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Introdução de maquinarias e a inovação tecnológica

Capítulo 3 – Organização, gestão e relações de trabalho: as atividades da operadora de

1. Introdução de maquinarias e a inovação tecnológica

Um dos primeiros aspectos a analisar quanto à gestão e à organização do processo de trabalho em ambos os segmentos é o papel da tecnologia para seus desenvolvimentos.

Marca do capitalismo, a inovação tecnológica e a incorporação de maquinarias se constituem em motores para o desenvolvimento produtivo. Segundo Marx (1984), o capitalismo tem como característica intrínseca a necessidade de constantemente criar e recriar as formas de exploração da força de trabalho. Para tanto, o aprimoramento dos mecanismos, da gestão e da organização do processo produtivo é fundamental, permitindo ao capitalista reduzir os custos de produção da mercadoria e obter a mais-valia106.

A inovação tecnológica possibilita aos detentores do capital simplificar e padronizar as tarefas, além de ampliar e intensificar, cada vez mais, seu controle sobre o

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Marx (1983) diferencia dois modos de extrair a mais-valia: um é a extração da mais-valia absoluta, a qual resulta do prolongamento da jornada de trabalho para além do necessário à produção da mercadoria; o outro é a extração da mais-valia relativa, que resulta da redução do tempo necessário, com mudanças no processo de trabalho que levam ao aumento da produtividade.

processo de trabalho. Braverman (1981) analisa, no que ele chama de revolução técnico- científica, o modo como a maquinaria e as tecnologias foram incorporadas na produção como forma de aumentar o controle do capitalista sobre ela. Segundo o autor, as diferentes inovações tecnológicas empregadas visavam eliminar o máximo possível o controle do trabalhador sobre a atividade e transferi-lo para um dispositivo, controlado, o máximo possível, pela gerência.

Todos esses aprimoramentos e o desenvolvimento de novas tecnologias revolucionaram o mundo do trabalho. Conforme indica Castells (1999), a revolução tecnológica da informação foi de extrema importância no processo de reestruturação produtiva do capitalismo desde os anos 1980.

Conforme as inovações tecnológicas e organizacionais foram permitindo que homens e mulheres aumentassem a produção de mercadorias com mais qualidade e menos esforço e recurso, o trabalho e os trabalhadores mudaram da produção direta para a indireta, do cultivo, extração e fabricação para o consumo de serviços e trabalho administrativo e de uma estreita gama de atividades econômicas para um universo profissional cada vez mais diverso (CASTELLS, 1999, p. 293).

Como vimos, o autor foi um dos pensadores que defendiam a ideia de que, cada vez mais, as novas tecnologias e os serviços de informação resultariam na liberação da sociedade do trabalho enquadrado, que seria substituído pelo trabalho criativo e emancipador. Entretanto, ao longo da História, a realidade mostrou-se outra. Ainda que tenham contribuído para o estabelecimento de empregos altamente qualificados, as novas tecnologias também possibilitaram a simplificação de tarefas, a substituição de trabalhadores pela maquinaria e a ampliação do submetimento de parte dos trabalhadores aos ditames operacionais, principalmente daqueles inseridos em trabalhos menos qualificados.

É nesse segundo campo que as duas atividades aqui analisadas se inserem. Nelas, o uso intensivo de serviços de informação e tecnológico permite às empresas padronizar e simplificar as atividades, intensificar o ritmo de trabalho, controlar o processo de trabalho e a interferência das trabalhadoras, além de reduzir os custos e otimizar a produção. Vejamos o caso de cada segmento:

No ramo de super/hipermercados, a introdução de novas tecnologias tem contribuído para reconfigurar a atividade da operadora de caixa, levando, principalmente, à intensificação do trabalho. Braverman (1981) assinala que a inovação

tecnológica do século XX possibilitou a mecanização do trabalho da operadora de caixa de supermercado, aproximando-o do da linha de montagem das indústrias.

Como dois exemplos, podemos citar a esteira rolante, que passou a impor novo ritmo ao trabalho, e o leitor óptico, que, a partir do escaneamento dos produtos, permitiu intensificar o trabalho (SOARES, 1998; PRUNIER-POULMAIRE, 2000). Para Sophie Bernard (2012), a introdução do escâner foi responsável por inserir esse trabalho na lógica da racionalização industrial, permitindo cadenciar e acelerar o ritmo, além de padronizar os movimentos.

Se esses dois componentes tecnológicos transformaram a atividade da operadora de caixa, intensificando o ritmo de trabalho, eles também alteraram o papel e a contribuição dos clientes na produção. Segundo Tiffon (2013), essa é uma particularidade do uso de tecnologias nos serviços: ela permite simplificar o trabalho de tal forma que parte da atividade pode ser externalizada ao cliente. A organização dos super/hipermercados a partir do princípio de self-service é exemplar quanto a essa lógica, uma vez que direciona ao cliente parte do trabalho realizado na venda de uma mercadoria.

Seguindo essa lógica, uma mudança atual vem sendo adotada nesse segmento: a automatização efetivada por meio da introdução de caixas automáticos em supermercados de países da Europa, por exemplo. Neles, os clientes são responsáveis por passar as mercadorias em uma máquina e fazer, nela, o pagamento da compra. Segundo Tiffon (2013), essa automatização promove a substituição do trabalhador não pela máquina, mas pelo cliente, o qual passa a fazer o trabalho de caixa. É preciso salientar, no entanto, que, na prática, isso não implicou a eliminação da figura das operadoras de caixa nos estabelecimentos. Ao contrário, o que ocorreu foi uma diversificação da tarefa e a intensificação do trabalho realizado por elas, as quais passaram a vigiar e a controlar o trabalho dos clientes, assegurando que estes realizem os procedimentos corretamente e não furtem os produtos, além de instruí-los e acolhê- los (BERNARD, 2012).

Esse tipo de automatização, que vem sendo aprimorado em países da Europa, mas ainda não tão disseminado no Brasil107, demonstra o interesse constante

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Essa automatização dos caixas (de autoatendimento) é encontrada em vários super/hipermercados em países da Europa e nos Estados Unidos, por exemplo. Bernard (2012) estudou sua implementação no caso francês. No Brasil, ainda são poucas as empresas a utilizar esse recurso. Ver, por exemplo, a experiência em Londrina (Disponível em: <http://gizmodo.uol.com.br/caixas-automaticos-de-supermercado-no-

das empresas em incorporar novas tecnologias que permitam simplificar o trabalho, aumentando a participação dos clientes e reduzindo o trabalho vivo necessário da operadora de caixa.

A incorporação dos serviços de informação também teve importantes desdobramentos sobre a organização do trabalho nesse segmento. Seu uso permite às empresas controlar, em tempo real, o número de caixas em atividade e o fluxo de clientes e de produtos e, assim, realizar os ajustes necessários para adequar a organização e o ritmo do trabalho à melhor fluidez.

“Porque assim, quando a gente abre o caixa, eles contam todos no sistema, a quantidade de caixas. E a gente também tem que verificar a quantidade de cliente por fila, para poder estar distribuindo esses clientes nos caixas que já estão abertos” (Carla, fiscal de frente de

caixa de hipermercado da empresa C, 3/3/2012).

Segundo Sophie Prunier-Poulmaire (2000), a informatização permitiu às empresas controlar a gestão dos estoques em tempo real, bem como conhecer precisamente o comportamento dos clientes – seus gostos, a periodicidade das compras e das vendas de produtos, os momentos de maior e menor afluência –, o que lhes propiciou melhor gestão e organização do trabalho nos estabelecimentos.

Do mesmo modo, a inovação tecnológica e os serviços de informação também foram responsáveis por transformar o setor de comunicação e de telefonia.

A expansão do segmento de teleatendimento, derivado do setor de telefonia, ocorreu ancorada no desenvolvimento tecnológico, que favoreceu o atendimento a distância de forma ampla, possibilitando, por sua vez, o deslocamento desse atendimento no espaço. O serviço prestado ao cliente deixou de ser necessariamente realizado pela e na empresa. Assim, no bojo do processo de terceirização, parte das empresas passou a contratar prestadoras de serviço de atendimento para seus clientes. Toda a dinâmica de desenvolvimento e expansão dos call centers no País esteve, assim, fortemente atrelada ao uso intensivo de novas tecnologias.

Os serviços de informação aplicados no teleatendimento possibilitam que as empresas controlem todo o processo de trabalho: o tempo de trabalho e o de não trabalho (as pausas, os descansos, as ausências), a produtividade, a qualidade e o

brasil/>. Acesso em: 12 fev. 2016) e em Belo Horizonte (Disponível em: <http://www.portalamis.org.br/?secao=noticias&id=1053>. Acesso em: 12 fev. 2016).

resultado, além de registrar todas as ligações (OLIVEIRA, 2009; WOLFF, 2009). A partir da obtenção de uma gama de dados fornecida por essas tecnologias, as gerências organizam o processo de trabalho de modo a garantir a melhor fluidez e a máxima produtividade. Assim, os serviços de informação aparecem, como indica Braga (2006a), como um impulso na direção da redução de custos das empresas.

Deste modo, a constante incorporação de novas tecnologias e o uso intensivo dos serviços de informação nos dois segmentos afetam a forma como o processo produtivo é organizado: eles possibilitam a simplificação das tarefas e a intensificação do trabalho, a substituição de parte do trabalho realizado pela trabalhadora por maquinarias, os deslocamentos no tempo e no espaço, a obtenção de uma série de informações que permitem às empresas ajustar o processo produtivo da maneira mais rentável possível, além do controle estrito sobre toda a atividade.

Esse forte controle marca ambas as atividades. A seguir, passaremos a analisar como opera a gestão pelo controle, possibilitada pelo desenvolvimento tecnológico.

2. Organização e gestão do trabalho: o forte controle