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Toninho Dina

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.1.2.1 LUTAS SOCIAIS E A QUESTÃO HABITACIONAL EM SJC

Se propor a analisar a Ocupação Pinheirinho como um evento isolado do contexto histórico, social e habitacional da cidade de São José dos Campos, é reduzir o ocorrido a um golpe de sorte, oportunismo ou interesses pessoais, políticos ou de pequenos grupos, como muito se ventilou pela cidade. Nesse sentido, acreditar que a Ocupação Pinheirinho foi um fato isolado é acreditar que a sua existência – e posterior remoção – não terá reflexos na cidade de São José dos Campos, ou mesmo na Região em que a cidade se insere.

Existe uma ampla literatura que trata da problemática habitacional no Brasil17. Por não

ser o foco desta pesquisa, toma-se a liberdade de não se aprofundar no tema, destacando apenas algumas passagens de interesse.

O problema habitacional de São José dos Campos não é recente e acompanha um movimento semelhante ao apresentado em outras regiões do Brasil. Maricato (2008), afirma que “A questão da terra está no centro dos conflitos sociais que alimenta a desigualdade social”. Segundo (SURIANO & RESCHILIAN, 2012, p. 196), em se tratando de São José dos Campos, “A habitação entrou na agenda do poder público municipal como um programa para erradicar as favelas”.

Sob a intervenção da Era Vargas, em 1932-1933 foram definidos quatro zonas para cidade: Comercial, Sanatorial, Residencial e a Industrial (SILVA, 2008, p. 56). Rosa Filho (2002, p. 52) identifica a primeira favela em São José dos Campos em 1930, surgida apenas três anos após a inauguração da Tecelagem Parayba. Dada a sua localização, esse núcleo ficou conhecido como Banhado, hoje conhecido como Jardim Esperança. Em 1932, surge o segundo núcleo, chamado de Linha Velha, hoje Santa Cruz. Destaca-se nesta década a migração de trabalhadores vindos do Sul de Minas Gerais (SILVA, 2008, p.56).

A construção da Via Dutra, na década de 1950, gerou uma supervalorização imobiliária, com o aparecimento de loteamentos de luxo em sua proximidade, fazendo com que loteamentos populares se concentrassem em áreas rurais mais distantes dela. Nessa época, foram aprovados 88 loteamentos pela municipalidade, sendo que a cidade contava com 24 loteamentos clandestinos. Surge também nessa década a favela conhecida como Santa Cruz II (SANTOS, 2006; SILVA, 2008, p. 56).

Segundo Santos (2006) e Silva (2008, p. 61), na década de 1960, devido ao crescimento da cidade e o início do conflito pela sua ocupação, é criado um Plano Diretor (o primeiro

17 (VALLADARES E FIGUEIREDO, 1981; KOWARICK (1994, 2000), MARICATO, 1979, 2009, 2011;

publicado em 1969 e o segundo em 1970). Define-se, então, um sistema viário, uma nova lei para loteamentos, a regulamentação de determinados loteamentos clandestinos e a flexibilização na classificação das zonas da cidade (SILVA, 2008, p. 62).

Ainda incapaz de suprir a demanda habitacional, São José dos Campos torna-se cidade- vitrine do milagre econômico (1968-78) acentuando a migração. É percebido um aumento do valor dos imóveis na cidade (SILVA, 2008, p. 62).

Em 1973, haviam quatro núcleos de favelas em São José dos Campos (soma-se aos núcleos anteriores a favela conhecida como Vidoca e a da Vila Guarani), com 430 barracos e um total de 1926 habitantes – um salto de 100% com relação à década de 1950 (ROSA FILHO, 2002, p. 46-47). Nessa época a migração é diversificada, com pessoas de outras regiões do Brasil. Em 1976, foi criado o Conjunto Habitacional São Judas Tadeu, localizado em uma região então afastada da cidade, com a função de remover a população da favela Linha Velha (ROSA FILHO, 2002). Em 1977-78, com déficit habitacional em 13 mil casas, já com a existência de 12 núcleos de favela, elaborou-se o Primeiro Plano de Desfavelamento, prevendo a reurbanização desses núcleos (SURIANO & RESCHILIAN, 2012, p. 196). Na prática, porém, aprovou-se a “Lei nº 2007/78, que instituiu a criação da Empresa Municipal de Habitação (EMHA), com a principal diretriz de planejar e executar programas de erradicação de favelas, cortiços e outras habitações inadequadas” (Id.). Suriano & Reschilian (2012, p. 196) a esse respeito afirmam: “o que ocorreu foi a transferência da população das favelas localizadas nas áreas centrais para loteamentos periféricos, como o Conjunto Elmano Ferreira Veloso, na região Sul, em 1980.”. Esse loteamento, assim como a maneira que a Zona Sul se insere nesse contexto, por estar diretamente relacionado com a Ocupação Pinheirinho, será tratado com mais detalhes em seção a seguir. Silva (2008), afirma que o processo de remoção segue a tendência de construção de unidades habitacionais em regiões distantes do centro. Nesse sentido Rosa Filho (2002) afirma:

A remoção de moradores de fato da área central para a periferia, viria modificar e dificultar as suas vidas. A acessibilidade a equipamentos urbanos e sociais ficava mais difícil. A partir de então, esses moradores passavam a depender de transporte próprio ou coletivo para se locomoverem ou para o emprego ou para quaisquer outros afazeres no centro da cidade ou em outro local. O acesso à saúde, à educação e ao lazer, também ficava mais difícil. A população sentia-se obrigada a permanecer nessas áreas afastadas, pois sua condição econômica dificultava deslocamentos (ROSA FILHO, 2002, p. 72).

Forlin e Costa (2010 apud SURIANO & RESCHILIAN, 2012, p. 196) destacam que “[Os programas habitacionais da cidade] [...] não atenderam à população que recebia até 3 salários mínimos, pois o financiamento de lotes urbanizados e casas populares eram voltados para a população cuja renda era de até 10 salários mínimos.”. Nesse sentido, afirma Maricato (2009, p. 37)

As diversas formas de provisão da moradia [...] constituem um conjunto continuo e interdependente: se o mercado é muito restrito às camadas de mais altas rendas, como acontece no Brasil, e o investimento público é escasso, a produção informal fatalmente se amplia, pois, como já foi destacado, todos moram em algum lugar.

Na década de 1980, época que o município recebe investimentos de base estatal (ROSA FILHO, 2002, p. 47), foram aprovados 67 loteamentos, chegando a uma oferta de 25 mil lotes. Nessa década, ocuparam-se os vazios urbanos existentes na cidade (SILVA, 2008, p. 64). Espalhavam-se pela cidade 12 favelas (ROSA FILHO, 2002). Com a criminalização dos loteamentos clandestinos, somado à crise econômica vivida no país, a cidade apresenta um acréscimo em seu déficit habitacional. No final desta década, a cidade contabilizava 17 favelas, totalizando 884 barracos (ROSA FILHO, 2002, p. 47). A tratativa dada pela municipalidade às favelas e a sua população é explicada por este autor da seguinte maneira:

[...] devido a uma determinação do poder executivo municipal de não proliferação de favelas, alguns funcionários da fiscalização faziam ronda pelo município para não deixar formar núcleos, principalmente, na região central da cidade. Havia uma escala de fiscais para saírem à noite e se percebessem qualquer construção de barracos, eles avisavam imediatamente a polícia para as devidas providências (ROSA FILHO, 2002, p. 58).

A década de 1990 se inicia com uma crise econômica afetando as condições de vida da população com desemprego e a alta inflação. Nesta década, Segundo Silva (2008, p.64), foi aprovado o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado, PDDI (Lei Complementar n. 121/95) e em 1997 uma nova Lei de Zoneamento (Lei Complementar n. 165/97). Nessa década, aprovou-se cerca de vinte loteamentos e cinco conjuntos habitacionais. Poucos lotes foram ofertados e manteve-se a dinâmica da ocupação dos vazios urbanos (SILVA, 2008, p.64). Ainda segundo pesquisas de Silva (idem), o Ex-Secretário de Obras e Habitação do Município de São José dos Campos no período 1993/1996, Luiz Carlos Raimundo Pontes relata:

Tinha uma fila de mais de sete mil famílias e essa fila não andava. Ao mesmo tempo a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) estava fazendo quase mil e quinhentas (ou mil e duzentas) casas aqui. A Caixa Econômica Federal já tinha feito o D. Pedro I, que era um número grande também de casas, me parece que

mil e duzentas casas, algo assim. Já tinha o Campo dos Alemães, que tinha sido começado pelo Bevilacqua. Então a gente verificava o seguinte: que aquela zona sul era um barril de pólvora, porque só tinham pessoas carentes amontoadas lá e não tinha estrutura. Hoje tem asfalto, tem água, tem esgoto, mas quando nós chegamos as ruas eram de terra, a água só tinha em parte, tinha lugar que não chegava água, aquelas mil e duzentas ou mil e trezentas casas que a CDHU estava fazendo a previsão de água era para chegar a dois anos para frente.

Segundo Rosa Filho (2002) a cidade apresentava nessa época 28 núcleos de favelas e 140 loteamentos clandestinos. Suriano e Reschilian (2012) afirmam que na década de 1990, sob o governo da Ângela Guadagnin (1993-1996):

[...] diferentemente do que havia sido feito nas administrações anteriores, adotou a política habitacional de investir na urbanização de favelas e na regularização de loteamentos irregulares, e criou o Conselho Municipal de Habitação e o Fundo Municipal de Habitação, com o intuito de construir casas populares, garantindo, assim, o acesso à infraestrutura, ao transporte e ao emprego.

É importante lembrar, entretanto, que durante o Governo da. Ângela Guadagnin na cidade de São José dos Campos, entre os anos de 1993 e 1996, houve a remoção de aproximadamente 70 famílias já no bairro do Campo dos Alemães.

Já na década de 2000, foi implantado o projeto “Habitar São José”, prevendo intervenções nas favelas. Volta-se a política de erradicação de favelas. Segundo dados de Rosa Filho (2002, p. 48), “[...] durante o ano 2000, a cidade atinge o total de 538.909 habitantes, com 9.230 moradores de favelas, em 22 núcleos, 12 mil famílias nos 120 loteamentos clandestinos e, também, cortiços.”. Ainda de acordo com Rosa Filho (2002, p. 75) o Plano de Desfavelamento dessa gestão, priorizava a remoção das favelas localizadas em áreas centrais, revelando o interesse imobiliário por trás destas ações.

Esse projeto, parte da plataforma política de quatro gestões municipais do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), se manteve até o final do ano de 2012. Inicia-se, então, o mandato do Prefeito Carlinhos Almeida (Partido dos Trabalhadores – PT), que manteve fortes críticas às ações de remoção dos governos passados.

Espera-se, com a breve exposição do histórico da questão habitacional de São José dos Campos que, logicamente, está inserido no brasileiro, fornecer um pano de fundo para a compreensão desta pesquisa e da Ocupação em si.

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