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2.4 Legendagem

2.4.5 Legendagem e Tradução intercultural

Tomando como referência Toledo (2015, p. 84), a tradução intercultural é fruto das ondas migratórias originárias do século XX devido à opressão de regimes ditatoriais e de conflitos armados. Tais migrações proporcionaram o inter- relacionamento entre culturas diferentes entre si. É nesse contexto que a tradução

intercultural surge como responsável pelo ―diálogo entre culturas‖ e pela

―intermediação entre duas visões de mundo distintas‖.

Ainda na atualidade, existe o entendimento de tradução com apenas uma simples transposição de uma língua estrangeira para uma língua nacional. Neste entendimento simplório, exclui-se a presença de um contexto para que a tradução venha a ser bem-sucedida. A tradução intercultural tem a sua importância neste contexto, pois com ela há a possibilidade de o ato tradutório se realizar de maneira contextualizada, buscando sempre compreender as situações culturais as quais ele se realizou.

Bassnett e Trivedi (1999, p. 2) corroboram com este ponto de vista quando dizem que:

A tradução não acontece no vácuo, mas num conjunto de partes unidas entre si; não é um ato isolado, é parte de um processo contínuo de transferência intercultural. Além disso, a tradução é uma atividade altamente manipulável que envolve todos os tipos de etapas nesse processo de transferência através das fronteiras linguísticas e culturais. A tradução não é uma atividade inocente ou transparente, mas é altamente carregado de significado em cada estágio; raramente, provavelmente nunca, envolve uma relação de igualdade entre textos, autores ou sistemas.

Segundo Valente (2010, p. 162), as últimas duas décadas os Estudos da Tradução (ET) vêm também dando atenção a questões de ordem cultural, não apenas mais se limitando tão somente a questões de ordem linguística.

Percebe-se que o processo tradutório está intimamente ligado à cultura à qual o material a ser traduzido é pertencente. Traços culturais como, por exemplo, religião, gastronomia e hábitos cotidianos devem ser cuidadosamente levados em consideração no desenvolvimento da legenda. É certo que ao desenvolver um produto audiovisual, uma produtora pensou antes a qual mercado (país e cultura) aquele material seria primeiramente destinado. Inevitavelmente, devido à globalização, que abre cada vez mais as portas para o multiculturalismo, estes materiais, ora produzidos para um

mercado específico, tornar-se-ão disponíveis para as mais diversificadas culturas e línguas, surgindo, neste momento, a necessidade do uso das legendas em língua alvo.

Por conseguinte, teremos situações em que a tradução por legendas será facilitada pela equivalência, não necessariamente perfeita, entre sociedades e culturas. Fernandes (2007, p. 87) declara que não havendo essa equivalência, surge o conceito de equivalência zero, que ocorre quando não existe correspondência para uma unidade lexical em uma língua alvo: são os chamados vazios referenciais; ou como Vinay e Darbelnet (1995, p. 31) nomeiam, lacuna. Ao ocorrer uma situação desta, de acordo com estes autores, o profissional de tradução deve expor ao espectador um termo substituto o mais equivalente possível:

O tradutor tem um dever (o de reconhecer e compreender o significado do termo) e três opções: deixá-lo como está, traduzir de modo semi-literal ou adaptá-lo completamente ao mundo cognitivo do público alvo da versão legendada. A estratégia empregada depende do próprio termo, da natureza do programa e do tradutor.

Desta maneira, Vinay e Darbelnet (1995, p. 31) afirmam que o tradutor tem a opção de escolher entre dois grandes grupos qual procedimento tradutório (PT) de elementos linguístico-culturais ele irá utilizar: a tradução direta ou literal ou a oblíqua / não-literal. A seguir discorremos sobre estes dois grupos, segundo Vinay e Darbelnet (1995, p. 31):

2.4.5.1 Tradução Direta (Literal)

Na tradução direta ou literal, ocorrem os procedimentos tradutórios (PT) em que o tradutor possui a opção de transpor elemento por elemento da língua fonte para a língua alvo, devido à existência de um paralelismo estrutural e metalinguístico entre os dois idiomas. Neste grupo temos os PT empréstimo, calque (decalque) e a

2.4.5.1.1 Empréstimo

No processo de resolução de uma lacuna, este procedimento é o mais simples de todos. Ele consiste em copiar ou utilizar a própria palavra da língua original no texto da língua da tradução. O objetivo é tornar a tradução o mais próximo possível da noção que se deseja expressar em relação à língua original. Como exemplo, podem- se citar as palavras online (LI), pizza (língua italiana) que são utilizadas tal e qual como são usadas na língua estrangeira ao serem usadas no PB.

2.4.5.1.2 Calque ou Decalque

É um tipo especial de empréstimo em que uma língua toma emprestada uma expressão de outra e traduz literalmente cada um de seus elementos. Há dois tipos de calque. O primeiro é o calque léxico ou de expressão, que também é comumente conhecido como ―aportuguesamento‖ de uma palavra estrangeira. Ele consiste em utilizar palavras já existentes na língua a ser traduzida, respeitando também sua estrutura sintática. Bons exemplos deste tipo de ocorrência tradutória são as palavras

volleyball, whisky, abat-jour, lasagna do inglês, galês, francês e italiano

respectivamente, que em português são traduzidos como voleibol, uísque, abajur e lasanha.

O segundo tipo é o calque de estrutura que consiste em introduzir uma nova construção (expressão) na língua de chegada. A expressão idiomática ou vocábulo é construído por elementos da língua meta, mas nos moldes da língua estrangeira. Exemplos de disso são skyscraper e pur-sang, do inglês e francês respectivamente, que em português são traduzidos como arranha-céus e puro-sangue. Venuti (1998) chama este tipo de tradução de Estrangeirização, opondo-se ao processo de Domesticação.

2.4.5.1.3 Tradução literal, direta ou palavra por palavra

Este tipo de método de tradução é aplicado quando comparamos dado segmento do texto fonte com o texto alvo e encontramos o mesmo número de palavras, na mesma ordem sintática, empregando as mesmas classes de palavras, e a escolha de

sinônimos lexicais. Para Vinay e Darbelnet (1995, p. 31), a tradução literal é, em princípio, uma solução completa em si mesma, única e reversível, pois a retradução teria como resultado precisamente o texto original. Podemos exemplificar com a sentença My

house is blue. Ao traduzirmos esta sentença para o português, teremos como resultado

Minha casa é azul. Comparando a sentença em LI e a tradução em língua portuguesa,

observamos o mesmo número de palavras, a mesma ordem sintática e uso das mesmas classes gramaticais.

2.4.5.2 Tradução Oblíqua ou Não literal

Na tradução oblíqua ou não literal, ocorrem os PTs que não são literais. Isto porque há casos em que a tradução literal não é possível, pois, o texto que seria produzido na língua da tradução poderia ter significado diferente do original, não possuir significação, ser estruturalmente impossível, não ter equivalência na cultura da língua da tradução ou dispor de correspondência, mas não no mesmo registro. Os PTs inseridos neste grupo são transposição, modulação, equivalência e adaptação. A seguir teceremos comentários acerca de cada um desses PTs.

2.4.5.2.1 Transposição

Este procedimento de tradução envolve substituir uma palavra de uma classe gramatical por outra palavra de outra classe gramatical sem que o sentido venha a ser alterado. Este procedimento ocorre, por exemplo, quando uma palavra é transformada em mais de uma unidade lexical (Sunset= Pôr do sol), quando duas unidades lexicais são convertidas em uma (It rained = Choveu), quando há mudança em classes de palavras (should he arrive late = se ele chegar atrasado) ou quando há qualquer alteração na ordem das palavras (yellow flower = flor amarela).

2.4.5.2.2 Modulação

A modulação está ligada a mudança da estrutura semântica do texto, mas mantendo o significado geral da ideia. É, por exemplo, traduzir It is easy to demonstrate como não é difícil demonstrar.

2.4.5.2.3 Equivalência

O procedimento tradutório da equivalência consiste na troca de um fragmento do texto original por outro que não o traduz literalmente, mas lhe é funcionalmente equivalente. É aplicado a elementos fixos de uma língua, como clichês, expressões idiomáticas, provérbios, ditos populares, onomatopeias de sons de animais, etc. Exemplos são cocoricó, onomatopeia do som de uma galinha em português e cock-

a-dodle-do, onomatopeia do som de uma galinha em inglês e antes tarde do que nunca,

expressão idiomática do português que é equivalente a better late than never, do inglês.

2.4.5.2.4 Adaptação

Neste sétimo procedimento tradutório, alcançamos o limite da tradução. É adotada naqueles casos onde a situação extralinguística referida pela mensagem da língua a ser traduzida é inexistente na cultura da língua de chegada. Nestes casos os tradutores necessitam recriar outra situação que possa ser considerada como sendo equivalente, no contexto extralinguístico da língua de chegada.