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2 ORDENAÇÃO DE DOCUMENTOS: NOÇÕES ELEMENTARES

3.1 ORDENAR PARA CONSERVAR E DISPONIBILIZAR: A TÔNICA FRANCESA

3.2.1 Jacob Schwartz

Jacob Schwartz publicou um artigo no Library Journal, de 1878, no qual apresentava as bases do esquema de ordenação que ele havia elaborado em 1871 e que estava em uso na

New York Apprentices Library desde o ano de 1872. Denominado “Combined System”, o esquema de Schwartz visava mesclar as características dos três métodos que o próprio autor identificava como sendo basilares para a ordenação de documentos, denomiando-os: numérico; alfabético e sistemático ou classificatório (SCHWARTZ, 1878, p. 6). Schwartz afirmava que cada um destes métodos poderia ser usado individual ou conjuntamente, como ocorria, por exemplo, em bibliotecas nas quais os sistemas de localização fixa combinavam grandes classes temáticas com a numeração sequencial dos livros incorporados à coleção; em bibliotecas que ordenavam os livros com base em arranjos puramente alfabéticos ou, ainda, naquelas que associavam a ordenação em amplas classes temáticas com a ordenação alfabética por autores dentro destas classes. Schwartz argumentava (1878, p. 6) que a despeito das várias combinações possíveis, até aquele momento ninguém havia combinado os métodos alfabético, numérico e sistemático, embora esta fosse a única possibilidade de construção de um sistema perfeito.

Diante desta constatação, o autor passava a apresentar seu esquema cuja denominação visava explicitar a combinação das características essenciais de cada um dos três métodos: 25 letras maiúsculas do alfabeto (A-Z, excetuando-se o J) representavam as classes principais alfabeticamente ordenadas a partir do nome que recebiam, os números de 1 a 9 faziam a primeira subdivisão das classes principais, mantendo também para as subclasses a ordenação alfabética de seus assuntos representada em sequência numérica e, se necessário, as letras do alfabeto poderiam ser pospostas aos números a fim de criar novas subdivisões.

As subclasses não são apenas organizadas em ordem alfabética, mas

alfabético-numericamente; isto é, cada número é utilizado para, e associado

com, um grupo particular de letras. Assim, assuntos que começam com letras A e B são sempre numerados 1. O número 2 representa Br até C, 3 corresponde de D até F, 4 para G e H, 5 de I até L, 6 para M e N, 7 para O até R, 8 para S, e 9 de U até Z81 (SCHWARTZ, 1882a, p. 84, tradução nossa).

Para o autor,

O sistema alfabético classificado apodera-se do pensamento central da classificação - grupos de assuntos - e ordena-os de forma que proporciona uma chave para sua ordem, e isso é tudo o que deveria ser exigido de qualquer esquema destinado, não para especialistas, mas para os leitores de todas as classes82 (SCHWARTZ, 1882b, p. 229, tradução nossa).

Em cada nível do esquema classificatório os livros poderiam ser divididos de acordo com seu tamanho e, em cada um desses agrupamentos por tamanho, eles seriam ordenados alfabeticamente de acordo com o sobrenome dos autores. A ordenação dentro das classes era conseguida a partir da divisão de uma sequência numérica de 1.000 números (0 a 999) em quatro diferentes agrupamentos a depender do tamanho do livro e, dentro dos quais as iniciais dos sobrenomes eram convertidas em notações numéricas, que Schwartz (1878, p. 7) denominava número do author (author number). Com isto, simultaneamente, obtinha-se a ordenação conforme o tamanho e a autoria dos livros.

Por ser o tamanho mais comum, o que resultaria em grande número de livros dentro do agrupamento, os autores de livros publicados como duodécimos (D) compreendiam o maior

81 "The subclasses are not only arranged alphabetically, but alphabetico-numerically; that is, each number is used

for, and associated with, a particular group of letters. Thus subjects beginning with letters A and B are always numbered 1. No. 2 represents Br to C, 3 is for D to F, 4 for G and H, 5 for I to L, 6 for M and N, 7 for O to R, 8 for S, and 9 for U to Z" (SCHWARTZ, 1882a, p. 84).

82 "The alphabetic classed system seizes upon the central thought of classification - groups of subjects - and

arranges them in a way that affords a ready key to their order, and this is all that ought to be required of any scheme intended, not for specialists, but for readers of all classes" (SCHWARTZ, 1882b, p. 229).

intervalo numérico, de 0 e 499; os octavos (O), menos comuns entre 500 e 799; ainda menos frequentes e, por isso, com intervalos menores, os quartos (Q) entre 800 e 899 e os folios (F) entre 900 e 999. Dentro de cada uma das quatro seções, iniciais comuns a sobrenomes eram distribuídas alfabeticamente, o que resultava na seguinte repartição para a composição do número do autor:

Quadro 2 - Extratos da Tabela de Schwartz, de 1878

Tamanho e respectivo intervalo numérico Iniciais do sobrenome do autor 0-499 D 500-799 O 800-899 Q 900-999 F Aa... 0 500 800 900 Ac... 2 501 '' '' Ad... 3 502 '' '' Ai... 5 '' 801 901 Kir... 245 647 849 949 Kla... 246 648 850 950 Kna... 248 649 '' '' Wor... 490 794 897 997 Za... 498 799 '' '' Fonte: Schwartz (1878, p. 7-8).

Os números de autor, embora integrais, por serem atribuídos com base na ordem alfabética, permitiam a interpolação de novos itens e refletiam a ordenação alfabética pretendida. Embora considerasse que a opção da ordenação dos livros dentro das classes poderia ocorrer pela ordem de entrada dos itens, Schwartz afirmava que esta solução era essencialmente arbitrária, pois acidental e destituída de explicação (SCHWARTZ, 1882c, p. 149). Para o autor, "como o assunto tratado determina o lugar de cada livro no esquema de classificação, seria mais lógico e coerente ter o número condicionado por algo no próprio livro"83 (SCHWARTZ, 1882c, p. 150, tradução nossa). Daí sua escolha pela conjugação entre tamanho e autoria.

Schwartz compreendia que sem a junção com os outros elementos seu esquema de classificação biliográfica poderia ser empregado para a elaboração de sistemas de localização fixa, ou absoluta (absolute location), como ele mesmo denominava. Para tanto, segundo o autor, bastava dividir o mobiliário de acordo com a estrutura de classes e subclasses e definir, para cada subclasse, um intervalo numérico para certo número de prateleiras que comportassem os livros incorporados à coleção (SCHWARTZ, 1879, p. 5). Contudo, não

83 "As the subject treated of determines the place of each book in a scheme of classification, it would be more

logical and consistent to have the number conditioned by something in the book itself" (SCHWARTZ, 1882c, p. 150).

seria este seu uso mais significativo, já que Schwartz estava em busca de um sistema para localização relativa dos documentos. Para o autor, a definição de um sistema de localização relativa se fazia pela soma de um esquema de classificação bibliográfica com outros atributos, relacionados aos documentos a serem ordenados, que orientassem os modos de se proceder a disposição destes documentos dentro das classes, colocando-os em relação a eles mesmos, não ao mobiliário que os abrigava.

Em artigo de 1882, também no Library Journal, além de defender o sistema proposto em 1871, com pequenos aperfeiçoamentos, Schwartz explicitava aquilo que ele considerava suas maiores virtudes: ser mnemônico e objetivo. A mnemonia era, segundo o autor, fruto do arranjo alfabético dos nomes das classes que também correspondiam à sua notação e, com isso, poderiam ser plenamente reconhecidas. A objetividade, por sua vez, configurava-se pois a ordem das classes seria definida não pela mente do elaborador do esquema, mas condicionada por sua ordem alfabética, um critério externo e, portanto, segundo o autor, objetivo (SCHWARTZ, 1882c, p. 149).

Neste texto, Schwartz (1882c) publicou uma nova tabela alfabética para atribuição do número de autor, ressaltando que, diferentemente da proposta anterior, nesta tabela os números deveriam ser atribuídos levando-se em conta a abundância ou escassez de itens dentro de uma classe e que as divisões por tamanho, outrora consideradas indispensáveis, não eram fundamentais ao bom funcionamento do esquema (SCHWARTZ, 1882c, p. 152-153). O autor acrescentava, ainda, indicações quanto à possibilidade do emprego de elementos diferenciadores para trabalhos de um mesmo autor dentro da mesma classe ou para itens duplicados. No caso de vários trabalhos do mesmo autor numa mesma classe, Schwartz indicava o acréscimo do número do título (title number), que poderia ser uma indicação numérica da ordem de entrada dos itens sob uma mesma classe e autoria, ou a letra inicial do título para manter uma ordenação completamente alfabética (SCHWARTZ, 1882c, p. 150). Para os itens duplicados, Schwartz propunha a adição de uma letra minúscula após o número do título. Estas adições sugeridas a partir da segunda tabela permitiriam ampliar a capacidade de individualização alcançada pelo número do autor. Elas apontavam para a crença de Schwartz quanto à superioridade dos sistemas de localização relativa e também demonstravam sua preocupação de encontrar meios práticos de efetivá-los e, ao mesmo tempo, garantir a coerência da proposta.

Considerado rival de Dewey, à época da publicação da CDD, por ser o único a publicar um sistema alternativo completo (SATIJA, 1987, p. 70), a proposta de Schwartz serviu tanto para inspirar novas soluções de ordenação de documentos quanto despertou

críticas bastante severas. Dewey, por exemplo, condenou-o por ser um típico exemplo da impossibilidade de se construir um sistema híbrido com qualidade, pois ele combinaria todos os problemas de um sistema estruturado em classes e de um sistema alfabético (DEWEY; PERKINS; CUTTER, 1879, p. 92). Cutter, por sua vez, afirmava que, aparentemente atrativo, o esquema de classificação de Schwartz era insatisfatório porque a definição do nome dos assuntos estava subordinada ao imperativo de se escolher palavras que coubessem na ordem alfabética, mas que não necessariamente favoreciam a estrutura lógica e pretensamente objetiva do esquema (DEWEY; PERKINS; CUTTER, 1879, p. 92).

Se o sistema de Schwartz levantou uma série de questionamentos quanto à sua validade, as tabelas para realizar a individualização dos itens dentro das classes, a partir do sobrenome do autor, obtiveram reconhecimento entre outros autores dedicados ao tema da ordenação de documentos. Sua proposta de criar um padrão para conversão dos sobrenomes de autores em notações numéricas foi a base para o desenvolvimento de uma série de outras tabelas que também objetivavam realizar a ordenação alfabética dos autores dentro das classes. John Edmands, bibliotecário da Mercantile Library da Filadélfia, no simpósio sobre o número de livro, em 1879, afirmava ter tirado proveito da tabela de Schwartz para a determinação do número de autor de seu sistema, fazendo apenas o acréscimo da inicial do sobrenome anteposta ao número extraído da tabela (EDMANDS et al., 1879, p. 39). Cutter, em artigo publicado no Library Journal em 1878, reconhecia ter nascido da análise conjunta do esquema de Schwartz e de Dewey, sua concepção de uma tabela decimal para atribuição de marcas de autor a partir de sobrenomes. Os números utilizados por Cutter para a composição da marca do autor foram inspirados na tabela de Schwartz e a ideia de decimalizá-los teria partido do esquema classificatório proposto por Dewey (CUTTER, 1878, p. 249).

Porém, mesmo tendo ocupado lugar de destaque nas primeiras discussões sobre os esquemas de classificação bibliográfica para fins de ordenação de documentos, especialmente conforme o método sistemático, e, consequentemente, na composição do número do livro, a proposta de Schwartz acabou desaparecendo da história das bibliotecas, segundo Comaromi, após uma série de disputas das quais outros modelos saíram vitoriosos (COMAROMI apud SATIJA, © 1990, p. 24).