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Máquinas Cognitivas

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2.7 UTOPIAS OU DISTOPIAS?

4.5.2 Máquinas Cognitivas

Ao estudar os processos lógicos da estruturação de conteúdos e ações, tanto no cérebro biológico quanto nos chips das máquinas informatizadas, procurou-se entender se estas últimas conseguem replicar as construções realizadas pelas primeiras. A possibilidade de máquinas que aprendem com os processos e ações humanas é recente (campo das Learning Machines), e tem seduzido os pesquisadores em razão das amplas possibilidades de que, em algum momento, as máquinas consigam ter autonomia do homem, não ficando mais dependentes dos algoritmos inseridos pelos mesmos. Testes preliminares já constataram que aparatos tecnológicos conseguem reconhecer determinadas reações humanas ao reagir diante de uma imagem ou situação específica.

Os pesquisadores entendem que os exemplos de emissão de comandos mentais humanos (esfera do biológico) para ações no mundo físico (mundo da matéria) são muitos, sinalizando que esta forma de comunicação poderá atingir, de muitas formas, toda a sociedade. Neste sentido, em palestra para estudantes em São Paulo, o jornalista Marcio Padrão relata que o CEO da Microsoft, o indiano Satya Nadella, disse que “chegou o dia não da ciência da computação, mas da computação do pensamento" (2016). Na mesma direção, o cientista brasileiro Nicolelis (2009) afirmou que:

Vamos submergir em sistemas virtuais e nos comunicaremos diretamente com eles. No longo prazo, o corpo deixará de ser o fator limitante da nossa ação no mundo. Nossa mente poderá atuar com máquinas que estão à distância e operar dispositivos de proporções nanométricas ou gigantescas: de uma nave espacial a uma ferramenta que penetra no espaço entre duas células para corrigir um defeito. [...]. Nosso cérebro roubará um pouco o controle que os genes têm hoje sobre a evolução. [...] A comunicação não será mediada pela linguagem, que deixará de ser o único ou principal canal de comunicação. (NICOLELIS, 2009).

Em depoimento ao jornalista Eduardo Anizelli, Nicolelis afirmou que:

O pensamento nada mais é do que uma onda elétrica pequenininha, se espalhando pelo cérebro, numa escala de tempo de milissegundos. O que fizemos [com primatas] foi descobrir que é possível ler esses sinais e extrair

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deles comandos motores capazes de reproduzir num braço mecânico ou numa perna robótica a intenção motora daquele cérebro”. (NICOLELIS, 2009).

E isto vem dando certo, pois o jornalista Nathaniel Scharping (2016)42 relata que:

Quatro músicos, incapazes de falar ou andar, usaram sinais elétricos de seu cérebro para selecionar passagens musicais, enquanto os músicos tocaram suas seleções em tempo real. A interface cérebro-computador dos pesquisadores permitiu que o quarteto expressasse sua criatividade musical sem cantar ou pegar um instrumento. (SCHARPING, 2016). 43

Reforçando tudo isso, Nicolelis estima que “o cérebro se libertou do corpo de vez. Isso quer dizer que, a longo prazo, nosso alcance como humanos vai mudar completamente. Você vai ter a chance de atuar voluntariamente em um ambiente a milhares de quilômetros da sua presença física”, pois estaremos em rede. É possível comunicar-se com máquinas através de equipamentos munidos de EEG – eletroencefalograma e softwares aprendem a controlar aparelhos e computadores apenas pensando em comandos. O mais comum é o uso de “boinas” com eletrodos que escaneiam as áreas nas partes estimuladas.

Zarkadakis (2005) fala dos novos métodos que estão sendo empregados baseados em FMRI, acrônimo inglês para Imagem Funcional de Ressonância Magnética (p. 115). Outra forma são as tatuagens eletrônicas que leem os pensamentos, como é o caso da criada por James Norton, que construiu um sistema de circuitos eletrônicos flexíveis na Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. Elas são muito leves e este aparelho de “leitura da mente” flexível “gerou sinais tão bons quanto os dos equipamentos de EEG tradicionais.

A evolução computacional avança rapidamente e, no caso específico da convergência entre o computador e a mente, foi concebida uma máquina informática neuronal. O primeiro neurocomputador 44, denominado BrainScales, integra o projeto Cérebro Humano, dos pesquisadores da Universidade de Heidelberg, na Alemanha. Os neurocomputadores,

42 Disponível em: https:// blogs.discovermagazine.com/d-brief/#.Vsj62Mc6p8A Acesso em: 22/06/2018.

43 Nathaniel Scharping (2016) No original: Four musicians, who are unable to speak or walk, used electrical signals from their brain to select musical passages while musicians played their selections in real-time. The researchers’ brain-computer interface allowed the quartet to express their musical creativity without singing or picking up an instrument.

44 Disponível em: https://spectrum.ieee.org/computing/hardware/the-brain-as-computer-bad-at-math-good-at-

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denominados de neuromórficos, são compostos por neuroprocessadores, ou seja, com lógicas espelhadas no funcionamento do cérebro humano. Estes processadores não executam procedimentos baseados nos princípios de Alan Turing ou de John von Neumann, base de todas as máquinas informatizadas até agora conhecidas. O professor Karlheinz Meier (2018)

45líder do grupo explicou que:

Ele é mais uma imagem direta, feita sobre silício, das redes neuronais encontradas na natureza, imitando células, conexões e comunicações intercelulares por meio da mais moderna microeletrônica analógica e digital. (MEIER, 2018).

O professor Meier conseguiu produzir um neurocomputador de 20 chips chamado Spikey, com capacidade equivalente a 4 milhões de neurônios e 1 bilhão de sinapses. Ao constatar que máquinas podem reproduzir neurônios e sinapses, importante destacar pesquisa similar que está sendo desenvolvida na Universidade de Manchester na Inglaterra, liderada pelo professor Steve Furber, que planeja simular um cérebro com 1 bilhão de neurônios, utilizando 50.000 microprocessadores normais, Inovação Tecnológica (2010)46. Os esforços dos cientistas em juntar o altíssimo poder de processamento dos supercomputadores para replicar a plasticidade do cérebro, que tem capacidade de processamentos paralelos, aponta na direção de que é possível imitar os procedimentos dos neurônios.

As evidências dos processos da Inteligência Artificial revelam que, ao construir máquinas que reproduzem o comportamento do ser humano, estas poderão em algum estágio futuro provocar uma reflexão sobre a essência deste, pois a humanidade estará diante do desafio de entender e assimilar as simbioses que serão geradas a partir dessa fusão até então improvável. As incessantes inovações tecnológicas mergulharam a sociedade num contexto epistemológico definido como pós-humanismo que, na velocidade e ubiquidade das simbioses cognitivas da atualidade, alargaram o conceito e o redefiniram como Transhumanismo, universo no qual os seres assimilariam os processos lógicos, as funções comportamentais e as características constituintes das máquinas.

45 Karlheinz Meier (2010) Disponível em: II Spectrum: https://spectrum.ieee.org/computing/hardware/the-brain-

as-computer-bad-at-math-good-at-everything-else (2017) > Acesso em: 7/6/2018.

46 Furber Steve (2010) Disponível em: http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?

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A forte aceleração dos avanços tecnológicos, que provocou mudanças radicais nas formas de vida da sociedade, contribuiu para fortalecer o conceito de Singularidade, destacadas no capítulo 3, “Comunicação no século XXI, subitem Utopias ou Distopias?”. De acordo com Ray Kurzweil (2005), “a palavra foi adotada pelos matemáticos para denotar um valor que transcende qualquer limitação finita, como a explosão de magnitude que resulta ao dividir uma constante por um número que fica cada vez mais próximo de zero”47 (2005, p.22). Kurzweil amplifica a exploração desse tema no livro já

citado Singularity is near, onde desafia conceitos, justificativas, esclarecimentos etc. e faz afirmações como esta:

A Singularidade representará o ponto culminante da fusão do nosso pensamento e existência biológicos com a nossa tecnologia, resultando em um mundo ainda humano, mas que transcende nossas raízes biológicas. Não haverá distinção, pós-Singularidade, entre homens e máquinas ou entre realidade física e virtual48. (KURZWEIL, 2005, p.9). Nesta obra considerada uma referência sobre o tema, Kurzweil aponta que, como o poder do processamento cresce fortemente, seria possível definir o ano de 2030 como o ponto em que a capacidade humana será ultrapassada pelo poder das máquinas (p.135), para declarar na sequência que “estabeleci a data para a Singularidade representando uma transformação profunda e perturbadora na capacidade humana, como 2045”. A inteligência não-biológica criada naquele ano será um bilhão de vezes mais poderosa que toda a inteligência humana hoje49 (p.136).

De fato, fala-se da Singularidade tecnológica, relacionando este conceito ao crescimento da Inteligência Artificial e abrindo as possibilidades para um computador superar o ser humano e gerar máquinas poderosas que ultrapassariam a inteligência deste. A Wikipedia descreve que em The Coming Singularity, Vernon Vinge relaciona o “fim da era humana com o avanço tecnológico da superinteligência a taxas

47 Kurzweil (2005) No original: The word was adopted by mathematicians to denote a value that transcends any finite limitation, such as the explosion of magnitude that results when dividing a constant by a number that gets closer and closer to zero.

48 Kurzweil (2005) No original: The Singularity will represent the culmination of the merger of our biological thinking and existence with our technology, resulting in a world that is still human but that transcends our biological roots. There will be no distinction, post-Singularity, between human and machine or between physical and virtual reality.

49Kurzweil (2005) No original: I set the date for Singularity – representing a profound and disruptive transformation in human capability- as 2045. The nonbiological intelligence created in that year will be one billion times more powerful than all human intelligence today.

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incompreensíveis”50. Apesar desta e de outras previsões catastróficas, evolui de forma

acelerada a criação de comandos emitidos através de pensamentos, sinalizando que, de forma consistente, a morfose homem-máquina evolui proporcionalmente à velocidade das inovações.

O mais recente avanço aconteceu na Wits University de Johanesburgo, na África, em setembro de 2017, onde “pela primeira vez, pesquisadores desenvolveram uma maneira de conectar o cérebro humano à internet em tempo real”51, conforme relatou Patrick Caughill para o site Futurism. A conquista integra o Projeto Brainternet que, segundo notícia divulgada na revista Wits University de Johanesburgo, na África, em setembro de 2017, “essencialmente transforma o cérebro ... em um nó de IoT - Internet of

Things na World Wide Web”52. De acordo com Caughill (2017):

Brainternet é uma nova fronteira nos sistemas de interface cérebro- computador. Há uma falta de dados facilmente compreensível sobre como um cérebro humano funciona e processa informações. Brainternet procura simplificar a compreensão de uma pessoa de seu próprio cérebro e dos cérebros dos outros. Faz isso através do monitoramento contínuo da atividade cerebral, além de possibilitar alguma interatividade53.

A jornalista Jolene Creighton (2017) destaca um exemplo concreto desse avanço: a empresa Braintree está criando “a primeira neuroprotese do mundo que pode imitar, reparar e melhorar nossa cognição”. Em outras palavras, eles estão fazendo computadores capazes de se conectar ao nosso cérebro”. O fundador da Kernel, Bryan Johnson, declarou à Creighton54 que “nossa conexão com nossas novas criações da inteligência é

limitada por telas, teclados, interfaces gestuais e comandos de voz – modalidades de entrada/saída ainda restritas. Temos muito pouco acesso aos nossos próprios cérebros, limitando nossa capacidade de co-evoluir com máquinas baseadas em silício de maneiras

50 Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Singularidade_tecnológica Acesso em: 22/06/2017.

51Wits University de Johanesburgo, África (2017) No original: For the first time ever, researchers have devised a way of connecting the human brain to the internet in real time.

52Wits University de Johanesburgo, África (2017) No original: It’s been dubbed the “Brainternet” project, and it essentially turns the brain “…into an Internet of Things (IoT) node on the World Wide Web”.

53 No original: Brainternet is a new frontier in brain-computer interface systems. There is a lack of easily understood data about how a human brain works and processes information. Brainternet seeks to simplify a person’s understanding of their own brain and the brains of others. It does this through continuous monitoring of brain activity as well as enabling some interactivity.

54 Disponível em: http://futurism.com/elon-musk-just-launched-a-company-to-merge-your-brain-with-a-

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poderosas”55. E conclui afirmando que com todas as novas tecnologias de acesso

baseadas em conexões biológico-selênio “isso aumentará nossas habilidades para garantir que possamos manter sistemas artificialmente inteligentes – eles ajudarão a garantir que os robôs não nos superem – e também ajudem a combater doenças neurológicas” (CREIGHTON, 2017).

Para S. Squirra, há que se refletir muito ainda sobre a relação homem-máquina, por mais fascinante que seja o que nos sinaliza o futuro, porque a paixão desenfreada que os jovens, principalmente, dedicam aos dispositivos tecnológicos pode se transformar numa dependência, que produz e consome uma cultura descartável sem substância. N esse sentido, S. Squirra (2018, p. 41) afirma em seu artigo que:

Na experiência cotidiana, os seres convivem com formas distintas de interações, normalmente mediadas por tecnologias (voz, imagens, sons, instrumentos, toques físicos etc.) sendo que, ao carregar as mensagens, estas alteram e desencadeiam comportamentos diferenciados de acordo os contextos onde se inserem. A recepção e elaboração entronizam compreensões ao decodificar as mensagens e as sensações, definindo estados de humor, ações e reações e posicionamentos quanto ao sentido original codificado. Dessa forma, caracterizam-se como puros processos comunicacionais, uma vez que replicam a relação direta emissor-canal- receptor, como originalmente proposto por Shannon em 1948.

Todavia, autores vêm advertindo para os possíveis problemas a partir da convivência humana com as tecnologias conectadas, as dependências tecnológicas que viciam até à morte (BBC56), sedução para o consumo irrefreado ou a descoberta do amor, entre tantos, que projetam o tema para a realização de contínuos olhares quanto à abrangência dos processos presentes em todos os espaços. De uma forma ou outra, percebemos que um campo enorme se abre com a viabilidade concreta das dialogicidades entre humanos e aparelhos informatizados sofisticados, sem a mediação de aparatos de visualização ou sonoros. A comunicação se dá sem movimentos ou comandos físicos fazendo com que a era de uma “ciência da mente” chegue de forma consistente e convidativa.

Dedicamos atenção especial ao tema da comunicação mental, pois entendemos que quando atingirmos esse estágio, ainda que efeitos ensejem um sinal de alerta para os consumidores e usuários intensivos de tecnologia, ela possibilitará a implosão das fronteiras entre homem e máquina; os processos comunicacionais serão fortemente

55 Jolene Creighton (2017) No original: Our connection with our new creations of intelligence is limited by screens, keyboards, gestural interfaces, and voice commands — constrained input/output modalities. We have very little access to our own brains, limiting our ability to co-evolve with silicon-based machines in powerful ways.

56 Documentário Chinese teenagers, publicado em 2015

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turbinados, permitindo um nivelamento praticamente horizontal do acesso a informações e conhecimentos e, consequentemente, fortalecerá a perspectiva de inserção social de contingentes populacionais que hoje estão marginalizados ou não habilitados para interagir com meios digitais de comunicação, como é o caso dos milhões de idosos que vivem no Brasil.

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5 A COMUNICAÇÃO E O IDOSO

A população idosa e a comunicação têm um longo caminho a percorrer e uma série de estágios a serem superados. O primeiro é o da inclusão digital, que permite o acesso a milhares de informações de toda ordem, incluindo deveres e obrigações que os governos e a sociedade têm para com ela e, concomitantemente, permitir que a comunicação através das mídias digitais ocorra de forma sistemática e amigável. O segundo tem a ver com o uso de modernos dispositivos comunicacionais, que precisam ser ergonomicamente concebidos, para que o idoso possa acessar os conteúdos em tempo real e tomar as eventuais decisões pertinentes ao dado obtido. Da mesma forma, o domínio do manuseio desses dispositivos contribui para ampliar e fortalecer as relações sociais e as amizades, independente de fronteiras geográficas. O terceiro está vinculado ao grau de compreensão que o idoso tem dos benefícios que as inovações podem trazer para sua qualidade de vida, pois a tendência é que tais dispositivos sejam cada vez mais orgânicos, replicáveis e integráveis ao próprio corpo humano. O acesso a esses conhecimentos é fundamental para entender a contribuição de tais avanços para uma vivência mais saudável e produtiva, bem como para a própria longevidade. Nos últimos anos, o desenvolvimento dessa área tem sido exponencial, o que torna cada dia mais urgente a inclusão do idoso nos processos comunicacionais. Há um quarto estágio, que surpreende e assusta ao mesmo tempo, e poderá afetar toda sociedade independente de faixa etária, que é o da comunicação mental direta entre seres humanos e entre estes e as máquinas, numa espécie de simbiose que dispensa o uso de qualquer dispositivo externo.

Por todos os argumentos explicitados, independente da cronologia das inovações, entendemos que a inserção do idoso no ecossistema de comunicação digital trará, entre outros benefícios inquestionáveis, um sentido de pertencimento social, a que a grande maioria dessa população hoje está alijada.

As políticas públicas de inclusão digital57 da criança, do adolescente e do jovem priorizam o futuro, mas negligenciam a expectativa de vida útil do idoso, que é uma perspectiva cada dia mais tangível para esta população. O idoso ainda não encontrou um lugar adequado na sociedade contemporânea. Sua contribuição para o desenvolvimento

57 Inclusão digital: entende-se como o processo de democratização de acesso às tecnologias da informação e da

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socioeconômico está quase sempre apoiada em referências de um passado que se perdeu no tempo, excluindo a possibilidade de qualquer protagonismo na construção do futuro.

A inclusão digital do idoso, que é o ponto de partida para sua inserção na sociedade moderna e, eventualmente, no mercado de trabalho, está prevista no artigo 1º do Estatuto do Idoso – Lei 10.741/037, mas é timidamente promovida pelos governos e pela sociedade, acentuando a exclusão de milhões de brasileiros.

Nesse contexto, tanto o acesso básico às informações cotidianas como os impactos que esses novos conhecimentos poderiam exercer em sua qualidade de vida passam desapercebidos, quando deveriam ser estimulados e difundidos em larga escala. Se somarmos a essa realidade o fato de que há um grande contingente de idosos que não dispõe de renda mínima, a exclusão digital representa um duplo desafio ao amplificar dramaticamente a vulnerabilidade de quem está à margem das noções rudimentares de informática, em relação àqueles de detêm tal competência.

Não faltam leis de proteção ao idoso, mas falta o cumprimento delas na prática, uma vez que há o dever moral e jurídico da sociedade e do Estado de amparar os idosos em obediência ao que está previsto na Constituição Brasileira. O Estatuto do Idoso, por exemplo, determina com clareza o dever de assegurar “com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária" e, especificamente quanto à inclusão digital, vale destacar o artigo 21, parágrafo 1, que obriga o Poder Público a criar “oportunidades de acesso do idoso à educação, adequando currículos, metodologias e material didático aos programas educacionais a ele destinados” por meio de “cursos especiais” que “incluirão conteúdo relativo às técnicas de comunicação, computação e demais avanços tecnológicos para sua integração à vida moderna”.

Pierre Lévy58 constatou ainda no início da difusão da internet que “o problema do ‘acesso para todos’ não pode ser reduzido às dimensões tecnológicas e financeiras geralmente apresentadas”, pois seria insuficiente colocar alguém em frente a uma tela mesmo que a interface fosse das mais amigáveis. As políticas públicas devem oferecer possibilidades de “participar ativamente dos processos de inteligência coletiva que representam o principal

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interesse coletivo do ciberespaço” e, com isso, favorecer a “autonomia das pessoas ou grupos envolvidos”. A relevância desta pauta é indiscutível e, vale destacar que sequer começamos a discutir de forma mais ampla os impactos jurídicos que serão gerados pela inteligência artificial, a partir da perspectiva de inserção de um ser cibernético na sociedade, o que provavelmente irá impactar no emprego e, certamente, no risco de uma exclusão ainda maior da população idosa.

O vocábulo “autonomia” constitui verdadeiramente uma palavra-chave, uma vez que sua ausência no âmbito informacional atinge dramaticamente os idosos e sintetiza um curioso

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