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CAPÍTULO 1 – UM PANORAMA SOBRE O ENSINO E APRENDIZAGEM DO PORTUGUÊS

1.3 LINGUAGEM

Desde a Grécia antiga, muitos pensadores, de diferentes áreas, vêm discutindo sobre o que é a linguagem. Porém, não nos ocuparemos dessa questão neste ponto. Retomaremos outra, a saber: como foi pensada a linguagem? Essa pergunta foi formulada, entre outros autores, por Kristeva (apud PALACHI, 2009), que afirma que a linguagem pode ser pensada como um conjunto de regras que não devem ser transgredidas, guardadas quem sabe aonde ou como um objeto social,

26Cf. <http://www.let.unb.br/jcpaes/index.php/publicacoes/59-traducoes>. Acesso em: 21 ago. 2011.

27Cf. “A Linguística Aplicada na Grande área da Linguagem”. Disponível em: <http://www.sala.org.br/textos-em-la/a-

meio de comunicação ou bem como um objeto da natureza humana28. Nesses pontos, concordamos com a autora e acrescentamos que nos processos de ensinar e aprender qualquer linguagem devemos levar em consideração ‘o sentido’, que não está nos sujeitos, nem na mediação, nem nas palavras. Em nossa opinião, o sentido está no meio social (lugar em que se produz a negociação, o movimento, no jogo de poder)29.

Citamos a síntese elaborada por Rauber e Jesus (2010, p. 29) sobre as concepções de linguagem. As autoras resumem em três as principais concepções: a primeira vê a linguagem como representação e expressão do mundo e do pensamento; a segunda concepção considera a linguagem como instrumento de comunicação; e a terceira vê a linguagem como forma de interação. Nota-se como as pesquisadoras trabalharam três correntes que pensaram a linguagem e todas elas de maneiras bem diferentes.

Aderimos à concepção de linguagem como lugar de interação. Levando em conta, porém, que:

[...] a visão de língua(gem) contemplada pela Perspectiva Interacionista tampouco é unívoca. A língua é um meio de comunicação e, ao mesmo tempo uma ferramenta do pensamento, é um processo e, por outro lado produto [...] Essa visão atribui à linguagem não apenas a condição de meio de comunicação, mas também de atividade cognitiva. Desta forma, o exercício da interação linguística pressupõe interlocutores engajados em garantirem a compreensibilidade do diálogo (um princípio baseado na comunicação) e, simultaneamente, em utilizarem a interação para pensar sobre a linguagem e para construírem conhecimentos de uso da língua, bem como confirmarem e revisarem conhecimentos pré-existentes (procedimento de ordem cognitiva). Desta maneira, o diálogo também ocupa uma posição dupla no interior do processo: ele propicia não só oportunidades de aprendizagem, mas também evidências sobre o processo

(SWAIN; LAPKIN, 1998 apud ROSSI, 2008, p. 21).

Ponzio (2007, p. 18) cita as concepções de linguagem de Sebeok e de Noam Chomsky e expressa que estes últimos consideram que ela não nasce exclusivamente como um mecanismo de comunicação, mas como um dispositivo de modelação. O autor afirma que a linguagem (verbal) é o dispositivo de modelação dos humanos, que os demais animais possuem outros sistemas de modelação, e que a função comunicativa aparece com o Homo Sapiens.

Morato (2009, p. 319) menciona a Sociolinguística, a Pragmática, a Psicolinguística, a Semântica Enunciativa, a Análise da Conversação, a Linguística Textual, a

28Tradução livre e textual de: “El lenguaje puede ser pensado como un conjunto de reglas que no debieran quebrarse

guardadas vaya uno a saber dónde o como un objeto social, medio de comunicación (puro medio) o bien como un objeto de la naturaleza humana”.

29Anotações de aulas da disciplina: A Materialidade da Linguagem, do Programa de Pós-graduação em Linguística da

Análise do Discurso como áreas que se pautam por uma posição externalista a respeito da linguagem. Ou seja, que não só (pré)ocupam-se com o sistema mas também com o funcionamento e constituição da linguagem, com o modo.

Em busca de outras maneiras de pensar a linguagem, visitamos o Projeto ‘Glossário’ da Sociedade de Linguística Aplicada (SALA) – Brasil, e encontramos a seguinte ‘definição’:

Fruição de uma dada língua em situações sociais de uso comunicativo de cujas inúmeras perspectivas o aprendiz de línguas constrói percepções distintas de seus processos de aproximação da nova língua ou de sua própria língua posta para aperfeiçoamento metódico (na escola, por exemplo)30.

Percebemos que a ‘definição’ oferecida pela SALA é a que mais contribui para o nosso trabalho, pelo fato de estar vinculada a quem está aprendendo e/ou ensinando uma língua- cultura, verbal ou escrita, e por resgatar atributos e situações sociais da linguagem, bem como a interação (dos sujeitos) no uso comunicativo.

Nessa perspectiva, qualquer forma de discurso é orientada por: i) a identidade do falante; ii) a identidade do ouvinte; iii) o contexto social em que o ato de fala está inserido; e iv) os julgamentos que os interlocutores fazem sobre o próprio comportamento linguístico e do outro (ROSSI, 2008, p. 30-31).

Uma concepção mais recente resgata, como eixo central, a interação (do aprendente) na língua estrangeira, segunda língua (entenda-se terceira ou quarta etc.) ou na língua adicional31.

Sobre o conceito de língua, aderimos àquele proporcionado pela SALA e publicado em seu glossário: Sistema abstrato organizado numa dada estrutura consoante, uma dada cultura cujos elementos se interrelacionam e se re-combinam de maneira regrada para servir o grande

30Cf. <http://www.sala.org.br/l/>. Acesso em: 20 set. 2011.

31 O termo, língua adicional, relativamente novo no Brasil, faz referência ao que alguns autores chamam de língua

estrangeira (LE) ou segunda língua (L2) de um indivíduo. Foi introduzido no Brasil, entre outros, por Schlatter e Garcez (2009), que expressam porque o preferem: “[...] Assim, falar de uma língua adicional em vez de uma língua estrangeira enfatiza o convite para que os educandos (e os educadores) usem essas formas de expressão para participar na sua própria sociedade. Conforme discutimos a seguir, esse convite envolve também a reflexão sobre que língua é essa, de quem ela é e de quem pode ser a que ela serve, o que cada um tem a ver com ela” (p. 128, grifo nosso).

Uma língua adicional é entendida como interação. Seria uma maneira de interagir na própria sociedade (do falante) e produzir significados sobre o que essa língua é. Com relação a de quem ela é, poderíamos substituir essa pergunta por “quais são os países que a têm como idioma oficial”, uma vez que não podemos atribuir o caráter de proprietário (da língua) a nenhum falante especificamente ou podemos atribuir essa propriedade a todos os falantes (nativos ou não nativos).

propósito comunicacional de uma língua constituída sob um nome (o Português, por exemplo)32. Entendemos que esse conceito abrange tanto as estruturas da língua quanto o aspecto cultural.

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