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2.4.2 O deslocamento da “velha matriz agroexportadora” e a formação da Aglomeración Urbana Central

Ocorreu uma transformação na estrutura produtiva, passando de um modelo agroexportador simples para um modelo agroexportador ampliado. Este incluiu um setor industrial substitutivo de importações que provocou as mudanças que repercutiram nos padrões de ordenamento territorial surgidos desde a década de 1940. O desenvolvimento de novas bases urbanas de acumulação e as novas modalidades de vinculação com o mercado mundial deslocaram a velha “matriz agroexportadora” como a base do ordenamento regional, o que provocou a conformação de uma Aglomeración Urbana Central.

Os novos processos urbanos deslocaram o café como atividade principal do ordenamento territorial e apareceram outras atividades, como o setor industrial e a expansão dos serviços que estruturaram o novo âmbito regional que, em 1980, alcançou aproximadamente 600 km2.

Segundo Lefebvre (2006), “[…] a indústria e o processo de industrialização assaltam e saqueiam a realidade urbana”, no entanto esse processo não ocorreu na Costa Rica; muito menos houve uma decomposição dos centros substituídos pelo centro de decisão. Dessa maneira se entende que, no caso costarriquenho, a cidade não se “alinha pela empresa industrial” como propunha Lefebvre (2006, p. 76), mas por outras atividades de serviços.

Nesse contexto se consolida a Aglomeración Urbana Central25 entre 1957-1973. (vide Esquema 4).

Pode-se realizar “[...] a distinção entre a cidade, realidade presente, imediata, dado prático-sensível, arquitetônico – e por outro lado o urbano, realidade social composta de relações a serem concebidas, construídas ou reconstruídas pelo pensamento.” (LEFEBVRE, 2006, p. 49). Essas construções e reconstruções são dinâmicas e vão continuar a caracterizar o processo de metropolização que hoje é o cenário do incipiente processo de verticalização no casco

urbano.

25 Esses diferentes termos utilizados relacionados com a área metropolitana vão se esclarecer ao longo do capítulo.

Esquema 4 - Evolução do Espacio Urbano no Valle Central, Costa Rica, segunda metade do século XX

Fonte: AUTOR, 2013; CARVAJAL; VARGAS, 1983. 2.4.4 Surgimento de um mercado imobiliário

A reprodução do espaço urbano desde meados do século XIX terá um duplo significado: ampliação do espaço habitável e profundas transformações na propriedade fundiária onde a terra urbana se evidencia como mercadoria e tem grande importância no processo de acumulação. A terra passou a ser objeto de transações lucrativas por força da urbanização e da valorização da infraestrutura urbana. (SOUZA, 1994). Começou-se a diferenciar a terra rural da terra urbana. Esta última se relaciona com o processo produtivo da edificação e isso se chama articulação primária da terra urbana, segundo Jaramillo

(2009). A diferença em relação à terra rural é que a urbana se relaciona, durante toda a vida útil, com o seu produto: o imóvel. As possibilidades de utilização deste produto dependem da forma particular de inserção do terreno na dinâmica espacial de todos os outros valores de uso na cidade. (JARAMILLO, 2009). As relações da terra urbana com os processos econômicos através do espaço construído no momento de seu consumo é denominado articulação secundária. Essa é a principal diferença relacionada à terra rural. Essas duas articulações interagem e quando o comprador de um espaço construído adquire o imóvel, também adquire direito sobre o terreno que é o suporte do espaço construído.

Formou-se um mercado imobiliário como uma atividade independente, especializada e dentro da estrutura econômica do Espacio

Urbano Metropolitano. A formação da propriedade territorial foi

estabelecida como um fenômeno do século XIX relacionada com a expansão cafeeira. Hall (1976, p. 171) explica a paisagem da seguinte maneira:

El área de las principales ciudades de la Meseta Central, como es lógico, han aumentado gradualmente desde su fundación en la época de la colonia. Durante el siglo XIX, la empresa francesa Tournón, por ejemplo, transformó cafetales aledaños a San José en el elegante suburbio residencial llamado Barrio Amón; durante las décadas de 1930 y 1940, San Pedro de Montes de Oca se convirtió, de un pequeño pueblecito de cafetaleros, en un suburbio residencial de San José. Pero la expansión territorial de las principales ciudades se aceleró enormemente después de la segunda guerra mundial, y sobre todo después de la caída de los precios del café, en 1958. La cantidad en que

antiguos terrenos agrícolas, generalmente

cafetales, han sido incorporados a las áreas urbanizadas, es probablemente aún más grande, en proporción, que la forma en que el crecimiento de la población urbana se ha desarrollado. A dinâmica econômica-social previamente analisada vai explicar a profunda transformação no setor imobiliário já que implica formas de crescimento diferentes em condições financeiras distintas.

Os padrões no setor imobiliário, certamente, mudaram muito desde o período colonial. Isso corrobora-se com a informação exposta por Cardoso (1975) sobre o número de terras vendidas e doadas desde o período colonial compreendido entre 1594 até 1890. Nesse período, somente 22% das vendas foram realizadas durante a colônia. Aproximadamente 75% das vendas se realizaram nas quatro províncias que formam a região central: San José, Alajuela, Cartago e Heredia. (Tabela 2). Esses dados mostram como San José é o local onde mais transações urbanas se realizaram desde o século XVI até final do século XIX.

Tabela 2 - Atribuição de terrenos baldios em virtude de cultivos e concessões, 1584-1890

Fonte: CARDOSO, 1975, p. 19.

O número de terras vendidas aumentou desde a independência e nas últimas décadas do século XIX. (Tabela 3).

Tabela 3 - Total de transações urbano-rurais no Valle Central, entre 1584 e 1890

Fonte: BAIRES, 1975.

Lugar Número de transações

Urbanas Rurais Total

San José 344 1.062 1.416 Cartago 316 1.026 1.342 Alajuela 97 576 673 Heredia 73 539 612 Total no Valle Central 830 3.203 4.033

Períodos Terras vendidas (ha) Terras doadas (ha)

1584-1821 77,487 12.127 1822-1839 56,439 13.896 1840-1850 28,450 3.853 1850-1860 53,769 34.413 1860-1870 35,783 6.389 1870-1880 52,329 34.727 1880-1890 54,535 86.225 Totais 358,792 191.630

As terras doadas, sem dúvida, também apresentam um aumento significativo nas últimas três décadas do século XIX, que correspondem ao período das reformas liberais no cenário urbano. (Tabela 3).

Posteriormente, já avançado o século XX, especificamente depois das intensas erupções do vulcão Irazú em 1963 e 1965, o excesso de cinzas originadas pelas erupções causaram prejuízos aos produtores de café, cujas lavouras se localizavam nas proximidades de San José, e venderam seus terrenos. É importante acentuar que esse fato representou um dos vetores que impulsionou o desenvolvimento urbano. Nesse contexto, Hall (1976) explica como os pequenos produtores de café que carecem de capital necessário para formar suas próprias companhias urbanizadoras se associam ou contratam o crédito com alguma das grandes empresas de desenvolvimento urbano.

O surgimento do mercado imobiliário propiciou mudanças nas atividades econômicas assim como o parcelamento do solo urbano. A cidade “sustenta relações de produção e de propriedade” (LEFEBVRE, 2006, p. 46) e essa nova dinâmica da propriedade imobiliária responderá às novas relações de produção, os novos mercados e assim determinará a magnitude e direção da ação expansiva territorial. A tendência assistemática (sem controle estatal) para definir os usos urbanos da terra propiciou um aumento no valor fundiário e uma apropriação de benefícios mais significativos para seus proprietários que a resultante das atividades de produção agrícola tradicional. Essa pode ser a situação atual nos arredores do Parque Metropolitano La Sabana, onde os grandes empreendimentos residenciais verticais estão atuando com força definindo novos valores fundiários e determinando novos usos do solo. Dessa maneira se entende que a propriedade privada e/ou pública do solo vai garantir sua extensão espacial, uma acumulação forte de capital, a orientação da expansão dependendo dos interessados e o ritmo do crescimento da cidade.

Jiménez (1980) realiza um estudo sobre as transações26 imobiliárias no Cantón Central San José no período entre 1950-1974 em que analisa as propriedades com uma superfície aproximada de um hectare ou mais, para entender as modificações espaciais e como a maioria das propriedades teve sua origem a partir da divisão das terras. Dessa maneira concordamos com Jiménez (1980, p, 10), em que a “[…]

propiedad privada de la tierra es históricamente la relación jurídico-

26 Segundo Jiménez (1980, p. 5) se entende por transações: “[…] aquellas compra-ventas de

política básica sobre la cual se sustenta, en las distintas formaciones sociales, el modo de producción capitalista.”

O Gráfico 5 ilustra o aumento das transações imobiliárias que contribuíram para a fragmentação das fazendas cafeeiras. Segundo Jiménez (1980), se registraram 2.186 transações com segregação em 72 das 161 fazendas analisadas entre 1950 e 1974.

Gráfico 5 - Total anual de transações imobiliárias registradas em San José, 1952-1974

Fonte: JIMÉNEZ, 1980, p. 90.

Esse fenômeno de divisão de propriedades responde à demanda de moradia e, em menor medida, de indústria e comércio. A pequena porção territorial que ocupam e a infraestrutura circundante são fatores que vão encarecer a renda do solo. Esse é o caso atual dos meios de consumo coletivo que se localizam nos arredores do Parque

Metropolitano La Sabana e que encarecem o valor das propriedades,

não sendo somente o fator da distância em relação ao centro da cidade. Esses fatores lhe conferem o caráter de exclusividade à área de estudo mantendo a diferenciação entre os bairros mais nobres e os menos nobres, herdada desde os inícios do século XX. Assim se explica como entre 1920-1928 os preços mais elevados se localizavam nos arredores da Avenida Segunda seguindo a direção leste-oeste. (vide Mapa 13). Esse padrão se mantém vigente e será analisado nos capítulos seguintes.

A partir da década de 1960 não se forja mais a grande propriedade e os poucos proprietários começam uma comercialização progressiva de terras intensificando a fragmentação, ampliando seu capital e obrigando um maior investimento de capital público e de serviços para responder ao novo modelo “desarrollista” 27

.

27“En la década de 1950, se fija un nuevo modelo desarrollista. Este […] tiene por objetivo

básico “dinamizar y diversificar la producción agropecuaria e impulsar la industria como apoyo del Estado y de sus aparatos de desarrollo energético, educacional, sanitario y de seguridad social.” (VEGA, 1977 apud JIMÉNEZ, 1980, p. 33).