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O LIVRO DE JEREMIAS E DE LAMENTAÇÕES DE JEREMIAS

I – O LIVRO DE JEREMIAS

É importante estar atento quanto ao fato de que as narrativas do livro não estão em uma ordem cronológica exata. Temos no livro uma espécie de antologia das profecias e das experiências pessoais de Jeremias. Os caps. 1 a 6 parecem estar em ordem cronológica, mas do capítulo 7 em diante o livro não apresenta uma sequência cronológica bem definida. Alguns trechos do livro não indicam sequer uma data. Isso dificulta a sequenciação dos fatos em Jeremias. É preciso considerar, entretanto, que só o ―simples‖ fato de o livro existir, apesar do contexto turbulento em que ele foi escrito, seja em Judá ou concernente ao cenário internacional, já é resultado da providência divina. Os sofrimentos a que Jeremias foi submetido foram tantos que seria difícil organizar um documento, de maneira mais meticulosa. Podemos ter no capítulo 36 um vislumbre de como o livro foi escrito.

Contexto Histórico

No cenário internacional, Jeremias foi o principal profeta do Senhor no período de 627 a 587 a.C. para Judá e para as nações vizinhas. Os profetas Ezequiel, Daniel, Habacuque e Sofonias foram contemporâneos a ele. Ezequiel,

assim como Jeremias, era oriundo da classe sacerdotal, mais jovem que Jeremias, e diferentemente dele, ministrou entre os cativos da Babilônia. O teor de sua mensagem era basicamente o mesmo da de Jeremias. Daniel, de linhagem real, também ministrava no cativeiro, mas no palácio de Nabucodonosor. Habacuque e Sofonias ajudaram Jeremias em Jerusalém.

O momento histórico-político em que Jeremias profetiza é muito movimentado. Duas superpotências se levantavam no cenário mundial: o Egito e a Babilônia. Judá, um Estado fraco, ficava entre as duas, por vezes um Estado vassalo e por fim, subjugado. Não nos deteremos a descrever as movimentações internacionais que formam o contexto histórico do livro de Jeremias e de seu ministério, por questões de tempo e de espaço. Todavia, é importante pontuar que Jeremias começa a profetizar quando a Assíria começa a se fragmentar e perde a hegemonia mundial, como potência política. Em 626 a.C. morre o último grande rei da Assíria, Assurbanipal, o que incita o Egito e a Babilônia (e o próprio Josias, rei de Judá) a buscar a independência política. Após a batalha de Carquemis, em 606- 605 a.C., a Assíria cai de vez para não mais se levantar, o rei do Egito volta derrotado para sua nação e a Babilônia emerge definitivamente como a nova potência da Ásia. A batalha de Carquemis foi, basicamente, um confronto entre a aliança assírio-egípcia contra as forças dos caldeus, prevalecendo estes últimos.

Em Judá, os precedentes históricos eram assustadores.

Jeremias iniciou seu ministério no reinado de Josias, um rei bom que adiou temporariamente o juízo de Deus prometido por causa do governo terrível de Manassés. Os acontecimentos estavam mudando rapidamente o Oriente Próximo. Josias tinha iniciado uma reforma, a qual incluía a destruição dos lugares altos pagãos em Judá e Samaria. Entretanto, a reforma teve um efeito pouco duradouro sobre o povo. Assurbanipal, o último grande rei assírio, morreu em 627 a.C. A Assíria estava enfraquecendo, e Josias expandindo o seu território para o norte. A Babilônia, sob o domínio de Nabopolasar, e o Egito, sob Neco, estavam tentando sustentar sua autoridade sobre Judá.

Em 609 a.C, Josias foi morto em Megido ao tentar impedir o Faraó Neco de ir contra o que restava da Assíria. Três filhos de Josias (Joacaz, Jeoaquim e Zedequias) e um neto (Joaquim) sucederam-no no trono. Jeremias viu a insensatez da linha de ação política desses reis e alertou-os sobre os planos de Deus para Judá, mas nenhum deles deu atenção à advertência. Jeoaquim foi abertamente hostil a Jeremias e destruiu um rolo enviado a ele, cortando-o em algumas colunas e jogando-as no fogo. Zedequias foi um governante fraco e vacilante, buscando às vezes os conselhos de Jeremias, outras vezes permitindo que os inimigos de Jeremias o maltratassem e o aprisionassem32.

A Mensagem do Livro de Jeremias

Jeremias sempre insistiu que a Babilônia prevaleceria sobre Judá. Chegou a sugerir que se Judá se submetesse à Babilônia, seria poupada. Se Isaías, cem anos antes, não contemplou a destruição de Israel pela Assíria, Jeremias não teve a mesma felicidade em relação à Judá, pois ele

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contemplou a destruição da cidade e do templo. Ele inicia seu ministério em 626 a.C. e durante 40 anos profetiza. Em 606 a.C., 20 anos após sua chamada, Babilônia invade Jerusalém deixando-a parcialmente destruída. Tem início aí o cativeiro babilônico, que duraria 70 anos. Em 586 a.C. o ―profeta das lágrimas‖ vê Jerusalém ser arruinada até as cinzas!33

É interessante notar que Deus, para corrigir seu povo, irá usar uma nação pagã, a Babilônia. Pode parecer estranho, muitas vezes, a maneira de Deus agir. O profeta Habacuque, contemporâneo de Jeremias, também foi avisado por Deus de que a Babilônia invadiria Jerusalém. Inicialmente, ele clama a Deus por causa da injustiça e da violência praticadas em Judá, e Deus lhe responde dizendo que os caldeus castigarão Judá. O profeta Habacuque acaba por ficar ainda mais confuso, afinal, como Deus poderia usar um povo ainda mais cruel para corrigir Jerusalém e Judá? Todavia, o Senhor lhe diz: “Eis o soberbo! Sua alma não é reta nele; mas o justo viverá pela sua fé” (Hc 2.4). A História, sob a ótica bíblica, não é cíclica, mas linear e Deus está no controle dos eventos a fim de que eles cumpram a Sua vontade. A perversa Babilônia foi o braço executor do juízo de Deus sobre a pecadora Judá, mas ela também foi castigada pelo Senhor por sua grande impiedade. Assim como aconteceu com Judá, Babilônia também seria castigada pela sua impiedade.

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Importante notar que ocorreram três invasões sucessivas: a primeira, em 606 a.C., que marca o início da contagem dos 70 anos profetizados por Jeremias (25.11,12; 29.10); a segunda, em 597 a.C., e a terceira em 586 a.C., quando tanto a cidade como o templo são totalmente destruídos.

O Livro de Jeremias e o Novo Testamento

Os escritores do Novo Testamento por vezes citaram e desenvolveram sua teologia com base em escritos do livro do profeta Jeremias. Exemplo muito interessante temos no livro de Hebreus, onde o autor ao falar da nova aliança, da qual Cristo é o Mediador, menciona textos de Jeremias (cf. Hb 8.8-13; 10.15-17 com Jr 31.31ss).

Mateus, quando narra a matança dos inocentes por ordem de Herodes, no afã de tentar matar também o menino Jesus, cita Jeremias 31.15, afirmando enfaticamente que aquilo era o cumprimento do que “... fora dito por intermédio do profeta Jeremias” (cf. Mt 2.17,18).

Um dos conceitos teológicos mais lindos expressos no Novo Testamento – Cristo como herdeiro do trono davídico – encontra base também em Jeremias. Lucas cita Jeremias 23.5 afirmando que Deus daria a Jesus o trono de Davi (cf. Lc 1.32). O apóstolo João, escrevendo o Apocalipse, salienta a onisciência de Cristo citando Jeremias 11.20 e 17.10. Aliás, o próprio Cristo foi comparado com Jeremias, quando chorou sobre Jerusalém (cf. Mt 16.14). Essa comparação se deu pelo fato de que Jeremias, em seu tempo, lamentava a pecaminosidade de Jerusalém e viu o que lhe ocorreria em função disso. Cristo, sendo Deus, anteviu a destruição da cidade pelos romanos, em 70 d.C., e lamentou por isso. Ao todo, os autores do Novo Testamento citam Jeremias 40 vezes, sendo a maioria das citações relacionadas com a queda de Babilônia (o livro de Apocalipse).

Esboço do Livro de Jeremias 1. O chamado de Jeremias - 1.1-9

2. Coleção de discursos - 2.1-33.26 Primeiro oráculos - 2.1-6.30

Sermão do templo e abusos no culto - 7.1-8.3 Assuntos diversos - 8.4-10.25

Eventos na vida de Jeremias - 11.1-13.27 Seca e outras catástrofes - 14.1-15.21 Advertência e promessas - 16.1-17.18 A santificação do sábado - 17.19-27 Lições do oleiro - 18.1-20.18

Oráculos contra leis, profetas e povo - 21.1-24.10 O exílio babilônico - 25.1-29.32

O livro de consolação - 30.1-35.19 3. Apêndice histórico - 34.1-35.19 Advertência a Zedequias - 34.1-7

Revogada a libertação de escravos - 34.8-22 O exemplo dos recabitas - 35.1-19

4. Julgamentos e sofrimentos de Jeremias - 36.1-45.5 Jeoaquim e os rolos - 36.1-32

Cerco e queda de Jerusalém - 37.1-40.6 Gedalias e o seu assassinato - 40.7-41.18 A fuga para o Egito - 42.1-43.7

Jeremias no Egito - 43.8-44.30 Oráculos para Baruque - 45.1-5

5. Oráculos contra nações estrangeiras - 46.1-51.64 Contra o Egito - 46.1-28 Contra os filisteus - 47.1-7 Contra Moabe - 48.1-47 Contra os amonitas - 49.1-6 Contra Edom - 49.7-22 Contra Damasco - 49.23-27

Contra Quedar e Hazor - 49.28-33 Contra Helão - 49.34-39

Contra a Babilônia - 50.1-3 6. Apêndice histórico - 52.1-34 O reinado de Zedequias - 52.1-3 Cerco e queda de Jerusalém - 52.4-27 Sumário de três deportações - 52.28-30 Libertação de Joaquim - 52.31-34

ANÁLISE DE ALGUNS TEXTOS DO LIVRO DE JEREMIAS