grau de satisfação

usufruída (pelo comprador i) resultante da utilização de um conjunto de bens e serviços (por esse mesmo indivíduo) - expressa em utis de i/u.t97.

Admite-se, de acordo com a hipótese da racionalidade, tal como ela foi definida no capítulo anterior e cuja consequência próxima é a hipótese 4 neste modelo, que cada consumidor pretende maximizar o

seu nível de utilidade, dados os seus gostos, rendimento, expectativas em relação ao futuro, etc. O

reflexo deste comportamento neste mercado será dado pela:

Função de Procura Individual (do comprador i): expressão matemática que nos dá as intenções de

aquisição de bem X (pelo comprador i), dados os valores das variáveis que as influenciam - expressa em u.f. X/u.t.

Em geral esta função será dada por:

onde qid representa as intenções de aquisição de bem X pelo comprador i - expressas em u.f. X/u.t. -, p o preço observado para esse bem - expresso em u.m./u.f. X -, p− X é o vector dos preços dos outros bens - em que cada um é expresso em u.m./u.f. bem -, RDi é o rendimento do agente i disponível para ser gasto em consumo - expresso em u.m./u.t. - e Eip é o vector das expectativas quanto aos valores futuros do preço do bem X - em que cada uma é expressa em u.m./u.f. X.

Tomando a hipótese 5, vamos considerar que todas as variáveis cujo valor é determinado fora do mercado, α =

d

pX,RDi,Eip, ...

i

, têm valores constantes. Assim, podemos reduzir a expressão que nos dá a função de procura individual do bem X a:

qid=q pid

a f

cujas principais propriedades são:

1. a partir de um certo preço muito elevado, pi, o comprador i não deseja adquirir qualquer

quantidade do bem X, ou seja, para p p i qid = 0 ;

2. para um preço nulo (se X é um bem livre), o comprador i não deseja consumir mais do que uma

quantidade qi, ou seja, para p qid q i

=0 ⇒ = ;

3. para um preço 0< <p pi, a função de procura é decrescente, ou seja, dq

dp p p p

id

i

a f

<0 ⇐ < <0 .

[Interpretação: quando aumenta infinitesimalmente o preço observado no mercado do bem X,

regista-se uma diminuição nas intenções de aquisição do mesmo bem.]

3. O comportamento do conjunto dos consumidores

Função de Procura de Mercado: expressão matemática que nos dá as intenções totais de aquisição

de bem X, dado o preço vigente no mercado - expressa em u.f. X/u.t. Esta função será dada pela soma das intenções de aquisição para cada preço:

Q pd q pid i m

a f

=

a f

=

1 .

Note-se que, não havendo intenções de aquisição negativas, a função de procura de mercado mantém as propriedades fundamentais das funções de procura individuais.

Função de Despesa: expressão matemática que nos dá as intenções totais de despesa na aquisição de

bem X, dado o preço vigente no mercado - expressa em u.m./u.t. Esta função será dada pelo produto da quantidade procura pelo preço:

D p

a f

= .p Q pd

a f

.

cujas principais propriedades são:

1. para preços do bem X iguais ou superiores a p= max

l

p1, ..., , ...,pi pm

q

, as intenções de despesa em bem X são nulas, pois as intenções totais de aquisição são nulas, ou seja, para p p≥ fi = 0 ; D

2. quando o preço do bem X é nulo, as intenções de despesa são nulas, ou seja, para

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3. pelo teorema de Rolle, sabemos que existe um preço 0£p∑£p para o qual a despesa tem um

valor máximo98.

Elasticidade Procura-Preço: expressão matemática que nos dá a variação percentual nas intenções

de aquisição de bem X resultantes de uma variação de um por cento no preço de mercado - não tem unidades. A função que nos dá esta elasticidade é dada por:

η p Q p Q p p p dQ p dp p Q p p d d d d

a f

=

a fa f

=

a f

a f

→ lim . ∆ ∆ ∆ 0 .

Existe uma relação próxima entre a função de despesa e a elasticidade procura-preço que é dada por: dD p dp d dp p Q p p dQ p dp Q p Q p p d d d d

a f

= .

a f

= .

a f

+

a f

=

a f a f

.η +1 e de onde podemos concluir que:

Preço Procura Elasticidade Despesa

p p> Qd= 0 h= ¤0 h =0 A despesa é nula.

p p= Qd= 0 não está definida A despesa é nula.

p< < p p Qd =Q pd

a f

h< - ¤ >1 h 1 A função de despesa é decrescente.

p=pQd =Q pd

d i

h= - ¤1 h =1 A despesa é máxima.

0< <p p Qd =Q pd

a f

h> - ¤ <1 h 1 A função de despesa é crescente.

p= 0 Qd q i i m = =

1

não está definida A despesa é nula.

4. O comportamento dos produtores

O comportamento do produtor individual em concorrência perfeita será devidamente fundamentado no capítulo 8. No entanto, e tendo em vista a análise do equilíbrio de mercado, podemos adiantar que, para cada um dos r vendedores do bem X:

Função de Oferta Individual (do vendedor k): expressão matemática que nos dá as intenções de

fornecimento de bem X (pelo vendedor k) que dependem do preço observado no mercado - expressa em u.f. X/u.t.

qks q p

ks

=

a f

e cujas principais propriedades são:

1. até um certo preço muito baixo, p

k, o vendedor k não deseja fornecer qualquer quantidade do bem X, ou seja, para p p< kqks = 0;

2. para um preço p p> , a função de oferta é crescente, ou seja k dq

dp p p p

ks

k

a f

>0 ⇐ > .

[Interpretação: quando aumenta infinitesimalmente o preço observado no mercado do bem X,

Função de Oferta de Mercado: expressão matemática que nos dá as intenções totais de fornecimento

de bem X, dado o preço vigente no mercado - expressa em u.f. X/u.t. Esta função será dada pela soma

das intenções de fornecimento para cada preço:

Q ps q pks k r

a f

=

a f

=

1 .

Note-se que, não havendo intenções de fornecimento negativas, a função de oferta de mercado mantém as propriedades fundamentais das funções de oferta individuais.

5. O equilíbrio no mercado

• Equilíbrio do Mercado: situação em que todos os agentes presentes no mercado vêem satisfeitas as

suas intenções individuais, dados os valores das variáveis que estão fora do seu controlo.99

Tomando este conceito de equilíbrio, apenas existirá um preço de mercado p* - o preço de

equilíbrio - que satisfaz, simultaneamente, as intenções de todos os agentes no mercado.

Matematicamente esse preço será dado pelo valor que satisfaz a equação: Q pd

a f a f

=Q ps

e graficamente a situação será representada por100:

0 s Q (p) (u.f. /u.t.)X Q ,Qd Q* p* p (u.m./u.f. )X d Q (p)s p p E ,

onde as coordenadas do ponto E nos dão os valores de equilíbrio para o preço e quantidade

transaccionada do bem nesse esquilíbrio.

Secção 1 - O Comportamento dos Consumidores

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