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Capitulo I – A Evolução da Estrutura Diretiva ao longo dos anos

2. Lideranças Intermédias

2.1. Liderança no Pré-escolar e 1º Ciclo

Apesar dos diferentes níveis de ensino, o que obriga a considerarmos as diferentes culturas que entre eles se estabelecem no que respeito à questão de “care”, apresentam-se como idênticas o que se traduz no conceito de “care” proposto por Nias (1999). A partir do conceito de “care”, enquanto preocupação pela vida emocional e pela proteção dos alunos dos mais baixos níveis etários.

Whatever the reasons, if we accept as generalisations that the teachers are affectively involved with children, and the proposition of the relational feminists that affectivity is the basis of an ethic of care, then it is easy to construe primary teaching as a ‘culture of care’ whose underlying values emphasise the importance of making children feel secure, happy and cared for (Nias, 1999, p.68).

A ética do cuidar emerge de sentimentos, mais do que de princípios racionais e pode compreender-se a sua ênfase numa situação profissional em que, para além da faixa etária das crianças, os professores trabalham num sistema de docência individual em que se encontram isolados, por longos períodos de tempo, com as “suas” crianças, nas “suas” salas. Esta perspetiva está também implícita no modo como os professores percecionam as relações entre si, na organização escolar.

A autora faz referência a três tipos de razões históricas que estão na origem desta característica cultural. Uma primeira prende-se com o facto de a educação poder ser entendida como “endoutrinação” associada a uma perspetiva religiosa. Uma segunda razão situa-se na influência que, na educação dos primeiros anos, tiveram as abordagens de Froebel, Pestalozzi e outros, mais viradas para o desenvolvimento do que para a aprendizagem. Uma última razão está relacionada com o entendimento da profissão como “obediência” ao sistema, associada ao baixo status social e económico e à feminização, entre outros fatores. Assim, uma “cultura de cuidar” pode associar-se a diferentes modos de entender a função docente, como afetividade, como responsabilidade e como altruísmo ou auto-sacrifício, mas a autora salienta o facto de, em qualquer dos casos, ela se constituir como uma fonte de identidade e compromisso com a profissão. A intensificação do trabalho docente, nestes níveis de ensino poder ter, neste sentido, efeitos mais devastadores junto dos professores. A autora identifica a “culpa” e a “tensão” como os efeitos que as exigências atuais do sistema têm nos professores. “Culpa” porque a responsabilidade moral na profissão é difusa, não definida e inegociável, ficando a cargo da consciência individual. “Tensão” porque o discurso atual se centra na relação custo-benefício e não no “care”, na prestação de contas

e não no “serviço”. A pressão competitiva aumentou, dentro e entre as escolas, o que tem um efeito paradoxal, já que torna a função de responsabilidade moral destes professores mais difícil de atingir. Assim, eles são levados a percecionar os interesses da escola mais em função dos indivíduos, do que em função das medidas legalmente instituídas.

Pode-se compreender melhor a gestão intermédia no 1º ciclo e pré-escolar, se entendida como uma tarefa “cultural” e “moral” intimamente associada ao “care”, enquanto preocupação pelos alunos e enquanto preocupação pelos aspetos afetivos e relacionais na organização, o que a distingue da gestão intermédia noutros contextos.

Southworth, autor que tem estudado a gestão intermédia nas escolas de 1º ciclo, salienta a função de liderança precisamente como uma forma de gestão da cultura das escolas, dando ênfase aos aspetos sociais, relacionais e morais do cargo. De uma forma sintética estabelece uma distinção entre os dois tipos de funções inerentes ao cargo, a de gestão e a de liderança: “Management is to do with keeping the organization going. Leadership though is about ensuring the organization – the scool – is going somewhere” (1998, p.8). Enquanto que a atividade de gestão implica a manutenção do funcionamento da organização, e nesse sentido é também um trabalho relacional, a liderança supõe, de acordo com o mesmo autor, uma ação social que pretende influenciar os outros. Sanches estabelece uma distinção entre estes dois conceitos, a partir da sua evolução histórica, considerando que “Ao contrário da visão tradicional que tem confundido liderança e gestão, para o tempo presente requerem-se mais líderes do que gestores”, (Sanches,1996, p. 21). Implica, defende o autor, uma visão global da escola, estabelecer objetivos e avaliar, coordenar e desenvolver o currículo, assegurar a qualidade do ensino-aprendizagem e constituir-se como exemplo, no seio da organização escolar.

Como se registou, dificilmente os gestores intermédios têm um entendimento do seu cargo nesta vertente de líderes de professores e num estudo sobre o 1º ciclo, relacionado com a deteção de necessidades de formação dos gestores intermédios, os autores salientam “Primary subject leaders acknowledged the importance of auditing colleagues’ training needs, but did not appear to take their response further than attempting to lead by example” (Bennett et al, 2003, p. 8).

A gestão intermédia poderá, assim, compreender-se como uma função complexa situada num “campo de forças” em que se jogam as ações e os interesses simultaneamente complementares e opostos dos vários atores, quer numa linha vertical quer horizontal, quer no interior, quer no exterior do contexto organizacional. Tanto nos departamentos, como nas escolas, enquanto contextos culturais e políticos, o gestor intermédio é um ator central. Com uma maior ou menor participação na política global da organização, o lugar do meio é sempre lugar de definição de regras, situações e problemas, de tradução e gestão de significados, de interação e negociação para

a afetação de recursos materiais ou simbólicos. Ao gestor intermédio cabe, assim, uma função que é simultaneamente cultural e política. A sua visão da organização, o modo como interpreta a sua função e as ações estratégicas que vai desenvolvendo, mais ou menos conscientemente, constituem-se como dimensões duma “construção” própria do cargo de gestão e permitem-lhe estabelecer equilíbrios mais ou menos provisórios e/ou conquistar “zonas de negociação” favoráveis à sua unidade organizacional.

Neste sentido, o desempenho dos papéis de gestão e as áreas de influência em que ele exerce a sua ação são fundamentais para descrever e analisar os modos como, no quotidiano, o gestor intermédio desenvolve essa ação.