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Parte II- Análise dos dados

8. Laços Sociais

8.1 Relação com os familiares, amigos e comunidade (quem ajuda e em que

situações)

Pretende-se nesta dimensão, conhecer como é a relação dos beneficiários com a família, amigos e a comunidade a partir do momento que é beneficiário de RSI e quais os suportes a que podem recorrer nestes âmbitos.

Segundo Paugam (2000) a segunda evolução da desqualificação social é o enfraquecimento dos laços sociais, nomeadamente com os laços familiares, que pode provocar situações de isolamento que são associadas às dificuldades de inclusão económica. De acordo com Castel (1994) a transformação no mercado de trabalho tem trazido insegurança que é acompanhada pela deterioração dos suportes relacionais e precaridade do emprego, o autor associa a isto um risco para os indivíduos caírem para a vulnerabilidade, mais propriamente ao que ele chama de desfiliação. E por isso o autor realça que para haver a inserção do indivíduo é preciso haver contacto com a família e com uma vasta rede de relacionamentos.

A maioria dos beneficiários do novo perfil ( NB1, NB2 e NB6) vem contrariar o que diz Paugam e Castel no que respeita ao enfraquecimento de laços sociais. O NB1, NB2 e NB3 revelam-nos

Problemática Dimensão T2 T3 T4 Processo de intervenção Avaliação dos técnicos sobre a compreensão que os beneficiários têm do RSI «O compreender compreendem. […]

Acho que alguns dão maior importância à parte da inserção

enquanto que a

maioria é por uma questão económica

[…] Eles tem

consciência, isto tem regras e tem que cumprir eles por vezes é que tentam contornar e tentam manipular o sistema, mas tem consciência isso tem.[…] »

Até há um tempo acho que eles pensavam que começavam a receber e que não… era tipo uma pensão. Mas agora não. Agora já percebem que é algo que recebem mas tem que fazer alguma coisa, portanto, dar algo em troca […] Portanto há as obrigações e não só direitos, estão conscientes disso. » «Alguns ainda continuam a pensar, os com menos habilitações, que é o salário mínimo nacional […] Isto não é um salário, é uma prestação social pequenina e que pode ser uma porta aberta mas eles não percebem isso. Esquecem-se completamente da vertente da inserção, só querem saber do dinheiro […] Mas os de maior escolaridade tem mais noção do que é o RSI.»

que as relações sociais mantêm-se iguais. Podemos verificar que alguns dos beneficiários esconde a sua situação como nos mostra o NB1 e NB6. Evidencia-se no discurso do NB1 que este esconde a sua situação perante os outros pelo medo de ser julgado: «[…]Eu escondo porque as pessoas dizem logo, és um lambão, tu és aquilo e aquilo e eu não gosto de ouvir isso […]». Verificamos aqui o que Goffman (1988) chama de estigma desacreditável- o estigma do individuo não é conhecido nem imediatamente percetível pelos indivíduos. A NB6 também se verifica este estigma ao esconder a sua situação:«[…]Escondo a minha situação porque a palavra RSI não me soa bem. […]» (NB6)

A maioria dos beneficiários tem ajuda por parte da família nas suas necessidades mais básicas. Similarmente no estudo de Matos e Costa (2012) verificou-se que os beneficiários com maior escolaridade consegue encontrar apoio na família, amigos e vizinhos face às necessidades do dia- a- dia. A família é o recurso que muitas vezes consegue satisfazer as suas necessidades. No caso do NB2 a sua relação com os amigos mantêm-se pelo fato de, no seu círculo de amigos, existirem mais casos como o dele. E também para este beneficiário, a família é o seu suporte de ajuda para o que precisa.

Apenas o NB7 mencionou fragilidade nas relações com amigos após o RSI entrar na sua vida, apenas podendo contar com ajuda da mãe. Este beneficiário reparou que as relações com os amigos alteraram-se rapidamente tornando-o mais solitário. Revela-nos que a nível social tem sido péssimo onde sente algum estigma por partes dos outros indivíduos: «A nível social é péssimo. […] é um estigma.[…]»(NB7) Segundo Bruto da Costa (1998) a exclusão social verifica-se nos laços sociais pelo facto de os indivíduos se isolarem dos outros indivíduos. Esta exclusão social verifica-se no discurso deste beneficiário. O RSI poderá ser gerador de exclusão pelo fato de limitar o beneficiário de realizar certas atividades na sua vida. Desde do momento que é beneficiário do RSI este beneficiário viu grandes alterações a nível social, pelo fato de nunca mais conseguir frequentar os jantares e os encontros com a sua rede de amigos (devido à sua carência económica). O que resultou no afastamento desses colegas. Também é gerador de exclusão devido ao estigma que os indivíduos têm face aos beneficiários desta medida. Apesar de o RSI, tentar acabar com a carga pejorativa sobre quem recebe este tipo de rendimento, esta tem persistido.

Contudo os testemunhos dados pelo novo perfil leva-nos a crer que a maior parte destes beneficiários estão distantes do que Castel (1994) chama de desfiliação, devido ao apoio que a família, vizinhos ou outros lhes prestam não levando a um isolamento social.

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Tabela 26 - Relação com familiares, amigos e comunidade- Novo perfil

Problemática Dimensão NB1 NB2 NB6 NB7

Laços Sociais Relação com os familiares, amigos e comunidade ( quem ajuda e em que situações)

«a minha relação sempre foi igual, eu não conto nada a ninguém, não me exponho. Pronto a família sabe. Eu escondo porque as pessoas dizem logo, és um lambão, tu és aquilo e aquilo e eu não gosto de ouvir isso […] [receber ajuda] dão me alguns alimentos mas é por parte de

pessoas que tenho mais intimidade. Às vezes convidam para jantar»

«[…] a relação com os amigos é a mesma mas claro que não

temos aqueles

convívios nem

aquelas saídas […]a relação com eles não mudou, aliás tenho

mais gente no

mesmo caso e

continuamos amigos

na mesma[…]só

conto com os meus pais. E já me dão uma grande ajuda, todos os meses posso contar com roupa lavada já é muito bom»

«Não noto diferença nas relações porque ninguém sabe. […] Por exemplo na minha família o meu pai não sabe desta situação só a minha mãe e uns tios […] Escondo a minha situação porque a palavra RSI não me

soa bem. Mas

também não quer desmotivar quem está a tirar um curso superior ou quem pensa estudar[…] [recebe ajuda] Da minha mãe mas para já é só como lhe disse ainda tenho dinheiro, ainda pago a renda, pago as contas. Compra-me uma roupa, um creme. Ela descobriu lá em França uma

farmácia que é tudo mais barato e então

manda-me tudo,

champô e tudo é ela que manda. O que é uma ajuda muito boa.»

«A nível social é péssimo. […] é um estigma. […]Aquele circulo mesmo de colegas antigos de trabalho em que fazíamos o jantar de Natal, de aniversário e não sei o quê, isso parou. O que torna as pessoas mais sombrias, mais solitárias […] Está a ver como o nosso universo começa a ficar muito restrito percebe?[…] A minha mãe nunca vai deixar que eu passe fome como é óbvio. […] portanto estou lá todos os dias para ajudar porque são 87 anos e tenho que lhe dar apoio na casa e acabo

por fazer a

refeição principal mas posso trazer um litro de leite para casa, um pão, qualquer coisa do género.»

Tabela 27 - Relação com familiares, amigos e comunidade- Perfil Tradicional

No perfil tradicional também não houve alterações nos laços sociais (BT2,BT3,BT5 e BT8). No BT3 as relações mantiveram iguais porque também a sua família está na mesma situação. É de referir que alguns dos beneficiários tem ajuda por parte de instituições (BT2 e BT5), dos vizinhos (BT8 e BT2).

Verifica-se no BT5 e BT8 a importância da sociedade- providência, que é definida por Santos: “redes de relações de interconhecimento, de reconhecimento mútuo e de entreajuda baseadas em laços de parentesco e de vizinhança, através das quais pequenos grupos sociais trocam bens e serviços numa base não mercantil e com uma lógica de reciprocidade.” (Santos,1993:46). No caso do BT5, este beneficiário ajuda em algumas situações a vizinha e em troca tem por parte desta oferta da alimentação. Já no caso de BT8, este cuida da horta de um familiar e recebe em troca alguns legumes. Leva também, como forma de reconhecimento, os legumes para os vizinhos que lhe oferecem algumas refeições. Também Martins (2000) reforça esta ideia de sociedade-providência na pobreza tradicional :“O nível de vida pode ser baixo, mas estão ligados a uma rede de apoio informal mais ou menos extensa, é, sociedade providência, geralmente integrando uma rede social de familiares e vizinhança.” (Martins,2000: 4)

Problemática Dimensão BT2 BT3 BT5 BT8

Laços Sociais Relação com os familiares, amigos e comunidade ( quem ajuda e em que situações) «[…] as relações mantiveram-se iguais com toda gente […] [ recebe ajuda] Por parte da vizinha em alguns alimentos e roupas que já não precisa e a igreja também ajuda» «não houve mudança, está tudo igual, porque a minha família também está assim como nós [...] Recebo ajuda das pessoas que dão roupa que já não usam. Toda a minha família é muito pobre por isso não conseguem ajudar.» «Eu e a minha vizinha damo-nos perfeitamente, até faço os recados a ela. Amigos não interessam muito e a minha família está em Angola[…]não confio em mais ninguém[…]Sim a vizinha ajuda – me no comer, dá- me fruta. […] Antes comia na associação mutualista mas agora vou lá buscar o comer […]E na cruz vermelha vou buscar alimentos» «[…]Os vizinhos desenrascam- me no comer, às vezes eles fazem o jantar para mim, conhecem-me desde pequenito e tratam-me

como fosse filho deles. Tenho uma prima que

tem uma hortinha em que eu dou uma mãozinha e ela dá-me alguns legumes. E depois também levo para os vizinhos que dão-me de comer.»

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