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2. A ORDEM DE SANTIAGO

2.3. Património e Visitações

2.3.2. Itinerário de Visitação

Na presente dissertação interessa também identificar os percursos realizados pelos visitadores da Ordem de Santiago para determinar eventuais coincidências com o percurso atualmente utilizado pelos peregrinos de Santiago de Compostela. Entende-se, à partida, que em cada uma das suas visitações, os visitadores da Ordem de Santiago tinham percursos estabelecidos para abranger todas as localidades integradas na sua jurisdição, as quais se situavam de oeste a este do Algarve. De forma geral, a zona central do Algarve seria percorrida pelos visitadores no sentido oeste-este-oeste, o que não corresponde, de um modo geral, ao traçado das vias de comunicação principais, que

50 Montante em dinheiro ou produtos que o foreiro paga anualmente ao senhorio pelo domínio útil

Dissertação de Mestrado – Marketing Turístico 39 ligavam as cidades algarvias diretamente com o resto de Portugal, ou seja no sentido sul-norte-sul. É natural, no entanto, que essas mesmas vias principais de comunicação, fossem utilizadas pelos visitadores na deslocação entre cidades, o que será o caso do corredor Faro – Loulé – Salir.

Quadro 1: Itinerário da Visita Pastoral de 1517/18

Data Início Data Termo Localidade Observações ?

06/12/1517

Saída de Palmela Faltam as primeiras quatro folhas desta ata, e não existe conhecimento de outra documentação que preencha esta lacuna

? Santiago do Cacém Inclui deslocação a Santo André, Melides e Corona

09/12/1517 ? Vila Nova de Milfontes

Inclui deslocação a cercal do Alentejo

12/12/1517 27/12/1517 Aljezur Inclui deslocação a Odeceixe 03/01/1518 10/01/1518 Loulé Inclui deslocação a Salir, Querença,

Boliqueime, Gorjões e Alte 10/01/1518 16/01/1518 Faro Inclui deslocação a Pechão, Nexe,

Estoi, São Brás de Alportel, São João da Venda e Quelfes

17/01/1518 25/01/1518 Tavira Inclui deslocação a Conceição de Tavira

25/01/1518 03/02/1518 Cacela

Castro Marim Alcoutim Martinlongo

Martinlongo foi visitada a 01/02/1518

05/02/1518 09/02/1518 Garvão Colos

Fonte: “Visitação da Ordem de Santiago ao Algarve 1517 – 1518” Al-‘ulyã nr 5, 1996

Segundo a ata da visitação de 1517/18, o itinerário recorrido foi circular, no sentido norte-sul ao longo da costa sudoeste de Portugal, entrando no Algarve por Aljezur e, de seguida, invertendo para este em direção às zonas de Loulé, Faro, Tavira e Castro Marim, de onde subiram ao Alentejo regressando a Palmela por Garvão e Colos. O

Dissertação de Mestrado – Marketing Turístico 40 itinerário encontra-se resumidamente apresentado no Quadro 151, considerado pela Dr.ª Luísa Martins52 como forma de logisticamente maximizar a viagem.

No entanto, os visitadores não teriam feito sempre o mesmo percurso. Para 1565, Martins e Cabanita (2001-2002) identificam como sequência cronológica das visitas um percurso que seguiu desde o sotavento para o barlavento algarvio, tendo os visitadores D. Pedro de Meneses - Comendador da Vila de Cacela - e João Fernandes Barregão - Prior em Alcácer do Sal, prosseguido com as visitas de Faro para Loulé, e daí em direção a Aljezur, de onde subiram pela costa no regresso a Alcácer do Sal.

Na I Jornada sobre as Vias do Algarve da Época Romana à Actualidade, realizada em São Brás de Alportel, em 2006, Luís Filipe Oliveira apresentou o seu estudo “Caminhos da Terra e do Mar no Algarve Medieval”, através do qual procurou conhecer o traçado das vias medievais do Algarve nos seus principais eixos inter-regionais de comunicação e concluiu que, se conhecem duas ligações ao Alentejo: “a que vinha de Aljustrel em direção ao castelo de Paderne, passando a serra por Ourique, e a que saía de Beja para Faro, com trânsito por Almodôvar, Salir e Loulé” (Oliveira, 2006:33). Esta última corresponde provavelmente a uma antiga via romana que esteve em uso até finais do período medieval, e que mereceu a construção de duas pontes no séc. XV – na Aldeia de Ator, e perto de Almodôvar, pois “nas restantes vias as ribeiras passavam-se a vau, quando o caudal o permitia”.

Ainda que os troços calcetados fossem raros na estrada de Loulé para Portugal, e que as condições de trânsito no inverno se degradassem, esta terá sido, segundo o mesmo autor, a via escolhida por Afonso III para levar a hoste régia até Faro, bem como pelos reis D. Dinis e D. Afonso IV nas únicas ocasiões em que visitaram Faro.

Do Algarve Oriental existe notícia de uma ligação de Tavira para Portugal, passando por Martinlongo, que terá sido utilizada por D. João I em direção a Évora após a conquista de Ceuta em 1415, e por D. Pedro I no seu trajeto entre Tavira e Beja no séc. XIV.

51 “Visitação da Ordem de Santiago ao Algarve 1517 – 1518” al-‘ulyã nr 5 1996

52 Entrevista exploratória realizada com a Drª Luísa Martins da Câmara Municipal de Loulé, em 20

Dissertação de Mestrado – Marketing Turístico 41 Já a oeste, conhece-se uma outra via que ligava Silves a Beja, segundo o itinerário seguido pelo rei D. Dinis em outra visita ao Algarve. Mais tarde, com a viagem de Pedro I e de documentação posterior, comprova-se a existência da ligação entre Beja e Lagos. E a sugestão de Oliveira (2006) é que do atual Porto de Lagos, saísse um caminho para Monchique, em direção a Garvão e Alcácer do Sal, possivelmente sobre uma antiga via islâmica.

Mas as estradas não suportavam muito tráfego, e os utentes mais assíduos seriam almocreves, mercadores e pastores. O supramencionado autor refere a realização de feiras importantes em Ourique, Almodôvar e Castro Verde, que atraíram muitos algarvios53. De forma geral, se valorizavam as deslocações feitas por mar e rio, que eram mais baratas e mais cómodas e que contavam com os dinâmicos portos de Aljezur, Lagos, Silves, Porches, Faro, Tavira e Cacela, os quais continuaram a comercializar com Andaluzia e norte de Europa mesmo após a anexação do Algarve ao território da coroa portuguesa, e viram ainda o seu movimento acrescido com a “comparticipação do Algarve nas rotas mediterrânicas desde finais do século XIV, sobretudo com as conquistas em África e as navegações atlânticas”, abençoadas aos olhos dos monarcas portugueses por São Vicente.

Moreno (1986) refere que estes portos algarvios eram também portas abertas à peregrinação a Santiago de Compostela para gentes que aqui chegavam por mar. Desde aqui dispunham de acesso marítimo ao resto do país, bem como, se desejassem seguir por terra, ligação às principais vias de comunicação por terra supramencionadas (Lagos, Faro e Tavira) e que correspondem às vias indicadas nos mapas dos Caminhos de Santiago difundidos, ainda hoje, pela Oficina del Peregrino em Santiago de Compostela através da Credencial do Peregrino54.

53 Segundo Oliveira (2006) não eram raros os moradores de Faro e de Loulé que tinham

propriedades em Almodôvar.

54 Moreno refere que não existe um inventário sobre o conjunto dos hospitais e albergarias de

peregrinos em Portugal na Idade Média, mas baseia-se num estudo da Prof.ª Iria Gonçalves sobre o estudo das estalagens existentes em Portugal nos séc. XIV e XV, para afirmar a existência de duas estalagens em Lagos, uma em Loulé e outra em Faro, e três estalagens em Tavira, que acolhiam viajantes, entre eles peregrinos.

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