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Neste capítulo será feita a análise das decisões sobre " ​fake news​" na Justiça Eleitoral. Apesar da ocorrência da desinformação se ultimar em diversos contextos, o trabalho foi direcionado para o contexto eleitoral para fins de delimitação do escopo com o intuito de aprofundar as averiguações das fundamentações jurídicas utilizadas e suas relações com os princípios constitucionais correlatos.

É mister, primordialmente, tratar sobre a organização da Justiça Eleitoral (JE) e sua competência. A JE possui como órgãos os Juízes Eleitorais, as Juntas Eleitorais, os Tribunais Regionais e o Tribunal Superior Eleitoral. Cabe a este expedir instruções para a fiel execução das Eleições (parágrafo único, do art. 1º, da lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral), que o faz por meio de Resoluções e Súmulas (art. 23, IX e XV, do Código Eleitoral), bem como "responder, sobre matéria eleitoral, às consultas que lhe forem feitas em tese por autoridade com jurisdição, federal ou órgão nacional de partido político" (art. 23, XII, do Código Eleitoral).

Quanto à competência do TSE, em se tratando de " ​fake news​" durante as eleições, atua de forma originária sobre as Representações Eleitorais por Propaganda Irregular nas Eleições Presidenciais e de forma recursal sobre os Recursos Especiais53 Eleitorais - RESPE 54 das decisões dos Tribunais Regionais embargadas, sendo, inclusive, irrecorríveis suas decisões, parágrafo único, do art. 22, salvo art. 281, ambos do Código Eleitoral, e art. 19 da Resolução TSE nº 23.478/2016, in verbis:

“as decisões interlocutórias ou sem caráter definitivo proferidas nos feitos eleitorais são irrecorríveis de imediato por não estarem sujeitas a preclusão, ficando os eventuais inconformismos para posterior manifestação em recurso contra a decisão definitiva de mérito”.

53 ALVIM, Frederico Alvim. Curso de Direito Eleitoral. 2a. Ed. Curitiba: Juruá, 2016, p. 479. 54 ALVIM, Frederico Alvim. Curso de Direito Eleitoral. 2a. Ed. Curitiba: Juruá, 2016, p. 610.

Não obstante, como instância superior, analisa matéria de direito, em tese, e não matéria fática. ​In Verbis​:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NA INTERNET. PESSOA JURÍDICA. ART. 57–C, § 1º, I, DA LEI Nº 9.504/97. PROCEDÊNCIA. INOVAÇÃO DE TESE. RECURSO ELEITORAL NÃO CONHECIDO. ARTS. 5º, IV, IX, XIV, e 220 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 72/TSE. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 24/TSE. REITERAÇÃO DE ARGUMENTOS. SÚMULA Nº 26/TSE. DESPROVIMENTO.

1. A matéria relativa aos arts. 5º, IV, IX, XIV, e 220 da Constituição Federal, tidos como violados, não foi devidamente prequestionada – sequer se apontou, nas razões do recurso especial, omissão no acórdão regional em violação ao art. 275 do Código Eleitoral –, o que atrai a incidência da Súmula nº 72/TSE.

2. O TRE/SP, instância exauriente na análise do acervo fático–probatório dos autos, a despeito de entender pela impossibilidade de conhecimento do recurso eleitoral, concluiu que o ora agravante não comprovou exercer atividade de jornalismo e que a mensagem veiculada pela pessoa jurídica O Jacaré de Tanga Propaganda e Marketing – EIRELI na internet – sem propósito informativo e jornalístico – configurou propaganda eleitoral.

3. Rediscutir tal entendimento exigiria o revolvimento de matéria fático–probatória, o que é inadmissível nesta instância especial (Súmula no 24/TSE).

4. Na linha da remansosa jurisprudência desta Corte Superior, ​“a simples reiteração de argumentos já analisados na decisão agravada e o reforço de alguns pontos, sem que haja no agravo regimental qualquer elemento novo apto a infirmá–la, atraem a incidência do Enunciado da Súmula nº 26 do TSE” (AgR–REspe nº 1669–13/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 27.10.2016).

5. Agravo regimental desprovido.

(AgR–AI 0608965–56, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 26.3.2019.)

Ademais, a atuação recursal do TSE em relação a conteúdo divulgado na internet55 se realiza durante o período de propaganda eleitoral, pois, decorrido esse prazo, acarreta, segundo a jurisprudência, perda superveniente do objeto processual

55 Ac.-TSE, de 4.12.2018, no REspe nº 1011: essa permissão está restrita à propaganda realizada pela

extinguindo o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC/2015. ​In Verbis​: 

ELEIÇÕES 2018. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO.​FAKE NEWS. ​FACEBOOK. TWITTER. YOUTUBE. REMOÇÃO DE CONTEÚDO. LIMINAR. PERDA DA EFICÁCIA. DESPROVIMENTO. 1. Nos termos do art. 33,caput e § 1º, da Res.–TSE 23.551, a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático, a fim de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, limitando–se às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

2. Na linha da jurisprudência desta Corte, as ordens de remoção de propaganda irregular, como restrições ao direito à liberdade de expressão, somente se legitimam quando visam à preservação da higidez do processo eleitoral, à igualdade de chances entre candidatos e à proteção da honra e da imagem dos envolvidos na disputa. Assim, eventual ofensa à honra, sem repercussão eleitoral, deve ser apurada pelos meios próprios perante a Justiça Comum.

3.Ultimado o período de propaganda eleitoral, a competência para a remoção de conteúdos da internet passa a ser da Justiça Comum, deixando as ordens judiciais proferidas por este Tribunal de produzir efeitos, nos termos do § 6º do art. 33 da Res.–TSE 23.551.

Recurso a que se nega provimento.

(Recurso na Representação 0601765–21, rel. Min. Admar Gonzaga, julgado em 2.4.2019.)

Como legislação aplicável nas decisões analisadas, além da própria lei nº 4.737/1965 (Código Eleitoral), estão: a lei nº 9.504/1997, de 30 de Setembro de 1997 (Lei das Eleições); a Resolução TSE nº 23.551, de 18 de dezembro de 2017, que dispõe sobre propaganda eleitoral, utilização e geração do horário gratuito e condutas ilícitas em campanha eleitoral nas eleições; as Súmulas TSE nº 24, 26 e 72 sobre requisitos processuais; a lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, que trata da reclamação de abuso de autoridade por meio da Ação de Investigação Judicial Eleitoral (art. 22, da LC nº64/90 c/c art. 74, da lei nº 4.737/1965); Resolução TSE nº 23.547, de 18 de dezembro de 2017, que dispõe sobre representações, reclamações e pedidos de resposta previstos na ​Lei nº 9.504/1997 para as eleições; Lei n° 12.965/2014 (Marco

Civil da Internet), que, inclusive, dispõe sobre apuração judicial de autoria para a afirmação da existência de anonimato, ​in verbis​:

"§ 2o do art. 33 da Res.–TSE nº 23.551/2017 A ausência de identificação imediata do usuário responsável pela divulgação do conteúdo não constitui circunstância suficiente para o deferimento do pedido de remoção de conteúdo da internet e somente será considerada anônima caso não seja possível a identificação dos usuários após a adoção das providências previstas nos arts. 10 e 22 da Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet)."