• Nenhum resultado encontrado

Percentual de audiências por responsáveis presentes

3.6 Mães, pais, famílias – a destituição do poder familiar

Questionado o juiz sobre os sujeitos envolvidos no cenário de destituição do poder familiar, o entrevistado respondeu dizendo que na maioria das vezes essas famílias têm apenas a figura da mãe, esta inclusive como a provedora do lar. Apontou ainda, que os pais pouco aparecem, fato esse já constatado durante a pesquisa de campo, no acompanhamento das audiências concentradas.

Durante as entrevistas nenhum dos entrevistados problematizou o fato da figura paterna pouco aparecer, sendo naturalizado por todos o fato da figura materna ser o principal e na maioria das vezes único sujeito envolvido neste cenário de destituição do poder familiar.

No que tange ao perfil dessas mulheres que perdem o poder familiar, indagamos aos entrevistados como eles veem essas mães, ou seja, qual o olhar que os profissionais têm em relação a elas. A psicóloga Antônia informou que na maioria das vezes, trata-se de mulheres usuárias de drogas, em situação de miséria, e em sua maioria negras e pardas. Frisa-se que o perfil narrado por essa entrevistada, em relação a seu olhar sobre essas mães, repousou em uma visão social e consequentemente um olhar sobre a raça/etnia dessas mulheres.

Em relação à entrevista do psicólogo Joaquim no tocante ao perfil dessas mães, o mesmo afirmou, assim como a psicóloga Antonia, que trata-se de mulheres pobres, muito pobres, na maioria das vezes negras. Aduziu ainda que normalmente não possuem maridos, ou seja, são famílias monoparentais regidas apenas pela figura da mãe. Segundo o entrevistado, elas que geram sua própria renda, os pais quase nunca aparecem. Ressaltou que são mulheres com muitos filhos, de diferentes parceiros, e as vezes abandonam seus filhos porque o novo companheiro não quer a criançca de outro casamento, então elas deixam seus filhos nas instituições de acolhimento. No início, visitam, depois o novo marido começa a

impor obstáculos o que levaria essas mães a deixarem de visitar seus filhos e acabaremm sumindo. De acordo com o psicólogo, normalmente são mulheres de mais ou menos trinta (30) anos de idade.

Por mais que a visão dos psicólogos em relação ao perfil dessas mulheres seja a mesma, qual seja, mulheres pobres e em sua maioria negras, houve uma preocupação por parte do psicólogo Joaquim em apresentar, também, um pouco dos problemas vivenciados por estas mães, seja com seus parceiros ou seja por não terem parceiros e assumirem suas vidas sozinhas.

Em relação à entrevista da assistente social Joana, o perfil traçado por ela das mães que perdem o poder familiar de seus filhos, foi muito interessante e reflexivo. A entrevistada afirmou que essas mulheres são pessoas que vieram de famílias desestruturadas, que não valorizavam o cuidado, porque não o receberam. Afirmou ainda, que muitas vezes, essas mulheres viveram em situações igualmente de abandono. Ressaltou que em diversos casos tratam-se de mães que também passaram por abrigos em sua infância e adolescência ou que viveram em situação de rua, fazendo a história com seus filhos se repetir, da mesma forma. No entanto, encerrou sua resposta afirmando que essas mulheres são, em sua maioria, usuárias de drogas e população de rua que devido a todos os fatores acima descritos, não querem seus filhos.

A visão desta assistente social demonstra um olhar preconceituoso, pois na medida que afirma que essas mulheres vieram de famílias desestruturadas e que não valorizavam o cuidado, esta profissional pauta sua fala apenas em convicções estereotipadas, sem saber de fato sobre o passado dessas mulheres, como eram suas famílias, e como eram suas relações com as mesmas. Sendo assim, a profissional parte de uma visão preconcebida sobre a realidade atual dessas mulheres, para determinar toda a história de vidas dessas, de forma estigmatizada.

Em relação à entrevista com a assistente social Mercedes, constatou-se que seu olhar sobre as mães é bem parecido com o da também assistente social Joana. Para a entrevistada as mulheres envolvidas nesse contexto, em geral, já tiveram um histórico também de abandono, violência, negligência e acabam por reproduzir tudo isso, não conseguindo exercer uma maternidade responsável. Finaliza a entrevistada dizendo que geralmente tratam-se de mulheres muito pobres, de baixo nível cultural, além de “descuidadas”.

Estes relatos das assistentes sociais, sobre o histórico de abandono – naturalizado - vivenciado por essas mulheres, e que muitas vezes se repete geração por geração nos remete exatamente, mais uma vez, a discussão sobre ausência de políticas públicas em prol desses

sujeitos. E ainda, em todas as entrevistas dos profissionais, percebeu-se que além da pobreza ser algo marcante quando definido o perfil das mães envolvidas no cenário de destituição do poder familiar, o problema com as drogas também é algo em comum na fala dos entrevistados.

Algo a ser destacado remete-se a fala da última entrevistada quando diz que trata-se de mulheres “descuidadas”. Ora, esta percepção em relação a essas mulheres é curiosa, pois se todos os entrevistados traçaram um perfil de pobreza vivenciado por essas mães, a característica “descuidadas” narrado pela entrevistada, se insere em todo o contexto de descuido, não só estético, como definiu a assistente social, mas também social, vivenciado por elas. Porém, vale ressaltar que apenas nessa entrevista essa característica foi levantada, não sendo observado nem mesmo abordado, por nenhum outro profissional, este aspecto.