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Em One Laptop per Child (2014d), ao apresentar a missão da OLPC, os responsáveis pelo projeto questionam a motivação de se distribuir um laptop para uma criança que não possui eletricidade ou mesmo água encanada. Persuasivos, os mentores da OLPC convidam à reflexão sobre a mesma questão, substituindo a palavra “laptop” por “educação”. Com esse discurso, a OLPC reforça o pensamento de que a educação é base de um mundo mais justo, derivando dela a construção de soluções para desafios sociais, como o combate à fome e à falta de moradia entre outros. Dessa forma, a Organização busca justificar que sua missão não é um projeto de distribuição de tecnologia, mas um projeto educacional que envolve tecnologia.

Então, quais seriam as funcionalidades do laptop educacional que potencializam a mediação pedagógica? Almeida e Prado (2011) consideram a

conectividade, a mobilidade, a imersão e a interoperabilidade dos laptops como

elementos capazes de contribuir para a reconfiguração das práticas pedagógicas. Para tanto, além do apoio e formação ao professor, as autoras defendem o uso do laptop em diferentes atividades e espaços, de maneira dialógica e a fomentar a aprendizagem individual e coletiva.

Essa concepção dialógica vai além do uso do laptop e envolve, sobretudo, o desenvolvimento de novos contextos de aprendizagem com base na prática social compartilhada, na produção colaborativa de conhecimentos e na reflexão sobre essa própria prática (ALMEIDA; PRADO, 2011, p. 14).

As pesquisadoras expressam que o viés educacional do uso do laptop suplanta as concepções tradicionais do ensino, o que propicia a integração da escola à cultura digital.

Entendemos o aspecto da conectividade dos equipamentos como a funcionalidade do laptop que permite acesso à internet. Por intermédio de uma rede sem fio (wireless), o laptop traz para o cotidiano do aluno e do professor a possibilidade de trabalho com a informação online, uso de diferentes mídias do ciberespaço no ensino e na aprendizagem, dinamização de processos dialógicos em rede, criação e publicação de trabalhos etc.

Além disso, por ser um equipamento pequeno e com alguma autonomia de funcionamento, o laptop educacional permite que as ações pedagógicas sejam realizadas dentro e fora do ambiente escolar. Essa característica do equipamento diz respeito à mobilidade. Com o computador móvel, a escola partícipe da cultura digital não fica refém de seu laboratório de informática como o local exclusivo para o uso da tecnologia na escola. Novos espaços e contextos podem passar a compor as estratégias para a criação e representação do conhecimento, o que reforça que podemos aprender a qualquer hora e em qualquer lugar. Tudo isso acaba por representar a característica da imersão na cibercultura possibilitada pelo uso do

laptop pelos sujeitos da educação na modalidade 1:1. Dessa forma, a imersão

contraria o uso episódico da tecnologia em um espaço de lugar e/ou tempo fixo(s), rompendo com a lógica estabelecida pelo laboratório de informática do ambiente escolar.

Finalmente, por interoperabilidade compreendemos os aspectos intrínsecos ao design do laptop educacional que possuem uma interface intuitiva e, portanto, de fácil manipulação e entendimento. Os softwares para a edição de textos, construção de apresentações, manipulação de fotografias (entre outros), aliados às facilidades de publicação do ciberespaço, potencializam a ação discente de maneira individual e coletiva.

Todos esses aspectos e funcionalidades podem ampliar as possibilidades criativas do indivíduo e, se devidamente estruturadas, podem resultar em ganhos qualitativos para o ensino e para a aprendizagem. Levando em conta a adoção das TDIC e a respectiva mediação pedagógica dos professores, o que se espera é o desenvolvimento de uma dinâmica educacional na qual o aluno assume uma postura mais ativa, com exercício de autoria frente ao saberes de referência, podendo desenvolver novos hábitos e habilidades na busca de referenciais para a solução de

problemas, bem como a construção dialógica/colaborativa do conhecimento. Esses esforços mostram que o

[...] uso de uma tecnologia da comunicação não se limita ao manuseamento instrumental da tecnologia ou à sua utilização em ordem à automatização total ou parcial de processos. O uso é um fenômeno participatório e colaborativo que implica uma apropriação efectiva da tecnologia pelo sujeito (DAMÁSIO, 2015, online).

Mesmo por que

[...] o essencial não é a tecnologia, mas um novo estilo de pedagogia sustentado por uma modalidade comunicacional que supõe participação, bidirecionalidade e multiplicidade de conexões entre os atores envolvidos na construção coletiva do conhecimento e da própria comunicação (SILVA, 2000, p. 22).

Percebemos que o professor precisa estar preparado para aliar as funcionalidades das TDIC às situações de aprendizado, reconhecendo a efetividade pedagógica daquelas, de modo a reconfigurar não só sua prática, mas também a própria maneira de aprender de/com seu grupo de alunos. As estratégias didáticas com o laptop educacional são complexificadas de forma a poder fazer emergirem processos de aprendizagem mais significativos, a incitar a participação, o diálogo e a produção de conhecimento. É o que Silva (2000) caracterizou como princípios da interatividade: a participação-intervenção, que convida os interagentes a superarem a opinião simplista do “sim ou não” frente às reflexões, buscando um posicionamento crítico frente ao que é discutido; a bidirecionalidade-hibridação, que prevê a transposição dos polos emissores e receptores para a coautoria e produção de conteúdos, rompendo com a lógica da transmissão; e a permutabilidade-

potencialidade, que valoriza o conhecimento construído e veiculado em uma rede

livre e articulada de conexões, associações e significações. Assim,

[...] o uso do Laptop Educacional na perspectiva de um computador por aluno, impulsiona novas relações em sala de aula e exige uma gestão dos tempos e dos espaços diferenciada do que ocorre em salas de aulas comuns, o que poderá impulsionar uma nova forma de trabalhar do professor, de organizar e gerir a sala de aula [...], mas não será o uso da tecnologia o criador dessas possibilidades, mas um conjunto harmonioso de recurso tecnológico, metodologia de

trabalho docente e ambiente propício à interação aluno–máquina, aluno–aluno e aluno–professor (MENDES, 2008, p. 22).

Mendes (2008) relata a complexificação das relações na sala de aula na cibercultura. Concordamos com o que a autora indica em sua pesquisa ao delegar ao verdadeiro poder transformador da prática pedagógica um amálgama de fatores que envolve sujeitos e suas relações entre si e com o ambiente onde se promove a aprendizagem, bem como com a apropriação e o uso das tecnologias com viés educacional. Essa sala de aula reconfigurada apresenta-se como um ambiente onde o professor passa a organizar estratégias e recursos – inclusive as TDIC – de maneira a expandir as possibilidades dialógicas, a exploração de conteúdos e a participação ativa de todos os envolvidos na efetivação da aprendizagem.

Assim como o giz e o quadro negro, o uso das NTICs28 exige ética,

planejamento, condições técnicas adequadas e pessoas capacitadas. A diferença é que a tecnologia amplia espaços físicos de atuação e permite uma nova racionalidade de tempo de estudo, tanto para o docente quanto para o discente. Isso altera o tipo de relação entre alunos, professores e funcionários técnico-administrativos. Essas características trazem em seu bojo alguns desafios, que só serão superados por organizações educacionais capazes de mudar (GUIMARÃES, 2005, p. 23).

Fechamos esta seção com o trabalho de Guimarães (2005), que alerta e reforça o que expusemos na primeira subseção deste capítulo. As possíveis mudanças com o laptop educacional implicam questionamentos, incertezas e desafios. As efetivas contribuições da incorporação das TDIC à prática pedagógica exigem – além de investimentos e infraestrutura – formação adequada e, fundamentalmente, a adesão docente. Só assim é possível pensar o desenvolvimento de propostas educacionais que, democraticamente, revelem a escola como um espaço incluído e que prove a inclusão na cibercultura.

CAPÍTULO IV

ESTUDO DE CASO EM TIRADENTES (MG/BRASIL)

Insanidade é fazer as coisas sempre do mesmo jeito e esperar resultados diferentes.

Albert Einstein (BRAINYQUOTE, 2015, tradução nossa)

Este capítulo compreende a contextualização da cidade e da escola eleitas como cenários de pesquisa no Brasil – Tiradentes (MG) e a Escola Municipal Marília de Dirceu (EMMD) – além de dados sobre a formação ofertada no Projeto UCA. Também, apresenta nosso estudo com duas professoras que trabalharam na EMMD no ano de 2011 e partilharam suas experiências. Trazemos em nossa análise o perfil de uso das TDIC dos sujeitos pesquisados e os resultados compilados com a ajuda do Atlas.ti confrontados a nossa rede teórica. A EMMD foi escolhida por possuir maior número de professores (14) e alunos (240) quando se deu a implantação do Projeto UCA em Tiradentes (UCA, 2014d).