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3.3 LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA

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CAPÍTULO III – NATUREZA DAS MÍDIAS

3.3 LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA

Nesta tese denominamos de linguagem cinematográfica ou cinema, qualquer mídia para apresentação de imagens em movimento, independentemente do tipo da mídia física de grau de recursividade superior que seja utilizada: celulóide, eletromagnética ou digital. A seguir apresentaremos brevemente como se desenvolveu a linguagem cinematográfica, por ser esta passível de utilização na gestalt multimídia das telas dos computadores.

Quando surgiu o cinema, nos anos que se seguiram à Primeira Guerra Mundial, por volta de 1914 – 1917, muitos espectadores não conseguiam compreender o novo espetáculo de figuras em movimento que viam. Assim, durante todo o tempo de projeção de um filme era preciso que uma pessoa, ao lado da tela – normalmente um lençol esticado – explicasse o que estava acontecendo, qual era a história que estava sendo apresentada – contada.

Com isso, segundo Jean-Claude Carrière, autor de A linguagem Secreta do Cinema (2006) “os filmes não só existem ali, na tela, no instante de sua projeção. Eles mesclam às nossas vidas, influem na nossa maneira de ver o mundo, consolidam afetos, estreitam laços, tecem cumplicidades” (CARRIÈRE, 2006 p. 8).

Luis Buñuel ainda conheceu esse costume [...] em sua infância na Espanha, em torno de 1908 ou 1910. De pé, com um longo bastão, o homem apontava os personagens na tela e explicava o que eles estavam fazendo. Era chamado explicador. Desapareceu – pelo menos na Espanha – por volta de 1920. Imagino que surgiram tipos como esse mais ou menos em toda parte. Porque o cinema criou uma nova – absolutamente nova – linguagem, que poucos espectadores podiam absorver sem esforço ou ajuda. (idem, p.15)

O cinema pode ser analisado sob diversos pontos de vista, desde que nesta análise seja excluída toda rigidez metodológica ou ideológica que povoa nossos pensamentos.

Nos dez primeiros anos do cinema, um filme representava apenas uma seqüência de “tomadas estéticas, fruto direto da visão teatral”. Os acontecimentos, as imagens que compunham a história, eram apresentados um depois do outro e em seqüência ininterrupta, dentro de um enquadramento imóvel. “as pessoas tinham curiosidade de saber de que era feita aquela imagem em movimento; vendo nela uma espécie de nova realidade, buscavam a ilusão, o truque”. Mas, depois da primeira surpresa compreendiam que a seqüência de acontecimentos apresentados, ordenados rolo a rolo, era fictícia. “Afinal, não era diferente do que acontecia no teatro, onde o palco era estático e claramente demarcado”. Os personagens surgiam e desapareciam, trocavam gestos, apareciam e desapareciam com num passe de mágica. Carrière explica bem este contexto: “Quando deixavam o campo de visão da câmera, era como se saíssem para os bastidores. E, como não tinham voz e (quase sempre) cor, eminentes cabeças concluíram que tudo aquilo era decididamente inferior ao teatro de verdade.” (idem p.16-17).

Carrière explica que nesta época ainda não havia surgido uma linguagem autenticamente de cinema até que os cineastas começassem a cortar os filmes em cenas, até que surgisse a montagem e a edição. O trabalho de montagem é um trabalho que consiste basicamente em escolher cenas e colocá-las em seqüência. A edição envolve a seleção e a seqüência de partes de um filme, consiste em construir a dimensão da imagem de um evento, ou seja, a seleção seqüencial das partes do material produzido. É no processo de conclusão do filme, que se apresenta a linguagem cinematográfica.

Foi ai, na relação invisível de uma cena com a outra, que o cinema realmente gerou uma nova linguagem, no ardor de sua implementação, essa técnica aparentemente simples criou um vocabulário e uma gramática de incrível variedade. Nenhuma outra mídia ostenta um processo como esse. Podemos tentar descrevê-lo, primeiramente, em termos elementares. Um homem, num quarto fechado, se aproxima de uma janela e olha para fora. Outra imagem, outra tomada, sucede a primeira. Aparece a rua, onde vemos dois personagens – a mulher do homem e o

amante dela, por exemplo. Para nós, atualmente a simples justaposição dessas duas imagens, naquela ordem, e até na ordem inversa (começando da rua), nos revela, claramente, sem que precisemos raciocinar, que o homem viu pela janela, a mulher e o amante na rua. Nós sabemos; nós o vimos no ato de ver. Interpretamos, corretamente e sem esforço, essas imagens justapostas, essa linguagem. Nem percebemos mais essa conexão elementar, automática, reflexiva; como uma espécie de sentido extra, essa capacidade já faz parte do nosso sistema de percepção. Há oitenta anos, no entanto, isso constituiu uma discreta mas verdadeira revolução; daí o papel essencial do explicador, apontando os personagens com o bastão e dizendo: ‘O homem olha pela janela...Vê a mulher dele com outro homem, na rua...’ E talvez, se a imagem seguinte fosse, por exemplo, o rosto enraivecido na espreita, desta vez perto da câmera (uma nova ousadia, nova mudança, novo tamanho da figura, novo uso do espaço) o explicador continuaria: ‘O homem está furioso. Acabou de reconhecer o amante da mulher. Está com idéias assassinas... [...] Fiquemos por um momento com o homem que espreita pela janela a hora da vingança. Agora, a mulher se despede do amante e se dirige para casa. Olhando para cima, ela vê o marido na janela, e treme de medo. Quase podemos ouvir seu coração bater. Se, nesse momento, o marido for filmado do ponto de vista da mulher, diretamente de baixo para cima, inevitavelmente vai parecer ameaçador, todo poderoso. Apenas a posição da câmera produzirá esse efeito, independente de nossos próprios sentimentos. Por outro lado, se virmos a mulher do ponto de vista do marido, de cima para baixo, ela parecerá amedrontada, vulnerável, culpada. Imaginemos que a cena se passa à noite. Se o diretor decidir dispor as luzes de modo que o rosto do marido fique iluminado por baixo, fazendo os dentes brilharem, exagerando os ossos das maçãs do rosto e as rugas da testa (elemento importante de filmes de horror), o homem parecerá cruel e aterrador. Por outro lado, uma iluminação suave, impressionista, pode fazê-lo parecer clemente. [...] tudo faz parte da vida e do amadurecimento de uma linguagem. [...] Assim, no curto período de alguns anos, empiricamente, em cima de fracassos e vitórias, elaborou-se a mais surpreendente das gramáticas. (idem, p.16-17).

A narração de Carrière nos mostra que desde as primeiras seqüências de desenhos até a sucessão das chapas de projeção da lanterna mágica, “a mão e o olho humanos trabalharam incansavelmente, e às vezes com surpreendente sucesso, para nos mostra o impossível – para nos mostrar movimento numa imagem estática”. Portanto, se considerarmos somente este ponto de vista já podemos dizer que o cinema representou um grande avanço técnico da humanidade. Mas a verdadeira inovação – complementa Carrière – empolgante, nunca vista e talvez nunca sonhada – reside na justaposição de duas cenas em movimento, “a segunda anulando a primeira, ao sucedê-la.”(idem, p.17)

O cinema criou um novo espaço com um simples deslocamento do ponto de vista. “Por exemplo, os olhos de um homem vagueiam por sobre a multidão e, de súbito, param. Se, nesse momento, outro personagem for imediatamente focalizado, sabemos que o primeiro homem está olhando para ele. Se a direção do olhar for bem estabelecida, essa relação fica

demonstrada sem sombra de dúvida.” Esses processos narrativos, continua Carrière, essas impressões ou novas formas de ‘mostrar’ sentimentos por meio do deslocamento e associações de imagens, “foram estabelecidos, no principio da década de 1920, com espanto e apaixonado entusiasmo, comprovado milhares de vezes.” (idem, p.18).

No ano de 1923, quando ainda era estudante em Madri, Luis Buñuel for à cidade de Paris em busca de alguns filmes que pudessem ilustrar novas técnicas do cinema, como a técnica de filmar em câmera acelerada, “imagem a imagem, o que permitiria ver o que nunca havia sido visto – a germinação e o crescimento de uma planta, por exemplo.” Entusiasmado com a ‘novidade’ Buñuel organizou algumas palestras em Madri para apresentar pessoalmente estas maravilhosas novidades.

Três anos mais tarde, em 1926, Jean Epsteim – um realizador de cinema polaco- francês – surpreendeu a todos quando disse: “A gramática cinematográfica é específica do cinema” (idem, ibidem). Embora esta colocação tenha surpreendido muita gente, finalmente o cinema começava a ser reconhecido como uma forma de arte com linguagem própria que se utilizava de códigos próprios e se tornava uma convenção de escala planetária indiferente às particularidades linguísticas de cada povo. Em breve espaço de tempo o cinema ofuscaria outras expressões artísticas.

A linguagem era manipulada de maneiras diferentes, conforme se quisesse sugerir um sonho (neste caso, em primeiro lugar, os olhos do personagem se fechavam), uma lembrança ou o ímpeto de agir. O rosto e, particularmente, os olhos do ator projetavam e recebiam sinais que organizavam a narrativa e criavam sentimentos. As imagens falavam através do olhar [...]. Hoje o espantoso é que, à medida que nosso século avança, tentamos ainda, de alguma forma, acompanhar essa bizarra evolução lingüística [...]. Numa mídia visual, nada é percebido mais imediatamente por uma platéia do que um velho efeito, algo já visto, algo já realizado. [...] quase no começo da aventura, os cineastas perceberam que a memória de imagens pode, às vezes, ser mais forte e duradoura do que a de palavras e frases. O cinema faz uso pródigo de tudo que veio antes dele. Quando ganhou a fala em 1930, requisitou o serviço de escritores; com o sucesso da cor, arregimentou pintores; recorreu a músicos e arquitetos. Cada um contribuiu com sua visão, com uma forma de expressão. [...] E foi através da repetição de formas, do contato cotidiano com todos os tipos de platéias, que a linguagem tomou forma e se expandiu, com cada grande cineasta enriquecendo, de seu próprio jeito, o vasto e invisível dicionário que hoje todos nós conhecemos. Uma linguagem que continua em mutação, semana a semana, dia a dia, como reflexo veloz dessas relações obscuras, multifacetadas, complexas, contraditórias, as relações que constituem o singular tecido conjuntivo das sociedades humanas. (CARRIÈRE, 2006, p. 22-23).

de escritores; pintores; músicos e arquitetos nas produções cinematográficas, o cinema precisou cada vez mais demonstrar que era dotado de uma linguagem própria para ser reconhecido, de fato, como uma forma de arte. Porém, para Jaques Aumont, autor de A estética do filme (1994) “atribuir-lhe uma linguagem era arriscar-se a congelar suas estruturas, passar do nível da linguagem ao da gramática; desse modo, em virtude do caráter muito impreciso da palavra, a utilização de ‘linguagem’ a propósito do cinema deu lugar a múltiplos mal-entendidos. Estes últimos balizam a história da teoria do cinema até hoje e encontram sua formulação nas noções de ‘cinelíngua’, gramática do cinema, ‘cine-estilística’, retórica filmíca etc.” (AUMONT, 2006 p. 157).

Foram os primeiros teóricos do cinema – Ricciotto Canudo e Louis Delluc que falaram pela primeira vez em “linguagem cinematográfica”. Canudo foi crítico de cinema pertencente ao futurismo italiano. Em 1911, publicou em Paris um artigo intitulado "A Naissance d'um sixième art. Essai sul le cinématographe", considerado o primeiro texto no qual se define o cinema como uma arte – a sétima arte – na qual se resumem as demais. Para Canudo, com o cinema nascia a "arte total", "a plástica em movimento", "a alma da modernidade", já que reunia e conciliava na sua linguagem e expressão a dimensão plástica da pintura, a arquitetura e a escultura e a dimensão rítmica da dança, a música e a poesia. Louis Delluc foi um grande colaborador do cinema francês e crítico cinematográfico. Foi mais conhecido por seus livros sobre Charles Chaplin, escritos em 1921 e traduzidos para o Inglês em 1922.

O termo “linguagem cinematográfica” representava, especialmente para os franceses da época, um novo meio de expressão que opunha o cinema à linguagem verbal, pois estes a consideravam uma linguagem universal que permitia superar os obstáculos da diversidade das línguas. Conforme explica Aumont (2006 p. 159) a linguagem cinematográfica “Realiza o sonho antigo de um ‘esperanto visual’: ‘O cinema anda por toda parte’, escreve Louis Delluc em Cinema et cie, ‘é um grande meio para os povos dialogarem’. Essa ‘música da luz’ não precisa ser traduzida, é compreendida por todos e permite reencontrar uma espécie de estado ‘natural’ da linguagem, anterior ao arbitrário das línguas”.

Considerando que o cinema multiplicava os sentidos humanos através da imagem, que permite reconduzir as representações da vida, das emoções do movimento por meio da linguagem cinematográfica visual, Canudo, Delluc e Abel Gance – renomado cineasta, produtor e editor de filmes, escritor e ator francês –, para tentar provar a complexidade do

cinema o batizam de ‘sétima arte’. Neste contexto, Gance postulava: “a linguagem das imagens, que nos reconduz à ideografia das escritas primitivas, ainda não está determinada, porque nossos olhos não são feitos para elas.”

Embora o cinema estivesse sendo considerado “a sétima arte”, o conceito de linguagem cinematográfica era contestada por alguns teóricos do cinema. Para os formalistas russos, por exemplo, esclarece Aumont que só existiria arte e, conseqüentemente, linguagem cinematográfica quando existisse transformação artística do mundo real. “Essa transformação só pode intervir se vinculada ao emprego de certos procedimentos expressivos, que resulta de uma intenção de comunicar um significado”. (AUMONT, idem, p.165)

Mais tarde, o conceito de gramática foi discutido entre os teóricos do cinema:

As gramáticas do cinema desenvolveram-se essencialmente depois da Liberação, no momento em que a promoção artística do cinema começava a ser reconhecida mais globalmente. O cinema era, portanto, uma arte total dotada de uma linguagem. Para conhecer melhor essa linguagem, parecia necessário explorar suas principais figuras. [...] o cinema, primeira arte realmente popular pela amplidão da sua audiência, deveria ser explicado a seu grande público, que assistia aos filmes na maior inocência, sem intuir uma linguagem. [...] A gramática cinematográfica estuda as regras que presidem a arte de transmitir corretamente idéias por uma sucessão de imagens animadas, formando um filme (Robert Bataille apud AUMONT, idem, p.165)

Para Marcel Martin, segundo Aumont todo esse discurso das gramáticas do cinema não podiam ignorar que aplicado ao cinema, “[...] o conceito de linguagem é bastante ambíguo. É preciso ver nele aquilo a que chamei o arsenal gramatical e lingüístico, essencialmente vinculado à técnica dos diversos procedimentos de expressão fílmica ”. (2006 p.170)

Outras discussões, acerca da importância e para esclarecimentos da linguagem do cinema, foram realizadas ao longo do tempo, até que alguns pioneiros da estética do cinema enfatizaram suas reivindicações acerca da originalidade desta arte e da sua total autonomia como meio de expressão e possuidora de materiais próprios de expressão, embora, incorpore outras linguagens com grau de recursividade inferior a exemplo da linguagem musical.

Segundo Aumont et al (2006 p. 192) para Louis Hjelmslev, o cinema tem várias linguagens e cada linguagem caracteriza-se por um tipo ou combinação específica de materiais de expressão, algumas são homogêneas e outras heterogêneas. Por exemplo: “O material da expressão da música é o som não-fônico, de origem instrumental, na maioria dos

casos; a ópera já é menos homogênea, pois acrescenta os sons fônicos (a voz dos cantores); o material da expressão da pintura é composto de significantes visuais e coloridos de origem física diversa, e pode integrar significantes gráficos.”

A linguagem cinematográfica sonora apresenta um grau de heterogeneidade particularmente importante, pois combina cinco materiais diferentes: a trilha de imagem compreende as imagens fotográficas que se movem, múltiplas e colocadas em série, e, acessoriamente, notações gráficas que podem substituir as imagens analógicas (letreiros) ou a elas se sobrepor (legendas e menções gráficas internas à imagem). [...] A trilha sonora veio acrescentar três novos materiais da expressão: o som fônico, o som musical e o som analógico (os ruídos). Esses três materiais intervêm simultaneamente com a imagem, é essa simultaneidade que os integra à linguagem cinematográfica, na medida em que, intervindo sozinhos, constituem uma outra linguagem, a linguagem radiofônica. Um único desses materiais é específico da linguagem cinematográfica, trata-se, é claro, da imagem em movimento. É por esse motivo que muitas vezes se tentou a essência do cinema através dela. [...] O cinema é igualmente heterogêneo em outro sentido, nele intervêm configurações significantes que necessitam do recurso ao significante cinematográfico e muitas outras configurações que nada têm de especialmente cinematográficas. [...] São essas configurações significantes que Christian Metz, depois de Louis Hjelmslev, A.L.Greimas, Roland Barthes e muitos outros, chamaram de códigos. (AUMONT, idem p. 190).

A denominação de códigos atribuída por Christian Metz às configurações significantes provocou diversas discussões. Aumont explicam que Metz, inspirado em Louis Hjelmslev, mobilizou uma certa oposição entre conjuntos concretos (mensagens fílmicas) e conjuntos sistemáticos, entidades abstratas, que são os códigos – “cuja homogeneidade não é de ordem sensorial ou material, mas da ordem da coerência lógica, do poder explicativo, do esclarecimento.”. (idem p. 195)

No contexto do cinema os códigos podem ser compreendidos como um certo número de configurações significantes, estas configurações estão ligadas diretamente a um determinado tipo de material da expressão, ou seja, para que elas possam intervir é preciso que a linguagem de recepção tenha alguns traços materiais. Para exemplificar este contexto Aumont et al (idem p. 196) citam como exemplo o código do ritmo, ou seja, “o conjunto das figuras fundamentadas em relações de duração; é evidente que esse código só poderá intervir literalmente em uma linguagem que possui um material de expressão temporalizado. É claro que sempre se poderá comentar o ‘ritmo’ da composição visual em um quadro, mas será num sentido muito metafórico.”

Portanto, as configurações significantes que podem apenas intervir no cinema são bem limitadas porque estão ligadas ao material de expressão que é próprio do cinema, ou seja,

à imagem fotográfica em movimento e a determinadas formas de estruturação que também são características do cinema. Para Aumont (idem, p. 197):

Um exemplo tradicional de código específico é o dos movimentos de câmera. Este diz respeito à totalidade do campo associativo vinculado às relações de fixidez e de mobilidade que podem intervir em um plano cinematográfico: a qualquer instante, a câmera pode permanecer fixa ou então produzir uma determinada trajetória (vertical, horizontal, circular). Cada um dos planos explicita uma escolha, isto é, a eliminação de todas as figuras não pensantes. Esse código é específico porque necessita concretamente da mobilização da tecnologia cinematográfica, como aparece com particular clareza na maioria dos filmes do húngaro Miklos Jancso (Sirocco d’hiver, 1969; Psaume rouge, 1971 et.), compostos de longuíssimos planos-seqüência com travelling imensas. O código das escalas de plano, que constitui muitas vezes o bê-á-bá das gramáticas cinematográficas, não é específico do cinema, pois se refere igualmente à fotografia fixa.

Enfim, a imagem mecânica que se move, múltipla e seqüencialmente, é o material da expressão do cinema. Ao passo que os traços particulares dessa linguagem evoluem, acentua- se o grau de especificidade de seus códigos. Os da analogia visual, por exemplo, se referem às imagens figurativas, “só serão fragilmente específicos do cinema ao mesmo tempo em que nele desempenham um papel de primeiro plano”. Os fotográficos, são ligados à incidência angular – enquadramentos. “O código das escalas de plano, o da nitidez da imagem referem- se apenas à imagem ‘mecânica’ obtida por uma tecnologia fisicoquímica” logo, são mais específicos do que os da analogia visual. Já os códigos relacionados à colocação em seqüência da imagem, são por sua vez mais específicos ainda – embora “se refiram também à fotonovela e à história em quadrinhos.”

Por último, os únicos códigos que são exclusivamente cinematográficos (e televisuais, mas as duas linguagens são amplamente comuns) estão ligados ao movimento da imagem: códigos de movimento de câmera, códigos dos raccords dinâmicos – uma figura como o raccord no eixo é própria do cinema, opõe-se aos outros tipos de raccord e só encontra equivalentes na fotonovela por aproximação.” (AUMONT, idem, p.197-98).

Acabamos de ressaltar a importância do som na produção de conteúdos cinematográficos. A linguagem musical é outra forma utilizada para transmitir informações e emoções a humanos, através do sentido auditivo. Do mesmo modo que as outras linguagens, também a linguagem musical é ouvida através de redes neurais que se formam para permitir que ousamos os sons, a música, como veremos a seguir.

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