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Letramento Digital: Uma Atividade Multitarefa

Face ao que expusemos a respeito dos conceitos de multiletramentos e dos novos letramentos, conceituar o letramento digital poderia ser visto como uma repetição ou extensão conceitual. Isso porque tanto o conceito quanto as características constitutivas das duas primeiras propostas englobam, facilmente, um modo novo e diferente de nos relacionarmos com a escrita e a leitura como práticas discursivas e formas de ação social, seja em ambientes digitais online ou offline, ou mesmo em ambientes não digitais. Esse modo novo de ler e escrever na tela é a característica mais saliente do letramento digital.

No entanto, vale salientar que nas duas propostas discutidas na seção anterior, o termo letramento digital não foi utilizado em momento algum. Nem pelos estudos sobre multiletramentos (THE NEW LONDON GROUP, 1996, online), nem pelos estudos dos novos letramentos (LANKSHEAR e KNOBEL, 2006; KNOBEL e LANKSHEAR, 2007). Deve-se isso ao fato de a noção de ser letrado digitalmente já estar contida nas práticas de escrita e leitura de ambos os estudos, mesmo sem haver utilização do termo. Na verdade, alguns autores, tais como Soares (2006) e Xavier (2005b), consideram o letramento digital como uma nova forma de ler e escrever que utiliza a tecnologia digital, mas que se pauta ainda na noção tradicional de letramento, discutida na seção 3.1.

Para Soares (2006, p. 151), letramento digital é

um certo estado ou condição que adquirem os que se apropriam da nova tecnologia digital e exercem práticas de leitura e de escrita na tela, diferente do estado ou condição – do letramento – dos que exercem práticas de leitura e de escrita no papel.

Para a autora o letramento digital difere do letramento tradicional, essencialmente pelo fato de os indivíduos se apropriarem da tecnologia digital para exercer práticas de escrita e leitura. Ou seja, as práticas são basicamente as mesmas; a mudança diz respeito ao local onde

essas práticas se realizam e/ou às ferramentas utilizadas para sua realização. Devemos nos indagar, na verdade, se estas práticas são, efetivamente, as mesmas, já que o suporte é diferente do suporte tradicional (papel impresso). Para nós, a posição da autora é um tanto simplista, visto que a apropriação, no sentido de domínio, de um programa/aplicativo para enviar e receber e-mails (tecnologia) não irá, simplesmente, replicar a prática anterior de escrita de cartas pessoais ou comerciais. Embora possam fazê-lo, as práticas são diferentes pelo fato de o suporte para leitura e escrita digital também ser diferente. A prática discursiva não será igual simplesmente porque o gênero a ser produzido a partir da nova tecnologia possui características recorrentes e tipificadas. São novas práticas, novos letramentos.

Atualmente não temos somente a tela do computador para processarmos a leitura de um texto qualquer; temos também a tela do telefone celular, do palm top e as telas sensíveis ao toque. E para escrever dispomos de mesas digitalizadores, lousas que transferem o que o professor escreveu para as pastas virtuais dos alunos e até mesmo cadernos digitais. Assim, leitura e escrita como práticas sociais não serão as mesmas em função do suporte nem serão diferentes apenas por causa do suporte. Ambas serão diferentes porque mobilizam saberes diferentes. Isso é já uma exigência da tecnologia, ao mesmo tempo em que é sua restrição. Podemos mobilizar saberes semelhantes, mas nunca iguais aos que mobilizamos quando lidamos com o suporte impresso. Esses saberes serão ativados de acordo com a necessidade de uso de certas tecnologias em conjunção com saberes anteriores (conhecimento do tema, domínio dos gêneros do discursos, etc).

Já Xavier (2005b) nos aponta que ser

letrado digital pressupõe assumir mudanças nos modos de ler e escrever os códigos e sinais verbais e não-verbais como imagens e desenhos, se compararmos às formas de leitura e escrita feitas no livro, até porque o suporte sobre o qual estão os textos digitais é a tela, também digital.

Difere esse autor da definição anterior pelo fato de estar incluída a noção de suporte como elemento responsável pela mudança nos modos de ler e escrever. Porém, há uma lacuna no tocante às diferenças. Seriam elas relacionadas ao estilo, ao conteúdo ou à construção composicional, para fazermos referência aos elementos constitutivos dos gêneros do discurso na definição de Bakhtin (2003)? É possível, ainda, nos perguntarmos se essas diferenças se relacionam exclusivamente ao suporte ou se existem outras variáveis (restrições) que interferem nesse modo diferente de ler e escrever. Variáveis como o tempo de navegação para leitura e escrita online, a habilidade em usar o computador (hardware e software), a

familiaridade com certos usos da linguagem em meio digital (netiqueta, emoticons¸ abreviações), o domínio dos programas necessários para ler e escrever no computador, entre outras.

Essas restrições da situação retórica, a Internet, são responsáveis pelo sucesso ou fracasso na adequação de uma prática discursiva que atenda às exigências dessa mesma situação. Tanto a audiência quanto o autor poderão adequar o seu discurso à situação, lançando mão de formas de ação recorrentes e tipificadas, entretanto tais formas, provavelmente, não estarão adequadas às exigências que o ambiente digital impõe. É relevante lembrarmos que para ser autor na Internet, de acordo com nossa proposta, é preciso que os sujeitos atendam às exigências dos sites de redes sociais dos quais participam.

Tanto a apropriação da tecnologia apontada por Soares (2006) quanto as diferenças nos modos de ler e escrever apontadas por Xavier (2005b) deixam várias questões em aberto. No caso de Soares (2006), essa apropriação da tecnologia se dará em que sentido? A apropriação do código linguístico mais a apropriação da tecnologia? Qual tecnologia? Um editor de textos, um navegador web, um tocador de mídia, um programa de edição de vídeos ou imagens? Ou do teclado, do mouse, da câmera? A qual escrita a autora está se referindo, apenas a verbal, ou um tipo de escrita multimodal, como proposta pelo TNLG (1996,

online.)? No caso de Xavier (2005b), quais mudanças no escrever? Mudanças que incluam

criações lexicais, refletindo variações linguísticas na rede, tal como apontado por Crystal (2001) em relação à língua inglesa, por exemplo? Ou mudanças que incluam uma escrita multimodal através da inserção de um vídeo ou áudio no texto escrito? Ou, ainda, questões relativas ao estilo, em função do meio digital ser mais dinâmico do que o ambiente de escrita acadêmica ou profissional? Ora, todas essas questões são bastante complexas e merecem ser ainda aprofundadas, o que foge ao escopo de nosso trabalho. Entretanto, lançar esses questionamentos agora pode, de certa maneira, instigar a curiosidade científica e promover outros debates sobre o tema.

O que realmente percebemos é a forte presença de definições de letramento digital que se encontram fundamentadas em um esquema de continuidade. Isto é, o letramento tradicional/escolar seria o ponto inicial deste contínuo e o digital seria o ponto final. No entanto, qual é o tipo de letramento que está no meio do caminho desses dois pontos? Um letramento semidigital ou um semiletramento? Essas são questões que Buzato (2007), de maneira bastante exemplar, aborda em sua tese de doutorado sobre a linguagem e o

letramento na inclusão digital. Para esse autor, o letramento digital deve ser entendido como “redes complexas de letramentos (práticas sociais) que se apoiam, se entrelaçam, se contestam e se modificam mútua e continuamente por meio, em virtude e/ou por influência das TIC [tecnologias de informação e comunicação]” (BUZATO, 2007, p. 168).

O letramento digital, segundo esse pesquisador, não é um contínuo no qual outros níveis de conhecimento, além do domínio da leitura, da escrita e da tecnologia, se somam de modo a caracterizar indivíduos como letrados (ou sua ausência a caracterizar indivíduos como iletrados). Sendo redes, os tipos de conhecimento se entrecruzam e se relacionam. Sendo práticas sociais (ou formas de ação social), os nós dessas redes estão continuamente se remetendo a outros nós, sendo (co)dependentes deles. Ocorrendo em meio digital ou por sua influência, tais nós podem ser infinitos, já que não é possível dominarmos todos os tipos de tecnologia – digital e não-digital – que fazem parte dessa rede de conhecimentos. Dessa forma, todos nós somos letrados digitais em algum ponto desses nós que se entrecruzam; não haveria possibilidade, pois, de existirem indivíduos absolutamente iletrados digitalmente. E, em se tratando de autoria na Internet, não haveria a possibilidade de não considerarmos sua ocorrência como sendo intertextual e interdiscursiva.95

É absolutamente importante, contudo, tecermos algumas considerações sobre o que dissemos a respeito da impossibilidade de existirem indivíduos iletrados digitais96 e o seu

contraponto, a universalidade da existência dos indivíduos letrados digitalmente. Ora, o letramento tradicional é, acima de tudo, um fenômeno cultural. De fato, não há possibilidade de existirem indivíduos iletrados. Em maior ou menor grau, sempre haverá um indivíduo (ou grupos de indivíduos) que faz uso da leitura e da escrita como formas de ação social. Esses usos podem ser mediados por outros indivíduos (aqueles que leem uma bula de remédio para um paciente na farmácia, que escrevem cartas em seu nome para um parente em uma cidade distante, etc). Há ainda os que fazem uso da linguagem como práticas sociais, tal é o caso das comunidades ágrafas que perpetuam suas crenças e atividades culturais por meio de ladainhas, lendas, contos e causos.97 Somente por não fazerem uso da leitura e da escrita, esses

indivíduos não podem ser concebidos como não participantes de formas de ação social. Ao contrário, essas práticas é que os definem como grupo social, com características muito

95 Entretanto, devemos considerar que a autoria fora do ambiente digital também é uma prática intertextual e interdiscursiva. Na Internet, existem certos elementos mais salientes em relação a essa prática. Como dissemos, iremos aprofundar essas questões no próximo capítulo.

96 Novamente estamos nos referindo aos indivíduos que são parte de uma comunidade grafocêntrica. 97 O trabalho de Joel Sherzer (1983) sobre os índio Kuna é bem ilustrativo a esses respeito.

singulares. Além disso, se considerássemos letrados apenas os indivíduos que fazem uso da leitura e da escrita, estaríamos perpetuando a ideia de que a fala não é relevante para os estudos da linguagem como práticas sociais. Permaneceríamos no erro de conceber a fala como o lugar do erro, do não planejamento, das variações, ao invés de a entendermos como um fenômeno tão complexo e diverso quanto a língua escrita.

Entretanto, no caso específico do letramento digital, temos que considerar dois caminhos, até certo ponto, paralelos, pois a tecnologia digital exige certo domínio da leitura e da escrita, ainda que minimamente. Diante da “digitalização” do mundo, indivíduos sem domínio do código linguístico se veem impelidos a usar uma ou outra tecnologia, tais como o uso de um caixa eletrônico, a digitação da senha em suas compras com cartão de crédito, o uso de um aparelho de DVD ou de uma TV LCD, nos quais as instruções são dadas na própria tela do aparelho, a manipulação de um telefone celular, etc. Esse seria o primeiro caminho, ou práticas sociais da leitura e escrita mais instrumentais. Em todos esses casos existe a utilização da tecnologia, da leitura e da escrita. É possível que os indivíduos que exercem essa prática não saibam como estendê-la para outros domínios digitais. É indiscutível, todavia, que eles são letrados digitalmente. Eles precisam digitar suas senhas nos caixas eletrônicos e nas operações com cartão de crédito, eles necessitam saber o que diz a tela da TV quando querem assistir a um filme ou sintonizar a TV, eles precisam saber como se localiza, se insere ou se apaga um contato da sua agenda telefônica no telefone celular. Em suma, eles fazem uso da leitura e da escrita como formas de ação social utilizando uma tecnologia digital. Mesmo que esse saber, em muitos casos, seja mínimo.

Já o outro caminho é aquele que estamos perseguindo neste trabalho, isto é, o caminho no qual indivíduos utilizam o computador e a Internet como ferramentas para a ação social para realizarem a autoria como uma prática discursiva multitarefa e multimodal. A popularização dos computadores e da Internet permitiu que a utilização de ambas as tecnologias fossem mais acessíveis aos usuários (Cf. Cap. 2). Como consequência, o ciberespaço permitiu o surgimento de uma infinidade de novas tecnologias no nível de programas. Para cada uma delas, existem públicos específicos e, por essa razão, as práticas de leitura e escrita na Internet são as mais diversas possíveis. São exigências diferentes de uma situação retórica em comum. Há os indivíduos que apenas leem e enviam e-mails e navegam na Internet, há aqueles que só leem e enviam e-mails mas não sabem (ou não gostam de) navegar, há os que utilizam apenas os programas de escritório (editor de texto, planilha e

criador de apresentações), há os que trabalham com editoração eletrônica, há os que criam

sites, há os que participam de comunidades virtuais, e muitos, muitos outros (a lista é quase

infinita). Dessa forma, este segundo caminho de pensarmos sobre o letramento digital inclui, necessariamente, o uso da leitura e da escrita. Não existe possibilidade de mediação nessas tarefas, tal como existiria no uso de um caixa eletrônico, por exemplo98.

É exatamente devido a essa infinitude de formas de ação social que necessitamos delimitar o conceito de letramento digital no contexto de nosso trabalho. A autoria é uma dessas formas de ação social e, sendo realizada em meio digital, optamos por caracterizá-la como uma prática discursiva multitarefa. Em outras palavras, podemos dizer que o letramento digital necessário à autoria é uma atividade multitarefa e ela própria, na Internet, é multitarefa. Existe uma relação de causa e efeito entre o letramento e a autoria, desde que obedecidas as exigências dos sites de redes sociais. Mas antes de apresentarmos nossa proposta, gostaríamos de fazer um resumo acerca dos conceitos de letramento que abordamos neste capítulo. As definições de cada um deles se encontram a seguir.

Tabela 2: Conceitos e definições de letramento. Conceitos e Autores Definição

Letramento

(SOARES, 2006, p. 18) [É] o resultado da ação de ensinar a ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como consequência de ter-se apropriado da escrita

Letramento

(KLEIMAN, 1995, p. 19)

[Nós] podemos definir hoje o letramento como um conjunto de práticas sociais que usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em contextos específicos.

Pedagogia dos

multiletramentos

(THE NEW LONDON GROUP, 1996, online)

[É] um tipo diferente de pedagogia no qual a língua e outros modos de representação são recursos representacionais dinâmicos, constantemente refeitos pelos usuários ao buscar alcançar vários propósitos culturais.

Novos Letramentos

(LANKSHEAR e KNOBEL, 2006, p. 64)

[São] maneiras socialmente reconhecidas de gerar, comunicar e negociar conteúdos significativos através de textos codificados em contextos de participação Discursiva. (Incluem-se aqui os conceitos de Digitalidade, da nova natureza do ethos e do remix.)

Letramento digital

(SOARES, 2002, p. 151) [É] um certo estado ou condição que adquirem os que se apropriam da nova tecnologia digital e exercem práticas de leitura e de escrita na tela, diferente do estado ou condição – do letramento – dos que exercem práticas de leitura e de escrita no papel.

Letramento digital

(XAVIER, 2005b) [Ser] letrado digital pressupõe assumir mudanças nos modos de ler e escrever os códigos e sinais verbais e não-verbais como imagens e desenhos, se compararmos às formas de leitura e escrita feitas no livro, até porque o suporte sobre o qual estão os textos digitais é a tela, também digital.

Letramentos digitais

(BUZATO, 2007, p. 168) [Letramentos digitais são] redes complexas de letramentos (práticas sociais) que se apoiam, se entrelaçam, se contestam e se modificam mútua e continuamente por meio, em virtude e/ou por influência das TIC

98 Entenda-se mediação como auxílio, não como um indivíduo ensinando um outro a realizar uma tarefa no computador e na Internet.

É perceptível, nessas definições, um ponto de encontro comum: o uso da escrita e da leitura para alcançar objetivos sociocomunicativos específicos como formas de ação social, sejam elas realizadas em ambiente digital ou não, de maneira dinâmica e não-linear. Apenas a definição do TNLG (1996, online) não inclui, explicitamente, o uso da escrita como condição para um indivíduo ser ou não letrado. O grupo considera a língua, as modalidades falada ou escrita, como outras formas de representação. Já Buzato (2007), embora não mencione a escrita ou a leitura, deixa transparecer que essas formas de agir socialmente dependem da escrita, visto que as TIC dependem essencialmente da linguagem escrita.

Ora, a autoria na Internet é uma forma de ação social que visa a atingir objetivos sociocomunicativos de modo dinâmico e não-linear, dependentes da língua escrita. No entanto, como esta atividade é realizada? Quais são os saberes mobilizados, tanto em termos de linguagem quanto em termos de tecnologia digital? Existe um nível ou uma gradação para classificarmos os indivíduos como mais ou menos letrados? Havendo essa gradação, a autoria seria possível para os indivíduos que se encontram em um nível inicial? Só poderemos responder a essas perguntas se considerarmos o letramento digital como uma prática discursiva que objetive uma ação social somente alcançada através de uma atividade multitarefa.

O termo multitarefa, advindo da computação, é um método pelo qual várias tarefas ou processos computacionais partilham recursos de processamento comuns entre si. De uma maneira bem simples, podemos dizer que a multitarefa é aquilo que acontece quando estamos diante do computador navegando na Internet, ouvindo uma música em MP3 e revisando um texto qualquer em um intervalo de tempo comum. É o computador que gerencia essa prioridade de tarefas; é o processador que disponibiliza mais ou menos recursos (memória, processamento) da máquina para cada uma dessas tarefas. A prioridade será dada àquela que estamos executando em um determinado momento.99 Do ponto de vista humano, não nos é

possível navegar e revisar o texto ao mesmo tempo, por isso nos alternamos entre a navegação e a revisão textual em intervalos de tempo diferentes. Damos prioridade a determinadas tarefas em intervalos também determinados. O computador apenas gerencia aquilo a que damos prioridade, disponibilizando, assim, os recursos necessários à execução da tarefa.

99 O gerenciador de tarefas do Windows XP pode ser acionado pressionando-se as teclas control + alt + delete simultaneamente. Existe neste aplicativo uma aba chamada “Processos”. Lá podemos ver todos os processos desempenhados pelo computador, as “multitarefas”.

Desse modo, ao realizar a autoria na Internet, os indivíduos gerenciam as tarefas de criação, edição, revisão, publicação e correção de gêneros digitais de acordo com as necessidades de cada ambiente de publicação no qual estão envolvidos no instante de execução de cada uma dessas tarefas. Isso difere, essencialmente, da imagem do autor canônico sentado a sua mesa de trabalho, com a pena e o papel dispostos a sua frente.

Os ambientes de publicação do autor da Internet são os sites de redes sociais nos quais os indivíduos interferem por meio da realização dessas tarefas (participação). E, como os sites de redes sociais são vários, cada um deles possui certas especificidades; em cada um deles os indivíduos deverão lançar mão de redes de conhecimentos específicos. Tais redes incluem, não somente o uso da língua escrita, já que a escrita é condição sine qua non para a atividade de autoria na Internet. Não somente a escrita textual, isto é, apenas texto sem nenhum outro tipo de semiose. Uma escrita multimodal, já que, dependendo do site de rede social, será exigido do autor a construção de gêneros que incluam, além do verbal, o visual e o sonoro também. Isto porque, essas redes incluem outros modos de representação de significados (visual e sonoro), uma digitalidade específica, um modelo diferente de intelecto (que seja, acima de tudo, multimodal, durante a execução de tarefas), um reconhecimento das nuances culturais e sociais que caracterizam a participação nos sites de redes sociais e a abertura à remixagem. Além disso, vários conhecimentos epistemológicos são ativados e utilizados durante a atividade de autoria, visto que muitos indivíduos que participam dos sites de redes sociais são especialistas em Direito, Filosofia, Letras, Matemática, Ciência da Computação, Culinária, Veterinária, etc. Neste caso, vemos a segunda dimensão da autoria apontada por Maingueneau (2010), e discutida no Cap. 1: aqueles indivíduos que conciliam suas carreiras profissionais em paralelo com a atividade de produção textual.

Pragmaticamente, como a multitarefa funciona em alguns dos modelos de sites que estamos utilizando para ilustrar nossos argumentos sobre a autoria na Internet100?

Primeiramente, devemos deixar claro que a multitarefa só é possível devido à descentralização das funções exercidas pelo leitor e pelo autor, colocando ambas em um plano