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5.4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.4.1. Jovens que desejam migrar do sítio para a cidade

Na região das ilhas de Abaetetuba os jovens que desejam dar continuidade

aos estudos precisam se deslocar para cidade, tendo que sair de sua realidade no

meio rural e conviver com o urbano. Os jovens explicam que atualmente já é possível

concluir o ensino médio nas comunidades de origem, isso porque existe o Sistema de

Organização Modular de Ensino (SOME) em algumas escolas das ilhas.

No entanto ainda não é possível encontrar nas comunidades visitadas a oferta

de curso técnico ou superior. Logo, a maioria dos jovens entrevistados, que pretendem

sair ou que já saíram da região das ilhas em direção a cidade, citaram os estudos

como um dos principais motivos para a migração.

Os jovens reconhecem a importância do SOME nas ilhas, esse sistema de

ensino tem ajudado e facilitado a vida de muitos que desejam concluir o ensino médio

e não tem condições de se deslocar para a cidade. Pereira (2016) afirma que com o

Sistema de Organização Modular de Ensino, a população do campo tem a seu favor

um instrumento de garantia de direitos nunca conquistados nas Constituições

anteriores à Carta Magna de 1988. Ainda segundo o autor:

Antes da implantação do SOME os sujeitos do campo conseguiam cursar somente às primeiras séries do ensino fundamental, uma vez que ao campo havia sido destinado apenas esse grau de escolaridade. Neste contexto, os discentes eram forçados a interromper seus estudos visto que suas famílias não tinham condições financeiras suficientes para mantê-los nos centros, até mesmo pelo fato de os mesmos contribuírem, satisfatoriamente, com a renda familiar, bem como pelo difícil acesso de muitas comunidades ribeirinhas em relação às cidades brasileiras, contribuindo assim para o elevado índice de analfabetismo e baixo grau de escolaridade dos jovens e adultos (PEREIRA, 2016 p. 188).

Apesar de ser uma opção para concluir o segundo grau os jovens relatam

diversas dificuldades como: a falta de estrutura das escolas para receberem alunos

do ensino médio, os professores acabam faltando na escola durante dias, os

barqueiros quando não recebem o pagamento da prefeitura param de levar os alunos

para a escola entre outras situações que interferem na boa qualidade da educação no

sítio.

Entre os jovens entrevistados alguns já concluíram o ensino médio, outros

ainda estão estudando o ensino médio ou fundamental, e outros jovens pararam de

estudar sem concluir o ensino básico e relatam que no momento não tem interesse

de voltar a estudar.

O gráfico 1 apresenta a distribuição dos jovens entrevistados no sítio e na

cidade. Os 60% entrevistados no sítio equivale a 27 jovens e os 40% entrevistados na

cidade equivalem a 18 jovens. Dos 27 jovens entrevistados no sítio, 19 já sonham em

sair do meio rural e ir morar na cidade de Abaetetuba, para dar continuidade aos

estudos através de cursos técnicos e/ou superiores ou para trabalharem, tendo em

vista a possibilidade de um emprego de carteira assinada.

Gráfico 1: Distribuição dos entrevistados, entre o Sítio e a Cidade.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2018.

60%

40%

Jovens no Sítio

Jovens na Cidade

Os jovens que moram no sítio e desejam migrar para a cidade de Abaetetuba

pretendem dar continuidade aos estudos, podendo cursar o ensino técnico e

profissionalizante na zona urbana. Estes jovens sonham em fazer um curso técnico

e/ou superior, entre estes os mais citados estão: técnico de enfermagem, pedagogia,

letras, direito e meio ambiente.

Os jovens que moram na cidade estão estudando e/ou trabalhando. A maioria

dos entrevistados na cidade moram com familiares (tios, avós, primos etc.). Os jovens

ribeirinhos estão fazendo cursos como: técnico de enfermagem, pedagogia, técnico

de meio ambiente. E os que trabalham, estão na profissão de feirantes, secretárias do

lar, babás etc. No gráfico 2 estão distribuídas as principais ocupações dos jovens

ribeirinhos na cidade de Abaetetuba.

Gráfico 2: Ocupações dos jovens ribeirinhos na cidade.

Fonte: Pesquisa de Campos, 2018.

Os jovens ribeirinhos relataram sobre as dificuldades de viver na cidade, falam

sobre a dificuldade de conseguir dinheiro para se alimentar, pagar cursos, pagar os

materiais escolares. Mas, mesmo diante das inúmeras dificuldades eles tem um

objetivo, que para a maioria, é ter uma profissão reconhecida e um bom emprego.

Temos ainda os relatos dos jovens ribeirinhos que moram no sítio e desejam

migrar para cidade, estes afirmam que “a vida no sítio é muito boa, existe fartura de

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Trabalha como Secretária do Lar Curso Técnico de meio ambiente no IFPA Cursa Pedagogia na UFPA Técnica de Enfermagem - Trabalha na Área Cursa Técnico de Enfermagem Trabalha em Loja do Comércio Ensino Médio - Só estuda Trabalha e Estuda

alimento, principalmente na safra do açaí. Mas não existe possibilidade de ter um nível

superior”.

Outros relatam que “ninguém passa fome no sítio”, “podemos até passar

algumas dificuldades, mas fome ninguém passa!”, “sempre tem uma galinha no quintal

e um cacho de açaí na árvore”, no entanto enfrentam grandes dificuldades para dar

continuidade aos estudos. E essa vontade de estudar, se formar, ter um bom emprego

no futuro é o que motiva o desejo da saída do campo.

No gráfico 3 é possível identificar os principais motivos que levam os jovens a

saírem do campo em direção as cidades nas comunidades visitadas.

Gráfico 1: Principais motivos apontados pelos jovens para abandonarem a zona rural.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2018.

É possível observar que a maior carência do jovem no campo é a falta de

qualidade de ensino e continuidade no nível superior. 41% dos entrevistados desejam

migrar para estudar e/ou dar continuidade aos estudos na cidade.

De acordo com o INEP (2007), as pesquisas continuam reafirmando a

permanência de acentuadas desigualdades educacionais entre campo e cidade em

todas as regiões do país, tanto em relação ao acesso à educação e à qualidade do

ensino quanto no que se refere à infraestrutura dos estabelecimentos, à formação

docente, ao grau de analfabetismo e às discrepâncias entre idade e série.

41%

13% 11%

8% 27%

Não há Escolas Tecnicas e Universidades

Não há Incentivo e Políticas Públicas

Violência no Campo (Assalto e Tráfico)

Falta de Área Dissponível no Sítio para os mais Jovens Falta de Estabilidade Financeira e Empregos com Carteira Assinada

Estudos apontam que a baixa educação e a insuficiência de políticas públicas

que têm gerado vários problemas, entre os quais se pode fazer referência ao grande

número de jovens fora da escola; a carência de ensino de qualidade no meio rural;

docentes alheios à realidade rural; ausência de infraestrutura adequada nas escolas;

currículo e calendário escolar alheios à realidade rural; escolas deslocadas das

necessidades e das questões do mundo rural e alheia aos interesses dos

trabalhadores rurais, de seus movimentos e organizações, e assim estimuladora do

abandono do campo (QUEIROZ, 2001).

Pinedo-Vasquez (2008), fala em sua pesquisa sobre as instituições

inovadoras e usa como exemplo a Escola Família, que ensinam jovens da zona rural

em diversas áreas do Brasil, oferecendo-lhes uma formação profissional relevante no

contexto em que vivem. Podendo dessa forma manter o jovem no meio rural, sabendo

que este terá uma profissão no campo e qualificação para o trabalho no mesmo.

Existem ainda as Casas Familiares Rurais (CFRs), que tiveram origem na

França, na década de 1930, e hoje estão disseminadas em todo o mundo. No estado

do Pará a oferta de escolarização nas CFRs acontece na forma de organização

curricular integrada ao Ensino Médio com qualificação. São destinadas aos jovens do

meio rural que desejam ter conhecimento aprofundado a respeito do trabalho no

campo. A CFR busca ofertar uma educação gratuita e de qualidade que permita aos

filhos dos trabalhadores permanecer com sucesso e qualidade de vida no campo

(PRAZERES, 2007).

Autores como Siqueira (2004) e Zago (2016) em suas pesquisas, falam do

deslocamento dos jovens do campo para a cidade a fim de continuar seus estudos. O

jovem rural precisa ir para as sedes dos seus municípios regularmente, onde terão

acesso à outra forma de vida e diferentes modos de relacionamento social ao qual

começarão a confrontar os valores da vida no campo e na cidade e despertarão o

desejo de viver tal modo de vida diferente do qual foram criados.

Apesar das políticas adotadas, as pesquisas continuam reafirmando a

permanência de acentuadas desigualdades educacionais entre campo e cidade em

todas as regiões do país (ZAGO, 2016). Um exemplo é que de todos os jovens

entrevistados que residem na cidade, apenas uma concluiu o ensino médio na

comunidade de origem na região das ilhas e entrou direto na universidade, essa

estuda pedagogia na UEPA campus Abaetetuba/PA. Ente os demais entrevistados

alguns finalizaram o ensino médio na cidade de Abaetetuba/PA e outros concluíram o

ensino médio nas ilhas e precisaram fazer um curso preparatório para prestar

vestibular.

Alguns dos entrevistados na cidade de Abaetetuba/PA relatam que já

passaram por diversas dificuldades financeiras e muitos até desejaram abrir mão de

seus sonhos e voltar para o campo, porque sabiam que lá teriam o alimento todos os

dias. Outros relatos são sobre a falta de oportunidade no campo para as pessoas do

campo, “depois que saí do sítio tinha vontade de me formar e voltar para trabalhar na

área ribeirinha, mas percebi que as oportunidades de emprego na cidade são muito

maiores”. Esses jovens falam que dificilmente irão voltar para morar nas ilhas.

Os jovens que hoje moram na cidade desejam ajudar a família que ficou no

campo. Houveram relatos como: “meu objetivo aqui na cidade é trabalhar para trazer

meu irmão mais novo para estudar aqui”, “depois que finalizar os estudos quero

trabalhar para mandar todo mês um dinheirinho para meus pais lá no sítio”.

Outra realidade observada durante as entrevistas é que muitos jovens estão

migrando para fugir da violência e das drogas. Os pais estão muito preocupados com

esse índice de criminalidade nas comunidades das ilhas e dizem que a falta de

emprego para os jovens que terminam o ensino médio é preocupante. Segundo

alguns interlocutores, muitos não conseguem encontrar o que fazer e acabam sendo

sugados pela criminalidade.

Durante as entrevistas na cidade de Abaetetuba/PA, foi identificada uma

família com quatro jovens moças, o pai e a mãe. Esta família de origem ribeirinha

sentiu a necessidade de ir morar na cidade, isso devido a violência que vem ocorrendo

no campo. Segundo relato das jovens entrevistadas a casa localizada na comunidade

Sagrado Coração de Jesus, no Rio Maracapucu foi invadida por ladrões várias vezes,

causando terror na família e preocupação nos pais, que decidiram abandonar tudo na

área ribeirinha.

Muitos entrevistados afirmaram que os assaltos passaram a ser frequentes

nas ilhas depois da grande intensificação da produção do açaí e da valorização do

fruto no mercado. Gonçalves (et al., 2016) fala sobre a violência que ocorre nas ilhas

de Abaetetuba e Belém/PA. Em pesquisa os autores receberam muitas reclamações

a respeito da falta de segurança.

Em certas localidades, foram registrados depoimentos de famílias que estão em situação vulnerável ao ataque de grupos organizados – denominados

regionalmente como “piratas” –, que invadem casas e abordam embarcações, levando equipamentos, produção e, em certos casos, agindo com violência (GONÇALVES et al., 2016. p. 87).

Outra questão observada durante o período de campo e nas entrevistas com

os jovens é que muitos deles, principalmente os do sexo masculino, tem grande

dificuldade de permanecer nas ilhas devido à falta de terra da família para a

distribuição entre todos os filhos. Alguns jovens relataram que os irmãos mais velhos

que foram casando receberam seus pedaços de terra no lote da família, mas para os

mais novos essa realidade não será possível, já que não há terra suficiente para todos.

Essa realidade também leva muitos jovens a migrarem para os centros urbanos.

Essa realidade já foi citada em vários estudos, que explicam que um dos

motivos para a ocorrência da migração de jovens é a pouca disposição de terra

familiar. Em muitos casos os filhos têm o objetivo de construir sua própria família e

permanecer no campo, porém se o pai ceder ao filho uma parte da terra pode

comprometer o sustento do restante da família. Carvalho et al. (2009, p. 5) explica

muito bem essa condição da terra quando diz que com as dificuldades que os jovens

encontram no acesso à terra há um desestimulo para a continuidade da vida no

campo.

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