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Capítulo 2. Enriquecimento ambiental

2.2. Enriquecimento ambiental nos locais de estágio

2.2.1. Zoo da Maia

2.2.3.1. Leopardos

Atualmente no centro estavam alojados seis leopardos (cinco leopardos de java - Panthera pardus

melas; um leopardo nebuloso - Neofelis diardi).

Os leopardos de java, nativos da ilha onde se encontrava o centro, são considerados uma espécie criticamente em perigo, principalmente devido à destruição e fragmentação do habitat (IUCN, 2015). Os indivíduos que se encontravam no centro tinham estado associados a conflitos com populações, o que é bastante comum pois com a diminuição da área da floresta os indivíduos mais novos têm de se aproximar das zonas habitacionais na fase de dispersão. Enquanto há populações que chamam entidades como a equipa de resgate deste centro, outras tentam lidar com este assunto sozinhas

a translocação do animal para uma zona de floresta densa até cirurgias para amputação de membros em animais vítimas de armadilhagem. Idealmente, depois da recuperação, os animais seriam libertados no seu habitat natural, mas começa a ser difícil fazê-lo uma vez que as áreas adequadas são tão limitadas que muitos animais resgatados e recuperados não podem ser devolvidos à Natureza.

O leopardo-nebuloso foi confiscado a um traficante de animais selvagens quando ainda era uma cria tendo sido criado à mão no centro. A probabilidade de este animal ser devolvido à Natureza é menor e, nestes casos, o centro tenta procurar outros centros especializados na espécie, transferindo o animal. Todavia, não existe nenhum centro dedicado a esta espécie, por isso este animal ficará em Cikananga por tempo indefinido.

Os leopardos de java estão em recintos individuais que incluem uma zona interior e uma exterior que podem ser separadas criando um bloco isolado. A zona exterior está coberta de vegetação arbustiva e árvores e cada uma possui também um lago com pouca profundidade. O leopardo nebuloso está alojado noutro bloco em que os recintos são menos naturais com piso de cimento e sem vegetação. Por outro lado, este tem vários troncos dispostos de maneira a que possa usufruir das três dimensões do recinto e são introduzidos objetos de enriquecimento ambiental com mais regularidade que nos recintos dos outros indivíduos.

Uma das formas mais simples de introduzir enriquecimento ambiental é através da alteração da maneira como é apresentada a comida. Simples mudanças como o(s) local(ais), hora, frequência ou estado físico do alimento podem fazer diferença no nível de estimulação do animal (Young, 2003).

No caso de predadores, o enriquecimento ambiental pode ser até uma “presa” móvel que o indivíduo tem de caçar, ou até uma presa viva, sendo uma ferramenta importante na manutenção da boa condição física dos animais, uma vez que promove o movimento.

Os leopardos não eram alimentados diariamente e a sua dieta era principalmente à base de frango e peixe, as proteínas mais comuns nesta zona, que eram apresentadas de dois formatos distintos.

O frango era colocado sobre as grades que cobriam o topo dos recintos. Assim, os animais tinham de saltar e agarrar-se a estas e com as patas ou a boca ir agarrando partes de carne que levavam para o solo e ingeriam antes de voltar a saltar para o teto do recinto para obter mais um pedaço. Este exercício além de aumentar a duração da refeição, é também essencial para a manutenção da condição física dos animais. Esta característica é especialmente importante em animais temporariamente em cativeiro podendo ser um fator a avaliar na decisão de libertação ou não (Reading, Miller e Shepherdson, 2013).

Figura 19 – Alimentação dos leopardos com frango sobre a grade do recinto

Por seu lado, o peixe era colocado vivo nos lagos tendo os animais de o pescar, o que poderia demorar algum tempo. A nível ético e até legal, esta é uma forma de enriquecimento ambiental muito controversa que, apesar de dividir opiniões, já se verificou provocar bons resultados no comportamento de felinos (Ings, Waran e Young, 1997; Quick, 1984; Wooster, 1997; Young, 2003).

Em zoos existe um problema adicional que consiste na aprovação, ou não, do público, no entanto, tanto Ings (1997) como Cottle (2009) verificaram que este não é tão impressionável como esperado aceitando a utilização de presas vivas como insetos, peixes e até coelhos (com uma taxa de consentimento decrescente) principalmente se essa prática for feita em áreas restritas ao staff.

Neste caso específico o público não tem um papel relevante pois é inexistente. Por outro lado, levanta-se outra questão que favorece a utilização de presas vivas, a possível reintrodução no habitat natural. Como já referi, em animais em que há intenção de libertar, o enriquecimento ambiental tem o papel fundamental de os preparar para a vida na Natureza, sendo o uso de presas vivas e a alimentação não diária dois instrumentos importantes (Reading, Miller e Shepherdson, 2013; Young, 1997).

Outra forma de enriquecimento ambiental que considerei bastante interessante está relacionada com os recintos em si. Durante o meu estágio em Cikananga foram conseguidos fundos para a construção de um novo bloco para os leopardos e eu tive a oportunidade de partilhar as minhas opiniões aquando do planeamento destas. Uma das características mais interessantes que este edifício terá é funcionar em sistema rotativo, ou seja, os recintos serão individuais mas não se destinarão apenas a um indivíduo específico, havendo a rotação destes por todos os recintos. Assim, os leopardos terão acesso a vários tipos de estímulos olfativos como fezes, urina e outras secreções provenientes de indivíduos da mesma espécie. Mais uma vez, esta prática desempenha um importante papel tanto na vida em cativeiro como no futuro de animais para reintrodução uma vez que é uma excelente forma de enriquecimento ambiental e que, principalmente para animais que dependem do olfato como sentido principal, é uma maneira de comunicação indispensável à vida no seu habitat natural (Reading, Miller e Shepherdson, 2013; Wells, 2009). Este tipo de instalações potencialmente facilita a transmissão de doenças que, no caso de devolução à Natureza, poderão ter repercussões a nível das populações selvagens.

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