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3. O MEIO DIGITAL DA MENSAGEM : A INTERNET E AS POTENCIALIDADES

3.3 O JORNALISTA E A MEDIAÇÃO NA REDE

Um dos grandes diferenciais da internet que se apresenta como desafio a escritores, editores ou mantenedores de sites quaisquer, durante a construção das páginas digitais, é exatamente traçar os limites entre os quais apontar os links que deverão ser seguidos pelo internauta, ou sugeridos como rota de navegação. Tal atividade não representa apenas uma intenção ou uma iniciativa por parte da atividade jornalística, mas configura-se como uma das expectativas que os internautas têm em relação à própria atividade jornalística: busca-se nos sites favoritos, a indicação de outros endereços eletrônicos que possam oferecer continuidade à navegação iniciada, onde seja possível encontrar outros textos sobre o mesmo assunto ou sugestões de onde encontrar novas leituras de um autor específico, por exemplo.

O caráter descentralizado da internet generaliza a circulação de conteúdos sem submissão e estruturas hierárquicas. Antigas intermediações, pretensamente válidas para todo o tecido sociocultural, não representam mais escalas inevitáveis. No ambiente virtual, com um mínimo de competência técnica, os usuários podem atuar, a um só tempo, como autores, editores, distribuidores e livreiros.52

No entanto, essa euforia de libertação que o hipertexto havia provocado, ao sugerir que se passaria a construir narrativas não-lineares que oferecessem ao internauta um papel de “autor” (ou ao menos de “co-autoria” da síntese narrativa, moldando a própria experiência de um texto), é, atualmente, questionável enquanto à sua verificação53. O caminho não-linear da leitura facultaria novos gabaritos de intervenção por parte dos leitores.

52

MORAES, Dênis de. 2001, p. 94.

53Essa figura do internauta-autor não decorre apenas da possibilidade de construção de uma narrativa a partir do

O que se percebe, ao contrário, é que grande parte das narrativas e textos jornalísticos na web ainda mantêm um formato unidimensional, contrariando pelo menos por enquanto, as esperanças de libertação do hipertexto, que oferece ao internauta a possibilidade de combinações infinitas com matérias em formatos mais tridimensionais54. As ferramentas oferecidas pelo hipertexto muitas vezes não são exploradas com a profundidade possível pela pequena familiaridade dos atuais jornalistas responsáveis pela criação e atualização dos sites com o novo meio, já que a tecnologia é recente e ainda não formou profissionais especializados nessa mídia. No depoimento de um dos profissionais entrevistados para esta monografia fica clara essa dificuldade enfrentada. Sobre o porquê de não se explorar tanto alguns recursos multimídias ou aprofundar a questão dos links no texto, Luis Fernando Vianna, ex-editor do Portal Literal, responde:

Houve um pouco da minha velhice ali...Minha prática é toda no impresso(...) Essa gente nova que mexe com internet desde cedo certamente tem mais facilidade pra isso(...)Acho que o texto para a web deve ser pensado dessa maneira. Como tem a possibilidade de você abrir para outros sites etc, isso precisa ser pensado(...)O pessoal do Paralelos, essa gente nova que mexe com internet desde cedo certamente tem mais facilidade pra isso...55

Por outra parte, o depoimento do editor do site Paralelos, Augusto Sales, tido inclusive pelos profissionais do Portal Literal como um site com gente mais jovem e, nesse sentido, mais aberto às ferramentas da web, surpreende pelo ceticismo. “Eu acho que não acredito muito nessa história de links, banners, essas coisas.(...) Até porque se a gente fosse botar, a gente ia falar com tanta gente, que íamos ter que botar uma lista enorme”.

Perguntado se ao entrar no Paralelos o internauta é convidado a visitar outros sites ou se fica mais “preso” ao site inicial, Augusto Sales mostra que essa não é uma questão pensada por eles ao editar o site: “Eu nunca pensei nisso”, afirma. Segundo ele, a própria temática da literatura não é convidativa à exploração de vídeos, sons, imagens etc.

publicação da produção individual, que não está mais preso às exigências do mundo editorial, como “ter um nome conhecido”, por exemplo. O anonimato não é empecilho para que se tenha publicado um texto qualquer, seja uma crítica cultural ou produção literária específica. A liberdade de produção e distribuição é, assim, enorme, ainda mais se pensamos que se trata de um público “infinito”, espalhado pelos mais distantes cantos do mundo.

54JOHNSON, Steven. Cultura da Interface: como o computador transforma nossa maneira de comunicar e

criar. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. p.45

A discussão se amplia ainda mais quando se percebe que o papel dos próprios jornalistas na web ganha uma nova feição, diferente da figura do mediador do impresso. Para muitos não é mais possível se falar em mediação, dado o caráter descentralizado e interativo da rede, que desconfigura o esquema dos meios de comunicação tradicionais, onde a produção de conteúdo “um-todos” determina a centralização na produção e a massificação na recepção. Por sua vez, a rede instaura o esquema “todos-todos” que desfaz a exigência da compatibilidade geográfica entre internautas espalhados no mundo inteiro, possibilidade que na mídia tradicional era dificultada pelos custos de produção, processamento e distribuição da informação.

O jornal – e os meios de comunicação de massa em geral – acumula por ter o poder de selecionar e produzir as informações que muitos receberão. Os homens comuns produzem os fatos, mas não podem produzir a notícia. Assim, o jornal acumula porque passa a ser o nó obrigatório de passagem do que pode ser comum a todos. A existência de poucos nós de produção e distribuição acarreta ainda canais fixos e fechados de distribuição de mensagens.56

A internet apresenta características bem diferentes, resultado de seu formato em rede: o número de “nós” (produção de informação) com conexões dois a dois, mesmo finito, pode dar origem a uma rede ilimitada (conexões entre eles) de informação. Os canais de produção e de distribuição são multipolares, diferentemente da rede centralizada de jornais impressos, por exemplo57, onde há uma hierarquia de produção e distribuição. Com um clique de mouse, o internauta passeia autonomamente pelos diversos nós que podem ser responsáveis tanto pela produção quanto pela distribuição de mensagens.

Essa estrutura permite a produção de uma quantidade enorme de informação que, em última instância vai dificultar o acesso à informação específica que se procura. Esse excesso de informação é uma limitação ao tão caro conceito de liberdade que qualifica a rede. Dessa forma, surge a necessidade de um mediador que funcione “filtrando” do excesso de informações produzidas aquelas que interessam a determinados grupos. No entanto, não se trata mais de selecionar e publicar a “informação de caráter geral”, que se supõe preenchedora

56

VAZ, Paulo. Mediação e Tecnologia. In: Intercom, 2001 - XXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2001, Campo Grande. Programa Intercom 2001 - XXIV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Campo Grande : Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, 2001. v. 1. p.5

dos interesses dos indivíduos - papel central do jornalismo na mídia tradicional. Mas talvez de filtrar e organizar informações específicas para grupos específicos58.

Isso porque a internet, ao contrário do que os prognósticos indicavam, não logrou êxito como meio de comunicação de massa “substituto” ou “competidor” com a mídia tradicional. Dessa forma, se em um primeiro momento – quando das primeiras experimentações com a linguagem web – fracassou-se ao se objetivar a conquista de um público ainda maior do que aquele alcançado pelos meios de comunicação de massa, em um segundo momento verificou-se que o foco deveria ser outro, que talvez a web devesse atuar em parceria com esses meios e se referir a um público muito mais específico, fragmentado em seus gostos e interesses. A internet, como meio de comunicação, segmentou o público consumidor de informação (personalizando as informações para grupos específicos), facilitou o contato de grupos que possuem o mesmo interesse (ao jornalista da rede cabe também facilitar as expressões individuais ao colocá-las de forma visível aos demais interessados no assunto)59 fazendo assim com que talvez a atividade e o foco dos próprios jornalistas precisassem ser alterados.

Nesse cenário, apresenta-se como uma função do jornalista a “seleção” (como era no impresso), mas agora entre fontes compartilhadas por todos os internautas, ou seja: cabe também a ele montar o quebra-cabeças dos links a serem acessados. A navegação na web é o próprio caminho da apuração, ou seja, a fonte utilizada pelo jornalista está, a princípio, disponível na própria web, não sendo mais possível imaginar o tão consagrado e fundamental “privilégio das fontes”, que demarcou o exercício da profissão no território do impresso. Também a garantia de que a informação selecionada é “confiável” e que, portanto, vale a pena ser lida em meio a tantas outras acessáveis, é muitas vezes dada pelo jornalista.

Principalmente no Jornalismo Cultural e também no Jornalismo sobre literatura, muitas críticas são feitas quanto à marginalização da crítica nessas publicações (impressas ou web) e sua substituição por “achismos”, comentários mal fundamentados, informações superficiais e incompletas etc. A multiplicidade de emissão na web favorece ainda mais essa situação. Algo que muitas vezes é filtrado justamente pela atividade jornalística que, como um “guarda de trânsito”, pode oferecer indicações de caminhos a serem seguidos. Ao mesmo tempo, muitos dos que buscam a cultura na internet, principalmente em sites como o Portal Literal e o Paralelos, o fazem por acreditar que nela está presente o jornalismo cultural de qualidade, com mais conteúdo (aprofundado), vivo e crítico.

58VAZ, Paulo. 2001

Esse profissional mediador garante a atenção do internauta para determinados sites por ele “linkados” ou indicados que, pelo menos em teoria, se aproximariam de uma informação “mais qualificada” para determinado leitor. Os nomes de jornalistas ou figuras famosas do impresso são, dessa forma, uma “isca” para que o internauta, muitas vezes desorientado, confie na definição de uma trilha já desbravada.

Mas nem sempre é necessário que o mediador ou colaborador ilustre seja necessariamente um jornalista e conhecido por todo o público leitor de jornais e revistas. Um indivíduo conhecido, por exemplo, no meio literário, por suas críticas curiosas e alta especialização em determinado setor, mas que não necessariamente seja jornalista, conta agora com um meio de publicação de sua seleção e uma inserção em um mercado até então fundamentalmente dominado por profissionais do jornalismo60. Até mesmo porque possui um público “fiel”, mas que antes não encontrava em um meio de comunicação de massa, por exemplo, espaço para suas idéias e, principalmente, não alcançava suficiente notoriedade para a conquista de patrocínio necessário. Agora, o próprio público aficionado pode se unir a ele na construção de um espaço para uma produção antes com poucas viabilidades de publicação. O caso do site sobre literatura “Paralelos” é emblemático, neste sentido.61

60

Com esta observação, quer-se apontar, principalmente cargos como o de edição de publicações, que muitas vezes está necessariamente vinculado ao exercício do jornalista (exigência de diploma etc).

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