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Capítulo 2. O Jogo

2.3. O Jogo Pedagógico

2.3.2. Jogo Tradicional Infantil: das Práticas Físicas do Recreio à EF

Os jogos e as brincadeiras populares e regionais são atividades que permitem à criança desenvolver competências diversas e construir conhecimentos acerca do seu património cultural. Na escola, estas atividades fornecem oportunidades à criança, de ativamente assumir uma postura e participação sócio integradora, tornando-a assim no próprio sujeito de ação e construtora autónoma de novas aprendizagens.

Este tipo de atividades são também estratégias ricas na aquisição e combinação de padrões básicos de movimento por propiciarem diversas experiências, ora de competição (individual, em pequenos e grandes grupos), ora de cooperação, ora de

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imaginação e/ou criatividade e por fim, criando capacidade de ajustar as suas ações e de se deparar e aceitar as situações de derrota.

Verificamos atualmente, um acréscimo da valorização da utilização do jogo nas escolas, como promotor de competências e saberes que visem o desenvolvimento integral das crianças. Condessa (2009, p. 37), afirma que, “Aos educadores e professores que leccionam a educação física na infância caberá a delicada tarefa de garantir o enriquecimento do seu património motor e cultural, que visa em simultâneo os domínios do desenvolvimento individual e colectivo.”

Neste sentido, os programas curriculares nacionais e regionais, passíveis da integração dos diversos domínios e áreas curriculares, na construção do saber dos alunos, devem valorizar o jogo como meio de desenvolvimento de diversas aprendizagens.

No Ensino Básico, a EF, surge assim como área de conteúdo, fundamental na transmição de conhecimentos específicos e tranversais ao currículo. Através do jogo lúdico e pré-desportivo, para além de todas as potencionalidades e riquezas que o caracterizam, a criança tem a possibilidade de desenvolver uma maior sensibilidade na preservação da cultura popular envolvente, regional e nacional.

Neste sentido, Condessa (2009, p. 38) refere que,

Durante o período de Educação de Infância e do 1º Ciclo do Ensino Básico as crianças sofrem uma grande mudança que se repercute nas diferentes àreas do seu desenvolvimento – físico, mental, espiritual, moral e social. A educação física, sendo também uma área de intervenção no campo da recreação e das expressões, assume um valor inquestionável, reconhecimento que se manifesta quer quanto às competências que se querem ampliadas, quer quanto ao processo de vivência e fruição que se pretende proporcionar.

O jogo e a criança estão interligados no tempo, a criança é um ser que brinca e comunica pela atividade lúdica, o jogo contribui para que ela adquira uma maior autonomia, maior flexibilidade e criatividade, edificando e desenvolvendo situações inovadoras que fazem parte integrante da construção da sua personalidade. A cultura é passada através do jogo. Esquemas lúdicos e formas de jogo passam de geração em geração, do adulto para a criança, e de criança para criança. As habilidades motoras são formadas e desenvolvidas através de situações pedagógicas que utilizam o jogo como meio educativo.

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Neste sentido, o Currículo Regional do Ensino Básico (CREB, 2011) na sua constituição, defende a importância da valorização do património cultural e regional açoriano em atividades escolares, integradoras e diversificadas. Segundo o documento anteriormente referido, pretende-se “Através de uma perspetiva integradora, sócio- construtivista e orientada (…) ” (Ministério da Educação, p. 6), o desenvolvimento progressivo ao nível “ (…) do conhecimento e valorização da realidade cultural, física e social (…) ” (ibidem).

Neste sentido, a EF escolar, fornece um importante contributo para a transmissão da cultural regional e local através dos jogos tradicionais. Assim, “ (…) objetivando-se o desenvolvimento da Educação Física no Currículo Regional da Educação Básica, destaca-se a importância das características próprias da Região, meio envolvente, aspetos culturais e recursos disponíveis na apropriação do currículo por parte dos alunos.” (idem, 2011, p. 102)

O jogo tradicional permite também desenvolver um conjunto de capacidades motoras, formuladas no Programa do 1º Ciclo do Ensino Básico (2004). Nomeadamente o equilíbrio, o deslocamento, a coordenação, a manipulação, bem como a interação, a descoberta, a cooperação, o ritmo etc. Este desenvolvimento transversal ou interdisciplinar permite à criança aquisições essenciais para o seu futuro a vários níveis: nível social, cognitivo, físico, psicomotor. O educador/professor deve apresentar à criança vários tipos de jogos tradicionais locais, permitindo a sua prática e exploração, para que esta, com base numa perspetiva motivadora, tome consciência da cultura popular local e regional do seu passado.

Condessa et al (2009) afirmou que no contexto açoriano, devido à agressividade crescente entre crianças verificada nas escolas da região, o papel das mesmas deve passar pela oferta de condições humanas e materiais, viáveis e favorecedoras, para que se possa reduzir ou mesmo irradiar a incapacidade do desenvolvimento das capacidades e aptidões destas crianças.

A autora supracitada, orientando-se pelas ideias de Schmid & Wrisberg (2000) in Condessa (2009) e posteriormente por Metzler (2005) in Condessa (2009), refere também que a qualidade do ensino da Educação Física escolar é baseada em quatro questões: Quem aprende?; Onde aprende?; O que aprende?; Como aprende? Neste contexto, a autora explica que é fundamental que o educador/professor, aquando da prática do brincar e do jogo, oriente a ação educativa em prol do contexto em que se

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insere. Deste modo, é crucial atender às características e necessidades das crianças, de modo a promover o desenvolvimento de competências integradoras do currículo, nomeadamente promover a cultura lúdica do brincar através das práticas físico-motoras, pois segundo Brougére (2002, p. 24), “A cultura lúdica é antes de tudo um conjunto de procedimentos que permitem tornar o jogo possível.”

Importa mencionar que o jogo tradicional na escola pode ser praticado para além das atividades programadas na ação educativa. Havendo uma permanente transposição das atividades realizadas em práticas físicas curriculares e extracurriculares para o recreio escolar. Atualmente, as crianças passam muito tempo na escola, desta forma os tempos livres, em que a criança está ausente de qualquer orientação, estão a aumentar, devido essencialmente à maior ocupação profissional dos pais. Deste modo, surge a necessidade de dinamizar os espaços do recreio escolar, oferecendo às crianças condições que estimulem de forma informal o jogo tradicional nas suas diversas dimensões.

Neste sentido, Pereira et al (2009, p. 106), menciona que “O recreio escolar, locus onde se mistura, a complexidade e a riqueza que encerram os grupos de pares, nas suas lógicas de formação, relações estabelecidas, coesão e interacção, com a transmissão e transformação de factos culturais e onde pulula uma verdadeira cultura infantil.”

Conforme Neto in Condessa (2009, p. 27), é necessário haver uma reformulação dos espaços de recreio de forma a tornarem-se lugares atrativos para as crianças, brincarem e jogarem. De uma forma geral, o autor afirma que todos os espaços em que a criança passa o seu tempo livre, são promotores das “culturas de infância” e permitem vivenciar experiências de jogo e movimento essenciais ao combate do “analfabetismo motor” e à promoção de estilos de vida saudável.

Um estudo2 realizado por um conjunto de investigadores teve como objetivo avaliar o Programa de Apoio à Educação Física (PAEF) implementado na Região Autónoma dos Açores, que tem como intenção generalizar a todas as escolas do 1º Ciclo a prática da Educação e Expressão Físico-Motora.

Neste estudo foram inquiridos alunos do 1º CEB e, no que diz respeito às atividades praticadas nos recreios, os investigadores verificaram que 51% dos alunos praticam jogos com outros colegas no recreio. Cerca de 80% dos alunos envolvem-se

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em atividades de cariz sedentário depois de saírem da escola e que as atividades que os alunos praticam e gostam mais, são os jogos.

Sendo assim podemos afirmar que a dinamização dos recreios através dos jogos tradicionais é uma mais-valia, pois permite sem dúvida alguma, desenvolver competências integradoras, nas dimensões pessoal e social das crianças e compensa a falta de movimento da criança nas atividades diárias.

Como verificámos anteriormente, o jogo tradicional pode ser praticado, em diversos contextos. Importa agora mencionar a importância do brinquedo no jogo tradicional. Sabemos que muitos dos jogos tradicionais existentes surgiram da utilidade dada aos brinquedos que inventavam ao longo da nossa história cultural. Segundo uma investigação apresentada por Pereira et al (2009), foi feito um estudo em 3 escolas de Jardim de Infância e 3 escolas do 1º CEB, com o objetivo de identificar comportamentos e perceber os benefícios do brinquedo no desenvolvimento de competências físicas e sociais nas crianças, bem como perceber a importância dos espaços de ação, no desenvolvimento de atividades tradicionais.

Verificou-se neste estudo, que as crianças gostavam de explorar brinquedos novos e apropriavam-se deles, e que os espaços exteriores são mais propícios a este tipo de práticas. Para Pereira (2009, p. 112), “Os brinquedos tradicionais parecem estar associados à promoção da cooperação entre as crianças (…) ” Aquando da utilização do carrinho de rolamentos a investigadora conclui-o que, “ Este brinquedo tradicional é usado por crianças mais novas e mais velhas do género feminino e masculino em simultâneo, portanto também tem um papel integrador (…) ” outra conclusão retirada pelos investigadores foi a de que os brinquedos tradicionais favorecem a ligação dos pais às escolas, bem como, previnem o bullying nos recreios.

A atividade física das crianças em contextos de jogo tradicional tem uma intencionalidade própria no processo de desenvolvimento e aprendizagem (adaptação biológica e social), mas está sujeita a um considerável conjunto de constrangimentos, tais como, as alterações dos estilos de vida e as influências culturais. Cabe ao educador/ professor proporcionar experiências diversificadas e enriquecedoras, a fim de que as crianças possam fortalecer a sua autoestima e desenvolver as suas capacidades.

Neste sentido, Condessa et al. (2009, p. 178), afirmam que, “Aos adultos, familiares e educadores compete resguardar as tradições culturais e mediar a sua transmissão às crianças, isto é, preservar e dinamizar a cultura do brincar a oferecer à

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criança do hoje e do amanhã. A acção cultural em geral e a acção educativa em particular contribuem para a construção da identidade cultural, individual e colectiva.”

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Capítulo 3. Formar o Educador de Infância/Professor do