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1.4 PERSPECTIVAS METODOLÓGICAS PARA O ENSINO DA LEITURA

1.4.6 Leitura e projetos didáticos

Agora trataremos do planejamento e dos projetos didáticos, que podem, a nosso ver, ser um fio condutor para uma prática significativa de linguagem na escola. Defendemos o ensino sistemático da interpretação reflexiva, dentro de seqüências didáticas bem definidas, para o desenvolvimento da compreensão do mundo e, conseqüentemente, para a formação do leitor proficiente.

Jolibert (1994) e Kaufman e Rodriguez (1995) são estudiosas que defendem e apresentam propostas do trabalho com língua portuguesa a partir do planejamento dos projetos didáticos para a educação infantil e o ensino fundamental.

Jolibert (1994) afirma que a pedagogia de projetos gera o engajamento da criança com o seu próprio aprendizado e facilita a vivência de atividades reais. A autora enumera características e vantagens dessa prática, que auxilia os aprendizes a:

a) não depender mais apenas das escolhas do adulto;

b) viver a experiência positiva do confronto com os outros (aportes mútuos e conflitos a serem superados) e da solidariedade;

c) decidir e comprometer-se após a escolha;

d) projetar-se no tempo através do planejamento de suas ações e de seus aprendizados;

e) assumir responsabilidades;

f) ser agentes de seus aprendizados, produzindo algo que tem um sentido e uma unidade (p. 21).

A autora citada apresenta três tipos de projetos como forma de melhor definição dos objetivos e situações a serem trabalhadas, que são: projetos referentes à vida

cotidiana; projetos-empreendimentos e projetos de aprendizado.

O primeiro tipo se relaciona ao trabalho cotidiano na escola, ao funcionamento desse ambiente que está especialmente planejado para o ensino. Os projetos da vida cotidiana conduzem à organização e vivência de elementos como tempo, espaço, atividades, responsabilidades e regras ou combinados da vida escolar etc. Os projetos- empreendimentos são aqueles centrados no funcionamento administrativo da escola. Esses projetos são complexos e de grande impacto para a comunidade escolar. São definidos em torno de uma meta mais ampla, por exemplo: organizações do pátio, uma excursão, instalação de biblioteca etc. O último tipo são os projetos de aprendizado. Esses projetos envolvem as aprendizagens da criança que nascem do desejo de compartilhar as expectativas sobre os conteúdos de formação que eram exclusivamente reservados para os docentes. Esses três projetos foram postos de forma separada para uma maior

compreensão, porém sua estrutura de funcionamento é integrada e todos eles podem ser ativados em qualquer momento das práticas escolares.

O trabalho com projetos proporciona ao aluno algumas vantagens em termos de sua constituição como leitor, na medida em que, havendo propósitos para a leitura, sendo a leitura uma prática social com funções definidas em cada contexto de interação, e tendo sido estabelecidos conjuntamente os objetivos do trabalho pedagógico, esse aluno se engaja nas atividades e se torna sujeito de sua aprendizagem. Além disso, os projetos permitem ao aluno desenvolver sua autonomia, organizar-se para o trabalho em grupo, avaliar-se entre outras questões. Tudo isso vai exigir a leitura e a escrita de materiais diversos, tornando a leitura significativa e fundamental.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (BRASIL, 1998) tratam dos projetos como organizações didáticas especiais e ressaltam a importância de o objetivo de todo o trabalho pedagógico ser compartilhado por todos que fazem parte da escola. Assim, o que torna o projeto significativo na prática educativa e, principalmente, na prática de leitura, se caracteriza por três aspectos, são eles: destinação, divulgação e circulação social. Segundo os PCN,

os projetos favorecem, assim, o necessário compromisso do aluno com sua própria aprendizagem, pois contribuem muito mais para o engajamento do aluno nas tarefas como um todo, do que quando essas tarefas são desenvolvidas pelo professor (BRASIL, 1998, p. 87).

De acordo com essa afirmativa, os projetos representam uma prática pedagógica significativa para a leitura e para o aluno, que se torna sujeito de sua aprendizagem. Para tanto, os PCN de língua portuguesa deixam claro que o projeto oferece condições reais para a escuta, leitura, produção de textos orais e escritos. Sendo assim, os projetos são norteados por exigência de aspectos pedagógicos e significativos para a leitura, por criar a necessidade de ler e analisar grande variedade de textos e suportes do tipo que se produz:

como se organizam, que características possuem ou quais têm mais qualidade; trata-se de uma atividade de reflexão sobre aspectos próprios do gênero que será produzido e de suas relações com o suporte.

Kaufman e Rodriguez (1995) também são adeptas da pedagogia de projetos (que elas denominam projetos didáticos, em função de sua estreita relação com o processo ensino-aprendizagem), tanto para o ensino de leitura, como para o ensino da escrita. As autoras afirmam que, no planejamento dos projetos didáticos, é preciso considerar os gêneros textuais e suas características.

Brandão, Selva e Coutinho (2006) julgam que os projetos didáticos possibilitam uma aprendizagem contextualizada e significativa, pelo fato de os mesmos conterem um problema a ser resolvido e que interessa a todos os envolvidos no trabalho.

A despeito das variações na denominação, o que parece característico da pedagogia de projetos é o fato de nela serem desenvolvidos trabalhos que valorizam a definição de objetivos claros e a significação da aprendizagem para o aluno. Ao planejar uma aula, nessa perspectiva, o professor precisa ter o projeto elaborado pela equipe, conhecer os alunos, definir objetivos para a aula, utilizar procedimentos viáveis e representativos. No desenvolvimento dessa prática, cabe destacar dois aspectos: o primeiro é a importância do planejamento; o segundo é a importância da avaliação; ambos os elementos possibilitam uma aprendizagem mais contextualizada (cf. BRANDÃO, SELVA e COUTINHO, 2006).

Em termos de leitura, acreditamos que dessa forma o ensino será baseado em objetivos específicos, que poderão, por sua vez, orientar desde a escolha do texto até os procedimentos metodológicos e a avaliação. Nesse sentido, qualquer projeto precisa estar vinculado a uma seqüência de textos que desenvolvam progressivamente a compreensão das crianças.

Acreditamos que a funcionalidade da leitura precisa ser resgatada na escola. Esse aspecto é estruturante de todo o trabalho didático-pedagógico em linguagem e nas demais áreas do currículo. A pedagogia de projetos é uma prática significativa em termos de leitura por tornar mais claros os objetivos e as condições de produção textual e possibilitar a participação do aluno na sua prática educativa. As finalidades da leitura, na perspectiva dos projetos, podem facilitar uma prática significativa que valoriza a reflexão e a formação do leitor crítico na escola.

No próximo capítulo, exporemos a metodologia de coleta e tratamento dos dados de nossa pesquisa.

A Raiz mais profunda da politicidade da

educação se acha na educabilidade mesma do

ser humano, que se funda na sua natureza

inacabada e da qual se tornou consciente.

Inacabado e consciente de seu inacabamento,

histórico, necessariamente o ser humano se

faria um ser ético, um ser de opção, de decisão.

2. PERCURSO METODOLÓGICO

O percurso metodológico representa o direcionamento por que optamos para responder à problemática da nossa pesquisa, ou seja, a escolha do método que consideramos mais significativo para realizar uma investigação no campo da educação, incluindo a definição do corpus e a coleta, o tratamento e a análise dos dados.

A construção desse caminho metodológico nos conduz à criação de uma relação próxima com o objeto de estudo e nos permite vivenciar movimentos de construção e desconstrução do conhecimento, os quais têm implicações no nosso próprio trabalho educativo, no sentido de que este se enriquece com as contribuições advindas da interpretação dos dados coletados. Ao longo do processo de investigação, como já afirmamos anteriormente, vamos construindo conhecimentos e, em cada estágio da pesquisa, estamos elaborando conceitos e transformando-os, acontecendo, assim, a reforma do nosso próprio pensamento.

Podemos dizer, portanto, que a produção do conhecimento que se constitui na pesquisa científica, com os dados coletados em um contexto social complexo, serve de importante elemento para a reforma do processo educativo. Um aspecto significativo é o fato de servir de subsídio para a reflexão sobre a nova perspectiva de educar na complexidade, uma vez que essa complexidade é característica das relações que são estabelecidas na prática educativa. Outro aspecto é o fato de servir principalmente para ajudar os professores e professoras a reconstruírem seus conceitos e a redimensionarem suas práticas educativas a partir dos estudos que possibilitam a reforma do próprio pensamento.

Assim, concordamos com Morin (2000), teórico que se dedica a estudar, entre outros aspectos, a complexidade existente na contemporaneidade, quando afirma que a

reforma do pensamento é condição para a reforma do ensino e é a partir da reforma do ensino que também se transforma o pensamento. É nessa dupla dimensão que se configura a complexidade dos fatos educativos. O autor ainda afirma que a reforma do pensamento refere-se à aptidão do indivíduo de organizar o seu próprio conhecimento. Considerando essa complexidade, o indivíduo precisa construir e reconstruir o seu pensamento diante das rápidas transformações que a sociedade tem sofrido nesses últimos tempos.

Como nosso propósito é discutir o tornar-se leitor e, por extensão, o tornar-se

cidadão (MORIN, 2000), nossa investigação vai além das condições regulares de um dado de pesquisa; ultrapassa a linearidade e, sendo assim, constitui-se de questionamentos diante da realidade analisada. É a partir disso que valorizamos e evidenciamos o olhar qualitativo que foi dado para todo o trabalho, imprescindível, sobretudo, por permitir valorizar o contexto social no qual os sujeitos observados estão inseridos. Para a pesquisa em educação, esse nos parece ser o caminho investigativo que melhor contribui para o tratamento dos dados.