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2 REVISÃO DE LITERATURA

4.5 LUDOTERAPIA EM VIRGÍNIA MAE AXLINE

No decorrer da pesquisa, no processo de Revisão de Literatura, fui tomada de agradável alegria pela leitura e estudo da dissertação de Bragio (2014), fonte de inspiração não somente para a temática brinquedoteca hospitalar, como também para o estudo das obras de Axline (1972; 1985). Fui tocada pela sensibilidade da

escrita nas obras de Virginia Mae Axline, e a maneira como a ludoterapia na sala de brinquedos propiciava ao garoto Dibs desvelar-se não apenas para si mesmo mas também para o mundo , para o outro. Axilne tem marcas humanistas-existenciais produzindo pelo método fenomenológico, mesmo que isso não seja explicitado na sua obra - focando nas descrições compreensivas do fenômeno. Partindo desse princípio, podemos sentir as relações dela com Rogers, seu mestre e amigo. Já Moreira (2007) pontua as possíveis relações de Rogers com Merleau-Ponty, e daí inventamos/ criamos essa possibilidade.

Virginia Mae Axline (1911-1988), psicóloga e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de Nova York, foi uma das pioneiras no uso da terapia de brincar, começando a desenvolver uma terapia de jogo não diretiva na década de 1940, baseada na abordagem emergente centrada em pessoa, Atenção Centrada no Paciente/Pessoa (ACP), de Carl R. Rogers (1902-1987), seu professor. Buscava desvendar, através da Ludoterapia, o ajustamento pessoal nos pacientes tidos como crianças problemas. Em 1947, publica a obra “Play Terapy” (Ludoterapia) estabelecendo oito princípios básicos da terapia de marca não-diretiva, sendo eles:

1. O terapeuta deve desenvolver um amistoso e cálido relacionamento com a criança, de forma que logo se estabeleça o “rapport”.32

2. O terapeuta aceita a criança exatamente como ela é.

3. O terapeuta estabelece uma sensação de permissividade no relacionamento, de tal modo que a criança se sinta completamente livre para expressar seus sentimentos.

4. O terapeuta está sempre alerta para identificar os sentimentos que a criança está expressando e para refleti-los para ela, de tal forma que ela adquira conhecimento sobre seu comportamento.

5. O terapeuta mantém profundo respeito pela capacidade da criança em resolver seus próprios problemas, dando-lhe oportunidade para isto. A responsabilidade de escolher e de fazer mudanças é deixada à criança. 6. O terapeuta não tenta dirigir as ações ou conversas da criança de forma alguma. Ela indica o caminho e o terapeuta segue.

7. O terapeuta não tenta abreviar a duração da terapia. O processo é gradativo e assim deve ser reconhecido por ele.

8. O terapeuta estabelece somente as limitações necessárias para fundamentar a terapia no mundo da realidade e fazer a criança consciente de sua responsabilidade no relacionamento (AXLINE, 1972, p. 69).

Destaca, na obra, como deve ser montada a sala da Ludoterapia tanto para terapias em grupo como individuais. Deve ser uma sala à prova de som, com pia de água quente e fria, janelas com grades, chão e teto protegidos para serem lavados, pois

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Rapport: Termo usado na psicologia. Significa criar uma relação. A primeira relação, a que acolhe que recebe. Observado na obra de Virginia Axline:Dibs: em busca de si mesmo(ver referências bibliográficas)

nesses espaços materiais como tintas e argila são permitidos. Além de possuir gravadores, filmadoras para uso de estudo sem que a criança perceba o uso. Mamadeiras, casinha de boneca, família representada por bonecos, animais, soldadinhos, panelas, roupas de bonecas, fantoches, papel, tintas, revólver, argila, areia, caixa de areia, teatrinho, palco e outros. Enfatiza que, no decorrer da obra, algumas sessões aconteceram a partir de uma maleta de brinquedos selecionados para a sessão específica. Muitos pesquisadores partiram dessa ideia para suas pesquisas de campo e muitos psicólogos e terapeutas utilizam a maleta sugerida pela referida psicóloga. Em suas sessões, apresenta diversos casos, entre eles está Ernest que, aos 3 anos, engoliu soda cáustica, ”um menino enjeitado de seis anos, com uma constrição na garganta, tímido, infantil e antissocial” (p. 303), “uma criança com defeito físico” (p. 342), em uma das sessões foi levado à Ludoterapia para ser preparado psicologicamente para uma cirurgia na garganta, mas pediu para voltar para a terapia assim que saísse do hospital. “Por certo, este contato evidencia que a vida emocional de uma criança é, frequentemente, a base de suas brincadeiras e, através delas, encontra alívio para suas tensões” (p. 172-173).

Em 1964, ela publicou “Dibs in Search of Self “ (Dibs em busca de si mesmo). Após a leitura da obra acima intercalando a original27 com a traduzida, dou sequência em Dibs, a sequência de estudos em Axline (1985). A obra Dibs foi apresentada por Bragio (2014) e a Ludoretapia de Axline (1972) por Colodete (2009).

Mas o que é Ludoterapia? Ludo, do latim, jogo. E terapia assim como a placa que Dibs encontra na sala de brinquedos, e a própria Axline responde quando foi indagada:

- Diria que terapia quer dizer esta oportunidade de vir aqui brincar com o que você quer falar sobre o que mais deseja. É o tempo em que você pode ser da maneira que quiser. É um período que você pode usar do modo que mais lhe agrade. Enfim, uma hora que você aprende a ser, de fato, você. Esta é a melhor explicação que lhe posso dar agora (AXLINE, 1985, p. 156- 157).

Os fenômenos de comportamento exterior estão submetidos à experiência vivida por cada pessoa e, quando esse indivíduo cresce com essa experiência, ele se aceita e aceita seu mundo em um conceito de si próprio o qual cada indivíduo tem dentro de si a capacidade de resolver seus próprios problemas. A linguagem através do brinquedo permitirá a libertação de todas as amarras que prendem suas emoções e

liberta desses sentimentos negativos tornando-o pessoa, centro do universo de sua existência.

Figura 7 – Livro Dibs: Em busca de si mesmo

Fonte: Acervo da pesquisadora

Dibs, uma criança talentosa de 6 anos de idade, aluno problema prestes a ser convidado a se retirar da escola pela direção, mas suas duas professoras não desistiam dele. A última tentativa seria feita por meio da ludoterapia nas sessões com a psicóloga D.A e, a partir do trabalho de uma psicóloga em uma sala de terapia, essa criança sai do casulo e alça voos para a vida. “Como você disse que queria. Como eu falei que desejava. Como nós conversamos que queríamos” (AXLINE, 1985, p. 285). Sensibilidade em estar junto com uma criança que até então não era diagnosticada, que apenas suspeitas a rondavam onde a escuta e o cuidado como elo de confiança e limite de sequência de atitudes por parte do profissional e do paciente.

As regras não precisaram ser impostas, os olhares eram suficientes e, na única vez que Dibs ousaria quebrá-las no quesito segurança, foi permitido e felicitado. Lançar uma mamadeira de vidro na parede tinha muitos significados para uma criança que vivenciou com seu corpo sessões em caixas de areia, permitindo rolar, tocar, sentir, saborear aos poucos o gosto da areia assim como ambos, ele e D.A, saborearam

cada evolução no desabrochar de uma individualidade sentida, percebida, consciente e significada. Um garotinho com transtornos globais do desenvolvimento, uma mãe cirurgiã, um pai cientista e uma irmã mais nova em um processo que eu diria, de epoché, suspendendo todas as barreiras em busca de vida.

A dinâmica da vida é tal, que qualquer experiência, atitude ou pensamento de todo indivíduo está constantemente mudando em relação à interação das forças psicológicas e ambientes sobre todos e cada um dos indivíduos, de maneira que o que aconteceu ontem não tenha para ele o mesmo sentido que tinha quando sucedeu, por causa do impacto das forças da vida e da interação dos indivíduos; da mesma forma, amanhã a experiência será integrada diferentemente (AXLINE, 1972, p. 11).

Assim como em uma brincadeira, através do brinquedo, que como um quebra- cabeças onde peças são encaixadas nos seus devidos lugares e nos momentos certos, a ludoterapia apresentada pela psicóloga Virgínia Mae Axline nos mostra a importância do brinquedo e da brincadeira diante das crianças com necessidades educacionais especiais na estratégia utilizada pelo psicoterapeuta, a fim de que se possa rumar no sentido da autenticidade através da linguagem corporal inigualavelmente revelada em um processo de “busca de si mesmo”.

5 RESULTADOS DO “DIÁRIO DE CAMPO: (COM)VIVENDO COM AS