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4 O CONTROLE SOCIAL DOS GASTOS PÚBLICOS E A

4.5 A lei de acesso à informação

A lei de acesso à informação (nº 12.527/11) foi promulgada em 18 de novembro de 2011, com o objetivo de regulamentar o acesso à informação pública, aumentando, assim, a

transparência na atividade administrativa 125. O processo que resultou nesse ato foi inspirado

122 Sobre o dispositivo e, mais uma vez, a necessidade de tornar as informações aceitáveis a todos, “Não basta,

porém, que a parafernália de documentos que compõem a prestação de contas fique disponível, trancafiada nos armários do Poder Legislativo ou do órgão técnico que as elaborou. É necessária a criação de mecanismos simplificados para a verificação de tais documentos por qualquer membro da comunidade” (CRUZ, 2001, p. 146).

123 No mesmo sentido, “É importante destacar, no entanto, que o cumprimento literal da regra, com oferta à

comunidade apenas de informações pertinente ao ano em curso, por si só, não pode satisfazer integralmente o objetivo republicano da Lei Complementar n. 101. A transparência fiscal exige informação suficiente, completa e adequada, de maneira a permitir o conhecimento e o controle das contas públicas, bem como a participação popular em sua gestão. Destarte, é fundamental que a sociedade possa ter acesso permanente às contas dos anos anteriores, não apenas do ano em curso, procedendo assim às comparações e aos contrastes necessários à construção de suas próprias conclusões” (MENDES, 2011, p. 397).

124 Como exemplos das mencionada críticas, cite-se: “Apesar destes avanços formais, inexiste ainda, na esfera

federal, qualquer disposição legal ou regulamentar que assegure aos cidadãos por meio da participação direta, a possibilidade de interagirem com o Poder Público durante a fase de elaboração e discussão do Orçamento Geral da União. Os princípios constitucionais e o fixado na Lei de Responsabilidade Fiscal dependem de regulamentação, sem o que permanecerão letra morta, convalidando-se, pela omissão dos Poderes, a sua inefetividade” (SANTOS; CARDOSO, 2002, p. 286).

125 Nesse sentido, “[...] a lei tem por escopo a concretização do direito fundamental à informação, marcado pelos

num movimento crescente nas últimas duas décadas, por intermédio do qual normas concernentes ao acesso à informação, em diversos países, foram criadas ou atualizadas (PAES, 2011, p. 408).

Indiscutivelmente, antes do advento da lei nº 12.527, o ordenamento jurídico brasileiro já apontava para a possibilidade/necessidade de propagar as informações públicas. Inclusive, logo no artigo 1º da norma em comento, indicam-se os dispositivos constitucionais que serviram de esteio para a sua criação: o inciso XXXIII do art. 5º, o inciso II do § 3º do art. 37 e o § 2º do art. 216. No campo infraconstitucional, diversas leis continham artigos que determinavam o acesso à informação por parte dos cidadãos, como a lei complementar nº 101/00 e as leis ordinárias nº 10.650/03 e nº 11.111/05. Não se pode afirmar, assim, que o diploma inova ou revoluciona no direito brasileiro. Trata-se, na realidade, do resultado de um processo ainda em curso, inaugurado pela CF/88, de ampliação dos meios de democratização do exercício do poder (CLÈVE; FRAZONI, 2013, p. 29; PEREIRA, 2012, p. 56).

É inegável, no entanto, a contribuição da lei em comento, pois a regulamentação detalhada de procedimentos de disponibilização/requerimento de informação, de parâmetros para restrições a esse acesso e de responsabilização dos agentes públicos fortalece a

concretização da publicidade das informações (CLÈVE; FRAZONI, 2013, p. 30) 126.

Antes do início do processo legislativo que resultou na lei, vários projetos tratando do assunto surgiram em ambas as Casas do Congresso Nacional. As discussões tiveram início em 2004, com o PL nº 219/03. De 2006 a 2007, um grupo de técnicos, sob a coordenação da Casa Civil, reuniu-se para elaborar uma minuta do projeto de lei de acesso à informação. A iniciativa resultou de reivindicações de entidades da sociedade civil, da imprensa e do meio acadêmico (PEREIRA, 2012, p. 56-57). A elaboração do texto contou com a colaboração de membros da Controladoria-Geral da União, do Ministério da Justiça, do Ministério da Defesa e do Ministério das Relações Exteriores, dentre outros. Em maio de 2009, finalmente, o projeto foi enviado para apreciação do Congresso Nacional. Na Câmara, como PL nº 5.228/09, dentre as alterações por que transitou, se pode destacar a explicitação da aplicação da norma a todos os Poderes, ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas, aos órgãos

proteger e atingir, e que, portanto, devem ser considerados como base inafastável de interpretação e aplicação” (SILVEIRA, 2013, p. 141).

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No mesmo sentido, “O direito de acesso às informações governamentais no Brasil, até recentemente, permanecia incompleto, devido, entre outras coisas, a uma interpretação restritiva daquilo que prevê o Artigo 5º, Inciso XXXIII, da Constituição Federal. Entre o dever de sigilo e o direito à informação, a burocracia permanecia acuada, pois não possuía parâmetros legais suficientes para fundamentar as respostas aos pedidos de informação” (PAES, 2011, p. 408).

públicos, às entidades públicas e às particulares que recebam recursos públicos. No Senado, o já PL nº 41/10 foi objeto de debates e diversas propostas de alteração, que, contudo, não foram levadas a cabo, de forma que o texto egresso da Câmara seguiu para sanção presidencial (PAES, 2011, p. 412-414).

De acordo com o texto aprovado, a divulgação das informações deve obedecer a diversas diretrizes listadas no seu artigo 3º, dentre as quais, se destacam, pela pertinência com o abordado até aqui: a publicidade como regra, e o sigilo como exceção; a utilização da tecnologia como ferramenta para a divulgação das informações; e o fomento do controle social da Administração Pública.

A publicização das informações pode ocorrer de duas maneiras, de acordo com o regime legal instituído pela norma. A primeira caracteriza-se por ser voluntária, partindo da própria Administração a divulgação de informações de interesse coletivo ou geral em local de

fácil acesso, sendo obrigatório a utilização da internet 127. Importa ressaltar que os sítios

eletrônicos, de acordo com o inciso I do §3º do artigo 8º, devem conter ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à informação de forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão. Dentre os dados que devem ser objeto da divulgação ativa, então os registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos financeiros; os registros das despesas; e as informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados. Ademais, para fomentar essa divulgação e garantir que as informações cheguem efetivamente ao cidadão, o artigo 9º da lei determina a criação de serviço de atendimento ao público nos órgãos e entidades públicas e a realização de audiências ou consultas públicas.

A outra modalidade de acesso à informação ocorre mediante requerimento, que pode ser feito eletronicamente por qualquer interessado, bastando, para tanto, a identificação do requerente e a especificação da informação requerida. Fica, portanto, vedada qualquer exigência relacionada à motivação do ato ou de outra natureza que inviabilize a solicitação. Nesse ponto, andou bem o legislador, pois, quanto maior o nível de exigência, maior também é a margem de discricionariedade atribuída à Administração, aumentando as chances de a informação não ser prestada (PAES, 2011, p. 415).

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Por força do § 4o do artigo 8º da lei, ficam dispensados na divulgação obrigatória na internet os municípios com população de até 10.000 habitantes.

Após o requerimento protocolizado, a disponibilização da informação deve ser imediata, todavia, quando isso não for possível, dá-se um prazo de 20 dias, dentro do qual a Administração deve comunicar a data, o local e o modo de realização da consulta; justificar a recusa do acesso pretendido; ou comunicar não possuir a informação, esclarecendo, todavia, qual o órgão responsável por ela, podendo, inclusive, remeter a este o pedido do requerente.

Conforme comentado anteriormente, o acesso à informação poderá ser negado. Essa recusa da prestação na informação será possível quando ela for classificada como sigilosa. Nesses casos, há possibilidade de interposição de recurso por parte do requerente, e é dever da Administração fornecer, juntamente com a negação, as informações necessárias a sua interposição (prazos e condições).

De acordo com o artigo 15 da lei em pauta, o interessado, tendo ciência da decisão denegatória, possui prazo de dez dias para recorrer ao órgão hierarquicamente superior ao recorrido. No caso de segunda negação, para os órgãos federais, a própria lei aponta a Controladoria-Geral da União como outra instância recursal, seguida pela Comissão Mista de Reavaliação de Informações.

Sobre o sigilo, importa ainda esclarecer que a lei tratou de enumerar, sem excepcionar o que já está previsto em outros diplomas normativos, as causas responsáveis por tornar uma informação sigilosa, bem como o prazo pelo qual ela pode permanecer nesse estado.

Dentre as causas que podem restringir o acesso à informação, está o seu potencial de pôr em risco a defesa e a soberania nacionais, as negociações internacionais, a estabilidade financeira e econômica do País e os projetos de pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico.

Na qualidade de sigilosas, as informações podem ser classificadas em três tipos: ultrassecretas, cujo sigilo pode durar até 25 anos; secretas, sigilosas por até 15 anos; e reservadas, por cinco anos.

Para dar maior força cogente às suas determinações, a lei não se furta do disciplinamento da responsabilidade do agente público, tipificando como ilícitas condutas que obstem de alguma forma a consecução das finalidades da norma, como a recusa à disponibilização de informação, o retardamento dessa publicização ou, ainda, a sua realização de forma incorreta ou incompleta. Dentre as sanções previstas pelo diploma para a prática dessas condutas, citem-se: advertência, multa e rescisão do vínculo com o poder público.

Para garantir, contudo, o alcance dos objetivos perseguidos pela norma, não basta, obviamente, a regulação detalhada da questão. Torna-se imprescindível, ainda, a capacitação dos destinatários da lei. Refere-se aqui tanto aos agentes públicos quanto à população responsável pela realização do controle da Administração mediante as informações obtidas.

Quanto aos primeiros, uma pesquisa realizada pela Controladoria-Geral da União em parceria com a UNESCO, em 2011, junto aos servidores do Poder Executivo, detectou uma situação de despreparo para lidar com questões relacionadas ao tratamento de arquivos e às informações sigilosas, marcado pelo desconhecimento dos conceitos e dos limites desses temas. Ademais, segundo a mesma pesquisa, também não se pode atestar a existência de uma cultura de máxima transparência na Administração Pública brasileira, pois 40,7% dos entrevistados mostraram-se a favor do sigilo eterno das informações (PAES, 2011, p. 417- 418) 128.

Já com relação aos cidadãos, não se pode afirmar que a disponibilização das informações ou a possibilidade de requerê-las, por si, tenham a faculdade de torná-los aptos à realização de seu mister referente ao controle social. Isso porque, inicialmente, é necessária a existência do interesse para fazê-lo, e, posteriormente, impõe-se que haja também uma capacitação apta a dar-lhes os conhecimentos necessários para compreender o conteúdo divulgado. Aqui não se está no intento de reduzir a importância da lei para a democratização do exercício do poder, mas, indubitavelmente, sem esses dois elementos mínimos, não se

pode afirmar que a norma atingirá seus objetivos 129.