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1. CONSTRUINDO OS ALICERCES DA PESQUISA

1.4 Lócus da pesquisa

Gente olha pro céu, gente quer saber o um Gente é o lugar de se perguntar o um Das estrelas se perguntarem se tantas são Cada estrela se espanta à própria explosão (...) Gente é muito bom, gente deve ser o bom Tem de se cuidar, de se respeitar o bom Está certo dizer que estrelas estão no olhar De alguém que o amor te elegeu pra amar (...) Gente quer comer, gente quer ser feliz

Gente quer respirar ar pelo nariz

Não, meu nego, não traia nunca essa força não Essa força que mora em seu coração (...) Gente lavando roupa, amassando pão Gente pobre arrancando a vida com a mão No coração da mata gente quer prosseguir Quer durar, quer crescer, gente quer luzir (...) (Veloso, 1977)

A pesquisa foi realizada junto a uma turma do BB Educar, composta por 19 moradores de São Sebastião, conforme a Tabela 3 a seguir, dos quais:

Ago Set Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez

1) Revisão da bibliografia

2) Redação do memorial, introdução, aspectos metodológicos, lócus da pesquisa, contexto histórico da EJA e abordagem histórico-cultural 3) Qualificação do projeto 4) Redação da dissertação 5) Pesquisa de campo

a) Observação participante e respectivo diário de campo b) Rodas de conversa

c) Entrevistas semiestruturadas 6) Análise do material produzido 7) Redação da práxis vivenciada 8) Revisão final da dissertação 9) Defesa da dissertação

2017

a) Seis cursaram os dois semestres do curso: Albeniz, Elisabeth, Márcia, Maria das Graças da Conceição, Maria de Lourdes e Rosaline;

b) Sete cursaram apenas o primeiro semestre (16.08 a 08.12.16): Cremilda, João Batista, João Evangelista, Maria das Graças Ribeiro, Maria Valeriana, Reginaldo e Renato;

c) Seis cursaram apenas o segundo semestre (31.01 a 01.07.17): Ana Maria, Clarinda, Clelcilene, Dionísio, Maria José e Valtenice.

Tabela 3 - Alunos da Turma BB Educar de São Sebastião

Fonte: Ficha de inscrição na Turma BB Educar de São Sebastião.

Nome Nasc. Idade Local de

nascimento Sexo Ocupação

Exper. Escolar

Semestre cursado 1 Albeniz de Carvalho da

Igreja 16.02.75 42 Maranhão M Mecânico 4º ano 1º e 2º

2 Ana Maria de Almeida 03.10.61 56 Bahia F Dona de Casa 1º ano 2º

3 Clarinda da Silva Oliveira 05.10.84 33 Piaui F Diarista 1º ano 2º

4 Clelcilene da Silva Oliveira 04.06.82 35 Piaui F Serviços gerais

de limpeza 1º ano 2º

5 Cremilda Borges dos

Santos 08.08.73 44 Bahia F Diarista 1º ano 1º

6 Dionísio Fogaça Gomes 01.12.78 39 Bahia M Pedreiro 2º ano 2º

7 Elisabeth Maria Borges 14.07.57 60 Maranhão F Costureira 3º ano 1º e 2º

8 Joao Batista da Silva 15.01.47 70 Bahia M Aposentado 1º ano 1º

9 João Evangelista Pereira

Muniz 24.06.63 54 Minas Gerais M Pedreiro 1º ano 1º

10 Márcia Antônia de Barros 16.05.84 33 Goiás F Cuidadora de

idosos 3º ano 1º e 2º

11 Maria das Graças da

Conceição 03.02.57 60 Piaui F

Cuidadora de

crianças 1º ano 1º e 2º

12 Maria das Graças

Rodrigues Ribeiro 05.11.80 37 Minas Gerais F Dona de Casa 4º ano 1º

13 Maria de Lourdes Fogaça

Gomes 03.06.72 45 Bahia F Diarista 1º ano 1º e 2º

14 Maria José dos Santos

Almeira 13.03.58 59 Bahia F Dona de Casa 3º ano 2º

15 Maria Valeriana Muniz 12.01.57 60 Minas Gerais F Diarista 2º ano 1º

16 Reginaldo Borges dos

Santos 18.01.80 37 Bahia M Pedreiro 1º ano 1º

17 Renato Alves dos Santos 27.05.74 43 Bahia M Pedreiro 2º ano 1º

18 Rosaline de Souza 26.08.33 84 Maranhão F Aposentada

rural 1º ano 1º e 2º

A turma, de maneira geral, caracterizou-se por sua heterogeneidade, tanto no que tange à idade dos educandos (de 33 a 84 anos) quanto à sua experiência escolar anterior (do primeiro ao quarto ano do ensino fundamental).

Todos eles, entretanto, tinham em comum o fato de terem interrompido há muitos anos os estudos, em função da precária situação financeira da família. Dessa forma, frequentaram a escola, ainda criança, em suas cidades de origem, mas não tiveram a oportunidade de concluir o ensino fundamental por uma série de motivos.

Enquanto alguns tiveram que ingressar muito cedo no mercado de trabalho, a fim de ajudar financeiramente no sustento da família, outros tiveram que assumir os trabalhos domésticos da casa, sobretudo os cuidados com os irmãos mais novos e parentes idosos, a fim de que os demais familiares pudessem trabalhar fora e, dessa forma, viabilizar alguma renda para a família.

Aqueles que dispunham de tempo para ir à escola, enfrentaram obstáculos que, aos poucos, foram inviabilizando a sua permanência na instituição, tais como: constantes mudanças de endereço em função da instabilidade de emprego dos pais; localização distante da sua moradia; inexistência de transporte escolar e falta de recursos para compra de materiais escolares.

Quanto às questões de gênero, procedência e atividade laboral exercida, o grupo de educandos era majoritariamente feminino (seis homens e treze mulheres), oriundo de cidades do interior do nordeste, localizadas nos estados da Bahia, Maranhão e Piauí, que migrou para o Distrito Federal em busca de melhores condições de vida, onde exerce profissões e atividades com baixa ou nenhuma remuneração: mecânico, pedreiro, diarista, serviços gerais de limpeza, cuidadora de idosos, cuidadora de crianças, dona de casa e aposentado.

Três dos educandos possuíam filhos ou netos pequenos que normalmente os acompanhavam às aulas, por não terem com quem deixá-los no período da noite. Todos eles estudavam em escolas públicas da comunidade: Eduarda (neta da Elisabeth) cursava a educação infantil, enquanto Benício e Riquelme (filhos de Albeniz e Márcia, respectivamente) o terceiro e o quarto ano do ensino fundamental.

No intervalo do lanche e ao final das atividades, os pais normalmente comentavam com seus filhos o esforço empreendido e a satisfação que sentiam nessa retomada dos estudos, frisando sempre a importância deles aproveitarem ao máximo a oportunidade de frequentar a escola durante a infância.

Imagem 3 – Turma BB Educar de São Sebastião/1º semestre

Fonte: https://www.facebook.com/ludocriarte. Publicação e acesso em 20.10.16. Obs.: Acima: Mª das Graças Ribeiro, Cremilda, Rosaline, Elisabeth, Mª de Lourdes, Luciana (pesquisadora e educadora), Mª de Fátima (Educadora), Renato, João Batista, Márcia, João Evangelista e Mª Valeriana. Abaixo: Mª das Graças da Conceição (apenas parcialmente na foto), Eduarda (neta de Elisabeth), Albeniz, Benício (filho de Albeniz), Riquelme (filho de Márcia) e Reginaldo.

Imagem 4 – Turma BB Educar de São Sebastião/2º semestre

Fonte: Acervo da pesquisadora.

Obs.: Mª José, Márcia, Eduarda (neta de Elisabeth), Ana, Elisabeth, Rosaline, Clelcilene, Mª de Lourdes, Dionísio, Albeniz, Luciana (pesquisadora e educadora), Clarinda e Mª das Graças da Conceição. Mª de Fátima (educadora) e Valtenice estão ausentes na foto.

As aulas ocorreram nas dependências da Brinquedoteca Comunitária gerida pela Associação Ludocriarte, entidade civil sem fins lucrativos, fundada em dezembro de 2004 e localizada na Quadra 103, Conjunto 5, Casa 1, em São Sebastião (DF). Em 2013 foi declarada entidade de utilidade pública, pelo Decreto 34.612, de 29.08.13 (GDF, 2013).

A estruturação do núcleo de alfabetização é fruto de parceria estabelecida com a Fundação Banco do Brasil (FBB), mediante a firmatura de convênio, constituindo- se em um marco institucional no âmbito da Ludocriarte, que ampliou o seu raio de ação.

Até então, o seu trabalho estava focado no atendimento diurno de aproximadamente 100 crianças e adolescentes, na faixa etária de 06 a 14 anos, em turmas matutinas e vespertinas, por meio de atividades lúdicas e culturais gratuitas, tais como jogos e brincadeiras tradicionais; contação, criação e dramatização de histórias; oficinas de informática, arte, dança, poesia, vídeo, capoeira, biodança e música, conforme consta do seu estatuto (LUDOCRIARTE, 2006) e portfólio (LUDOCRIARTE, 2017).

Imagem 5 – Crianças atendidas pela Associação Ludocriarte

Desde 2010, a Brinquedoteca atua também como Ponto de Cultura, a partir de parceria estabelecida com a Secretaria de Cultura, conforme Diário Oficial do Distrito Federal, de 18.06.10, oferecendo cursos de formação para brinquedistas e promovendo eventos culturais, encontros e palestras para os familiares das crianças.

Além disso, publicou a coleção de livros “Era uma vez...”, composta por três volumes, para distribuição gratuita à comunidade local, sendo o primeiro deles relativo a histórias clássicas recriadas pelas crianças, enquanto o segundo e o terceiro versam sobre histórias por elas criadas, editados em 2012, 2014 e 2016, respectivamente.

A expansão das atividades da Associação, com a criação da turma de alfabetização de jovens e adultos, visa atender a uma antiga reivindicação dos pais e familiares das crianças e adolescentes matriculados na brinquedoteca, haja vista a carência de escolas na região que ofereçam cursos de alfabetização, no âmbito da EJA, no período noturno.

Nesse sentido, importante ressaltar a grande integração da turma, na qual a maioria dos educandos, além de serem vizinhos e morarem próximos à brinquedoteca, possuem laços de parentesco:

a) Albeniz e Maria da Conceição Ribeiro são casados, assim como João Evangelista e Maria Valeriana;

b) Rosaline é ex-sogra de Elisabeth;

c) Maria de Lourdes e Dionísio são irmãos, tal qual Clarinda e Clelcilene; d) Cremilda e Reginaldo, além de irmãos, são também primos de Renato. As aulas ocorreram as terças e quintas, de agosto a dezembro de 2016, e as segundas e quintas, de janeiro a julho de 2017, sempre das 18h30 às 21h30, conforme acordo de trabalho discutido com a turma no início de cada semestre.

O fato das aulas ocorrerem apenas duas vezes por semana foi um fator decisivo para que a maioria dos educandos se matriculasse no curso, haja vista a dificuldade, por eles relatada, de frequentarem as aulas todos os dias à noite, por uma série de motivos: cansaço em função da longa jornada de trabalho diurna; compromisso alguns dias à noite com eventos ligados à igreja e outras instituições locais; bem como a necessidade de realizarem trabalhos domésticos em sua residência.

Ademais, importante ressaltar que a turma participou de quatro eventos bastante significativos, que serão discutidos mais detidamente no capítulo 4:

a) XXIII Festival Artístico Cultural da Brinquedoteca Ludocriarte, realizado em 03.12.16, no qual a turma apresentou trabalhos desenvolvidos no decorrer do primeiro semestre relativos à situação-problema-desafio preconceito;

b) Roda de Conversa com o Sr. Rodrigo Pradera, Administrador de São Sebastião, em 20.03.17, na sede da Administração Regional, com a entrega de carta, elaborada pela turma, a partir das discussões realizadas sobre as principais situações-problemas-desafios enfrentadas pela comunidade, contendo propostas de superação no âmbito da saúde, segurança, educação, violência nas escolas, transporte e saneamento básico;

c) Visita ao Congresso Nacional e à Catedral Metropolitana, seguida de piquenique no Centro Cultural Banco do Brasil, em 18.06.17;

d) XXIV Festival Artístico Cultural da Brinquedoteca Ludocriarte, realizado em 01.07.17, no qual ocorreu a apresentação de trabalhos desenvolvidos no decorrer do segundo semestre e a formatura da turma, com a entrega dos respectivos certificados.

Ao longo do curso, o processo educativo teve como base a abordagem histórico-cultural de Vigotski e a pedagogia libertadora de Freire, conforme proposto pelo BB Educar (FBB 2004, 2007 e 2015), fortalecidas pelo firme propósito da constituição de sujeitos de amor, poder e saber, nos moldes preconizados por Reis (2011), cuja experiência histórica de mais de 30 anos no Paranoá e Itapoã serviu de base e inspiração para o trabalho realizado na comunidade, que procurou observar as especificidades e atender às expectativas e anseios dos educandos, visando a sua efetiva transformação.

Doravante, após a formatura da primeira turma de alunos em julho de 2017, pretende-se sistematizar e tornar permanente a Turma BB Educar de alfabetização na comunidade de São Sebastião, a partir da participação anual nos editais da Fundação Banco do Brasil, cuja próxima edição está prevista para o primeiro semestre de 2018.

Planeja-se também negociar, junto à Secretaria de Educação, a viabilidade da abertura de turmas da EJA primeiro segmento nas imediações da brinquedoteca, a

fim de que os educandos possam continuar os seus estudos em uma escola pública próxima à sua residência.

A fim de contextualizar a pesquisa desenvolvida, no capítulo seguinte será analisado o histórico da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, no Distrito Federal e, mais especificamente, na comunidade de São Sebastião. Ao final, será apresentada, em linhas gerais, a gênese do Programa BB Educar, sua proposta pedagógica e estrutura de operacionalização.